domingo, 29 de agosto de 2010

Um neoliberalismo mais devastador? = por Paulo Ferraresi Pegino (Blog do Nassif)

Quando explodiu a crise em 2008, muitos aproveitaram para decretar o fim do período neoliberal e anunciar que, daquele momento em diante, o estado e a sociedade estariam novamente ditando as regras do jogo. A ideologia do livre-mercado deveria admitir o erro da crise causada e recuar. Vacinados pelo desastre, estados e sociedade passariam a controlar os excessos do livre-mercado.

Esse otimismo auto-ilusório dos setores progressistas da sociedade, ao mesmo tempo esperançoso, mas também demais envolvido emocionalmente com os fatos que se seguiam, obscureceu a capacidade de se analisar criticamente os efeitos da crise e de se perceber as respostas rápidas que poderiam surgir no contra-ataque do modelo de capitalismo de livre mercado. E foram, de fato, rápidas.

No primeiro momento da crise, como se sabe, veio o socorro aos bancos e as grandes empresas. Países ao redor do mundo derramaram cifras trilionárias de dinheiro público para salvar e premiar os especuladores que apostaram contra as vidas de milhões de trabalhadores e da sociedade em ativos artificialmente inflacionados. Enfraquecidos ideologicamente, os apostadores do livre-mercado, de fato, recuaram. Ouviram um sermão, mas recuaram com os bolsos preservados a preenchidos com o dinheiro público.

Mas, já num segundo momento, os ideólogos do livre mercado ressurgiram, agora cobrando a conta pelo rombo causado por aquele mesmo socorro trilionário nas finanças públicas. O mesmo socorro trilionário que salvou os especuladores passou a ser visto pelos economistas de plantão como sinal de gastança pública e mau gerenciamento do estado.

Empresas de rating começaram a baixar as notas de avaliação de risco dos estados nacionais. Estes, por sua vez, e de forma articulada, se puseram a cortar os gastos sociais: pensões, direitos trabalhistas, educação, saúde, investimentos públicos, tudo congelado, cortado ou revisto para baixo. Todos os "privilégios" sociais, incompatíveis com a modernização da gestão do estado enxuto, conforme a cartilha da mitologia do livre-mercado, foram revistos. Os que ainda não foram, estão em vias de ser. De quebra, acelera-se ainda o processo de privatizações de empresas públicas. Tudo para dar uma resposta rápida e não abalar a confiança do livre-mercado.

O modelo neoliberal, dado como morto, em pouco tempo se impõe novamente como agenda política e como a fórmula inconteste para sair da crise provocada pelo próprio modelo. Em vez de precipitar o fim do modelo, a crise o fortaleceu.

A profecia do fim do neoliberalismo tem efeito inverso: na conta do sacrifício imposto aos trabalhadores e a sociedade está, ainda, a flexibilização das leis trabalhistas e a destruição dos modelos de seguridade social. Basta se atentar para o discurso de Obama, Sarkozy, Berlusonci, etc e etc...

Além disso, na Europa e nos EUA, nunca se contratou tantas pessoas em condições de trabalho precário, temporários, meio período, etc. As grandes empresas ganham duas vezes: o estado reduz os custos trabalhistas, e a crise as ajuda a congelar salários e demitir em massa. Os sindicatos recuam para preservar o pouco emprego que resta. Não à toa, as grandes empresas ao redor do mundo começam a publicar balanços com lucros recordes. Os trabalhadores perdem, mas o grande capital continua a ganhar.

O fim do neoliberalismo pode, na verdade, ser o começo de uma era de capitalismo ainda mais sombria para o mundo: tradicionalmente, o enfrentamento dos abusos e excessos do capitalismo é feito pelos trabalhadores organizados. Mas a crise foi uma oportunidade de ouro para o capital “higienizar” sua relação com os trabalhadores: o poder de negociação e enfrentamento dos trabalhadores está sendo aniquilada, com a ajuda decisiva dos estados nacionais.

Ainda, as grandes empresas aproveitam a debilidade causada pela crise nas pequenas e médias empresas para aniquilar ou absorver concorrentes. O mercado fica mais concentrado, os trabalhadores mais enfraquecidos e as grandes empresas ainda mais poderosas, podendo interferir ainda mais nas leis e na regulação do estado e em toda vida social.

Fim do neoliberalismo ou o início de um neoliberalismo ainda mais devastador?


Comentário

Hoje Caetano Veloso escreve em alguns jornais uma coluna em que critica o "retorno do estado" na economia brasileira, dizendo que isto não é o que está sendo feito no resto do mundo. Nenhuma palavra é dita sobre o fato do Brasil estar crescendo - com esta política - muito mais do que a grande maioria dos outros países do mundo, além de ser um dos que menos foi afetado com a crise dos neoliberais.
Nenhuma palavra, também, com os trilhões de dólares gastos para encher os bolsos dos especuladores defensores do "livre mercado" contra o Estado. Nenhuma raiva, nenhuma ironia, nenhum desprezo.
Certa vez Cateano definiu-se como um "subintelectual de miolo mole". Neste caso, não posso discordar dele.

A oposição e as críticas responsáveis - por sergiolmrivero (blog do Nassif)

Esta produção de auto-engano, baseada nos próprios preconceitos das "raposas" demotucanas e dos "analistas" da grande mídia é uma coisa que, um dia, vai precisar ser estudada pelo pessoal da ciência política.

Não faz sentido pensar na Dilma como um poste. Ela foi a pessoa mais poderosa do governo, depois do Lula, por pelo menos dois anos. Parece o mesmo preconceito idiota que cegou os políticos tucanodemos em relação ao Lula. Se o PT e a esquerda latinoamericana são seus inimigos, o pior erro que eles fizeram foi subestimá-los.

Agora essa turma tá chorando suas pitangas, dizendo que o país vai "ficar sem oposição"...Bom...Numa democracia, caso eles não saibam, é preciso o voto dos cidadãos para que os políticos possam ocupar postos eletivos (ehehehe). Sem voto, não tem deputado, senador ou presidente.

Acredito que estamos vivendo uma época extraordinária no Brasil. Está morrendo o Brasil gestado na ditadura militar. Ainda há muito do legado do período da ditadura por aí, por que as transformações qualitativas, em qualquer processo social, são sempre complexas e cheias de descontinudades. Não existe o novo sem o antigo. Mas, o que parece estar em curso é o debate sobre o que queremos do Brasil do século XXI. Como vencer os grandes desafios do Desenvolvimento (que voltou á agenda) reduzindo a desigualdade social. Lula, por aprendizado, convicções morais e escolha política, tem o grande mérito de ter conduzido, com cuidado e responsabilidade, o país para esta nova agenda.

Quem lê regularmente a imprensa internacional e as publicações especializadas, vê que a percepção global do processo que está acontecendo no Brasil é extremamente positiva. Fica claro para o olhar irônico de gente que escreve no Financial Times que, surpreendentemente, apesar do atraso institucional e das desigualdade, o Brasil está virando, rapidamente, uma robusta e pujante democracia moderna e começa a disputar espaço de influência global, com todos os custos em que isso implica. A imprensa brasileira com, honrosas exceções como este blog aqui, passa longe deste debate, bramindo slogans tolos e preconceitos, falando para um segmento cada vez menor da sociedade brasileira.

Esse discurso que combina soberba e interesse está fortemente desconectado da realidade, o que muita gente ja apontou por aqui. Mais que chavões repetidos à exaustão, os ditos "liberais" precisam meter a mão na massa e estabelecer quais as críticas responsáveis e as propostas concretas que eles tẽm para o desenvolvimento e para a nova agenda imposta a eles pelos prováveis 12 anos de governo do PT.

Sem isso, vai restar a esse povo amargar a derrota, atropelados pelo trem que eles, tolamente, tentaram não ver.

sábado, 28 de agosto de 2010

Investigações pós-Katrina revelam ataques raciais pelos brancos - por Trymaine Lee (Nova Orleans - EUA)

Nos dias que se seguiram após o furacão Katrina ter deixado grande parte de Nova Orleans em ruínas inundadas, a cidade estava tomada de histórias de violência e derramamento de sangue.

A narrativa daqueles primeiros dias caóticos –construída em grande parte com base em relatos incompletos e rumores infundados– rapidamente se transformou em uma espécie de consenso terrível: negros pobres e saqueadores assassinavam inocentes e aterrorizavam quem quer que cruzasse o caminho deles na cidade escura, desprotegida.

"Ao olhar para trás, na época em que estava sendo noticiado, parecia que a cidade estava sob sítio", disse Russel L. Honore, o general reformado do Exército que liderou os esforços militares de ajuda humanitária após a tempestade.

Hoje, um quadro mais claro está surgindo, e é igualmente feio, incluindo violência de vigilantes brancos, extermínio por policiais, acobertamento oficial e uma população sofredora bem mais brutalizada do que muitos estavam dispostos a acreditar. Vários policiais e civis brancos acusados de violência racial foram indiciados recentemente em vários casos, e mais incidentes estão vindo à tona à medida que o Departamento de Justiça inicia várias investigações de violações de direitos civis após a tempestade.

"O ambiente que foi produzido pela tempestade trouxe à tona o que estava dormente nas pessoas daqui – a raiva e desprezo que sentiam contra os afro-americanos na comunidade", disse John Penny, um criminologista da Universidade Sulista de Nova Orleans. "Nós poderemos nunca saber quantas pessoas foram baleadas, mortas ou cujos corpos nunca serão encontrados."

O rompimento dos diques deixou 80% de Nova Orleans submersa, mas na área não inundada de Algiers Point, por exemplo, um enclave de maioria branca em um bairro predominantemente negro na margem oeste do Rio Mississippi, milícias brancas armadas isolaram muitas das ruas.

Eles colocaram avisos que diziam: "Nós atiramos em saqueadores". E o som de disparos temperava os dias e noites quentes como trovões de uma segunda tempestade.

