quinta-feira, 14 de maio de 2009

A tirania teocrática no Irã - por Wálter Fanganiello Maierovitch (Cartacapital)

No Irã, o guindaste passou também a ser usado nos enforcamentos. E o corpo do condenado permanece durante horas pendurado nas alturas. Uma exibição pública de origem medieval, voltada para difundir o medo. Entre os 192 Estados membros da ONU, o Irã é o segundo que mais promove a execução da pena capital. A China está em primeiro lugar, detém o recorde de 5 mil mortes, apenas em 2006.

Por ocasião da Assembleia-Geral das Nações Unidas de 18 de dezembro de 2007, o Irã refutou a resolução da moratória sobre a pena capital. Ficou ao lado de outros 54 Estados membros, a incluir Israel e EUA, onde 38 estados federados adotam tal pena.

A moratória acabou aceita por 104 países e 29, entre os presentes, abstiveram-se de votar. Hoje, 59 países mantêm a pena capital, e 25 executam rotineiramente essa forma de “homicídio legal”. No planeta, 2008 fechou o ano com 2.390 execuções de condenados.

A situação iraniana agrava-se pelo fato de a maioridade estar estabelecida em 9 anos de idade para as mulheres e em 15 anos para os homens. Portanto, uma criança do sexo feminino de 9 anos pode ser enforcada. Também poderá casar-se, daí a ocorrência, na visão ocidental, dos chamados matrimônios sob coação. E são muitos no Irã.

Não surpreendeu ter o Irã aderido à Convenção da ONU sobre Direitos da Infância. É que a redação dada ao artigo 49 da supracitada convenção não mudava as suas regras. Segundo o artigo 49, veda-se a aplicação de pena de morte para quem cometeu crime quando menor de idade. Ora, nada mudou, pois na aplicação da sharia xiita, não são executados menores de idade.

Até o fechamento desta coluna, 150 iranianos com menos de 18 anos aguardavam no corredor da morte a chamada dos carrascos incumbidos da preparação dos enforcamentos. Em 2008, o Irã enforcou oito menores de 18 anos. Quando da guerra contra o Iraque de Saddam Hussein, 80 jovens condenados à morte puderam trocar a pena pelo combate, no papel de “bucha de canhão”.

Por outro lado, os presídios iranianos encontram-se abarrotados, e os presos em condições desumanas. A Amnesty International alertou que “entre os reclusos estão acusados por crimes de opinião, políticos, homossexualismo e adultério”. Pior, o mesmo juiz que investiga é, como regra, aquele que julga. E não precisa julgar conforme as provas.

A jornalista Zahra Kazemi, com dupla nacionalidade (iraniana e canadense), ficou incomunicável durante cinco anos no temido cárcere de Evin, reservado a presos políticos e localizado na periferia de Teerã. Em 2003, comunicou-se ter sido encontrada morta na cela. No mesmo cárcere, está a jornalista Roxana Saberi, de 32 anos, e a ativista de direitos humanos Esha Momeni, de 28. Ambas possuem dupla cidadania (iraniana e norte-americana) e se encontram condenadas por espionagem, em processos “armados” para exploração política.

Há pouco mais de três meses, Roxana fora presa em flagrante com uma garrafa de vinho comprada de contrabandista. Para a sua surpresa, a acusação mudou para espionagem, pois a sua licença de jornalista não havia sido renovada pelo Ministério da Cultura e a Guarda do Islamismo; e ela atuava como freelancer.

Roxana, de mãe japonesa e pai iraniano, fugiu, em 1979, para os EUA, em face da Revolução Islâmica. Já foi miss Dakota do Norte (1998) e esteve em greve de fome. Ressabiado, o pai fala em profunda depressão. Em Paris, a organização Repórteres Sem Fronteira promove manifestações em favor de Roxana.

As jovens são permanentemente vigiadas pela polícia de proteção aos bons costumes, da qual provém Ahmadinejad. São presas por participar de festas clandestinas, ingerir bebida alcoólica, escutar música americana e “namoros expansivos”. Na reincidência, os pais são responsabilizados.

Em 1º de maio, apesar das pressões internacionais, realizou-se o enforcamento da pintora Delara Darabi, de 23 anos. A acusação era de ter matado a prima, de 58. Na ocasião, Delara tinha 17 anos. Em 2005, confirmou-se a condenação, apesar de sua negativa e de a perícia oficial haver demonstrado que os golpes fatais, dados com punhal, haviam sido desferidos por pessoa destra. E ela era canhota.

Delara conseguira um adiamento em 20 de abril. Isto porque pegaria mal para Ahmadinejad participar da Conferência sobre Racismo da ONU com as mãos tingidas de sangue. Tão logo voltou, deu-se o enforcamento, sem comunicação oficial ao advogado e à família.

Como se percebe, sem tocar nas questões sobre Holocausto, aniquilamento de Israel e armas atômicas, o presidente Lula, no que tange ao seu grande prestígio internacional, teve sorte com o adiamento da visita de Ahmadinejad ao Brasil. Agora, resta torcer pela eleição, em junho, de Mir-Hossein Mousavi, um moderado reformista.

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