segunda-feira, 31 de março de 2008

"Ressurge a democracia" - Editorial de "O Globo" em 02/04/1964

Vive a Nação dias gloriosos. Porque souberam unir-se todos os patriotas, independentemente de vinculações políticas, simpatias ou opinião sobre problemas isolados, para salvar o que é essencial: a democracia, a lei e a ordem. Graças à decisão e ao heroísmo das Forças Armadas, que obedientes a seus chefes demonstraram a falta de visão dos que tentavam destruir a hierarquia e a disciplina, o Brasil livrou-se do Governo irresponsável, que insistia em arrastá-lo para rumos contrários à sua vocação e tradições.

Como dizíamos, no editorial de anteontem, a legalidade não poderia ser a garantia da subversão, a escora dos agitadores, o anteparo da desordem. Em nome da legalidade, não seria legítimo admitir o assassínio das instituições, como se vinha fazendo, diante da Nação horrorizada.

Agora, o Congresso dará o remédio constitucional à situação existente, para que o País continue sua marcha em direção a seu grande destino, sem que os direitos individuais sejam afetados, sem que as liberdades públicas desapareçam, sem que o poder do Estado volte a ser usado em favor da desordem, da indisciplina e de tudo aquilo que nos estava a levar à anarquia e ao comunismo.
Poderemos, desde hoje, encarar o futuro confiantemente, certos, enfim, de que todos os nossos problemas terão soluções, pois os negócios públicos não mais serão geridos com má-fé, demagogia e insensatez.

Salvos da comunização que celeremente se preparava, os brasileiros devem agradecer aos bravos militares, que os protegeram de seus inimigos. Devemos felicitar-nos porque as Forças Armadas, fiéis ao dispositivo constitucional que as obriga a defender a Pátria e a garantir os poderes constitucionais, a lei e a ordem, não confundiram a sua relevante missão com a servil obediência ao Chefe de apenas um daqueles poderes, o Executivo.

As Forças Armadas, diz o Art. 176 da Carta Magna, "são instituições permanentes, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade do Presidente da República E DENTRO DOS LIMITES DA LEI."

No momento em que o Sr. João Goulart ignorou a hierarquia e desprezou a disciplina de um dos ramos das Forças Armadas, a Marinha de Guerra, saiu dos limites da lei, perdendo, conseqüentemente, o direito a ser considerado como um símbolo da legalidade, assim como as condições indispensáveis à Chefia da Nação e ao Comando das corporações militares. Sua presença e suas palavras na reunião realizada no Automóvel Clube, vincularam-no, definitivamente, aos adversários da democracia e da lei.

Atendendo aos anseios nacionais, de paz, tranqüilidade e progresso, impossibilitados, nos últimos tempos, pela ação subversiva orientada pelo Palácio do Planalto, as Forças Armadas chamaram a si a tarefa de restaurar a Nação na integridade de seus direitos, livrando-os do amargo fim que lhe estava reservado pelos vermelhos que haviam envolvido o Executivo Federal.

Este não foi um movimento partidário. Dele participaram todos os setores conscientes da vida política brasileira, pois a ninguém escapava o significado das manobras presidenciais. Aliaram-se os mais ilustres líderes políticos, os mais respeitados Governadores, com o mesmo intuito redentor que animou as Forças Armadas. Era a sorte da democracia no Brasil que estava em jogo.

A esses líderes civis devemos, igualmente, externar a gratidão de nosso povo. Mas, por isto que nacional, na mais ampla acepção da palavra, o movimento vitorioso não pertence a ninguém. É da Pátria, do Povo e do Regime. Não foi contra qualquer reivindicação popular, contra qualquer idéia que, enquadrada dentro dos princípios constitucionais, objetive o bem do povo e o progresso do País.

Se os banidos, para intrigarem os brasileiros com seus líderes e com os chefes militares, afirmarem o contrário, estarão mentindo, estarão, como sempre, procurando engodar as massas trabalhadoras, que não lhes devem dar ouvidos. Confiamos em que o Congresso votará, rapidamente, as medidas reclamadas para que se inicie no Brasil uma época de justiça e harmonia social. Mais uma vez, o povo brasileiro foi socorrido pela Providência Divina, que lhe permitiu superar a grave crise, sem maiores sofrimentos e luto. Sejamos dignos de tão grande favor.

cartão corporativo e as ambulâncias do Serra - por Paulo henrique Amorim

http://www.paulohenriqueamorim.com.br/materias28.asp

domingo, 30 de março de 2008

Avaliação positiva do governo Lula atinge maior nível desde 2003, diz CNI/Ibope - por Gabriela Guerreiro (Folha)

O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva registrou avaliação positiva de 58% em março deste ano, segundo pesquisa CNI/Ibope divulgada nesta quinta-feira. O índice é o mais alto desde março de 2003, primeiro ano de Lula na Presidência da República. Somente 11% dos entrevistados avaliaram o governo federal como ruim ou péssimo, enquanto 30% consideraram a condução do governo como "regular".

Em dezembro de 2007, na última edição da pesquisa CNI/Ibope, a avaliação do governo foi de 51%. Em março de 2003, o índice de aprovação ao governo federal também foi de 51% --o que foi considerado pela CNI/Ibope como um crescimento considerável para a avaliação do governo federal.

Já a aprovação ao presidente Lula também cresceu em março deste ano. No total, 73% dos entrevistados aprovam a maneira do presidente governar o país. O índice também foi o segundo melhor registrado pela pesquisa.Somente em março de 2003, a avaliação pessoal do presidente obteve índice maior, de 75%. Em março do ano passado, a avaliação de Lula foi aprovada por 55% dos entrevistados.

Confiança

No mesmo índice de crescimento, a confiança no presidente registrou índice de 68%, enquanto apenas 28% dos entrevistados afirmaram que não confiam em Lula.

Em dezembro do ano passado, o índice de confiança no presidente foi de 60%. Já em abril de 2006, o índice registrou 62%.

Segundo a CNI/Ibope, o movimento expressivo das avaliações positivas também repercutiu na expectativa em relação ao segundo mandato de Lula. Dos entrevistados, 42% afirmaram que o atual mandato de Lula está sendo melhor que primeiro. O percentual dos que consideram o segundo mandato pior que o primeiro caiu de 21% em dezembro para 16%.

A pesquisa ouviu 2.002 pessoas entre os dias 19 e 23 de março, em 141 municípios. A margem de erro é dois pontos percentuais para mais ou para menos.


Comentário: a despeito de tanto esforço, tanta calúnia, tanta mentira, da própria Folha, e de tantos outros...

Dilma, Simon e um conhecido blog - por Gilson Caroni Filho

Ricardo Noblat cobrou de Pedro Simon que fizesse um discurso no Senado denunciando o suposto "dossiê" dos cartões corporativos. O senador gaúcho estava falando de outro assunto. Pediu desculpas ao jornalista e cobrou explicações da ministra Dilma Roussef. Simon sabe qual é o seu exato lugar.


Denunciar irregularidades na esfera pública, com o amparo de sólido trabalho investigativo, é tarefa irrenunciável do jornalismo. Deixar de fazê-lo, sob qualquer pretexto, é recusar os princípios que fundamentam a liberdade de imprensa, assegurada em qualquer regime democrático. Sobre isso não cabe qualquer discussão. É ponto pacífico para os que desejam a solidez das instituições políticas.

Mas, como já frisamos inúmeras vezes, quando a informação deixa de se submeter a outro imperativo que não seja o do aprofundamento democrático, a liberdade desejada se apresenta como sua própria contrafação. É servida, como subproduto de uma vulgata do utilitarismo, para satisfazer os interesses de seus leitores e sócios maiores.

Um jornalismo que se presta à instrumentalização partidária, distorcendo a realidade, infamando quem considera adversário político, usurpa uma franquia do Estado de Direito para funcionar como panfleto de ocasião. Deixa de ser instância fiscalizadora dos Poderes para tentar substituí-los como única instância legitimadora, subtraindo-lhe direitos e deveres. Quando a imprensa vira partido, seja de oposição ou de apoio a qualquer governo, renuncia ao seu caráter republicano, passando a ser ferramenta de interesses escusos. Há dúvidas se merece ainda ser mesmo chamada de imprensa.

É o que parece estar ocorrendo agora com o vazamento de um suposto dossiê contendo gastos feitos com cartão corporativo na época do governo Fernando Henrique. Antes de verificar se foi montado pela revista Veja, useira e vezeira em construir castelos de cartas, parcela expressiva da grande mídia não hesita em atribuí-lo ao Palácio do Planalto.

Há quase três anos, Luciano Martins escreveu um artigo para o Observatório da Imprensa ( "Quando faltam a razão e o direito") que se tornou definitivo pela dinâmica do jornalismo brasileiro. Analisando o que se delineava como tendência no surgimento do “blog do Noblat", o articulista foi preciso:

"A estréia do jornalista Ricardo Noblat, com seu blog político, no Estado de S. Paulo, traz uma lição inestimável para a compreensão do momento que vive nossa imprensa. Traz também uma mensagem claríssima aos jovens profissionais que sonham um dia escrever no outrora vetusto diário paulista.

A constatação é clara: engajada na luta partidária, a tradicional imprensa brasileira, bem representada pelo Estadão, perdeu os últimos pruridos e não se acanha em abrigar um panfleto em suas páginas, desde que venha a reforçar seus propósitos com relação ao atual governo. A mensagem aos jovens também não poderia ser mais explícita: se quiserem ser bem-sucedidos num grande jornal, aprendam a nadar de acordo com a corrente. Se possível, sejam radicalmente a favor de tudo que pensa o patrão. Substituam a ética pela moral do dia, e boa carreira”.

Mudou o veículo (hoje o blog se encontra na sombra da família Marinho) mas a toada permaneceu a mesma. O jornalismo (?) praticado ali comporta não só pleno endosso ao discurso da oposição como, em circunstâncias especiais, busca orientá-la visando à maior eficácia política. Não faltam, é claro, advertências públicas aos que não se comportam de acordo com a orientação da grande imprensa. Afinal, quem, senão ela, pode ser a única instância de intermediação possível? Quem, de fato, é a atora relevante do jogo político? Quem melhor conhece os atalhos que levam à desestabilização de governos eleitos através de coberturas tendenciosas?

Nesse sentido, nada mais pedagógico que duas postagens de Noblat, na sexta-feira, 28 de março. Em ambas, o jornalismo-torcida evidencia quem é quem na esfera pública midiática. Demonstra como se produz o esvaziamento de instituições clássicas de representação para que a imprensa reitere sua centralidade política.

Irritado com um discurso do senador Pedro Simon que, inadvertidamente, sobe à tribuna sem a pauta atualizada, o blogueiro não mede a intensidade da carraspana naquele que tem se notabilizado por um posicionamento incondicional às demandas tucanas. O texto foi ao ar às 9h53m:

"O que faz Pedro Simon (PMDB-RS) que discursa na tribuna do Senado sobre a harmonia das relações entre os três poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) e não diz uma palavra, uma palavrinha só sobre o escândalo do dossiê produzido pela secretária-executiva da Casa Civil da presidência da República contra o casal Fernando Henrique Cardoso e o governo anterior? Será que Simon não leu a reportagem publicada hoje pela Folha de São Paulo? Será que nenhum assessor dele o alertou a respeito? Ou será que ele considera a história mais uma invenção da mídia dita golpista? Ô Simon, atentai bem: não dá para bancar o senador combativo e na hora agá afinar a voz. Não dá para enganar os trouxas o tempo todo".

A irritação obedece à lógica midiática. De onde o senador gaúcho imagina que há espaços para autonomia relativa? Às 11h20m, menos de duas horas após a advertência, Simon passa recibo e expõe o servilismo solicitado. Noblat registra com satisfação:

“Há pouco, Pedro Simon (PMDB-RS) voltou a discursar no Senado. Referiu-se à nota deste blog que cobrou sua omissão diante do fato denunciado hoje pela Folha de S. Paulo - o de que a Secretária-Executiva da Casa Civil encomendou o dossiê (ou "levantamento de dados") contra o governo FHC no caso do uso de cartão corporativo. Simon alegou que o discurso que fizera pouco antes estava preparado há muito tempo. E que ele não lera a reportagem da Folha. Pediu desculpas ao blog. Tudo bem, Simon. Não há de ser nada. Foi erro de sua assessoria, que não o alertou há tempo. É muito raro um político pedir desculpas. Não caberia pedir desculpas ao blog, mas aos brasileiros que assistiam à sessão do Senado transmitida pela televisão. A adesão à humilde ordem dos franciscanos fez bem a Simon."