Reginald Bell, um morador negro, disse em uma recente entrevista que foi ameaçado por dois homens brancos armados ali, poucos dias após a tempestade. Os homens, em uma sacada a poucas quadras de sua casa, gritaram para ele: "Nós não queremos gente da sua laia por aqui!"

Então um dos homens armou seu rifle, apontou para Bell e disse que não queria mais vê-lo nas ruas de Algiers Point, disse Bell. No dia seguinte, ele disse, os homens o confrontaram em sua varanda, enquanto ele estava sentado com sua namorada. Eles enfiaram as armas –um rifle e uma Magnum .357– nos rostos do casal e reiteraram sua exigência.

"Não havia eletricidade, polícia, nada", disse Bell, 41 anos, sentando em sua varanda em uma tarde recente. "Nós estávamos indefesos. Eu dormi com uma faca de açougueiro e uma machadinha sob meu travesseiro."

A área da margem oeste da cidade foi poupada de inundações, mas nos dias e semanas que se passaram após a tempestade, ela ficou cheia de árvores caídas e, segundo testemunhas, de corpos de vários homens negros –nenhum dos quais parecia ter se afogado.

"Eu vi corpos estirados nas ruas por semanas", disse Malik Rahim, que vive virando a esquina da casa de Bell e veio em sua ajuda. "Eu não estou falando do Nono Distrito inundado, eu falo do seco Algiers. Eu os vi ficarem inchados e serem devorados pelos cães. E todos tinham ferimentos de bala.

"Nós gritávamos a plenos pulmões naqueles primeiros dias, mas ninguém queria ouvir."

Bell disse ter procurado a polícia não muito depois do confronto com os dois brancos armados, mas nenhum boletim de ocorrência foi preenchido e nenhuma ação foi tomada. Apenas no ano passado, quando ele foi entrevistado por um grande júri federal que investigava as violações de direitos civis na Nova Orleans pós-Katrina é que as pessoas passaram a prestar atenção, ele disse.

Algumas das acusações mais sérias vieram à tona após as investigações do jornal "The Times-Picayune" e da organização de notícias sem fins lucrativos ProPublica, que destacaram grande parte da violência policial e da violência racial na área de Algiers Point.

Um caso é o de um ex-morador de Algiers, Roland J. Bourgeois Jr., que é branco e foi acusado de participar de um dos grupos de vigilantes. Ele foi recentemente indiciado pelo governo federal por violações de direitos civis no assassinato de três homens negros que tentavam deixar a cidade. Segundo o indiciamento, Bourgeois, que atualmente vive no Mississippi, alertou um vizinho que "qualquer um que vier pela rua e for mais escuro do que um saco de papel pardo vai levar bala".

O caso mais proeminente envolvendo a polícia é o do tiroteio na Ponte Danziger, no leste de Nova Orleans, onde seis dias após o Katrina, um grupo de policiais, empunhando rifles de assalto e armas automáticas, disparou contra um grupo de civis desarmados, ferindo uma família de quatro e matando dois, incluindo um adolescente e um deficiente mental. O homem, Ronald Madison, 40 anos, recebeu um disparo de rifle nas costas e então foi pisado e chutado enquanto morria, segundo os autos do processo.

Em maio, o prefeito Mitch Landrieu convidou o Departamento de Justiça para conduzir uma revisão plena do Departamento de Polícia da cidade. O Departamento de Justiça também deu início a várias investigações civis e criminais da violência pós-Katrina envolvendo a polícia e civis.

Thomas Perez, um secretário assistente de Justiça, disse que o governo federal está investigando oito casos criminais envolvendo acusações de má conduta policial. Muitas pessoas na cidade – incluindo ativistas, vítimas e testemunhas– há muito argumentavam que a violência racial estava sendo ignorada pelas autoridades locais.

"Nós fomos desdenhados como malucos nos últimos quatro anos", disse Jacques Morial, um co-diretor do Instituto de Justiça da Louisiana, uma organização de defesa sem fins lucrativos, e filho do primeiro prefeito negro de Nova Orleans. "Eu acho que o que estamos vendo agora corrige a realidade do Katrina, e acho que isso concede justiça para muita gente."

O superintendente de polícia da cidade, Ronal Serpas, que assumiu o departamento em maio, disse ter ficado perturbado com o que veio à tona desde a tempestade.

"Nós temos que confrontar isso e ir a fundo", disse Serpas. "Há exemplos demais de homens que usavam este distintivo e reconheceram no tribunal um comportamento que é um verdadeiro insulto a esta cidade, assim como aos homens e mulheres deste departamento que usam este distintivo com orgulho e dignidade."

Em uma tarde recente, Rahim, 62 anos, caminhava pelas ruas de Algiers e apontava onde, quadra a quadra, as milícias levantaram barricadas e montaram guarda. Ele caminhou ao longo do dique onde os restos mortais carbonizados de Henry Glover foram encontrados no porta-malas de um carro incendiado, causando o indiciamento de três atuais e dois ex-policiais.

"Como é possível remover as cicatrizes dos olhos de todas as crianças que testemunharam essas atrocidades?" perguntou Rahim.

Honore disse que também se faz essas perguntas.

"Eu acho que a cada ano há mais tempo para as pessoas refletirem a respeito", ele disse. "Eu saí do Katrina com um ponto de vista a respeito. E não passa um mês sem que eu fale com alguém que sobreviveu a isso e que me dá um ponto de vista diferente, que eu não dispunha antes."

Tradução: George El Khouri Andolfato
http://noticias.uol.com.br/midiaglobal/nytimes/2010/08/28/investigacoes-pos-katrina-revelam-ataques-raciais-pelos-brancos.jhtm  

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Duas versões do caso Lula x Frias Filho (blog do Nassif)

Não sei por que razão, na edição online não está a matéria da impressa, com a versão do Otávio Frias Filho para a grosseria cometida no almoço oferecido pelo jornal a Lula, em 2002. Na versão de Otávio, ele apenas questionou a falta de preparo de Lula. Mas a versão do Ricardo Kotscho descreve em detalhes a grosseria e desmente (a priori) a versão nova de Otávio.

Por Der Steppenwolf
Livro: Do Golpe ao Planalto – Ricardo Kotscho
Capítulo: Rumo à Vitória 2000 – 2002 - página 225

(...)

O único problema mais sério que tivemos no relacionamento com a imprensa ao longo da campanha aconteceu por culpa minha. Lula já havia mantido encontros e participado de almoços com os dirigentes dos principais meios de comunicação, mas resistia a atender ao convite da Folha para o tradicional almoço com os diretores, editores e repórteres especiais. Quase toda semana, "seu" Frias ou alguém a seu pedido repetia o convite, que eu voltava a levar a Lula. Este alegava que noutras ocasiões tinha ficado contrariado com a maneira pouco cortês como fora tratado no jornal. Tanto insisti, que ele acabou me autorizando a marcar o almoço. Impôs, no entanto, que o número de participantes fosse reduzido, para que pudesse conversar melhor com o "seu" Frias.

Em razão de algum mal-estar ocorrido em almoços anteriores, dos quais não participei, o clima já não pareceu muito amigável desde o momento em que "seu" Frias recebeu Lula e José Alencar. Otávio Frias Filho ficou calado, enquanto Lula não parava de falar dos seus planos para o país e da importância de ter um vice como Alencar. Assim que os comensais sentaram à mesa, Frias Filho disparou a primeira pergunta: se Lula se sentia em condições de governar o país, mesmo sem ter se preparado para isso, não sabendo nem falar inglês. O candidato fez uma expressão de incredulidade, olhou prá mim como quem diz: "E eu tinha que ouvir isso?", engoliu em seco e deu uma resposta até tranqüila diante daquela situação constrangedora.

Como se tivessem sido ensaiadas, as perguntas seguiram no mesmo tom hostil ao convidado até que, já quase na hora em que seria servida a sobremesa, alguém quis saber como ele se sentia ao aceitar uma aliança com Paulo Maluf. O argumento era que, se o PL apoiava Maluf na eleição para governador de São Paulo, o candidato do PT a presidente também estaria se aliado ao político que mais combatera durante toda a história do partido. Não havia porém, nenhuma aliança em São Paulo entre o PP e o PT, que disputava a mesma eleição tendo como candidato o deputado federal José Genoíno. Foi a gota d'água. Lula não respondeu; levantou-se, dirigiu-se a "seu" Frias e comunicou: "O senhor me desculpe, mas não posso mais ficar aqui. Vou embora. Não posso aceitar isso, em nome da minha dignidade."

Ficou todo mundo paralisado. "Seu" Frias levantou-se também. Antes de sair, Lula ainda disse a Otavinho, o único que permaneceu na sala:"Eu não tenho culpa se você está nervoso porque teu candidato vai mal nas pesquisas". Para ele, a Folha estava apoiando José Serra. Pegando no braço do candidato, "seu" Frias o acompanhou até o elevador e depois até o carro, no estacionamento, com os outros todos caminhando atrás. "Nunca tinha acontecido isso antes na nossa casa", lamentou.

(...)

Pesquisas polêmicas - por Marcos Coimbra (Correio Braziliense)

Pesquisas nas quais não se pode confiar são um problema. Elas atrapalham o raciocínio. É melhor não ter pesquisa nenhuma que tê-las.

Ao contrário de elucidar e ajudar a tomada de decisões, confundem. Quem se baseia nelas, embora ache que faz a coisa certa, costuma meter os pés pelas mãos.

Isso acontece em todas as áreas em que são usadas.

Nos estudos de mercado, dá para imaginar o prejuízo que causam? Se uma empresa se baseia em uma pesquisa discutível na hora de fazer um investimento, o custo em que incorre? Na aplicação das pesquisas na política, temos o mesmo. Ainda mais nas eleições, onde o tempo corre depressa. Não dá para reparar os erros a que elas conduzem.

