sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Uma revolução em curso - por Luis Nassif

A Operação Satiagaha marca um saudável momento de ruptura do modelo institucional brasileiro. Levará bom tempo até se avaliar corretamente seu significado e seus desdobramentos.
Nos últimos 20 anos houve um rearranjo nos sistemas de poder, em torno de novos atores políticos. Um deles, os gestores de fortunas, os financistas, que começam a despontar no final da década de 80 e receberam enorme impulso no governo Fernando Henrique Cardoso.
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Toda a engenharia econômica, financeira e política do Plano Real visou transferir para esses novos atores a gestão econômica e o controle da economia. O grande ideólogo desse jogo foi Gustavo Franco. Em meu livro “Os Cabeças de Planilha” descrevo em detalhes esse fenômeno.
Os líderes desse processo vão desde o hoje amplamente respeitado Jorge Paulo Lehman e seus sócios na GP, até os controvertidos Daniel Dantas, do Opportunity, e André Esteves, ex-Pactual.
Esses grupos passam a deter influência ampla sobre órgãos reguladores – Banco Central, CVM (Comissão de Valores Mobiliários), CADE (Conselho Administrativo de Direito Econômico), sobre a própria Fazenda. Seu poder foi ampliado desmedidamente quando montaram alianças com parte da grande mídia.
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Fenômeno pouco analisado, a crise dos grandes órgãos de comunicação teve duas vertentes. De um lado, as grandes mudanças tecnológicas trazidas pela Internet, que quebraram pela primeira vez as barreiras de entrada no negócio mídia – antes, havia necessidade de investimentos pesados em gráfica, estoques de papel, distribuição.
De outro, a crise cambial de 1999 que fragilizou todos os grupos que haviam investido pesadamente nos anos anteriores.
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Ao mesmo tempo, o novo perfil da economia induzia às tacadas rápidas, jogadas de tomada de controle, jogadas na privatização, IPOs manipulados, captação irregular de poupança interna para fundos offshore.
Os novos financistas passam a usar a mídia como uma arma adicional nas suas guerras empresariais.
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O jogo tornou-se absolutamente sem regras. Havia manipulação na mídia, politização do Ministério Público e da Polícia Federal, dos Tribunais superiores. CPIs passaram a ser utilizadas para chantagem; órgãos reguladores, como o BC e a CVM, foram apropriados pelas novas forças. Esse jogo pesadíssimo corrompeu partidos políticos, infiltrou-se em dois governos.
Não sobrou uma instituição em pé.
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Mas, dentro de cada área do Estado, havia funcionários públicos sérios olhando tudo e percebendo que a lei estava sendo burlada.
É através deles que ocorre a grande reação. Policiais Federais insubordinando-se contra suas chefias para fazer valer a lei; jovens procuradores destemidos, juízes de primeira instância, refletem, no âmbito das suas corporações, o novo quadro da opinião pública que emergiu nos últimos anos. Uma opinião pública com acesso à Internet e a outras formas de informação.
Há que se tomar cuidado com excessos. Mas uma conclusão é inevitável: a Satiagraha foi levantada em cima dos escombros de um modelo político-institucional que apodreceu. E abre espaço para o surgimento do novo.

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