O que temos aqui não é apenas a tutela da política pela imprensa. Mais que isso, fica evidente como se estrutura a hierarquia no campo conservador. Quem fugir da organização discursiva das oficinas de consenso deve ser advertido e, dependendo da relutância, silenciado.

O velho senador deve fazer sua contrição sem constrangimento. Ou será que ele não se deu conta de que o alvo do denuncismo vai além de Dilma Roussef? O que está em foco é a possibilidade de esvaziar a representação parlamentar do PT a partir de 2010. Para tanto, é preciso minar uma candidatura viável, seja ela qual for, desde já. Veleidades pessoais nessa hora soam absurdas. O jogo é sujo demais para melindres. Simon sabe qual é seu exato lugar.

O reacionarismo antidemocrático - por Luiz Felipe de Alencastro

Desde os anos 1970, quando se tornou o centro político do país nação (em 1965, a eleição direta de Negrão de Lima – juscelinista declarado – para o governo da Guanabara, abalou a ditadura e mostrou que o Rio ainda era a capital política nacional), São Paulo elege o que há de pior e de melhor no Brasil.

Jânio, Maluf, Enéas, Clodovil representam a primeira categoria. Ulysses, FHC, Suplicy, e Lula, cuja iniciação política deu-se em São Paulo, aparecem, conforme o gosto do freguês, como o que há de melhor.

Num artigo na Folha em 23/10/2005 procurei mostrar que este paradoxo constitui um dos componentes da "desordem paulista" que tumultua o quadro político nacional.

Dentre as coisas ruins da paulicéia, existe, ainda e sempre, um tipo de reacionarismo antidemocrático difícil de ser achado noutras partes do país.Assim, um artigo do deputado estadual paulista João Mellão Neto ("Os perigos da incomPeTência"), do DEM, publicado no Estadão em 3/08/2007, critica (com razão) a ausência de Lula junto às famílias das vítimas do Airbus em São Paulo, mas conclui com a seguinte reflexão:

"Nada contra o fato de o presidente se refugiar nos Estados nordestinos. Afinal, é neles que se encontra a grande maioria de seus eleitores, todos eles devidamente subornados pelo Bolsa-Família. Mas, a bem da Nação, a sua passagem deveria ser só de ida. Chegou a hora de dizer: Basta!"

Subornados?

BNH, correção monetária, juros altos para os bancos, juros negativos e perdão de dívidas para os usineiros, Proer, tudo que engordou a conta da classe média e de muita gente rica durante décadas desaparece diante do "suborno" do Bolsa-Família.

Ora, como escreveu outro dia Fernando Canzian no Folhaonline, "o difamado Bolsa Família é apenas uma fração dos juros pagos a quem tem dinheiro no banco, são 0,4% do PIB contra quase 7%".

Cabe lembrar que em 2006, Lula venceu na maioria dos Estados do Norte e do Nordeste, mas ganhou também em Brasília, Goiás, Espírito Santo, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Nestes 5 Estados ele obteve uma vantagem de 7.291.000 votos sobre Alckmin no segundo turno.

Ou seja, mesmo que todos os brasileiros do Norte e do Nordeste tivessem ficado em casa, ou pertencessem a um outro país, Lula ainda dava de lavada no candidato tucano no segundo turno.

Para ser coerente, o deputado do DEM deveria também incluir todos os brasilienses, goianos, capixabas, mineiros e cariocas no seu 'chega pra lá' excludente e preconceituoso.

De quebra, poderia agregar ainda, neste mesmo grupo de "subornados" cujo voto vale menos que o dele e de seus amigos, todos os eleitores da Baixada Santista e da Grande São Paulo, que também deram a maioria de seus votos a Lula.

Falta quanto tempo ainda para a direita brasileira aprender o caminho das pedras da prática democrática?

Correa chama jornalistas de apátridas; Colômbia vaza supostos dados de computador para o NY Times - por Azenha

http://www.viomundo.com.br/denuncias/correa-chama-jornalistas-de-apatridas-colombia-vaza-supostos-dados-de-computador-para-o-ny-times/ por Luiz Carlos Azenha

Lula tira Dantas da forca e faz "El gran acuerdo" com FHC

http://www.paulohenriqueamorim.com.br/materias26.asp - por Paulo Henrique Amorim

Dantas, Bergamo e Chaer - por PHA

http://www.paulohenriqueamorim.com.br/materias25.asp - por Paulo Henrique Amorim

Especialista destaca crescimento da renda com ‘padrões chineses’ para todos, com destaque para os mais pobres - por Márcia de Chiara (Estadão)

Esta é a década da redução da desigualdade de renda, com crescimento chinês para todos os brasileiros, não apenas para a classe C. A constatação é do economista Marcelo Neri, chefe do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas, que acompanha de perto a redução da miséria no País. Apesar do avanço, ele está cético em relação ao futuro. “O Brasil está num momento mágico, que pode estar terminando com essa crise internacional.” A seguir os principais trechos da entrevista.

O sr. acha que o crescimento da classe C mudou a cara do País?
Sim. O fenômeno que mais me impressionou nesta década, mais que o crescimento da classe C, foi o crescimento chinês do poder de compra dos pobres. Ou seja: a redução da desigualdade de renda. Esta é a década da redução da desigualdade, da mesma forma que a década passada foi a da estabilização e a de 80, a da redemocratização.

Qual indicador mostra essa redução da pobreza?
De 2001 a 2006, os 10% mais pobres tiveram um ganho de renda 57,5% em termos reais acumulado per capita. O começo da classe C teve um ganho de 24,9% real nesse mesmo período. Alguém que está no topo, os 10% mais ricos, teve 6,8% de ganho real. Os números são nossos com base nos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) do IBGE. Houve redução da desigualdade, mas com um ponto importante: crescimento para todos. Nos últimos dois anos (2005 e 2006), que pegam exatamente esse movimento de ascensão da classe C, a renda per capita real dos 10% mais pobres aumentou 26,6%. O acréscimo de quem está no meio da distribuição, onde está a classe C, foi de 20,2%. Os 10% mais ricos tiveram um aumento de 15,3% no período. Nos últimos dois anos, houve um crescimento chinês da renda para todos, inclusive para a classe C.

O sr. acha que esse crescimento da classe C se sustenta ou não?
A minha visão é de que o Brasil está num momento mágico, mas que pode estar terminando com essa crise internacional. Há essa dúvida em função da crise e esse começo de reação por parte do governo, que quer desaquecer o consumo. Por outro lado, uma parte do crescimento da classe C foi artificialmente impulsionado por algo que não é sustentável no longo prazo, que foi o aumento de rendas de pensões e aposentadorias. Uma parte importante dos emergentes da classe C são aposentados e pensionistas beneficiados pelo reajuste do mínimo. Além disso, eles contam com o crédito consignado. Essas transferências do Estado para o meio da pirâmide populacional, não para os mais pobres, não há como serem mantidas no longo prazo. Mas temos também fatores altamente positivos e sustentáveis na expansão da renda da classe C, como o aumento do emprego formal. No ano passado foram criados quase 1,7 milhão de postos de trabalho. Esse recorde continuou nos dois últimos meses. A carteira de trabalho talvez seja o maior símbolo do que é ser classe C no Brasil e isso tornou-se realidade para muitos. Talvez os fatores sustentáveis dominem. Acho que 2007 foi o ano de sustentabilidade. Neste ano, a economia está bastante aquecida. Mas há uma situação internacional que está virando. Não seria otimista em relação ao futuro da classe C, mas acho que os ganhos de renda foram muito bons. Para o futuro há mais interrogações do que certezas. Vários fatores que impulsionaram a classe C estão em xeque agora.

O que o Brasil precisa fazer, em termos de políticas públicas, para suportar o crescimento dessa classe C?
Uma medida de política pública importante, cujos resultados serão colhidos mais à frente, são os investimentos em educação. Um PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) educacional para gerar resultados mais rápidos. Outro ponto importante é o Estado não atrapalhar o empreendedorismo da classe C, que sonha ter um negócio próprio. Qual é política pública adequada para isso? É o Estado atuar de forma que retire os entraves e facilite a abertura e o fechamento de um negócio. Um coisa que eu fiquei bastante bem impressionado nesse processo é o microcrédito. Há um movimento de microcrédito para financiar o sonhos dos empreendedores que o Brasil começa a descobrir agora. Essa é uma política pública com elementos privados. É estrutural e não é paternalista. Os empreendedores investem, correm risco e quitam os financiamentos. Na prática, as pessoas querem elas próprias serem protagonistas de suas histórias

Outra bolha, ora bolas - por Márcia Pinheiro (Cartacapital)

Enjoou da crise hipotecária americana? Temos novidades. A mais recente ameaça agora é a bolha de commodities. Pra começar, commodities são identificadas como produtos que vêm da terra: petróleo, produção agrícola e metais. Têm esse nome complicado por serem negociadas em bolsas de futuros e possuírem referência de preços no mercado internacional. Na origem, serviram para proteger os agricultores, os produtores e os consumidores das oscilações imprevistas de preços. O mercado pode ser poderoso, mas não manda na natureza.

Só que, e sempre há um porém, as commodities tornaram-se refúgio dos investidores que não queriam apostar meia pinga em títulos de governos, bancos e empresas, por causa da podridão da crise do subprime. Os preços foram bombando, sempre com a justificativa de que há 2,5 bilhões de cidadãos chineses e indianos ávidos por comer, ter energia elétrica e combustível em seus atuais e futuros carros. Até que as cotações chegaram a um nível insustentável.

A coisa fugiu ao controle. Os preços tornaram-se irrealistas e as vendas em massa aconteceram. Se a China não crescer 11% em 2008, crescerá 9% ou 10%. Muda tanto assim? Nada. Mas com essa justificativa boba, e com intenções nada pueris, os investidores desovaram suas posições futuras em commodities na semana passada. Ou para cobrir prejuízos no mercado hipotecário, ou por puro medo mesmo.

O Brasil é produtor de commodities por excelência. Mas não será esse chilique do mercado que abaterá nossa economia. Há outros chiliques em Brasília muito mais danosos. Não embarque em explicações simplistas dos pregões, que mudam de A a Z de um dia para outro, sem a menor cerimônia. Existe o perigo da desmontagem violenta das operações futuras com commodities, isso lá é verdade. Outra vez, fico cada dia mais chata e repetitiva: faltaram regulação e supervisão nessas operações.

Dica econômico-cultural
Com Deus e o Diabo soltos na terra dos mercados, ocorreu-me o panteão africano, magnificamente descrito por Pierre Verger, no livro Orixás, da editora Corrupio. Cada deus iorubá representa as virtudes e as fraquezas humanas. Oxumaré se assemelha a um certo tipo de investidor. É o “arquétipo das pessoas que desejam ser ricas... e não medem sacrifícios para atingir seus objetivos”. A obra, belissimamente ilustrada, mostra que, se alguém inventou a roda, não foi Wall Street.

Na batida da semana

Senta que lá vem chumbo. A semana é carregada de indicadores que os mercados olham. Reagem a cada um como se fosse o fim do mundo. A começar pelos americanos, na segunda-feira 24, são divulgados os indicadores de vendas de novas residências em fevereiro. Vão recuar. Na terça, sai um índice de confiança do consumidor importante.

Na quarta, vamos conhecer as encomendas à indústria de bens duráveis de fevereiro (dizem que crescem um pouquinho), as vendas de casas novas (caem) e a quantidade de petróleo que os EUA têm em estoque. Isso, ninguém aposta previsão. Na sexta, são divulgados dados sobre a renda e o consumo dos americanos.

Aqui, o mais importante são os dados do setor externo de fevereiro, que prometem navegar no terreno negativo, a sair na segunda-feira. Na quinta, tem a reunião do Conselho Monetário Nacional. Olha o bolso! Especula-se que o CMN possa restringir o prazo dos financiamentos, principalmente para a compra de automóveis. Bom prestar atenção. E há ainda a pesquisa mensal do emprego, divulgada pelo IBGE. Por enquanto, você verá um país descolado da crise externa. Uma hora a conta será paga, mas não agora.

sábado, 29 de março de 2008

Nossa burguesiadevia e ficar quietinha e pensar muito no que ela fez para este país - por Luiz Carlos Azenha

http://www.viomundo.com.br/opiniao/nossa-burguesia-devia-e-ficar-quietinha-e-pensar-muito-no-que-ela-fez-para-este-pais/

Choque de realidade - por Luiz Antonio Cintra (Cartacapital)

Em duelo com a dura realidade dos fatos, o governador José Serra, candidatíssimo a candidato à Presidência da República em 2010, esforça-se nas últimas semanas para não acusar os golpes que o destino lhe tem pregado. Não foram poucos e ainda levará algum tempo até que seus efeitos sejam completamente conhecidos. Em poucos dias, Serra viu o fôlego financeiro do seu governo – e, por tabela, de seus ambiciosos planos políticos – reduzido consideravelmente, ao não conseguir levantar os 6,6 bilhões de reais que a privatização da Cesp renderia, de acordo com os planos do estado. Assistiu à confirmação pública de Geraldo Alckmin, seu maior adversário interno no plano estadual, como virtual candidato do PSDB à prefeitura paulistana. E contou com um empurrão do PT, que jogou para a frente a decisão em torno da provável aliança com o PSDB mineiro de Aécio Neves, o tucano que insiste em tirar o sono do governador paulista em sua cruzada rumo ao Planalto. Para quem conhece Serra, a maior prova de que as coisas não andam como ele gostaria são o bom humor e a leveza com que tem aparecido para comentar seus reveses.