Pense-se o que seria a formulação de uma estratégia de campanha baseada em pesquisas de qualidade duvidosa. Por mais competente que fosse o candidato, por melhores que fossem suas propostas, uma candidatura mal posicionada não iria a lugar nenhum.

Com a comunicação é igual. Boas pesquisas são um insumo para a definição de linhas de comunicação que aumentam a percepção dos pontos fortes de uma candidatura e que explicam suas deficiências. As incertas podem fazer que um bom candidato se torne um perdedor.

E na imprensa? Nela, talvez mais que em qualquer outra área, essas pesquisas são danosas. Ao endossálas, os veículos ficam em posição delicada.

Neste fim de semana, a Folha de São Paulo divulgou a pesquisa mais recente do Datafolha. Os problemas começaram na manchete, que se utilizava de uma expressão que os bons jornais aposentaram faz tempo: Dilma dispara.... Dispara.., afunda... são exemplos do que não se deve dizer na publicação de pesquisas. São expressões antigas, sensacionalistas.

Compreende-se, no entanto, a dificuldade do responsável pela primeira página. O que dizer de um resultado como aquele, senão que mostraria uma disparada? Como explicar que Dilma tivesse crescido 18 pontos em 27 dias, saindo de uma desvantagem para Serra de um ponto, em 23 de julho, para 17 pontos de frente, em 20 de agosto? Que ganhasse 24 milhões de eleitores no período, à taxa de quase um milhão ao dia? Que crescesse nove pontos em uma semana, entre 12 e 20 de agosto, apenas nela conquistando 12,5 milhões de novos eleitores? O jornal explicou a disparada com uma hipótese fantasiosa: Dilma cresceu esses nove pontos pelo efeito televisão. Três dias de propaganda eleitoral (nos quais a campanha Dilma teve dois programas e cinco inserções de 30 segundos em horário nobre), nunca teriam esse impacto, por tudo que conhecemos da história política brasileira. Aliás, a própria pesquisa mostrou que Dilma tem mais potencial de crescimento entre quem não vê a propaganda eleitoral. Ou seja: a explicação fornecida pelo jornal não explica a disparada e ele não sabe a que atribuí-la. Usou a palavra preparando uma saída honrosa para o instituto, absolvendo-o com ela: foi tudo uma disparada.

É impossível explicar a disparada pela simples razão que ela não aconteceu. Dilma só deu saltos espetaculares para quem não tinha conseguido perceber que sua candidatura já havia crescido. Ela já estava bem na frente antes de começar a televisão.

Mas as pesquisas problemáticas não são danosas apenas por que ensejam explicações inverossímeis.

O pior é que elas podem ajudar a cristalizar preconceitos e estereótipos sobre o país que somos e o eleitorado que temos.

Ao afirmar que houve uma disparada, a pesquisa sugere uma volubilidade dos eleitores que só existe para quem acha que 12,5 milhões de pessoas decidiram votar em Dilma de supetão, ao vê-la alguns minutos na televisão. Que não acredita que elas chegaram a essa opção depois de um raciocínio adulto, do qual se pode discordar, mas que se deve respeitar.

Que supõe que elas não sabiam o que fazer até aqueles dias e foram tocadas por uma varinha de condão.

Pesquisas controversas são inconvenientes até por isso: ao procurar legitimá-las, a emenda fica pior que o soneto. Mais fácil é admitir que fossem apenas ruins.

Boas pesquisas são um insumo para a definição de linhas de comunicação que aumentam a percepção dos pontos fortes de uma candidatura e que explicam suas deficiências. As incertas podem fazer que um bom candidato se torne um perdedor.

terça-feira, 17 de agosto de 2010

Caso Lunus: a versão do cachorro louco - por Leandro Fortes (Brasília, eu vi)

Seria apenas risível, não fosse, antes de tudo, muito grave, o surgimento de uma nova e alucinada versão sobre a operação da Polícia Federal, deflagrada em março de 2002, que resultou na apreensão de 1,3 milhão de reais na sede da construtora Lunus, em São Luís, no Maranhão. A empresa, de propriedade da governadora Roseana Sarney (PMDB) e do marido dela, Jorge Murad, tornou-se o epicentro de uma crise política que modificou os rumos da campanha eleitoral de 2002, justamente quando a direita brasileira parecia capaz de emplacar, finalmente, um candidato puro-sangue com real chance de chegar à Presidência da República. Na época, Roseana Sarney era do PFL, atual DEM, e resplandecia numa eficiente campanha de mídia como exemplo de mulher corajosa, determinada e, sobretudo, competente. Resguardada pelo poder do pai, o senador José Sarney (PMDB-AP), e pela aliança pefelista que sustentava o governo Fernando Henrique Cardoso, Roseana sonhou, de fato, em tornar-se a candidata da situação contra Luiz Inácio Lula da Silva.


O desejo da família Sarney de retornar ao Palácio do Planalto revelava, em primeiro plano, o absoluto descolamento da realidade de um clã provinciano e truculento, incapaz de perceber o mundo além das fronteiras do Maranhão. Por outro lado, revelava, ainda, total desconhecimento dos métodos e da sanha de seu verdadeiro adversário, o tucano José Serra, empenhado em ser candidato pelo PSDB a qualquer custo. Serra, ao contrário de Roseana, tinha montado uma máquina de moer inimigos a partir de um “núcleo de inteligência” instalado na antiga Central de Medicamentos (CEME) do Ministério da Saúde, comandada pelo delegado da PF Marcelo Itagiba, atual deputado federal pelo PSDB. Itagiba, no entanto, era apenas o ponto de contato entre Serra a direção-geral da corporação, então nas mãos de outro tucano, o delegado Agílio Monteiro Filho, que chegou a se candidatar, sem sucesso, à Câmara dos Deputados, em 2002, também pelo PSDB. Em 2007, o delegado foi nomeado ouvidor-geral adjunto do Estado de Minas Gerais, uma espécie de ombudsman paroquial, pelo governador Aécio Neves. Um prêmio de consolação, convenhamos, para lá de meia-boca.

Agílio Monteiro Filho comandou de longe uma operação montada em bases políticas, dentro do Palácio do Planalto, com o aval do presidente Fernando Henrique e de seu candidato à sucessão, José Serra. Imputar esse fato ao PT e, mais incrivelmente, a Lula, quase uma década depois do ocorrido, só se justifica pela insana caminhada de parte da mídia ao precipício, onde também se pretende jogar a memória nacional e a inteligência alheia, para ficarmos em termos brandos. O depoimento do tal sindicalista Wagner Cinchetto à revista Veja, como parte da série “grandes entrevistas de dedos-duros do mundo sindical”, tem a pretensão de transformar fatos concretos e apurados numa versão aloprada baseada, unicamente, nos valores invertidos do mundo bizarro em que se transformou boa parte da imprensa brasileira. Trata-se de caso explícito de abandono completo da regras básicas do jornalismo, mesmo a mais primária, a de pesquisar, com um google que seja, aquilo que já foi escrito a respeito.

Digo isso porque, quando da deflagração da Operação Lunus, eu era repórter do Jornal do Brasil, em Brasília, e fui destacado para descobrir os bastidores daquela sensacional ação policial que, inusitadamente, havia sido comemorada tanto pelo Palácio do Planalto como pela oposição petista. Eu tinha boas fontes na Polícia Federal, tanto em Brasília como no Maranhão, e desde as primeiras horas da notícia fui alertado de que, embora a grana dos Sarney fosse mesmo suja, a operação da PF tinha sido armada para detonar Roseana Sarney. Outro que foi avisado cedo sobre o assunto foi o próprio José Sarney. Furibundo, o chefe do clã iniciou um movimento político que resultou em uma de suas raras dissidências governistas e em um ódio paternal profundo pela figura de José Serra.

Na ponta da Operação Lunus estava o delegado Paulo Tarso de Oliveira Gomes, atual adido policial nos Estados Unidos, nomeado pelo diretor-geral da PF, delegado Luiz Fernando Corrêa, imagina-se, por bons serviços prestados à corporação. Gomes era um homem de confiança de Agílio Monteiro Filho e, portanto, do PSDB. A chance de haver alguma ligação dele com o PT ou Lula é a mesma de Marcelo Itagiba se tornar ministro da Justiça em um eventual governo Dilma Rousseff. Ou seja, zero. Jamais houve, contudo, o tal telefonema para o Palácio do Planalto feito por Gomes para avisar FHC do sucesso da empreitada. O delegado Paulo Tarso Gomes enviou, isso sim, de dentro do escritório da Lunus, um fax para o Palácio da Alvorada, à noite, onde o presidente Fernando Henrique, ansioso e de pijamas, aguardava notícias sobre a ação. O texto anunciava a missão cumprida. Foi uma matéria minha, no JB de 2 de março de 2002, que revelou a armação.

Eu soube do fax porque, à época, consegui acessar os dados da companhia telefônica do Maranhão e me deparei com o grau de amadorismo da ação. Incrivelmente, o delegado-chefe da operação, no afã de mostrar serviço, nem esperou voltar para o hotel em São Luís para dar as boas novas a FHC: passou um fax de dentro da empresa investigada! Os números, tanto do telefone da Lunus, como do Palácio da Alvorada, foram registrados pela telefônica e, um dia depois, também foram estampados pelo Jornal do Brasil, a tempo de desmentir uma versão montada às pressas, na assessoria de imprensa da PF, que chegou a apresentar um fax falso para evitar a desmoralização da operação. Tudo isso poderia ter sido checado, sobretudo na Editora Abril, haja vista que o editor-chefe do jornal, que participou diretamente da edição das matérias, era o jornalista Augusto Nunes, atualmente, um dos colunistas da revista Veja.

Mais uma coisinha que ninguém se lembra de falar quando se trata da Operação Lunus: embora tenha sido um sucesso político para os tucanos, foi um fracasso total para a Polícia Federal. Um ano depois, o Supremo Tribunal Federal (STF) arquivou, por falta de provas, o processo contra Roseana Sarney decorrente da ação da PF.

No fim das contas, o neoarrependido Wagner Cinchetto nada mais é o do que um dos cachorros loucos liberados pela mídia neste agosto eleitoral. Ao imputar a Lula e ao PT a tucaníssima Operação Lunus, o sindicalista conseguiu apenas consolidar essa impressão terrível, que cresce com a proximidade das eleições, de que os ventos da derrota não trazem, definitivamente, bons conselhos aos candidatos.


Comentário

Bob Woodward e Seymour Hersh são considerados dois dos maiores repórteres e jornalistas de todos os tempos dos Estados Unidos.

Numa lista brasileira, dentre outros, fatalmente estariam Mino Carta, Marina Amaral, Sérgio de Souza, Bob Fernandes e Leandro Fortes.

Maria da Conceição Tavares – 80 anos de reflexões – por Julio Cesar Macedo Amorim (Carta Capital)

A mais influente economista brasileira fala de sua chegada ao País, de seus heróis na academia e na política e dos anos FHC e Lula

Portuguesa de origem, brasileira de corpo e alma, ela é certamente a intelectual mais importante do país no último meio século. Como professora na Universidade Federal do Rio de Janeiro, formou e influenciou gerações de economistas, bem como o debate econômico. Como ex-integrante do PMDB, ex-deputada federal e filiada ao PT, nunca se esquivou da militância progressista, inspirada na ideia de Darcy Ribeiro de apostar na construção de "uma democracia racial nos trópicos". Em comemoração a seus 80 anos, completados em abril, a Editora da UFMG, em parceira com a Fundação Perseu Abramo, lança, na terça 24, em Belo Horizonte, uma coletânea de artigos sobre sua obra. Escalados para analisar o legado da economista, Emir Sader, Ricardo Bielschowsky, José Carlos de Souza Braga e Maurício Borges Lemos. O livro foi organizado por Juarez Guimarães, responsável também por uma longa entrevista com ela publicada nas páginas finais. A seguir, CartaCapital reproduz os principais trechos dessa entrevista, uma panorama da vida pública de Maria da Conceição desde a sua chegada ao Brasil, em 1954. A revista encaminhou ainda três perguntas complementares à professora, referentes aos períodos de FHC e Lula no poder. As respostas aparecem em quadro separado da entrevista concedida a Guimarães.


Juarez Guimarães: Como se formou esta sua identidade de esquerda, que se mostrou tão resistente às duras provas do tempo, no contexto da ditadura salazarista? Que personalidades e episódios foram decisivos?
Maria da Conceição Tavares: A influência familiar foi decisiva. Meu pai, Fausto Tavares, era anarquista e dava asilo aos refugiados da Guerra Civil Espanhola. Do ponto de vista intelectual, a influência mais importante, em Portugal, foi a do professor Bento de Jesus Caraça, matemático de esquerda e produtor cultural das mais brilhantes enciclopédias do país. Além disso, era militante do Partido Comunista Português, ilegal, dando aulas para trabalhadores que organizavam o jornal A Voz Operária.

JG: A senhora falou, uma vez, do apelo de Darcy Ribeiro. Como ele a influenciou?
MCT: Ele foi uma figura muito importante entre os intelectuais que conheci quando cheguei ao Brasil. Ele tinha não apenas o otimismo da vontade, mas também, ao contrário da maioria, o otimismo da razão. Acreditava na criatividade do povo brasileiro, na sua complexidade, na sua capacidade de recuperação nas derrotas. Sua frase mais marcante para isso era a que ele considerava o destino do povo brasileiro na construção da nação: "vamos construir uma democracia multirracial nos trópicos".

JG: Sua formação como economista deu-se em um período em que as duas grandes tradições do pensamento econômico brasileiro, a economia política do desenvolvimento e a economia liberal, estavam formando seus campos e suas instituições. O que aprendeu e qual a sua apreensão crítica do pensamento econômico liberal brasileiro nesse período?
MCT: Da parte dos liberais, que eram maioria na escola de economia onde me formei (a Faculdade de Economia e Administração da Universidade do Brasil, atual Universidade Federal do Rio de Janeiro), o autor mais importante era Eugênio Gudin. Para mim, particularmente por seu liberalismo político, que contrastava com o seu conservadorismo econômico, foi o professor Octávio Gouvêa de Bulhões, de quem fui assistente de 1960 até sua aposentadoria, em 1978. Com ambos aprendi algumas coisas importantes do ponto de vista da construção institucional da moeda e do crédito no Brasil, algo que a esquerda até hoje tem dificuldade de manejar. Eu era "monetarista"de manhã e "estruturalista"de tarde. Para o lado estruturalista, contribuiu muito a leitura de Formação Econômica do Brasil, do mestre Celso Furtado.

JG: Como foi sua aproximação de Celso Furtado e San Tiago Dantas?
MCT: Minha vinculação ao que se pode denominar "esquerda positiva", que não anulava o meu pensamento crítico sobre o nacional-desenvolvimentismo, prende-se aos desastres sociais, que tinha verificado naquilo que se pode chamar de esquerda golpista ou, dito de outra forma, as tentativas de tomar o poder sem apoio popular amplo. Na verdade, para mim, "esquerda positiva” era toda aquela que apontava um programa reformista que incluísse reformas amplas de caráter social. Esse era o caso de Celso Furtado, mas não creio que valha o mesmo para San Tiago Dantas. No caso de Furtado, tanto na SUDENE quanto no próprio Plano Trienal, esse programa reformista era evidente. No que diz respeito ao diálogo entre cepalinos e marxistas, ele era mais fácil no Rio de Janeiro, por causa do Iseb (Instituto Superior de Estudos Brasileiros). Já os cientistas sociais de São Paulo, em particular da USP, tinham uma visão "marxiana"do marxismo, vale dizer, estritamente acadêmica. Nenhum deles, com exceção de Paul Singer, tinha propriamente relação com os movimentos sociais e o movimento operário. Mais do que isso, os sociólogos e politólogos paulistas eram mais weberianos do que propriamente marxistas. Depois de 1964, o diálogo entre marxistas e cepalinos avançou sobretudo na Unicamp, durante a década de 1970, com as contribuições iniciais de João Manuel Cardoso de Mello, o Capitalismo Tardio, e de Luiz Gonzaga Belluzzo, Valor e Capitalismo: Um ensaio sobre economia política.

JG: A senhora chegaria em 1964 à direção do escritório Cepal-BNDE, então seguramente o principal centro intelectual do nacional-desenvolvimentismo brasileiro. Nessa trajetória, seria possível, em um esforço sintético, identificar quais economistas críticos foram mais importantes na sua formação?
MCT: Do ponto de vista da minha formação econômica, inclusive a crítica, o economista mais importante foi Aníbal Pinto Santa Cruz, diretor do Centro Cepal-BNDE, entre 1961 e 1964, que tinha a dupla formação cepalina e marxista. Além disso, fiz contato com os economistas do BNDE (hoje BNDES) durante o Plano de Metas de Juscelino Kubitschek. Lá conheci Ignácio Rangel, que, além de marxista, também tinha feito o curso da Cepal em Santiago e havia realizado a sua crítica ao pensamento cepalino, no que diz respeito à escassez da oferta de alimentos. Foi ele que me aconselhou a completar minha formação lendo Hilferding, o primeiro grande autor a tratar do tema do capital financeiro, usado por Lenin no seu livro sobre o imperialismo.

JG: Em depoimento à Agência Brasil, a senhora lembra os acontecimentos de 1964, o Comício da Central do Brasil, o crescimento vertiginoso da conspiração e o incêndio da UNE (União Nacional dos Estudantes). Recém nacional-brasileira, grávida, como viveu essa dramática descontinuidade? Como reestruturou sua força intelectual e existencial para o novo período da resistência que, então, se iniciava?
MCT: O golpe de 1964 bateu forte na minha vida até porque ele foi inaugurado e ganhou a sua primeira força aqui no Rio. Ver a UNE em chamas não é propriamente uma memória fácil de apagar. A duras penas, entre 1964 e 1968, consegui suportar graças à minha militância em toda a universidade brasileira. Nunca dei tanta palestra na minha vida, com exceção do período da redemocratização. Outra contribuição foi o surto da MPB, nesses anos, que também se espalhou por todas as universidades. Mas, decididamente, o que me fez superar a mágoa desse período foi o fato de ter estado no Chile entre o fim de 1968, antes do AI-5, e março de 1973. No último período do governo (Salvador) Allende, antes do golpe militar, a situação econômica e política tinha se complicado muito. A maioria dos diretores da Cepal tinha postos importantes no governo. Assim, a partir de março de 1972 até março de 1973, pedi licença na Cepal e fui colaborar, assim como outros economistas estrangeiros, entre os quais o brasileiro José Serra e o então ministro chileno da Economia Carlos Matus. Foi também um período duro, porque para nós, brasileiros, estava claro que a confiança de Allende sobre a vocação democrática dos militares era infundada.

JG: O seu caminho foi diferente, desde o início, daquele formulado no eixo Cebrap-USP, sob a liderança de FHC, de dissolução da problemática histórica do subdesenvolvimento em uma nova perspectiva das relações entre dependência e desenvolvimento. Como a senhora avalia hoje o debate sobre a dependência à luz do conceito de maior alcance histórico do subdesenvolvimento?
MCT: o debate sobre a dependência decorre da imprecisão do próprio conceito. Basta ler as obras de Cardoso e Falletto (1970), Ruy Mauro Marini (1973), Theotonio dos Santos (1972) e André Gunder Frank (1967). Este último (Capitalism and Underdevelopment in Latin America) é apenas uma versão marxistizada da visão de Celso Furtado sobre desenvolvimento e subdesenvolvimento. O primeiro (Dependência e Desenvolvimento na América Latina), de FHC e Enzo Faletto, é uma colagem sociológica, de tipo weberiano, sobre as classes dominantes em cima de um modelo centro-periferia, basicamente cepalino. Já o conceito de subdesenvolvimento é historicamente referido ao desenvolvimento coetâneo dos países centrais e periféricos. Como se trata de um modelo histórico-estrutural, o próprio Furtado admite que não pode ser confundido com atraso e modernização, já que se reproduz tanto no estágio agrário-exportador quanto no estágio mais avançado de substituição de importações. O livro fundamental do mestre Furtado vai, portanto, mais fundo e mais além do que a simples noção de dependência, seja ela econômica, financeira ou cultural.