O caso do fracassado leilão da Cesp é emblemático. Na terça-feira 25, véspera da data marcada para o leilão, depois de confirmado o desastre, Serra bateu na tecla de que a culpa foi da crise financeira norte-americana e do fluxo reduzido de crédito internacional para os investidores. “Numa conjuntura internacional ruim, não foi fácil para as empresas encontrarem financiamento”, afirmou Serra, acrescentando que fazia uma avaliação “como economista”. Restou ao governador lançar mão de uma “vantagem comparativa” às avessas, para usar uma expressão cara à teoria econômica: “Não vendemos a empresa na bacia das almas”, foi o melhor que o governador pôde argumentar em sua defesa, como se tivesse resistido a uma incomensurável pressão. Quem sabe proveniente de Serra, o político.

“Sem dúvida, foi uma derrota para o governo paulista, que poderá, inclusive, ser explorada pelo Aécio. Mas não creio que seja suficiente para inviabilizar a candidatura do Serra à Presidência, inclusive porque há questões circunstanciais, como o cenário internacional e o problema das concessões”, afirma o cientista político Cláudio Couto, professor da PUC-SP e da FGV. Couto considera que nem a possibilidade de levar o carimbo de privatista seria necessariamente ruim para Serra. “Na última campanha, quando o Alckmin reagiu usando boné e camiseta de estatais, o estrago foi grande por ele ter demonstrado insegurança. Se tivesse defendido as privatizações, acredito que o resultado seria diferente”, avalia.

Uma parcela da mídia bem que tentou colaborar com o governador, culpando as empresas pré-qualificadas e mesmo o governo federal. As primeiras por terem se recusado a participar dentro das condições estabelecidas pelo governo de São Paulo. E o segundo por não ter alterado em cima da hora as leis que regulam o setor elétrico nacional, de modo a permitir a renovação de duas concessões que a Cesp terá de devolver à União em 2015, responsáveis por dois terços da capacidade de geração da empresa paulista. É consenso entre os especialistas do setor que aí está a principal causa do fiasco.

Caso saísse uma cartada do Ministério de Minas e Energia nesse sentido, não é difícil supor a acusação que recairia sobre o governo federal, por atentar contra a segurança jurídica, tida como um dos pilares do crescimento econômico. Curiosamente, ocorreu o contrário: na quarta-feira 26, alguns jornais tidos como liberais defenderam, na primeira página, a necessidade de alterar a “confusão” da atual lei de outorgas, conforme o desejado por Serra. O governador também incluiu na sua lista de causas a incerteza em relação às concessões, mas em um modesto terceiro lugar, atrás da crise nos EUA e do ímpeto baixista dos investidores candidatos.

A lei que trata do setor elétrico é, contudo, bastante clara a esse respeito – bem como a infelicidade de Serra. Obriga o governo do estado de São Paulo a devolver as usinas de Jupiá e Ilha Solteira, assim que o prazo de concessão vencer pela segunda vez. Caberá à União realizar nova licitação e auferir lucro com o leilão, posto que o potencial hidráulico dos rios é patrimônio nacional – não do governo de São Paulo ou de sua geradora de energia.

Nesse ponto, o governo federal também teve sua parcela de responsabilidade. Poucos dias antes do leilão, o ministro Edison Lobão (Minas e Energia) afirmou que buscava uma “brecha” jurídica que permitisse renovar pela terceira vez as concessões da Cesp. Com isso, concedeu alguns dias de vida a mais para o sonho de Serra, que ainda fez correr a informação de que o BNDES entraria para financiar os compradores.

A jogada do ministro Lobão não foi sem sentido. Serviu para defender interesses da estatal federal de energia, Eletrobrás, cujas outorgas também vencerão nos próximos anos pela segunda vez. Como a intenção oficial é transformar a companhia em uma Petrobras do setor elétrico, seria ruim que a empresa tivesse de entregar suas concessões. Ao fim, ficou claro que este é um assunto que terá de ser avaliado pelo Congresso Nacional, provavelmente, na próxima legislatura.

Em viagem a São Paulo, o senador Sérgio Guerra (PE), presidente nacional do PSDB, bateu o martelo no mesmo dia em que foi decretado o cancelamento do leilão. Mais uma vez, contra os interesses serristas. O anúncio saiu depois de Guerra encontrar-se com o governador e com Alckmin, separadamente. O senador pôde constatar o grau de animosidade que separa, de modo irremediável, os dois tucanos.

Depois do encontro, Guerra afirmou que a aliança local entre o DEM e ala tucana ligada a Serra teria de conviver com dois candidatos nas próximas eleições municipais. A questão será conter o ímpeto do prefeito Gilberto Kassab e de Alckmin, de modo que a campanha não cause estragos duradouros.

Com Serra veladamente apostando suas fichas em Kassab, o risco será o de Alckmin sair marchando e a banda (tucana) não o acompanhar. “Não há dúvida nenhuma de que o Serra vai cristianizar o Alckmin. Ele já deixou claro, aliás, que as lideranças do PSDB municipal não vão ungi-lo candidato. O Alckmin terá de dizer ‘eu quero’”, diz o pesquisador do Cebrap Marcos Nobre, professor do Departamento de Filosofia da Unicamp. Referência a Cristiano Machado, do PSD, que em 1950 disputou com Getúlio Vargas e foi sumariamente abandonado pelo partido, cujos militantes preferiram votar em Vargas.

No caso de Alckmin, essa possibilidade cresce consideravelmente quando se leva em conta o estilo Serra de fazer política. Para os analistas políticos, sua carreira sempre foi marcada pelo individualismo e a sede de poder. Também lembram o episódio que envolveu, em 2002, a pré-candidata à Presidência da República pelo então PFL, Roseana Sarney, que desistiu da disputa depois de uma batida da Polícia Federal encontrar 1,3 milhão de reais em dinheiro na empresa de seu ex-marido Jorge Murad. O dinheiro seria usado para gastos da campanha. Na ocasião, lideranças do partido de Roseana saíram convencidas de que a campanha de Serra estava por trás da denúncia. Por conta desse caso e também de desavenças entre Serra e ACM, consta que uma parcela considerável do atual DEM prefere trabalhar contra os interesses de Serra. E a aliança seria vital para viabilizar a candidatura deste em nível nacional.

Nos bastidores, comenta-se que a tensa relação entre Serra e Alckmin chega a envolver as respectivas esposas, a atual primeira-dama do estado, Mônica, e a ex Maria Lúcia. As duas cortaram relações, e o ponto central da discórdia seria um assunto de interesse público. Lu Alckmin, como é conhecida, não considera razoável que as contas do último ano do governo de seu marido tenham merecido advertências do Tribunal de Contas do Estado (TCE). Vê o dedo do atual governador nessa história.

Constrangimentos, pelo visto, não faltarão ao candidato Alckmin. Nas últimas semanas, ele tem convivido com artigos em jornais e manifestos assinados pela bancada de seu próprio partido na Câmara Municipal. Em todos os casos, não é necessário nenhum conhecimento maior de semiótica para captar a mensagem: Gilberto Kassab, apesar de ser do DEM, é o preferido.

A seu favor, Alckmin conta com o fato nada desprezível de ser o primeiro colocado nas pesquisas de opinião. Em segundo lugar, a ministra Marta Suplicy e, em terceiro, Kassab.

Com essa vantagem e as poucas opções que os próximos anos lhe reservam na política, o ex-governador sabe que não pode dar margem ao azar, nem muito menos ficar a reboque de Serra. “Alckmin não pode perder. Se perder, provavelmente terá de esperar até 2010, quando sairá candidato a senador. Mas seu perfil é de executivo e isso poderá ser fatal quando ele chegar ao Senado. O mais provável é que ele seja um zero à esquerda no Parlamento”, afirma Nobre.

O silêncio e a calúnia - por Mino Carta

Pergunto aos leitores: em qual país democrático e civilizado a saída de um jornalista do peso de Paulo Henrique Amorim de um portal da importância do iG seria ignorada pelo resto da mídia? Na imprensa, a notícia só mereceu uma lacônica nota na Folha de S.Paulo, no vídeo o registro pela TV Senado de um discurso do senador Inácio Arruda, do PCdoB do Ceará, a lamentar o episódio e solidarizar-se com Amorim.

E o episódio não somente é muito grave, mas também altamente representativo da prepotência dos senhores, acobertados pelos seus sabujos midiáticos. O espetáculo da tartufaria não é surpreendente. Não cabe espanto, sequer um leve assomo de perplexidade. Tudo normal, na Terra brasilis, tão distante, tadinha, da contemporaneidade do mundo. Porque não há país democrático e civilizado onde o abrupto afastamento de um profissional tão honrado e competente quanto Amorim não teria repercussão na mídia, imediata e profunda.

Não faltaria a busca das razões que levaram o iG a agir de forma tão violenta, ao tirar Conversa Afiada do ar sem aviso prévio, ao lacrar o computador do jornalista e enxotar o pessoal da equipe da sede do portal. Bastaria este comportamento para justificar a repulsa da categoria em peso e a investigação dos interesses envolvidos, necessariamente graúdos.

Pelo contrário, ouviu-se clangoroso silêncio, quase a insinuar que, se a mídia não o noticia, o fato não aconteceu. Que diria Hannah Arendt ao verificar que no Brasil há cada vez menos “homens dispostos a dizer o que acontece e que acontece porque é”, de sorte a garantir “a sobrevivência humana”?

Pois o fato se deu, e não se exigem esforços mentais einsteinianos para entender que os donos do iG (Brasil Telecom, Fundos e Daniel Dantas) decidiram abandonar Amorim ao seu destino. Não é difícil também enxergar como pano de fundo o projeto de fundir Brasil Telecom com Oi, a ser executado com o apoio do BNDES, e portanto do governo federal, a configurar mais um clássico do capitalismo sem risco de marca tipicamente brasileira.

Ocorre-me comparar o mutismo atual diante de um fato tão chocante com a indignação midiática que, recentemente, submergiu a campanha de ações movidas em juízo por fiéis da Igreja Universal do Reino de Deus contra a jornalista Elvira Lobato, da Folha de S.Paulo, autora de reportagem sobre o êxito empresarial da Iurd. Não está claro até o momento se o Altíssimo acudiu o bispo Macedo e seus prosélitos, mas é certo que, se o fez, ou o fizer, terá de enfrentar a ira da mídia nativa.

Foi um coro de manifestações a favor da liberdade de expressão ameaçada, um rosário de editoriais candentes, de colunas vitriólicas, de comunicados de entidades representativas da categoria. A saber, Fenaj, ABI, ANJ, Abraji, sem contar a associação dos correspondentes estrangeiros (OPC). Ah, sim, a famosa liberdade de imprensa. A mídia verde-amarela não hesita em defendê-la, quando lhe convém. Permito-me concluir que, no caso de Paulo Henrique Amorim, não lhe convém.

Recordo episódio similar que me diz respeito. A minha saída de Veja em fevereiro de 1976. Vai às livrarias na segunda 31, lançado em Curitiba, um livro de memórias de Karlos Rischbieter, presidente da Caixa Econômica Federal no começo do governo do ditador de plantão Ernesto Geisel, depois transferido para a presidência do Banco do Brasil e enfim ministro da Fazenda de outro plantonista, João Batista Figueiredo. Ficou por um ano, saiu contestando as políticas que a ditadura pretendia levar adiante.

Escreve Rischbieter em um dos capítulos:

“No começo de 1975 deu entrada na Caixa um pedido de financiamento do Grupo Abril. O pedido era de um financiamento que equivalia a 50 milhões de dólares, para consolidação de várias dívidas, em grande parte em moeda estrangeira. O pedido foi analisado pelo pessoal competente, recebeu parecer positivo e foi aprovado pela diretoria. Mas faltava a aprovação do Governo. E Armando Falcão, ministro da Justiça e guardião dos “valores revolucionários” vetou o financiamento com o argumento de que a Veja, carro-chefe das publicações do grupo, e que tinha como diretor Mino Carta, era sistematicamente antigoverno. Em seu livro autobiográfico, O Castelo de Âmbar, Mino conta com detalhes o episódio que culminou com sua saída do Grupo Abril. Eu tentei, no meio da discussão, convencer o general Golbery a assumir o controle da situação e convencer o presidente a vetar o veto do ministro da Justiça. Mas foi em vão. O empréstimo só foi aprovado quando Mino Carta deixou a Veja no começo de 1976”.

In illo tempore colegas de profissão também silenciaram, com exceção do jornal do sindicato paulista. Em compensação, alguns insinuavam, quando não afirmavam, que eu prestava serviço ao chefe da Casa Civil, Golbery do Couto e Silva, quem sabe em troca de vantagens financeiras. Tempos depois, em 1979, Figueiredo no poder, um célebre jornalista escreveu um texto na Folha de S.Paulo intitulado “De João a Mino, os donos do poder”. João Figueiredo, está claro. Apresentava-se ali a seguinte tese: “Lá na outra ponta do bonapartismo, em versão microscópica e virulenta, está o jornalista Mino Carta, mini-representante do mandonismo local, que apoderou-se da abertura política concebida e instrumentada pelo general Golbery do Couto e Silva, seu amigo e aparente protetor, para pontificar sobre o que é certo ou errado”.

Vinte anos depois, em 1999, outro jornalista de larga nomeada escreveu um livro para recuperar o tempo perdido e disse que eu fui demitido da Veja. Nada disso, esta é a versão do patrão. Eu me demiti, para não ter de levar as moedas da Editora Abril, e não seriam trinta dinheiros. Mas, desde a eleição de Lula em 2002, há quem sustente, periódica e inexoravelmente, que CartaCapital está a serviço do governo. Eis aí, inúmeros jornalistas nativos não conseguem imaginar um colega digno que não se porte igual a eles.

quarta-feira, 26 de março de 2008

A ocupação do Iraque, cinco anos depois - por Guilherme Scalzilli

Há um equívoco de origem nas discussões sobre se os EUA estão vencendo a “guerra contra o Iraque”: nunca houve guerra, mas ocupação. E essa constatação é mais conseqüente do que pode parecer à primeira vista. Guerras e ocupações têm objetivos e métodos diferentes. As primeiras terminam, por exemplo, e são fundamentalmente empreitadas militares, planejadas para atingirem essa finalidade o mais rapidamente possível. Domínio territorial, quando visado em si, faz sentido apenas se longevo, e possui aspectos econômicos indissociáveis da força armada.

Mas o completo usufruto das potencialidades econômicas, estratégicas e até simbólicas da ocupação não depende apenas da deposição do governo local e da presença de tropas. Um país em ruínas, com população hostil e mão-de-obra extenuada proporciona mais prejuízos que dividendos. A missão formalmente civilizadora dos EUA é incompatível com o expressivo número de baixas dos invasores, o genocídio dos civis iraquianos e o predomínio do terror, da tortura e da clandestinidade.

Acontece que manter um longo estado de beligerância no Iraque também é lucrativo para os grandes conglomerados que assumiram o poder com George W. Bush. A espantosa cifra de três trilhões de dólares (gasto estimado da invasão até agora) dá uma boa medida do tipo de riqueza envolvida. Trata-se de dinheiro público (ou quase) passando às mãos de companhias privadas, em pleno florescimento da maior crise financeira das últimas décadas. Mesmo exagerando a quantia gasta para cobrir indenizações, percebe-se que essa fortuna quase não se abala. Simplificando, para visualizar remotamente a cifra, imaginemos duas mil empresas recebendo um bilhão de dólares cada, em cinco anos.

Eis o aspecto tenebroso da conquista estadunidense: ela não transcorre segundo expectativas claramente definidas. Quanto mais se aproxima de uma vitória estritamente militar (inevitável a longo prazo), mais consolida a derrota do projeto inicial, que vislumbrava um protetorado submisso e estável. E o abandono dos objetivos originais, além de garantir satisfação financeira aos asseclas de Bush, ajuda a criar novos critérios de sucesso para divulgação à opinião pública.

Em resumo, basta imergir a ocupação desastrada no imaginário guerreiro para se inventar um triunfo militar. Em breve os EUA poderão abandonar um Iraque arruinado, sem perspectivas, entregue à miséria e ao desespero, e esse gesto parecerá vitorioso apenas pelo alívio que proporcionará.

As eleições e a Internet - por Rogerio Garcia Fernandez

O TSE, mais uma vez, legisla sem conhecimento de causa. Em 2006, apresentei no encontro anual da ANPOCS (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais) um trabalho que mostra a ignorância do TSE quando o assunto é campanha eleitoral na internet.

Na última Resolução do TSE (legislação sem passar pelo congresso) n.º 22.718, que trata sobre o assunto, os candidatos agora só poderão fazer campanha em sites destinados exclusivamente para isso. Ou seja, o partido ou o simpatizante não pode fazer campanha para o candidato, porque não destinado exclusivamente para isso.

É uma piada proibir que em meu blog eu não possa expressar a minha opinião ou fazer campanha para o candidato que bem entender. Eles saem do pressuposto que todas as pessoas que publicam coisas na internet são profissionais da área de comunicação (e vivem disso) e por isso devem seguir a legislação eleitoral remendada pelas resoluções estapafúrdias do TSE.

É uma visão torta, que interpreta o que ocorre na internet da mesma forma que na televisão. Desconsidera-se a tecnologia, pois, todos devem ter um canal específico e se expressar de maneira clara e precisa para facilitar o julgamento do TSE, caso haja um conflito de interesses a partir da opinião expressa. É, na prática, um jogo de cena para dizer que a internet é um problema a mais para o TSE, pois as pessoas podem se expressar livremente, com o mínimo de controle (que perigo!) e não uma nova maneira de praticar a democracia.

A CPI dos cartões e a repercussão negativa dos fatos - por Azenha

http://www.viomundo.com.br/visite-os-bastidores/a-cpi-dos-cartoes-e-a-repercussao-seletiva-de-noticias/

Um aforismo Bolivariano

"Os Estados Unidos parecem destinados pela providência para encher de fome e miséria a América Latina em nome da Liberdade".
Símon Bolívar (1783-1830), político e revolucionário venezuelano, chamado O Libertador

Falta alguém no mensalão: Dantas - por PHA

http://www.paulohenriqueamorim.com.br/materias21.asp - por Paulo Henrique Amorim

Direita, eu? - por Leandro Fortes (Cartacapital)

Chega a ser engraçado essa coisa de, no Brasil, ninguém ser de direita. Por aqui, alguém só se diz de direita quando quer chocar ou demonstrar certa ferocidade política e pessoal do tipo “sou de direita mesmo, vai encarar?”. Coisa de cabo eleitoral da TFP e bestas-feras do gênero. Mas a regra é diferente. Quem é de direita só abre a boca quando percebe receptividade no ambiente. Mais ou menos como quem é racista. Normalmente, para se identificar alguém de direita é preciso observar o conjunto dos atos e o tom do discurso, uma mistura de falsa simulação ideológica que inclui, necessariamente, a negação das divisões políticas ou, no limite, a própria negação da política. Dessa forma, ao ser questionado sobre pendores ideológicos, o indivíduo de direita se sai sempre com o clichê da queda do muro de Berlim – embora a maioria apenas desconfie, ligeiramente, do verdadeiro significado do evento e do processo que o deflagrou. Depois da queda do muro de Berlim, portanto, não tem mais direita nem esquerda, é tudo muito relativo. Outra saída é dizer que odeia política, que é apolítico (?), que político é tudo canalha, que não vai mais dar o voto para ninguém. Mentira: vai votar na direita.

No Brasil, há casos clássicos de políticos e intelectuais que migraram para a direita, um pouco pelo desencanto do comunismo, pela perda natural dos ideais que a idade provoca, mas muito pela oportunidade de ficar rico ou fazer parte da elite nacional que toma uísque escocês e freqüenta balneários de luxo, ainda que forma subalterna e humilhante. Não é preciso citar nomes, mas muitos pululam pelos parlamentos, partidos políticos e redações de jornais. Pergunte a qualquer deputado ou senador se ele é de direita, e não vai aparecer nenhum. Todo mundo tem uma desculpa para não ser de direita, mesmo os mais conservadores e reacionários, mesmo as viúvas da ditadura militar, mesmo os risíveis neodemocratas de plantão. Todos vão dizer que esquerda e direita não existem mais. Que depois da queda do muro de Berlim, etc,etc,etc.

A verdade é que ninguém quer se admitir de direita porque, no Brasil, ou em qualquer outra nação latino-americana que tenha sido submetida a regimes neofascistas comandados por generais, ser de direita tem pouco a ver com a clássica postura liberal econômica ou com a defesa das leis de mercado. Tem a ver é com truculência, violência, racismo, fundamentalismo religioso, obscurantismo político, coronelismo, ódio de classe e, é claro, golpismo. Por isso há tão poucos direitistas assumidos. Assim, de cabeça, aliás, não lembro de nenhum. Ah, de repente me lembrei de uma confissão antológica do ex-deputado Wigberto Tartuce, o Vigão, parlamentar do PTB brasiliense, de riquíssimo prontuário policial, temeroso de ser confundido na multidão: “Eu sou de direita, mas sou honesto”. Até agora, a única confirmação das autoridades policiais é a de que Vigão é mesmo de direita.

O vale-tudo de Serra - por José Dirceu

Ê PSDB! Os tucanos não aprendem, querem continuar privatizando. O caso da Companhia Energética de São Paulo (CESP) é emblemático. Nem o apagão de 2001 e todas as suas conseqüências os convenceu do erro de privatizar o setor energético, principalmente a parte de geração. Em todos os países, inclusive nos EUA, a privatização na área não deu certo. Mas o governador José Serra insiste no leilão da CESP, mesmo com as incertezas sobre a renovação das concessões e a queda do preço das ações da companhia - que ele atribui a especulação, quem diria!

Leitor amigo, vamos pensar juntos e eu vou te ajudar a entender a insistência do governador: a questão de fundo é política, está vinculada ao fato de o Serra ser candidato a presidente da República em 2010. Por isso, busca a todo preço fazer caixa para grandes obras, e em função desta candidatura, faz de tudo - vende empresas do Estado, insiste em privatização que não deve ser feita, faz empréstimos, antecipa receitas, dá anistia e refinancia débitos tributários.

terça-feira, 25 de março de 2008

Serra me demitiu? - por PHA

http://www.paulohenriqueamorim.com.br/materias18.asp - por Paulo Henrique Amorim

Em carta, Venezuela reclama que "Washington post" já chamou presidente até de palhaço