JG: Após oito anos de governo Lula, em que medida avançou-se na republicanização do País?
MCT: Na minha opinião, o governo Lula foi o que mais avançou na republicanização do Brasil, porque a sua luta fundamental é por incluir os excluídos nos seus direitos econômicos, sociais e políticos. Avançou muito na questão do trabalho, mas relativamente pouco na questão da terra. A luta por tornar republicano e democrático o próprio Estado brasileiro ainda está no começo. E quanto ao rentismo financeiro, sobretudo nas suas formas de arbitragem de movimentos livres de capitais internacionais, isso praticamente não avançou. Essa é uma herança do neoliberalismo iniciado no mundo na década de 1970 e tardiamente, mas de forma perversa, no Brasil, que deixou uma herança mundial responsável inclusive pela recente crise mundial.

JG: Durante dez anos a senhora foi parte da direção executiva nacional do PMDB. Como foi essa experiência e que balanço faz dela?
MCT: É difícil fazer um balanço desses dez anos, mas posso ressaltar duas coisas. Primeiro, ter lidado de perto com uma das figuras políticas mais interessantes e competentes que me foi dado conhecer, Ulysses Guimarães. Em segundo lugar, o fato de que, durante dez anos, conheci por dentro a classe política brasileira que se reunia numa ampla frente democrática, mas cujas características de participação política não eram particularmente agradáveis. A começar pelo fato de que, na sua maioria, se guiavam mais pelo seu interesse privado do que pelo bem público. Assim, embora o líder político do PMDB não possa ser posto em tela de juízo, a expressão regional do partido era muitas vezes paroquial na luta parlamentar. A visão de mundo e sua capacidade de identificar um projeto para o Brasil eram francamente limitadoras em relação ao que o velho Ulysses e seus assessores, entre os quais me incluo, tínhamos proposto como programa partidário, sobretudo, em 1982. Os programas nunca foram discutidos a sério em qualquer instância partidária, a não ser em alguns poucos aspectos setoriais.

JG: Por que a senhora entrou no PT e qual a sua participação na formação do novo programa que ali estava se construindo?
MCT: Entrei no PT para continuar a luta política pelos meus sonhos de um Brasil novo. Minha participação na formação dos programas que foram se gestando de 1994 em diante foi particularmente intensa no período 1994-2002, quando Lula, ademais de nosso candidato permanente, dirigia o Instituto da Cidadania. Uma ONG na qual participavam ativamente a maioria dos intelectuais de esquerda do Brasil e boa parte dos dirigentes partidários e dos líderes sindicalistas do próprio PT. Foi um período muito rico, uma espécie de universidade aberta para todos. O "aluno" que mais participava, com atenção extrema e perguntas provocadoras, era, sem dúvida, o próprio Lula. Suas ideias a respeito do Brasil e do mundo, sua memória e sua inquietação permanente fazem dele o maior intelectual orgânico do povo brasileiro.

JG: A senhora foi deputada federal. Quais os momentos mais marcantes do mandato?
MCT: Infelizmente, o meu mandato popular foi, sobretudo, de resistência às políticas de desmantelamento da Constituição de 1988 de todo o período FHC. Não fosse a camaradagem com a bancada do próprio PT e do PCdoB, teria "capotado" durante esse período. A nossa transição democrática, na verdade, só começou para valer, no aspecto social, no governo Lula, já que a bancada do PT sempre foi minoritária no Congresso Nacional. Em um regime presidencialista do tipo brasileiro, o peso do chefe do Estado para o destino do nosso país ganha uma importância desmedida. Espero, por isso, que ganhemos as próximas eleições da República para continuar aprofundando a transição democrática e republicana.

JG: Que esperanças novas alimentam hoje sua vida?
MCT: Alimento as mesmas esperanças que tive por inspiração do velho Darcy Ribeiro e pelo amor que desenvolvi pelo povo brasileiro. A saber: "A construção de uma democracia racial nos trópicos". O fato de minha militância recente ter ficado mais branda decorre apenas de que já estou um pouco mais cansada ao chegar aos meus 80 anos.

Crise de identidade – por Jorge Furtado

O jingle do candidato José Serra acumula as funções de tentativa de fraude e confissão de derrota.

Fraude porque mente (insistentemente) ao dizer que José Serra é o candidato da continuidade e não da oposição. O jingle mais do que sugere, afirma que Serra - subitamente transformado em Zé - é o cidadão de origem humilde que "foi a luta e venceu", como o Lula, e por isso é o melhor candidato para o "Brasil seguir em frente".

Nos últimos sete anos e meio, a oposição - e sua imprensa – referiu-se ao Lula como ignorante, analfabeto, bêbado, estuprador de meninos, mentiroso, ladrão e assassino. Hoje, faltando dois meses para a eleição, Lula ocupa o primeiro verso do jingle do candidato desta mesma oposição. "Era brincadeirinha, nós também adoramos o Lula! Apedeuta era elogio, quer dizer 'fofinho'!"

Confissão de derrota porque nunca em toda a história deste país (ou de qualquer outro, que eu saiba) se ouviu um jingle de um candidato de oposição que incluísse o nome do titular do cargo ao qual este candidato faz oposição. É como se o hino do Flamengo incluísse o nome do Vasco.

O jingle da oposição investe na ignorância ou desatenção do (e)leitor, uma aposta que se tornou um padrão. Não tem dado muito certo. Depois de sete anos e meio de ataques coléricos ao presidente e ao seu governo, os demotucanos chegam à eleição com um jingle em que o refrão grita, com todas as letras, o nome de Lula da Silva, mas não o nome do seu próprio candidato, José Serra.

x

Quando Lula da Silva sair
É o Zé que eu quero lá
Com Zé Serra eu sei que anda
É o Zé que eu quero lá

José Serra é um brasileiro
Tão guerreiro quanto eu
É um Zé que batalhou
Estudou, foi à luta e venceu

Zé é bom e eu já conheço
Eu já sei quem ele é
Pro Brasil seguir em frente
Sai o Silva e entra o Zé

José Serra foi Ministro
Deputado e Senador
Esse Zé já foi Prefeito
Zé já foi Governador

Tá testado e aprovado
Por tudo que ele já fez
Sempre teve do meu lado
Eu quero Zé Serra dessa vez

(refrão)

Quando Lula da Silva sair
É o Zé que eu quero lá
Agora é Serra Presidente do Brasil

http://joseserra.psdb.org.br/jingle-da-campanha

O neopopulismo – por José Sarney (Folha de São Paulo)

Em 1988, eu era presidente da República e Michel Rocard, primeiro-ministro de Mitterrand. Dele recebi com generosa dedicatória um livro, "Le Cur à l'Ouvrage", que podemos traduzir como "amor a uma causa". Tratava justamente de um tema que já àquele tempo aflorava: a morte da democracia representativa, com o enfraquecimento das instituições intermediárias entre o povo e a constituição do governo democrático.

Sustentava ele que a tecnologia transformara a mídia em espaço público e passara a exercer o poder que tinha sido do Parlamento. A mídia, pouco a pouco, ocupara o lugar dos partidos políticos, definidos como grupos de pressão que não desejam influenciar o governo, e sim exercê-lo.

Agora, 20 anos depois, vejo num dossiê do Observatoire de la Démocratie de 2007 o mesmo Rocard tratando do mesmo tema, já com o avanço das comunicações em tempo real. Ele acrescenta um dado atual a suas ideias: sem os líderes carismáticos que caracterizavam o velho populismo, nasceu um novo populismo mediático, que explora a defesa dos valores nacionais contra aqueles que ele, neopopulismo, escolhe como responsáveis pelas crises e perdas dos comportamentos morais, corrupção e elites ilegítimas que exploram o povo. Este novo caminho adota uma mensagem forte de soluções fáceis para problemas impossíveis de resolver a curto prazo. É o que vemos com frequência todos os dias.

Diz Rocard que o neopopulismo prescinde de partidos políticos, crenças religiosas, sindicatos e sociedade civil organizada, porque é a mídia que exerce esse papel, que não precisa daquelas instituições porque "reduz o conteúdo da mensagem política a uma imagem minimalista, ou à emoção, à sedução e à manipulação dos efeitos retóricos que ocupam o lugar central".

Poucos formadores de opinião pública são atores desse processo, sem obrigação de nenhuma delegação do povo, e usam os mesmos argumentos do velho populismo. Basta ver os programas policiais de retumbante sucesso.

A atual eleição pode oferecer farto material para um estudo mais aprofundado dessa evolução da democracia representativa. Ela está moribunda, os partidos não funcionam e os atores dependem dos novos meios de comunicação de massa, que usam mais a emoção que a razão. Como debater ideias nos 140 caracteres de um tweet?

Acrescente-se a tudo isto que a eleição foi capturada pelo sistema eleitoral, que exerce tutela sobre a vontade do povo. O destino da democracia merece uma pergunta: Quo vadis? Calculo a cara dos barbudos ingleses que a inventaram no século 13, tempo do rei João.

JOSÉ SARNEY escreve às sextas-feiras nesta coluna.



Comentário


Um belo texto. É pena que seja proveniente de um senhor feudal – e que ele mesmo se beneficie nos seus feudos do terrorismo midiático.