O governo da Venezuela se manifestou, por carta, contra o que definiu como "cobertura hostil" do jornal americano Washington Post em relação ao país, especialmente em editoriais. Segue a íntegra da carta, endereçada ao subeditor da página editorial, Jackson Diehl:
"Durante os últimos anos temos lhe informado sobre nossa preocupação com a cobertura hostil, distorcida e imprecisa que seu jornal tem feito da Venezuela, particularmente na página de editoriais.
Previamente comunicamos nosso alarme com respeito às reportagens pouco equilibradas sobre a Venezuela durante o período 2000-2006, as quais evidenciaram análises parciais e julgamentos falsos sobre o governo do presidente Chávez e os eventos que se desenvolveram no país. Não obstante, desde então essa tendência do Post tem piorado.No ano passado foram escritos mais editoriais sobre a Venezuela do que em anos anteriores, 98% dos quais foram negativos ou agressivos, com informação falsa ou manipulada. Por isso, nos vemos forçados a crer que o Washington Post está promovendo uma campanha contra a Venezuela e contra seu presidente eleito democraticamente, Hugo Chávez.
Durante o último ano, ao referir-se ao presidente Chávez, os editoriais do Washington Post utilizaram qualificativos como "homem de força", "autocrata", "palhaço", "errático", "déspota" e "ditador" em oito ocasiões distintas e em sete oportunidades se fez referência ao governo como "ditadura", um "regime repressivo" ou uma forma de "autoritarismo". Estes juízos não são apenas falsos, como extremamente perigosos. O governo dos Estados Unidos já se utilizou de tais classificações para justificar guerras, intervenções militares, golpes de estado e outras técnicas de mudança de regime, ao largo das últimas décadas.
Longe de ser uma ditadura, o governo do presidente Chávez tem o índice mais alto de popularidade da história contemporânea da Venezuela e ganhou três eleições presidenciais com vitórias avassaladoras, assim como outros processos eleitorais importantes, incluindo um referendo revogatório contra seu mandato em agosto de 2004, em que venceu com clara maioria de 60% a 40%.Hugo Chávez é o primeiro presidente da História da Venezuela a incluir a maioria da população pobre do país na tomada de decisões chaves e na elaboração de políticas públicas. A criação de conselhos comunitários, que governam de maneira local, e o incremento da participação dos eleitores são sinais claros de uma democracia vibrante e aberta, demonstrando assim que a Venezuela está longe de ser uma ditadura.As inexatidões e distorções da página editorial do Washington Post se estendem além da mera desqualificação do presidente Chávez. Em mais de onze ocasiões os editoriais asseguraram, de maneira falsa, que o presidente "controla os tribunais e os meios televisivos". A Venezuela tem cinco poderes autônomos entre si por mandato constitucional: Poder Executivo, Poder Legislativo, Poder Judiciário, Poder Eleitoral e Poder Cidadão.
Diferentemente dos Estados Unidos, em que o Poder Executivo nomeia juízes para a Suprema Corte, na Venezuela os magistrados do Tribunal Supremo são eleitos através de uma processo de seleção e votação da Assembléia Nacional. O Poder Executivo não joga nenhum papel na designação dos juízes dos tribunais. Os meios de comunicação da Venezuela continuam sendo controlados majoritariamente pelo setor privado, apesar do que afirma a página editorial do Washington Post.Da mesma forma, em outras oito ocasiões os editoriais do Washington Post fazem referência errônea ao projeto de reforma constitucional apresentado em dezembro, como se este permitisse ao presidente Chávez "governar indefinidamente" ou se convertesse em "um presidente de fato por toda a vida." A reforma constitucional buscava a supressão do limite de mandatos eleitorais, mas não das eleições. Os venezuelanos teriam mantido o direito e o dever de escolher os candidatos e de votar por eles em um processo transparente.O interessante é que o Washington Post não fez qualquer acusação similar contra o presidente da Colômbia, Álvaro Uribe, quando ele agiu para reformar a Constituição e permitir a sua reeleição para um segundo mandato. Uribe teve êxito em 2004 e está tentando novamente uma modificação para aspirar a um terceiro mandato. Onde estão as queixas do Washington Post contra a ditadura e o governo por toda a vida na Colômbia?
O Washington Post também manipulou e censurou gravemente as informações sobre o crescimento econômico da Venezuela. Duas vezes, publicações recentes na página editorial descreveram as medidas econômicas do governo como "políticas econômicas excêntricas e desastrosas."
Sob as políticas econômicas de Chávez a pobreza extrema alcançou seu nível mais baixo de todos os tempos: 9,4% (2007), em comparação com 42,5% em 1996. O desemprego caiu para 6,9% (2007), de 16,6% em 1998.Durante o governo Chávez o salário mínimo aumentou substancialmente, a ponto de chegar a ser um dos mais altos do mundo em desenvolvimento e houve uma significativa redução da dívida pública. Igualmente, Chávez pagou a dívida com o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional e aumentou os investimentos na produção agrícola nacional.
Ainda assim, o Washington Post não reflete nenhum destes avanços positivos e progressistas. De outra parte, seus editoriais se dedicam a acusar o presidente Chávez de envolver-se em uma "corrida armamentista" (quatro vezes), "violar os direitos humanos" (três ocasiões), "facilitar/aceitar o tráfico de drogas" (seis vezes) e "promover uma agenda anti-americana" (seis vezes). O pior de tudo é que, apesar das declarações de Chávez em contrário, o Washington Post continua perpetuando o mito perigoso de que Chávez é um "antisemita", "alinhado com nações ou grupos terroristas" (nove vezes).
Sr. Diehl, o senhor deve saber que os Estados Unidos estão levando a cabo atualmente uma guerra internacional contra o terrorismo. Neste mês de março, o governo Bush já declarou de forma clara que aquelas nações associadas com, ou amistosas com Estados ou grupos terroristas podem ser objeto de uma invasão preventiva ou de uma intervenção. É esse o fim que se busca na Venezuela?
O editorial de 15 de fevereiro de 2008, "O blefe de Chávez", vai um passo além. A peça é uma convocação pura e simples a um boicote do petróleo venezuelano, uma ato que afetaria irremediavelmente tanto ao povo da Venezuela quanto ao povo dos Estados Unidos. Através dos aplausos do Washington Post às táticas mafiosas de uma das corporações mais ricas do mundo, a Exxon Mobil, é evidente que sua lealdade é com os lucros corporativos, acima dos direitos do povo.
Seu mais recente editrorial, de 5 de março de 2008, "Aliados do terrorismo", mais que uma mera crítica às políticas do presidente Chávez é uma ameaça ao povo da Venezuela. Ao aceitar a priori - sem qualquer investigação ou verificação - documentos que se diz foram encontrados em um computador que teria pertencido a Raúl Reyes, das FARC, o Washington Post imprudentemente condena a Venezuela e o Equador como nações que promovem e protegem o terrorismo e justifica a violadora, injuriosa e perigosa doutrina Bush dos tempos modernos: a guerra preventiva.
Ao comparar a violação da soberania do Equador pela Colômbia com o ataque dos Estados Unidos à Al Qaeda, o Washington Post penosamente apóia a mais irracional das guerras da História e faz um chamado para que ela se expanda pela América Latina. Achamos extremamnente preocupante a defesa da violação da soberania do Equador e a satisfação que vocês demonstram com essas táticas agressivas e ilegais, acompanhadas da advertência de que a Venezuela é um "perigo".
Estamos indignados com o conteúdo da página editorial do Washington Post sobre a Venezuela. O Post foi um bastião da genuína reportagem investigativa e da busca da verdade. Esses dias acabaram e o Washington Post converteu-se agora em nada mais que um tablóide que serve aos interesses especiais. Os nobres princípios que Eugene Meyer imaginou para o Washington Post em 1935, que incluiam "dizer a verdade tão próxima da verdade que pode ser confirmada", "dizer TODA a verdade tanto quanto se possa, nos assuntos importantes para a América e o mundo" e "o jornal não será aliado de nenhum interesse especial, mas será justo, livre e sadio em suas perspectivas sobre os assuntos e as pessoas públicas" foram violados por editores como o senhor Diehl, que escolheu promover uma agenda pessoal nociva em vez de assegurar a grandeza de seu jornal."

O Macartismo à mineira - por Pedro Venceslau

Nelson Rodrigues costumava dizer que toda unanimidade é burra. Em Minas Gerais, a unanimidade em torno do governador Aécio Neves vai mais longe. É, além de burra, truculenta, cega e venal. Nenhum outro governador brasileiro ostenta índices tão altos de aprovação e popularidade.

Apontado como um dos favoritos ao Planalto em 2010, Aécio raramente aparece na mídia em situações desconfortáveis ou constrangedoras. Quando isso acontece, como no caso do “Mensalão Tucano”, a imprensa mineira é a última tocar no assunto.

Via de regra, espera um sinal de fumaça do Palácio da Liberdade para entrar na pauta, sempre na esteira da defesa do governador. Mas de onde vem esse fervoroso engajamento jornalístico? Será bairrismo em torno da perspectiva de um mineiro na presidência? Ou é o fato do governador ser jovem, boa pinta e austero com as finanças?

Nos bastidores do Palácio da Liberdade, sede do governo mineiro, existe uma azeitada máquina de comunicação e propaganda trabalhando a todo vapor para manter a imagem de Aécio intacta e em alta até as eleições de 2010.

Esse projeto de poder, que começou a ser gestado em 2002, é baseado no binômio truculência e dinheiro. Em Minas, é proibido falar mal do governador. Casos de jornalistas que ousaram quebrar essa regra e foram demitidos ou ameaçados existem aos borbotões. O resultado, em muitos casos, é a opção pela auto-censura como forma de sobrevivência.

Esse consenso tem sido financiado através de farta publicidade estatal. Não é a administração direta, mas as estatais que mais gastam em comunicação e publicidade. Com isso fica mais difícil a fiscalização da Assembléia Legislativa, que ainda por cima conta com uma oposição pouco coesa. “Minas é um estado com alto grau de censura. A imprensa, aqui, é porta-voz do governo Aécio.

Existem muitas denúncias de jornalistas perseguidos pelo Palácio da Liberdade. A intervenção do governo se dá de forma direta. Eles pedem a demissão de funcionários e, em muitos casos, são atendidos. Hoje, a censura é mais econômica, já que a cota de publicidade (estatal) nunca foi tão alta. O gasto de publicidade de Aécio cresceu 500% em relação a Itamar. Na execução fiscal de 2006, ele gastou 400% a mais que o previsto”, relata o deputado estadual Carlin Moura, do PCdoB.

A pedido da revista Fórum, Carlin enviou um requerimento ao governo pedindo uma planilha detalhada com todos os investimentos publicitários do Estado, incluindo as estatais. Até o fechamento desta edição, esses dados ainda não haviam sido liberados.

“Existe uma caixa preta, já que a maioria dos gastos é feita por empresas estatais, como a CEMIG e a COPASA, sobre as quais a Assembléia não tem controle. Eles não dão as rubricas separadas”, conclui Carlin. Em tempo. Segundo dados do Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi) o governo estadual gastou R$ 39,6 milhões com a pasta de Comunicação em 2006.

Não foi por acaso que Minas Gerais foi o estado que registrou a maior adesão à Semana de Democratização da Mídia. No último dia 5 de outubro, cerca de 1000 manifestantes de entidades como Abraço, FNDC, FENAJ, CUT, UNE e MST se concentraram na frente do Palácio da Liberdade.

Além de pedir transparência nos processos de concessão de TV, os mineiros denunciaram a falta de liberdade de imprensa no estado. “Em Minas Gerais a liberdade de pensamento é muito mais atacada, pois vivemos sob uma pesada censura praticada pelo governo do Estado em parceria com os donos dos principais veículos.

Com o objetivo de promover a blindagem em torno da figura do governador Aécio Neves, vários jornalistas foram demitidos por produzirem matérias que desagradaram o Palácio da Liberdade. Depois dessa perseguição, nunca mais se viu ou se ouviu uma única reportagem que contrariasse o interesse da elite que governa Minas Gerais”, resumiu o manifesto batizado de “Carta de Belo Horizonte, produzido pelos manifestantes.

“O maior jornal do estado, O Estado de Minas, eu chamo de O Estrago de Minas. Ele é totalmente ligado ao governador. A verdade é que todos estão comprometidos. Não sobra nenhum. Chamam o Aécio de “o filho do avô. Ele não tem tradição nenhuma na política, mas é blindado. Por que? Falam do mensalão mineiro, mas deviam investigar é o mensalão da mídia mineira.

A revista Fórum faz muito bem em abordar esse tema”, diz José Guilherme Castro, coordenador de comunicação e cultura da Abraço (Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária) e secretário geral da FNDC (Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação).

Aqui em Minas não saiu nada sobre o mensalão mineiro. Só começaram a publicar essa história quando veio a reação do Aécio”, conclui Kerisson Lopes, um dos organizadores da manifestação do dia 5, em Minas.

No último mês de outubro, Fórum conversou com jornalistas, políticos, pesquisou números e levantou histórias reveladoras sobre os bastidores de uma relação mais que promíscua entre o primeiro e o quarto poder em Minas Gerais.

Coco e romance em Ipanema
Em plena tarde de quinta feira, três carros de luxos estacionam em frente a um quiosque de Ipanema, na altura do Jardim de Alah. Os curiosos param para ver a cena. Um casal desce cercado por seguranças e pede água de coco.

No dia seguinte, os jornais cariocas revelam o nome dos pombinhos: Aécio Neves e a miss Natália Guimarães. A nota repercutiu no país inteiro, menos em Minas Gerais. Ocorre que naquele mesmo dia, o governador tinha um importante compromisso – uma solenidade em homenagem a cultura mineira.

Diante da inusitada ausência do governador, o vice Antônio Augusto Anastásia teve de improvisar o discurso. Esse pequeno episódio foi lembrado pelo deputado Carlin para um plenário vazio na Assembléia Legislativa de Minas. Não houve repercussão. Ninguém tocou no assunto nem mesmo nas colunas sociais locais.

O “namoro” só veio à tona na base de Aécio quando sua assessoria achou conveniente. “O romance do governador com a miss Brasil”, estampou, na capa, a revista IstoÉ Gente do último dia 15 de outubro. O episódio é menor, mas cheio de significado.

Apesar do clima de macartismo, alguns profissionais ousam revelar os bastidores do esquema. Fórum conversou com um dos editores de um dos maiores jornais mineiros. Por motivos óbvios, ele pede para não ter seu nome revelado. “As pautas chegam com algumas “rec´s” – recomendações. É o editor-chefe quem administra isso. Ele precisa ter jogo de cintura. Para garantir essa blindagem, o governo ataca em massa e manda fazer cadernos especiais de estatais, especialmente da Copasa.

Quem cuida dessa interlocução diretamente é a irmã do Aécio, Andréia Neves. É ela que manda na área de imprensa. O Aécio paira por cima. Andréia provocou a demissão de vários companheiros”.

O nome de Andréia Neves da Cunha, 48 anos, irmã mais velha de Aécio e chefe do serviço de assistência social do estado, causa calafrios nas redações mineiras, especialmente nas de Belo Horizonte.

Apesar de, formalmente, ocupar um cargo que tradicionalmente pertence a primeira dama, na prática é ela a comandante de fato da área de comunicação da administração. Em reportagem publicada em outubro no jornal Valor Econômico, os repórteres César Felício e Ivana Moreira revelaram ao Brasil o que todo jornalista mineiro já sabia.

Coube a Andréia o comando da operação colocada em curso para minimizar os danos do noticiário do mensalão mineiro sobre seu irmão. Foi ela que decidiu pela estratégia de aguardar uma semana para que Aécio se pronunciasse oficialmente.

Além do serviço social, a irmã de Aécio também comanda o “Grupo Técnico de Comunicação”, uma equipe de doze profissionais de mídia empregados na estrutura do Estado e que determina as ações de marketing. Não é exagero dizer que esse é o quartel general da inquisição.

Andréia mãos de tesoura
Era para ser apenas um trabalho de conclusão de curso, mas se tornou um dos vídeos mais assistidos do site You Tube. Em 2003, o estudante de comunicação da UFMG, Marcelo Baeta, recebeu anonimamente uma lista de jornalistas demitidos a pedido do governador. Ficou com a pulga atrás da orelha e passou a prestar mais atenção no noticiário.

A decisão definitiva de fazer um documentário foi tomada em novembro de 2004, quando o governo lançou uma campanha maciça para anunciar o “Déficit Zero”. Baeta notou que a matéria do repórter Ismar Madeira, no “Jornal Nacional”, eram bem parecidas com os anúncios publicitários do governo do intervalo, onde um ator-repórter anunciava que “Minas Gerais superou uma década no vermelho”.

Um escândalo. No fim da noite, Aécio apareceu no programa Jô Soares, no qual foi fartamente elogiado pelo apresentador bonachão.

A apuração de Baeta revelou a faceta mais brutal do governo Aécio. Um dos entrevistados foi o jornalista Marco Nascimento, hoje diretor de jornalismo da TV Gazeta, em São Paulo. Ele conta, sem rodeios, que Andréia Neves pediu sua cabeça logo depois das eleições, quando Nascimento era diretor de jornalismo da Globo MG, em função de uma série de matérias “que estavam sendo ruins para o governo”.

“Eu imaginei que contaria com o apoio da Globo no Rio, mas estava enganado”, disse para Baeta. Procurado por Fórum, Nascimento disse que prefere não falar mais sobre esse assunto. Ele não imaginava que um trabalho de conclusão fosse ter tamanha repercussão, a ponto de ser citado em matérias publicadas na Europa.

Outro que denunciou os abusos de Aécio, mas acabou voltando atrás foi o jornalista esportivo Jorge Kajuru. Em maio de 2004, ele ficou furioso na véspera de um jogo da seleção brasileira no Mineirão. Com o microfone em punho, esbravejou: “Sobra ingresso para os convidados do governador de Minas, falta para o torcedor”.

Resultado: foi demitido no intervalo. Irado, Kajuru fez um desabafo no programa do apresentador Clodovil. “A irmãzinha dele (Aécio) pede a cabeça de jornalista. Tem jornalista em Belo Horizonte perdendo emprego por causa dela. A emissora sofreu uma pressão enorme. Aécio deve estar rindo agora”.

Não resta dúvida que o período mais agressivo das investidas de Andréia Neves contra os jornalistas foi entre 2003 e 2004. “Nos primeiros anos de governo, recebíamos muitas denúncias graves de jornalistas que reclamavam de cerceamento por parte dos editores.

Havia ingerência direta do governo e da assessoria na cobertura. Era escancarado. Os proprietários eram pressionados e pressionavam os editores para barrar a divulgação de matérias ruins para o governo. Os repórteres denunciavam mudanças e distorções nas matérias que escreviam.

Nos últimos dois anos, as denúncias diminuíram. Na minha opinião, a pressão, hoje, é mais financeira. A conjuntura profissional – leia-se falta de emprego – colabora para deixar os jornalistas com medo. A cobertura, por sua vez, continua chapa branca.

É difícil ver notícias de impacto contra o governo ou o governador. Denúncias só aparecem em veículos de outros estados”, revela Alexandre Campelo, diretor do Sindicato dos Jornalistas de Minas Gerais.

O caso Lindemberg
Não é de hoje que a imprensa mineira mantém relações promíscuas com o governo estadual. Há quem diga que a tradição nasceu com Assis Chateubriand e seu império, os “Diários Associados”, grupo que ainda hoje é forte no estado – é dono do jornal O Estado de Minas.

Especulações à parte, existe um episódio curioso que passou completamente batido pela grande imprensa nacional, mas que merece ser observado com lupa. No último dia 19 de setembro, a revista IstoÉ publicou uma reportagem explosiva: “Exclusivo: Os documentos do mensalão mineiro”.

A repercussão foi imediata em todo país, menos em Minas. Mas isso não vem ao caso. O que chama atenção é o fato de que o documento que deu origem à matéria – um relatório da Polícia Federal – está, hoje, disponível na Internet para quem quiser ler e repercutir. Mas, curiosamente, existe pouca gente interessada no assunto.

Fórum imprimiu e esmiuçou as 172 páginas do relatório. E descobriu que ainda existe muita pauta quase inédita para ser publicada. Em linhas gerais, o relatório – que se refere ao período em que o tucano Eduardo Azeredo foi governador e candidato a reeleição – mostra que toda a estrutura de caixa 2 criada por Marcos Valério passava pela comunicação, através da simulação de gastos com comunicação.

Mas isso também não é novidade. Na página 151, entretanto, um nome salta aos olhos: Carlos Lindemberg Spínola Castro. Para quem não sabe, ele era na época e ainda é editor do jornal Hoje em Dia, que pertence à Igreja Universal e é um dos maiores do Estado.

No período investigado, o ano de 1998, quando Azeredo tentou a reeleição, Lindemberg recebeu da SMP&B, portanto da campanha, R$ 130 mil para dar “opiniões políticas”. Em depoimento para PF, ele reconhece que recebeu R$ 50 mil.

Existe algum problema no fato de Lindemberg ser o responsável por um dos principais jornais do estado e receber dinheiro da campanha do governador que tenta a reeleição? A imprensa mineira acha que não.

Tanto é que apenas um site no estado, o “Novo Jornal”, tocou no assunto. Outros jornais e revistas do Brasil chegaram a ensaiar a publicação do caso, mas foram “convencidos” a deixar quieto. Fórum conversou com Lindemberg. É ele quem se defende. “Não existe relação entre uma coisa (ser diretor de um jornal) e outra (prestar serviço como consultor). Sempre prestei consultoria. Não trabalho para nenhum político ou agência, fui pago por uma agência de forma limpa. Tanto é que não há ilicitude em relação a mim”.

Além de dizer que toda unanimidade é burra, Nelson Rodrigues (sempre ele) também disse, certa vez, em sua “Flor de Obsessão”: “o mineiro só é solidário no câncer”. Dessa vez, contudo, parece que ele errou.

segunda-feira, 24 de março de 2008

Discurso do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, na cerimônia de assinatura de ordens de início das obras do PAC em Araraquara

Vou tomar um pouquinho de água. A diferença do Lula presidente, aqui em Araraquara, e o Lula metalúrgico, na porta de fábrica, é que lá, quando eu ia fazer assembléia às 5h da manhã, era obrigado a tomar uma coisa mais quente do que água para poder falar, e como presidente eu estou com uma aguinha aqui.

(...)