Jackson Lago e Capiberibe que o digam.

A leveza da educação paulista – por Luis Nassif

Alguns meses atrás, quando a velha mídia ainda tinha pretensão de eleger presidentes, Otávio Frias Filho permitiu que um troglodita, Demétrio Magnolli, fuzilasse dois repórteres da Folha nas próprias páginas do jornal. Motivo: uma matéria desfavorável ao senador Demóstenes Torres, que era contra cotas raciais.

Qual a razão de tanto empenho do Magnolli e do Otávio em combater as cotas, a ponto do primeiro chamar os jornalistas de "meliantes" no jornal do segundo, com sua concordância? Apenas o fato de que o tema tornara-se bandeira do inacreditável Ali Kamel. Apenas isso. O fervor de cruzado desse pessoal destinava-se apenas a prestar reverência ao Kamel em sua cruzada e impedir que um chefe todo-poderoso da Globo pudesse ser derrotado em sua bandeira pessoal. Mero capricho de novo-rico do poder.

Demétrio perdeu o cetro de corneteiro mor da brigada "eu-amo-o-Kamel" para a Época - que considerou o livro do seu chefe um dos mais importantes da década, nesse interminável festival de ridículos que marcou o ápice do deslumbramento desses novos poderosos, CEOs do jornalismo.

Os dois jornalistas da Folha foram fuzilados. Antes deles, houve outros expurgados em nome dessa guinada do jornal.

Poucos jornalistas da Folha se mantiveram na trincheira do bom jornalismo (não vou mencionar nomes para não expô-los, mas quem lê a Folha sabe quem são). Oportunistas aderiram ao que manda o chefe. Jornalistas de caráter resistiram, embora recolhendo-se até que cessasse esse macartismo infernal.

Agora, a custosa e quase inútil tentativa da Folha de recuperar a imagem perdida dependerá fundamentalmente dos que resistiram à infâmia.

O espaço dado a Laura Capriglione na página 2 do jornal é a reabilitação interna a uma jornalista de caráter. O tema tratado mostra que, embora deva favores a José Serra, a Folha começa a acordar de cinco anos de cegueira continuada.

Da Folha

LAURA CAPRIGLIONE

Insustentável leveza

É de estarrecer a forma como se comporta o governo do Estado de São Paulo quando o assunto é educação.

Agora, uma medida que se chegou a apresentar como revolucionária cai por terra antes mesmo de ser aplicada. Trata-se do chamado "vale-presente" -a Secretaria da Educação daria R$ 50 a alunos que, em dificuldades com matemática, não faltassem a aulas de reforço.

Houve quem visse no "presente" propósitos eleitoreiros, outros acusaram-no de premiar o fracasso escolar (bons alunos não concorreriam ao benefício), outros ainda de ser antieducativo, já que, ao prazer do aprendizado, que deveria ser o alvo do processo pedagógico, se anteporia a força da grana.

Ocioso, agora, discutir as objeções. O que assombra é a leveza beirando a irresponsabilidade com que o secretário Paulo Renato Souza anunciou o cancelamento do programa, ontem, na Folha: "É um projeto que está muito cru", disse ele. "Muito cru", secretário?

Tem sido assim a condução da educação pública paulista.

Projetos ditos sensacionais em um dia evaporam no dia seguinte. Isso ajuda a explicar por que são pífios os indicadores de desempenho escolar no Estado mais rico.

E não melhoram, como o próprio Paulo Renato foi obrigado a reconhecer à vista dos resultados do último Saresp (Sistema de

Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo): "Numa avaliação média, eu diria que tivemos uma estagnação", admitiu, confrontado com o fato de que a performance em matemática no ensino médio chegou a regredir entre 2008 e 2009.

Em português e matemática, a nota dos alunos do 3º ano do ensino médio atesta que eles têm competência abaixo da que seria esperada para alunos da 8ª série do ensino fundamental.

São 15,5 anos de administrações tucanas em São Paulo.

Uma criou a Escola da Família, outra desidratou-a. Primeiro se trombeteou que professores temporários sem qualificação para lecionar seriam demitidos. Depois o propósito foi abandonado. "Minha primeira obrigação é garantir aula", disse o secretário, como se alguém discordasse.

Até uma incrível parceria entre a cantora pop Madonna e a Secretaria da Educação chegou a ser alardeada, com direito a foto do secretário e do então governador José Serra em troca de sorrisos com a "Material Girl".

A ideia era aplicar um tal "programa educacional baseado em princípios cabalísticos" na rede pública. "Não é propriamente um programa formal, mas para desenvolver psicologicamente. Para enfrentar melhor a vida", disse Serra à época. Foi só a mãe de Lourdes Maria voltar para casa e nunca mais se falou no assunto. Seria tudo uma piada se não se tratasse das vidas e esperanças de tantos jovens.

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Sucessão de erros leva Serra a jogar todas as fichas na TV - por Raymundo Costa e Raquel Ulhôa (Valor Econômico)

Houve uma época, não faz muito tempo, em que o candidato tucano à Presidência da República, José Serra, considerava que vencer a eleição não era tão difícil assim. "Difícil vai ser governar", dizia aos amigos. Era um tempo em que Serra circulava no patamar dos 40% das pesquisas de intenção de voto, enquanto a petista Dilma Rousseff, embalada pela popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, já dava mostras de que seria uma candidata competitiva.

Em janeiro, a pesquisa CNT/Sensus registrava 44% a 37% em favor de Serra. Na sexta-feira, o Datafolha trouxe o tucano oito pontos atrás de Dilma (41% a 33%). A situação se inverteu, a liderança nas pesquisas trocou de mãos e Serra agora joga todas as suas fichas nos programas eleitorais no rádio e televisão que serão exibidos a partir desta terça-feira, 17. Para Serra, vale a aposta que o jornalista Luiz González, encarregado do marketing do tucano, fazia desde o pré-lançamento da candidatura, em 10 de abril: a eleição será decidida no horário eleitoral.

Serra e o PSDB atribuem o acelerado crescimento da candidatura Dilma nas pesquisas ao empenho pessoal de Lula, cuja popularidade na faixa dos 75% é inédita para um presidente desde o restabelecimento das eleições diretas, e ao uso da máquina pública para turbinar a campanha presidencial da ex-ministra da Casa Civil. Mas é certo, também, que Serra e o PSDB cometeram uma série de erros políticos, ao longo do período que antecedeu ao início da propaganda eleitoral partidária.

O ex-governador de São Paulo foi lançado pré-candidato do PSDB, DEM e PPS em abril, em clima singular numa convenção tucana que deixou otimistas os militantes. Serra passou então a centralizar as articulações políticas de sua campanha. Ela chega ao horário eleitoral sem um comitê ou coordenadores. Ninguém fala em nome do candidato ou da campanha. Serra fez as escolhas, mesmo quando o partido gostaria que outras opções fossem consideradas, casos, por exemplo, da assessoria de imprensa e do publicitário.

Havia tucanos que gostariam de ver no comando do programa eleitoral o marqueteiro Duda Mendonça, responsável pelas campanhas vitoriosas de Lula em 2002 e 2006. Serra teve pelo menos duas reuniões com Duda Mendonça. No fim, decretou: "O candidato tem que confiar no marqueteiro". González fez as duas últimas campanhas vitoriosas de Serra - para a prefeitura e para o governo de São Paulo -, mas os tucanos se queixam de seu estilo. Serra prometeu que ele ouviria os políticos, o que era a queixa principal. De fato, o jornalista conversou com tucanos e demistas e hoje é considerado por eles um problema menor na campanha de Serra. "Ele consegue até fazer com que o candidato cumpra uma agenda", diz um tucano.

A escolha do vice foi outro fator de desgaste para a candidatura do tucano. Quando o ex-governador mineiro Aécio Neves deixou de ser opção, os olhos do PSDB voltaram-se para o senador Francisco Dornelles (PP-RJ), que é tio-avô de Aécio. Dornelles não aceitou porque a maior parte do PP, partido que preside, preferiria apoiar Dilma. "É o máximo que eu posso fazer", avisou Dornelles, ao informar que a sigla não daria seu tempo de tevê para nenhum dos candidatos.

Sem Aécio ou um partido que somasse mais tempo de televisão para o candidato, a escolha óbvia passou a ser um nome do Democratas. Mas a ala ligada ao ex-senador Jorge Bornhausen, mais próxima a Serra, disse que não queria a Vice na chapa, porque isso dividiria o partido. Na verdade, o grupo tentava descartar a senadora Kátia Abreu (DEM-TO), um nome bem cotado, à época. Mas 15 dias depois o DEM mudou de ideia e passou a reivindicar a Vice. Nas contas feitas pelo PSDB, o nome ideal no Democratas era o do ex-prefeito do Rio de Janeiro Cesar Maia - apesar da rejeição alta, ele agregaria pelo menos 30% dos votos do Rio à chapa de Serra, segundo o entendimento dos tucanos. Convidado, Maia não aceitou, segundo apurou o Valor.

Outro nome capaz de agregar votos, na avaliação do PSDB, era o do senador Álvaro Dias. Com ele na chapa, os tucanos praticamente fechariam o Paraná, pois seu irmão, o também senador Osmar Dias (PDT) entraria na coligação como candidato à reeleição. Álvaro chegou a ser indicado pelo PSDB, que voltou atrás diante dos protestos do DEM.

O problema é que Serra não falava com o presidente do Democratas, Rodrigo Maia, deputado que apostou na escolha de Aécio Neves como candidato do PSDB. Os dois chegaram a fazer uma viagem entre o Rio e São Paulo no mesmo jatinho. Serra disse a Rodrigo que eles deveriam fazer uma reunião com os outros presidentes de partido para decidir sobre o candidato a vice. Reunião que nunca ocorreu. O DEM apresentou uma lista com dois nomes - o deputado Carlos Melles (MG) e a ex-vice-governadora do Pará Valéria Pires Franco. Os tucanos é que colocaram um terceiro nome, o deputado José Carlos Aleluia (BA). O escolhido foi o candidato Índio da Costa, relator do projeto de lei da Ficha Limpa, que o candidato Serra conheceu no Youtube (eles haviam se esbarrado, no Rio, durante a transmissão de um dos jogos do Brasil na Copa do Mundo). González foi ouvido e aprovou.