Primeiro, antes de falar das obras que tantas pessoas já falaram, eu quero que vocês compreendam um pouco o que está acontecendo no Brasil neste momento. Tem muita gente que diz que as coisas estão dando cento no Brasil porque o Lula tem sorte. Obviamente, que eu prefiro ser o Lula com sorte do que o Lula sem sorte, porque não há na vida nada que aconteça, para nenhum de nós, se a gente não tiver um pouco de sorte. Mas o que está acontecendo no Brasil é uma coisa que nós preparamos e muitos dos ensinamentos que eu aprendi na minha vida cotidiana eu coloco em prática na arte de governar este País.
Eu me casei pela primeira vez em 1969 e assumi o compromisso, com a minha mulher, de que eu só ia pagar um ano de aluguel e depois eu ia comprar uma casa. Para poder comprar essa casa, no primeiro ano de casados – eu e a mulher trabalhando – nós nunca fomos a um restaurante, nós nunca fomos ao cinema, porque a cada vez que eu ia pagar o aluguel, eu achava aquele dinheiro amaldiçoado. Era um dinheiro que eu dava e eu sabia que não estava construindo nada para mim. Fizemos um ano de sacrifício, não tinha restaurante, não tinha cinema, não tinha teatro, não tinha festa, não tinha roupa nova, não tinha nada. Um ano depois, eu comprei a minha primeira casa. Quem conhece São Paulo, era no Parque Bristol, era uma ribanceira tão grande que, quando chovia, a gente quase não conseguia ir trabalhar, porque não tinha guia, não tinha sarjeta, o barro virava uma cola e eu tinha que colocar uma galocha, andar a pé até o asfalto, tirar a galocha, embrulhar em um jornal e levar para a fábrica. Quando chegava à fábrica, lavava, deixava secar e à tarde, quando eu saía da fábrica, descia do ônibus, na padaria, colocava a galocha, chegava em casa, tirava a galocha. Mais um pouco e eu pegaria o apelido de Lula Galocha.
Dois anos depois, minha mulher morreu, eu fiquei quatro anos viúvo, me casei outra vez. Tinha vendido a casa porque eu tinha me mudado para São Bernardo. Quando eu me casei com a Marisa, eu assumi um compromisso: em um ano a gente vai comprar outra casa. Não deu para comprar em um ano, eu comprei a casa em um ano e seis meses. A Marisa trabalhava, eu trabalhava, outra vez não tinha restaurante, não tinha cinema, não tinha roupa nova. Qualquer dinheiro que a gente ganhava era guardado para a gente comprar a casa. Um ano e meio depois, eu comprei uma casinha do BNH,com 33m2. Imaginem o tamanho da casa: quando um filho ia dormir, o outro tinha que se levantar; quando colocava o fogão, tinha que tirar a geladeira; se esticasse o pé no quarto, o pé saía pela janela. Nunca reclamei, porque não sou feito para reclamar. Eu aprendi que, em vez de reclamar, nós temos que fazer as transformações que acreditamos que seja possível fazer, e fazê-las.
Eu contei esses dois casos para chegar ao Brasil. Aqui tem extraordinários companheiros e companheiras que vieram comigo, intelectuais da mais alta competência deste País. Essas pessoas sabem, como muitos de vocês aqui em Araraquara sabem que, quando eu tomei posse, muita gente dizia: “Coitado do Lula. O Brasil está quebrado”. Primeiro, o Brasil não tinha credibilidade externa, a gente não tinha dinheiro para pagar as nossas importações, o dinheiro que a gente tinha de reserva eram 30 bilhões de dólares, emprestados pelo FMI, e a gente estava com os juros na estratosfera. A inflação já tinha ultrapassado os dois dígitos, e a situação era que “o Brasil vai quebrar”.
A primeira coisa que nós fizemos, no ano de 2003, foi o maior aperto que este País já conheceu. Eu perdi até amigos que achavam que eu podia fazer a transformação no primeiro ano ou no primeiro mês. Perdi muitos amigos que achavam que eu não ia fazer nada, porque os juros continuavam altos, porque o Brasil não crescia, porque tinha desemprego. E nós fizemos o ano de maior sacrifício neste País. Aumentamos, inclusive, o superávit primário: era de 3,75% e nós levamos para 4,25%. Por quê? Porque eu precisava fazer um sinal para os credores brasileiros de que a gente ia garantir o pagamento daquilo que era a dívida contraída por nós mesmos.
Passamos 2003, 2004 deu uma melhorada, a inflação começou a voltar e nós tivemos que aumentar juros outra vez. Passamos 2005 muito apertados. Todo mundo acompanhou pela televisão o que os partidos de oposição tentaram fazer conosco. Todo mundo, aqui neste País, acompanhou o que uma parte da imprensa fez conosco em 2005 e em 2006. E em nenhum momento vocês me viram nervoso porque eu tinha objetivos, eu tinha propósitos. Eu sempre dizia: qualquer governante neste País pode errar, que não tem problema, o povo já está acostumado com erros de governantes. O povo elege um governante e ele não cumpre 10% do que prometeu. Quando termina o seu mandato ele vai embora, estudar lá fora, fica quatro anos fora, depois regressa como se nada tivesse acontecido, e ainda se candidata outra vez.
Eu dizia: eu não posso errar, porque se eu errar, tem duas coisas graves que vão acontecer. Primeiro, eu não posso ir para fora, não quero ir para fora. Quando eu perdi as eleições, me ofereceram um curso em Harvard, para que eu fosse me preparar, aprender inglês, que eu ia ficar mais “chiquérrimo”. Obviamente que tinha vontade de fazer tudo isso, mas eu achava que se eu quisesse ser presidente do Brasil, eu precisava conhecer a alma deste País, viajar este País, viajar os grotões deste País, conhecer a cara do povo deste País. Pois bem, esta é a primeira razão pela qual eu não posso errar. A outra é porque vindo de onde eu vim e chegar à Presidência da República... porque também não estava nos livros de sociologia um operário ser presidente da República do Brasil. Imaginava-se que se houvesse uma revolução, um operário poderia chegar à Presidência da República. Mas não tem, também, nenhum país que fez revolução em que um operário que chegou à Presidência da República, normalmente era alguém mais sabido do que o operário, intelectualmente. Então, o Brasil construiu uma coisa sui generis.
O Brasil é uma das dez maiores nações do mundo e o nosso processo cultural, o nosso processo democrático permitiu que um metalúrgico, que só tem um curso do Senai, chegasse à Presidência da República deste País. E eu dizia: por que eu não posso errar? Porque se eu errar, eles vão colocar uma cangalha no nosso pescoço e vão passar 150 anos ou 200 anos para as pessoas admitirem que um operário pode chegar à Presidência da República.
Então, todo o sacrifício que nós fizemos permitiu que a gente pudesse estar vivendo o momento que estamos vivendo hoje. Nós, que tínhamos apenas 30 bilhões de reais de reservas, dos quais 15 bilhões e 900 milhões do FMI, hoje temos quase 200 bilhões de dólares de reservas, não devemos nada ao FMI, não devemos nada ao Clube de Paris e não devemos nada a ninguém. O que nós devemos são as compras que fazemos. Hoje o Brasil, que desde que Cabral colocou os pés aqui sempre deveu para alguém, na história de 500 anos o Brasil sempre deveu para alguém, hoje, graças a Deus, o Brasil é credor internacional, nós temos mais reservas do que nós devemos.
O Hélio e os sindicalistas aqui presentes sabem que eu fui um sindicalista razoavelmente importante neste País. Fiz as lutas mais memoráveis do final dos anos 70 e do começo dos anos 80, e nunca a gente conseguia aumento real de salário. A inflação era de 83% ao ano, era de 50%, era de 70%, era de 90%. Pois bem, quando a gente pegava a metade da inflação, já era uma vitória. Eu fiz greve de 41 dias e voltamos a trabalhar sem receber um centavo de aumento. O que está acontecendo agora, companheiros sindicalistas? Noventa e seis por cento dos acordos feitos pelos sindicatos são acordos feitos acima da inflação, com aumento real de salário.
Aqui no Brasil pobre não tinha acesso a banco. Aliás, os bancos tinham desaprendido a atender pobre. Até o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal tinham desaprendido a atender pobre. Era muito melhor atender um cidadão de chapelão, com charuto na boca, do que atender um cidadão com uma sandália havaiana no pé. O que nós fizemos? Nós resolvemos fazer crédito para o povo pobre deste País. Criamos o crédito consignado, já que os bancos diziam que não emprestavam dinheiro para pobre porque o pobre podia não pagar. Nós demos a folha de pagamento como garantia. Os aposentados brasileiros nunca tinham condições de fazer um empréstimo. Criamos o empréstimo consignado para o aposentado. Qualquer aposentado, hoje, pode ir a um banco, de preferência escolher o que tem os juros mais baratos, contrair o empréstimo e só pagar 30% do seu salário. Não pode pagar mais. E o que começou a acontecer no Brasil? As pessoas começaram a comer mais, a gastar um pouco mais, a comprar coisas essenciais. Criamos o programa Bolsa Família, que muita gente dizia: “isso é assistencialismo”. As pessoas não sabem o que significam 50 reais na mão de uma mãe pobre. Com 50 reais que nós damos de gorjeta em um bar, quando tomamos cerveja, uma mãe consegue colocar comida em casa para os seus filhos, por 10 ou 15 dias. E hoje atendemos 11 milhões de famílias, são 44 milhões de brasileiros que podem comer três refeições por dia.
Eu vi o depoimento de uma mulher que eu coloquei na televisão, ela dizia: “antes do Bolsa Família, eu tinha duas netas que moravam comigo, eu comprava um lápis e cortava o lápis ao meio para que cada criança tivesse metade”. Hoje ela pode comprar uma caixa de lápis para cada neta e não precisa repartir. Esses dias, a imprensa foi atrás de uma mulher do Bolsa Família porque ela comprou uma geladeira e aí já acharam que ela era burguesa, não precisava mais do Bolsa Família. Eu quero que ela compre geladeira, eu quero que ela compre televisão, eu quero que ela compre roupa, eu quero que ela compre sapatos. É preciso acabar, neste País, com o preconceito contra os pobres. É preciso acabar, neste País, com a idéia de que os do andar de baixo não podem nada e que os do andar de cima podem tudo. É preciso que as pessoas percebam que nós precisamos – se quisermos ter um país vivendo em paz, com muita liberdade e democracia – estender a mão para aqueles que não tiveram chance no século XXI.
Ontem eu fui a uma formatura da Universidade Zumbi dos Palmares. É a primeira vez, em 500 anos de história deste País, que nós conseguimos formar, de uma única vez, e entregar o diploma para 120 meninas e meninos negros deste País, que são segregados há séculos e séculos. Este ano, nós vamos ter a primeira turma formada pelo ProUni. São 60 mil jovens que tiraram o diploma pelo ProUni e 40% desses são negros e negras. É preciso acabar com essa história de que nordestino e negro têm que ser pedreiros, ajudantes de pedreiro ou cortadores de cana. Nós não temos vergonha de ser pedreiros ou cortadores de cana, mas queremos ser engenheiros, queremos ser médicos, queremos ser (inaudível), queremos ser tudo aquilo a que temos direito neste País.
Meus companheiros e companheiras, eu fui sexta-feira ao Rio de Janeiro lançar o PAC no Complexo do Alemão, que vocês aqui em Araraquara só vêem, pela televisão, pela criminalidade. Fui à Rocinha, que também a gente só vê pela criminalidade, e fui em Manguinhos, que é chamado de Faixa de Gaza, porque tem batalha todos os dias. Tem a linha do trem e um muro que divide. O muro é a Faixa de Gaza, é uma quadrilha atirando na outra quadrilha. Nós fomos lançar o PAC lá, levar água, levar esgoto, fazer ruas, levar escola, levar hospital, levar teleférico para as pessoas descerem o morro. Hoje leva 2 horas, vai demorar 19 minutos quando estiver pronto o teleférico. Tem muita gente que fala: “o Lula está gastando muito dinheiro com os pobres, o Lula precisa fazer mais investimentos”. Porque neste País, também se aprendeu que tudo que a gente dá para o rico é investimento e tudo que a gente dá para o pobre é gasto, quando eu acho que é o contrário. Eu acho que a gente colocar dinheiro na mão do pobre é investimento neste País.
Hoje o Brasil está vivendo um momento, eu diria, quase mágico. Eu me lembro que quando eu tomei posse a indústria automobilística me procurou dizendo: “nós estamos quebrados, temos muita empresa querendo ir embora”. E ontem eu recebi uma carta: eles saíram de 2 milhões e 200 mil carros, e estão prometendo produzir 4 milhões de carros em 2009. Qual foi o milagre? O milagre foi uma coisa que a gente vinha dizendo para eles há 20 anos: com 24 meses de prestação, só pode comprar um carro o setor da classe média. Se vocês quiserem que o pobre compre um carro, aumentem o número de prestações, porque o pobre não olha o custo final, ele olha se a prestação cabe no holerite dele, se cabe no bolso dele. Hoje as pessoas estão esperando três meses para comprar um carro; caminhão, nove meses, se for caminhão pesado; máquinas agrícolas, não tem mais no mercado. Não tem pedreiro, não tem engenheiro, não tem azulejista. Por que não tem? Porque durante 26 anos este País estava preparado para não crescer. Havia uma lógica entre os economistas do governo de que o Brasil não poderia crescer mais do que 3% ao ano. Nós queremos provar que o Brasil pode crescer 3%, 4%, 5%, 6% e quanto a economia suportar. Qual é o cuidado que nós temos que ter? O consumo não pode crescer acima da capacidade produtiva do País. Até pode, porque a gente pode importar um pouco. Mas é preciso que a gente tenha cuidado porque, se cresce muito o consumo e a indústria não investe em novas fábricas, em nova produção, a gente tem de volta uma doença desgraçada – que nós não gostamos dela – que é a inflação, que muitas vezes favorece o rico e quem paga o preço é o pobre que vive de salário neste País.
Pois bem, hoje eu posso dizer para vocês, sem medo de errar: vivemos o melhor momento do País, dos últimos 30 anos, e com possibilidade de melhorar ainda mais. Só para saneamento básico são 40 bilhões de reais; para habitação são 106 bilhões de reais. Mais ainda, só da Funasa são 4 bilhões de reais para atender cidades de até 50 mil habitantes, de preferência aquelas que têm mais mortalidade infantil, aquelas que têm doença de Chagas. Criamos o programa de Financiamento de Habitação Social: foram 2 bilhões no ano passado e 2 bilhões neste ano. A economia brasileira vai continuar crescendo, o salário vai continuar crescendo, o consumo vai continuar crescendo, as indústrias vão continuar investindo, e eu tenho a convicção de que daqui a 10 ou 15 anos a gente vai poder ter, neste País, uma geração que viveu 10 ou 15 anos com a economia brasileira crescendo, vendo a nossa juventude arrumar emprego.
Cada vez, Marilena Chauí, que eu vejo a televisão mostrar um assalto ou um crime, ela mostra um jovem de 17, 15, 30 anos. Eu não estou aqui defendendo que esse jovem cometa crime, não. Ele tem que ser punido. Agora, é importante saber que esse jovem é resultado do descaso de 30 anos de administração pública deste País, em que os pobres foram sendo segregados, as famílias foram vivendo um processo de degradação pela miséria, sem perspectiva, sem escola. Essas crianças não tinham oportunidade. É por isso que nós vamos fazer 214 escolas técnicas; é por isso que nós vamos fazer 10 novas universidades federais; é por isso que nós vamos fazer 48 extensões universitárias; é por isso que nós aumentamos de 8 para 9 anos o tempo de permanência da criança nas escolas; é por isso que, na semana que vem, vamos anunciar internet banda larga em 55 mil escolas das cidades brasileiras, para que o nosso jovem possa viajar para onde ele quiser, pela internet, possa estudar e possa competir com qualquer outro, mesmo que seja de classe social mais privilegiada.
Este País está sendo construído porque um dia vocês acreditaram. O grande desafio que nós temos é elevar a auto-estima deste País, é acreditar que a gente pode, é acreditar que nós temos que ser persistentes. Até porque, se eu não fosse persistente eu teria desistido na primeira derrota, em 82, quando eu perdi para o governo de São Paulo. Eu teria desistido em 89, quando eu perdi para o Collor. Eu teria desistido em 94, quando eu perdi para o Fernando Henrique Cardoso. Eu teria desistido em 98, quando eu perdi outra vez para o Fernando Henrique Cardoso. Mas eu acreditava tanto que eu podia chegar lá e, chegando lá, que a gente podia mudar a cara deste País, que nós chegamos lá, por persistência, perseverança, que é uma coisa que o ser humano não pode perder nunca. Não há espaço na vida humana, a vida humana é muito curta na Terra, não há espaço para a gente se levantar de manhã e dizer: “Ah, está uma desgraça, as coisas não dão certo, estou desanimado.” Não existe espaço para isso. O dia que você acordar acabrunhado ou acabrunhada, e achar que está tudo errado, vá à luta, levante a cabeça, acredite em você, que a gente muda a nossa vida e muda este País.
É por isso, meu companheiro Edinho, que com muito orgulho estou aqui, porque em 2006 eu vim aqui num comício, e no comício eu disse que ia tirar essa ferrovia. Essa ferrovia, todo mundo sabe, a parte mais rica da sociedade morava do trilho para o centro, e a parte mais pobre era do trilho para a periferia. Então, nós vamos acabar com essa divisão social. Esse trilho tem que ser símbolo do desenvolvimento de Araraquara e não símbolo da divisão de classes, aqui na cidade de Araraquara. Vamos tirar. Eu prometi. No ano passado veio o meu Ministro do Planejamento, no dia da publicação do edital. Hoje eu vim com o meu Ministro dos Transportes para dizer: essas obras vão começar agora e em 2010, se Deus quiser, eu estarei aqui para inaugurar o novo terminal. E onde hoje tem trilho, vamos plantar flores para a gente alegrar ainda mais o povo da Morada do Sol, o povo desta cidade extraordinária.
Por isso, meus queridos companheiros e companheiras, eu estou feliz. Primeiro, pela escola homenageando a Gilda. Eu tive pouco contato com a Gilda, mas tenho uma profunda admiração e sou muito amigo do seu companheiro, o nosso, não menor, Antônio Cândido. A segunda coisa foi vir aqui, Edinho, junto com você... O Edinho é uma dessas coisas boas que acontecem na vida de uma cidade. O Edinho é um companheiro, conheço poucos como ele, desprovido de interesses, eu nunca vi o Edinho rancoroso, nunca vi o Edinho nervoso. E somente quem se levanta de bem com a vida é que pode ser assim. A gente se levantar todo dia acreditando que vai ser melhor, acreditando que vai conseguir...
Então, eu queria me despedir dizendo para vocês: nós, brasileiros e brasileiras, pobres e ricos, pretos e brancos, a gente pode construir esta nação, uma grande nação. O Brasil jogou fora muitas oportunidades, eu não vou jogar fora as oportunidades. Quando nós estamos investindo em educação é porque eu acho que não tem outra saída. Ou a gente forma a nossa juventude, qualifica a nossa juventude e começa a exportar não só suco de laranja, não só minério de ferro, não só soja, mas exportar inteligência, conhecimento, porque é isso que vai colocar valor agregado e dar dimensão de nação desenvolvida ao Brasil.
Por isso, muito obrigado, de coração, Edinho. Muito obrigado pelo prazer de estar aqui hoje, nesta querida cidade de Araraquara, voltando aqui, e prometendo voltar para inaugurar o contorno ferroviário.
Um beijo e um abraço.