Ao contrário do PT, que tratou de amarrar suas alianças Estado por Estado, a ponto de retirar da disputa candidatos como Fernando Pimentel, em Minas Gerais, para se assegurar do apoio do PMDB, Serra costurou mal os palanques estaduais do PSDB. Serra, por exemplo, não era um entusiasta da candidatura Fernando Gabeira ao governo do Rio. Preferia que o PSDB lançasse nome próprio. Gabeira fora a sensação da eleição municipal de 2008, campanha na qual o PSDB investiu algumas centenas de milhares de reais, mas já não parecia dispor do mesmo prestígio junto ao eleitorado carioca.

A aliança acabou formalizada por insistência de Márcio Fortes, que é o candidato a vice-governador na chapa encabeçada por Gabeira. Isso, por sua vez, criou um problema para Serra: até então, Fortes dividia com Andrea Matarazzo a tarefa de arrecadar recursos para campanha. O próprio Serra achou por bem retirar Fortes da arrecadação nacional. Para seu lugar foi chamado um ex-executivo do banco Itaú, Sérgio de Freitas, sem experiência em campanhas eleitorais. A prestação de contas da campanha tucana indica a menor arrecadação entre os principais candidatos, mas tudo indica que há um descompasso na contabilização dos recursos. Mesmo no setor financeiro, os grandes bancos contribuíram ou prometeram contribuir com a campanha de Serra, entre os quais o Itaú, Bradesco, Santander e o banco Safra.

Serra está também atento à utilização dos recursos: ele estabeleceu o limite e a periodicidade das quantias enviadas à campanha nos Estados. Para ganhar ou perder, Serra está no controle da própria campanha.


Comentário

Eventualmente o noticiário político econômico dos jornais passa por uma cegueira difícil de acreditar.

Independente dos erros que José Serra e sua equipe (ou “seus asseclas”, entenda-se como quiser) cometessem na campanha, ele não seria eleito. Isto porque o país está muito, mas muito melhor hoje do que em 2002. Nada pode contrariar isto.

Os que durante oito anos disseram que o governo Lula não prestava, hoje dizem que “por utilizar a máquina pública” em favor da campanha de Dilma é que ela cresce. Uma bazófia. Esta suposta “utilização da máquina pública” ocorre tão somente quando o presidente defende – verbalmente – sua candidata (e não o faz em eventos oficiais). ¿É isto que pode eleger alguém, uma pessoa defender uma candidata, em eventos públicos que são absolutamente censurados pelos meios de imprensa?

Na verdade, não querem ceder que o presidente Lula faz um bom governo. Claro, com diversos erros (BC, Jobim, Geddel, PF pós-Lacerda, nomeações ao STF, etc.). Mas é muito superior do que os que o antecederam.

Como apresentados a esta irretorquível realidade, voltam-se ao seu mundo de conto de fadas, escondendo-se na suposta utilização da máquina pública. Na verdade, não querem admitir que, por oito anos, foram, na grande maioria das vezes, injustos.

Os fatos novos – por Marcos Coimbra

Nas eleições presidenciais, no entanto, até agora não houve um candidato que fosse o mais votado no primeiro turno e perdesse no segundo. Tirando as duas vitórias de FHC, isso não aconteceu com Collor ou Lula. Ninguém venceu de virada

Começa, nesta terça feira, a etapa final das eleições, com a propaganda eleitoral chegando à televisão e ao rádio. Serão 45 dias decisivos até 3 de outubro, quando, pelo que parece, quase todas terminarão.

Nas legislativas, por que é em um só turno que elas se resolvem. Para o Executivo, por que o sistema político ofereceu aos eleitores, no plano federal e na maior parte dos estados, um cardápio limitado. Como, raramente, são mais que dois candidatos competitivos, muitas não irão para o segundo turno.

Não que isso vá fazer diferença no futuro. No longo prazo, tanto faz ganhar no primeiro ou no segundo. Os mandatos não são mais legítimos ou mais sólidos se a eleição foi de uma só vez ou se houve outra "vuelta", como se diz em espanhol. Já tivemos presidentes e governadores eleitos das duas maneiras, sem que isso fosse relevante. Fernando Henrique, por exemplo, ganhou em 1998 no primeiro turno e viveu quatro anos complicados, nos quais sua avaliação caiu sem parar. Lula, que teve que disputar o segundo turno em 2006, governou sem problemas e sua popularidade sempre subiu.

Nas pesquisas, os candidatos que estão atualmente na frente também lideram nos cenários de segundo turno, seja no plano federal, seja nos estados. É isso mesmo que costuma acontecer na urna: quem vence o primeiro, tende a vencer o segundo, salvo nas exceções de praxe. Já as tivemos em várias eleições estaduais, quase sempre explicadas pela rejeição ao candidato que ganhou o primeiro.

Nas eleições presidenciais, no entanto, até agora não houve um candidato que fosse o mais votado no primeiro turno e perdesse no segundo. Tirando as duas vitórias de FHC, isso não aconteceu com Collor ou Lula. Ninguém venceu de virada.

Também não tivemos, desde a redemocratização, a derrota de um candidato que chegasse à reta final na liderança das pesquisas. Nas cinco eleições presidenciais que fizemos, sempre terminou vencendo quem estava em primeiro lugar. Houve trocas entre o segundo e o terceiro (Lula e Brizola, em 1989, Serra e Ciro, em 2002) ou entre o terceiro e o quarto (Enéas com Quércia, em 1994), mas nunca uma reviravolta que desse a vitória a quem estava em segundo lugar.

A explicação mais provável desse padrão de resultados finais pouco surpreendentes é a tendência da maioria dos eleitores de definir cedo seu voto para presidente. Na verdade, o mais cedo que a pessoa consegue. Depois que conhece os candidatos e escolhe, sua decisão só muda se algo de extraordinário ocorrer.

O caso mais emblemático de mudança de "última hora" em uma eleição presidencial aconteceu em 1994. Até o final de junho, Lula liderava em todos os cenários, com 30 pontos de vantagem sobre Fernando Henrique. Aí, um míssil chamado Plano Real caiu do céu e estilhaçou a candidatura petista. Em pouco mais que dois meses, o quadro se inverteu e o tucano chegou à vitória (no primeiro turno).

Mas essa história mostra quão forte tem que ser uma alteração de cenário para tirar do trilho uma eleição presidencial. Nenhuma das outras foi assim. O desfecho de todas se tornou previsível bem antes. As urnas sempre confirmaram o favoritismo de quem estava na frente nas pesquisas.

Ou seja, não existem "fatos novos" que mudem uma eleição presidencial na undécima hora. Pelo menos, não existiram, até agora, em nossa trajetória.

Dois tipos de pessoas ficam inconformados com essa previsibilidade. De um lado, quem não gosta do candidato que lidera e quer que ele (ou ela) perca. Imaginando que, na ausência de "fatos novos", seu preferido será derrotado, fica à procura deles, torcendo para que apareçam. Reza para que os debates, as entrevistas na televisão, um escorregão, uma declaração polêmica, sacudam tudo e mudem as tendências que estão em curso.

De outro, os jornalistas. Existe coisa mais aborrecida que repetir a mesma manchete todo dia, dizendo que tudo está igual? Que a eleição continua tão previsível hoje quanto há meses? A imprensa precisa de notícias, de preferência surpreendentes. Sem "fatos novos", fazer o jornal é mais difícil. Por isso, os jornalistas os amam.

E os jornalistas que não querem a vitória de quem está na frente? E as empresas de comunicação que têm simpatias por quem está em segundo ou terceiro? Aí, se os fatos novos teimam em não surgir, a tentação de criá-los é grande.

Inutilmente, pelo que conhecemos de nossas eleições presidenciais anteriores. Quando a maioria do eleitorado cisma que vai votar em alguém, não há "fato novo" que a mova. É como fogo de morro acima. Ou água de morro abaixo.

BNDES, transparência e pseudo subsídios – por Antonio Corrêa de Lacerda (Valor Econômico)

A atuação do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) tem sido alvo de uma série de questionamentos, especialmente no que se refere a um alegado subsidio embutido nos empréstimos ao setor privado.

O foco tem sido nos aportes realizados pelo Tesouro Nacional ao banco, envolvendo nos últimos dois anos um montante de R$ 180 bilhões. Como a taxa de juros cobrada pelo BNDES aos empréstimos é pela TJLP (Taxa de Juros de Longo Prazo), atualmente em 6% ao ano e a divida pública é regida principalmente Selic (Taxa básica de juros, definida pelo Copom-Comite de Politica Monetária), hoje em 10,75%, a diferença se configuraria em um subsidio ao setor privado.

No entanto, a questão não é assim tão simples. Aparentemente haveria na operação uma diferença de 4,75 pontos percentuais que se configuraria em um subsidio da ordem de R$ 8 bilhões ao ano, a ser coberto pelas contas publicas. Mas, o raciocínio aqui tem que ser dinâmico e não estático. Mais econômico do que contábil.

O primeiro ponto a ser destacado é que trata-se de empréstimos de longo prazo, de 30 ou mais anos. É muito pouco provável que a diferença atual, entre Selic e TJLP prevaleça nesse longo período. A tendência é que elas se aproximem, pois as taxas de juros básicos devem ser reduzidas.

Segundo, vale analisar o papel dos bancos públicos. Eles existem como atividade de fomento, financiando investimentos em infraestrutura, indústria e agropecuária, algo que os bancos privados nem sempre estão dispostos a fazê-lo. Outro aspecto importante é que, no mundo cada vez mais globalizado, nossas empresas concorrem com outras, que tem condições de financiamento incomparavelmente mais favoráveis.