Cházes diz que foto dele com Bin Laden será divulgada; Colômbia se enrola com falso ideólogo das FARC

http://www.viomundo.com.br/opiniao/chavez-diz-que-foto-dele-com-bin-laden-sera-divulgada-colombia-se-enrola-com-falso-ideologo-das-farc/

quinta-feira, 20 de março de 2008

O jornalista de 2008 não é mais o de 1968 - por Celso Lungaretti

A direita brasileira não se notabiliza por produzir quadros intelectualmente brilhantes (os Robertos Campos são raros!). Quem melhor a serve, defendendo o status quo com argumentos menos primários, costumam ser pessoas formadas pela esquerda que, em qualquer ponto da trajetória, passam a remar a favor da corrente.

Há uma legião de escribas produzindo textos convenientes para a direita e sendo recebida de braços abertos pelos sites e correntes de e-mails das viúvas da ditadura. Gente que começa dissecando o conformismo da opinião pública e acaba colocando seu talento a serviço de quem tudo faz para manter bovinizada a opinião pública.

Torçamos para que não seja esse o novo rumo de Elio Gaspari. Seria um triste epílogo para uma carreira que, garante-me o excelente articulista Laerte Braga, começou na órbita do PCB.

"Não identificado"

"Em 2008 remunera-se o terrorista de 1968", publicado na Folha de S.Paulo de quarta-feira (12/3) é, seguramente, um dos escritos mais inoportunos e infelizes da carreira de Gaspari. Parece mais uma peça complementar da campanha da extrema-direita contra o programa de anistia do Ministério da Justiça do que uma análise do autor de A Ditadura Escancarada.
Contrapõe, utilizando uma narração piegas e folhetinesca no mau sentido, as trajetórias de um militante da Vanguarda Popular Revolucionária (Diógenes Carvalho Oliveira) e de um jovem piloto que perdeu a perna quando da explosão de um petardo diante do consulado estadunidense em São Paulo. Compara, de forma simplista e demagógica, os valores de reparações concedidas pela União a ambos.

Segundo ele, tal atentado teria sido cometido pela VPR e seus autores seriam Diógenes e os "arquitetos Sérgio Ferro e Rodrigo Lefèvre, além de Dulce Maia e uma pessoa que não foi identificada". Esquece-se, entretanto, de citar as fontes que amparam sua convicção – lapso imperdoável num historiador!

A referência a "uma pessoa que não foi identificada" denuncia, entretanto, a origem de sua suposição (até prova em contrário, não a considerarei uma informação): os inquéritos policiais-militares da ditadura. Se algum(ns) dos quatro apontados houvesse(m) admitido publicamente sua(s) culpa(s), não teria(m) por que ocultar o nome do quinto participante.

Entulho autoritário

O que são os IPMs do regime militar, do ponto-de-vista jurídico? Nada. Uma ignomínia que pertence à lata de lixo da História, já que tudo neles contido tem origem viciada: foram informações arrancadas mediante torturas as mais brutais, que várias vezes causaram a morte dos supliciados, como no caso de Vladimir Herzog.

E era muito comum os torturados simplesmente admitirem o que os torturadores pensavam ser verdade, ganhando, assim, uma pausa para respirar. Então, ao ler a versão dos algozes, eu sempre noto que, em cada ação da resistência, são relacionados muito mais autores do que os necessários para tal operação.

Para alguém que estava pendurado num pau-de-arara, recebendo choques insuportáveis, é desculpável que respondesse "sim" quando os carrascos perguntavam se fulano ou sicrano participara de determinado assalto a banco. Fazíamos o humanamente possível para evitar a prisão e/ou morte dos companheiros, mas não estávamos nem aí para o enquadramento penal nos julgamentos de cartas marcadas da ditadura.

O Projeto Orvil, o chamado "livro negro da repressão" (síntese do acervo ensangüentado dos IPMs), cita-me como um dos três juízes no julgamento de um militante caído em desgraça com a VPR; no entanto, além de não haver jamais julgado companheiro nenhum, nem mesmo tomei conhecimento da convocação desse tribunal, se é que ele realmente existiu.

Daí a impropriedade, a imoralidade e, até, a ilegalidade de se utilizar esse entulho autoritário como argumento contra quem quer que seja.

Revisão necessária

Gaspari parece colocar em planos diferentes as ações armadas cometidas pela resistência antes e depois da promulgação do AI-5, como se o país não estivesse sob ditadura.

O exercício do direito de resistência à tirania independe da intensidade da tirania. Não existe meia-virgem: ou era democracia ou era ditadura. O Brasil estava desde 1964 submetido ao arbítrio de usurpadores do poder que já haviam praticado um sem-número de barbaridades, como a humilhação, tortura e quase enforcamento, em público, do lendário Gregório Bezerra.

Então, todo aquele que, por resistir à tirania, foi preso e torturado como Diógenes, merece, sim, uma reparação, à luz do Direito das nações civilizadas e segundo as recomendações da ONU.
E, se tudo o que Gaspari supõe fosse provado, o justo seria o Estado indenizar Diógenes pelos direitos atingidos e condená-lo à prisão pelas matanças cometidas. As reparações da Comissão de Anistia não são prêmio de boa conduta, de forma que uma coisa não invalidaria a outra.

Esta possibilidade, infelizmente, inexiste por causa da Lei da Anistia de 1979, que, ao conceder um habeas-corpus preventivo para os verdugos, acabou inviabilizando também a apuração de excessos cometidos pelos resistentes. É urgente e necessária sua revisão, doa a quem doer.

Quanto à linha de raciocínio de Gaspari, se levada às últimas conseqüências, desembocará na conclusão de que assassinos podem ser torturados pelos agentes do Estado. Então, repito: torço sinceramente para que ele não esteja aderindo às tropas de elite do autoritarismo redivivo.

***

P.S.: Antes mesmo do que eu esperava, a Folha de S.Paulo foi obrigada a reconhecer a impropriedade de se utilizar o "entulho autoritário como argumento contra quem quer que seja", publicando na edição de sábado (15/3) um "erramos" no qual admite que, tanto na coluna do Elio Gaspari quanto no noticiário, acusara falsamente Dulce Maia de participação no atentado ao consulado dos EUA.

quarta-feira, 19 de março de 2008

Esclarecimentos - por PHA

Esclarecimento I

O iG rescindiu meu contrato que ia até 31 de dezembro de 2008. O Conversa Afiada continua o mesmo – e mais livre, aqui, neste novo espaço.

Seja bem-vindo!

Paulo Henrique Amorim

Esclarecimento II

O Conversa Afiada ficou fora do ar por 08 horas e 58 minutos.

Breve, escreverei um Máximas e Mínimas para tentar explicar o que aconteceu.

O iG se limitou a enviar uma notificação assinada por Caio Túlio Costa, para avisar que o contrato se rescindia de acordo com clausula que previa um aviso prévio.

Não é a primeira vez que me mandam embora de uma empresa jornalística. Só o Daniel Dantas me “tirou do ar” duas vezes: na TV Cultura e no Uol.

E ele sabe que não vai me tirar, nunca ...

Com isso, se encerrou a vida deste blog num portal da internet.

Nenhum blog de relevância política nos Estados Unidos, por exemplo, está pendurado num portal.Clique aqui para ver: http://www.huffingtonpost.com/ ou http://www.talkingpointsmemo.com/, para ficar em dois dos melhores exemplos.

Essa é a virtude a internet: último reduto do jornalismo independente.

Assim, se você acha que o Farol de Alexandria e o presidente eleito são dois impostores; se você gosta do Festival do Tartufo Nativo; se acha que o PIG, além de ilegível, não tem salvação; que os portais da internet brasileira são uma versão – para pior – do PIG; que a Veja é a última flor do Fascio; que o Ministro (?) Marco Aurélio de Mello deveria ser impeached; que Daniel Dantas deveria estar na cadeia;que Carlos Jereissati e Sergio Andrade vão ficar com a “BrOi” sem botar um tusta; que a “BrOi” significa que o Governo Lula vai tirar Dantas da cadeia; que chega de São Paulo, porque está na hora de um presidente não-paulista etc etc etc ... se você acha tudo isso, continue a visitar o Conversa Afiada neste novo e renovado espaço.

Em tempo: o Conversa Afiada anuncia publicamente que não é candidato a nada no iBest. Nunca levou isso a sério. Não vai ser agora que vai levar.
Muitas novas atrações virão. Até já !
Paulo Henrique Amorim

Segue alguns links do site do Azenha comentando o fato:

http://www.viomundo.com.br/denuncias/presidente-do-sindicato-dos-bancarios-lamenta-queima-do-arquivo-de-paulo-henrique-amorim/

http://www.viomundo.com.br/radio/feijoo-sobre-derrubada-de-site-aviso-boicote-censura-punicao/

http://www.viomundo.com.br/radio/senador-suplicy-lamenta-o-fim-do-conversa-afiada/

http://www.viomundo.com.br/radio/senador-suplicy-lamenta-o-fim-do-conversa-afiada/ (meio cortado)

http://www.viomundo.com.br/radio/sindicalista-diz-que-forma-como-site-foi-tirado-do-ar-foi-desrespeito/

http://www.viomundo.com.br/opiniao/ig-fez-com-paulo-henrique-o-que-nem-a-globo-fez-comigo/

http://www.viomundo.com.br/opiniao/retirando-a-candidatura-do-ibest/

http://www.viomundo.com.br/opiniao/queima-de-arquivo-digital-marca-um-dia-historico-para-a-internet-brasileira/

http://www.viomundo.com.br/opiniao/queima-de-arquivo-digital-marca-um-dia-historico-para-a-internet-brasileira/