Empresas sulcoreanas e chinesas, por exemplo, contam com financiamentos públicos a custo praticamente zero e tem as suas atividades apoiadas com subsídios e incentivos porque são vistas como estratégicas para o desenvolvimento e inserção internacional destes países.

A questão é que as altas taxas de juros praticadas no mercado doméstico brasileiro inibem os investimentos produtivos. Elas são um verdadeiro convite ao ócio. Porque alguém investiria na produção para ganhar menos do que receberia adquirindo títulos da dívida publica, sem muito esforço e quase sem risco. Os próprios bancos privados tendem a não se interessar por operações de crédito, porque é muito mais cômodo e seguro financiar o Estado. No Brasil, os bancos públicos também têm a função de corrigir parcialmente essa anomalia.

Mas, as contas públicas também são favorecidas com o resultado das operações realizadas pelos bancos públicos. Primeiro porque há um efeito multiplicador dos investimentos, que vamos considerar, de forma conservadora, da ordem de 2 vezes. Os R$ 180 bilhões adicionais de capacidade de empréstimos do BNDES geram potencialmente R$ 360 bilhões de atividade econômica, que propiciam uma receita tributária da ordem de R$ 72 bilhões, considerando, também de forma bastante conservadora, um carga tributária média de 20%.

O segundo aspecto é que a atividade do BNDES é lucrativa. Somente em 2009 gerou o lucro liquido de R$ 6,7 bilhões, depois do pagamento de Imposto de Renda. O Tesouro Nacional é beneficiário de grande parte desse lucro, na forma de dividendos.

Um terceiro ponto, de difícil mensuração é o custo da não realização de investimentos. O BNDES praticamente dobrou a sua participação no financiamento de investimentos na infraestrutura e indústria nos últimos quatro anos, de 21%, em 2005, para quase 40% do total, em 2009. Se não houvesse o apoio dos bancos públicos muitos projetos não seriam realizados, especialmente na infraestrutura, representando uma restrição ao crescimento da atividade, do emprego, da renda e da receita tributária. Algo danoso para o país.

Ou seja, não há subsidio nas operações do BNDES, nem no conceito clássico da OMC (Organização Mundial do Comercio), porque os juros praticados, embora mais baixos do que a média do mercado brasileiro ainda estão muito acima dos concorrentes internacionais, nem representam ônus para as contas públicas, uma vez que a receita gerada para o governo, supera em muito o custo implícito na operação.

A crise internacional deveria ter ressaltado o papel crucial desempenhado pelos bancos públicos no Brasil, que representaram um importante instrumento de política macroeconômica anticíclica. Foi um determinante contraponto à escassez de crédito de financiamento e, portanto, um dos principais fatores que diferenciaram a economia brasileira de outros países em desenvolvimento que não puderam contar com instrumentos equivalentes.

Não deixa de ser curioso observar que os defensores da ora, do erário público e da transparência, no que se refere ao suposto subsidio dos empréstimos públicos ao setor privado, jamais tenham proposto o mesmo procedimento para o custo de financiamento da dívida pública. Os juros reais mais elevados do mundo geram uma despesa pública anual de 5,5% do PIB (Produto Interno Bruto), algo próximo de R$ 160 bilhões ao ano. Uma transferência enorme renda de toda a sociedade para o setor financeiro e os rentistas, extremamente vulnerável às “expectativas” de inflação e de juros, que acabam influenciando fortemente as decisões do Copom !

Antonio Corrêa de Lacerda é professor-doutor do departamento de economia da PUC-SP e ex-presidente do Cofecon ? Conselho Federal de Economia e da Sobeet.

SP suspende projeto com vale-reforço – por Mônica Bergamo

Programa de tutoria previa bolsa para alunos tutores e vale-presente para frequentadores de aulas extras


Projeto foi alvo de polêmica depois que Folha revelou que previa prêmio a aluno com mau desempenho


O secretário da Educação, Paulo Renato Souza, decidiu adiar projeto que prevê pagamento de R$ 50, em vale-presente, a estudantes que participarem de atividades de reforço em matemática.

Paulo Renato vai reunir hoje sua equipe para discutir a decisão. "É um projeto que está muito cru. Temos de amadurecer mais, discutir mais com a sociedade. Precisamos convencer as pessoas antes de implantá-lo", disse ontem. "Está havendo polêmica desnecessária."

Os alunos que receberiam o reforço seriam escolhidos entre os que possuem notas baixas, conforme informou a Folha semana passada. O vale-presente buscava incentivar a participação nas atividades, que não seriam obrigatórias.

Educadores criticaram a ideia. Uma das principais ponderações era o fato de premiar alunos com baixo desempenho -o que poderia incentivar as notas baixas.

APOIO

Apesar de suspender o programa, o secretário da Educação afirma que continua apoiando a proposta.

"Ela não é nem minha. É uma proposta do BID [Banco Interamericano de Desenvolvimento] e da Fipe, que já foi testada em vários lugares. Acho que pode ser testada também aqui."

Mesmo apoiando o teste do projeto, Paulo Renato disse que ficará surpreso se o pagamento der resultado. "Seria uma surpresa se esse projeto desse um resultado espetacular. Se funcionar, será uma beleza."

A proposta, chamada Multiplicando Saber, é um projeto-piloto, que pretende atender 1.200 alunos do ensino fundamental. Eles receberiam sessões tira-dúvidas, dadas por 400 bons alunos do ensino médio, duas vezes por semana, por 90 dias.

O pupilo que não faltassem a nenhuma atividade ganharia vale de R$ 50, a serem gastos em livros, CDs ou cadernos. O vale-presente foi instituído devido ao temor de que os alunos tivessem muitas faltas ou até desistissem.

Comentário

O mais impressionante de tudo é que este senhor, Paulo “Gates” Renato de Souza, ainda posa de especialista em educação, dando entrevistas à torto e a direito para criticar a política de educação do governo Lula – para mim, que é justamente o seu maior legado.

Mais do que dobrou o número de estudantes que estão ingressando em universidades federais (com a construção de novas unidades, extensão de campi e o Reuni), mais do que dobrou o número de escolas técnicas, aumentou drasticamente os recursos para a educação básica (via Fundeb), criou o belo programa do Pró-uni, etc.

Já Paulo Renato... Paulo Renato, além desta brilhante ideia de premiar os piores, tem um histórico invejável de greves, gatesmania, etc.


Além, claro, de um dos momentos mais elucidativos da história da política brasileira: ele mandou um artigo para a folha de São Paulo, chamado “tentáculos da reestatização”, em que criticava a compra pelo Banco do Brasil de outras instituições bancárias estaduais. Porém, junto com o artigo que ele enviou por e-mail, foram as mensagens trocadas por ele com o presidente do Bradesco. Ele perguntava se o texto estava “ok”, para podr enviá-lo. Ou seja, utilizava seu espaço de político para criticar um banco público, pedindo a benção do presidente de um banco privado. O neoliberalismo em estado puro.


P.S: a Folha publicou a troca de e-mails e acabou não publicando o artigo. Dias depois, sabendo do acontecido, o artigo foi publicado pelo Estadão. Também lapidar.

Presidente do Congresso colombiano diz que atentado foi obra da extrema direita - da France Presse, em Caracas

O presidente do Congresso colombiano, Armando Benedetti, disse neste domingo que o atentado de quinta-feira em Bogotá que deixou nove feridos é obra da extrema direita, que quis enviar uma mensagem ao recém-empossado presidente Juan Manuel Santos.


"Pessoalmente, creio que isso foi feito por forças da extrema direita", declarou Benedetti em entrevista à rede Telesur, com sede em Caracas.

"Foi uma mensagem que quiseram enviar ao novo presidente. É difícil lançar uma hipótese, mas esta é a minha", destacou.

Para Benedetti, os autores do atentado são setores que "se querem fazer sentir desta forma".

A autoria do ataque com carro-bomba, que causou graves danos aos edifícios próximos, ainda não foi descoberta. O governo de Santos considera "todas as hipóteses" acerca dos motivos e autores do atentado, segundo o ministro da Defesa, Rodrigo Rivera.



Comentário


Como bem diz um belo provérbio chinês: “Uma vez em cima do tigre, não há como descer”.


Depois de ter se deliciado com alimentação em abundância, o tigre não vai se saciar tão facilmente.


Este é o espólio que Álvaro Uribe deixa.

Serra, o anti-social – por Luis Nassif

Do Painel da Folha

Bico Veteranos, sobretudo no Senado, reclamam que até hoje a campanha de Serra não convocou nenhuma reunião para engajar as bancadas tucanas. Também é verdade, porém, que o único senador do PSDB a demonstrar no Twitter empenho pela candidatura presidencial do partido é Alvaro Dias (PR).

Silêncio 1 Desabafo de um candidato a governador alinhado à campanha nacional da oposição e bem posto nas pesquisas em seu Estado: "Consigo falar com todo mundo, menos com o meu candidato à Presidência".

Silêncio 2 O candidato ouviu o conselho de um tucano acostumado com o fuso horário de Serra: "Por que você não experimenta ligar para ele de madrugada?".

Comentário

Como Ministro da Saúde, Serra mantinha as portas do gabinete fechadas a qualquer reunião. Não recebia Secretários de Saúde, gestores, políticos. No Palácio Bandeirantes, nenhum prefeito conseguiu ser recebido por Serra. Era refratário a reuniões de secretariado, a despachar individualmente com secretários, a receber representantes de qualquer entidade - seja de trabalhadores, empresários ou movimentos sociais. Da Prefeitura, não tenho muitas informações, mas duvido que tenha se reunido uma vez sequer com os sub-prefeitos.

Na campanha, jamais se reuniu para valer com aliados, conselheiros externos, lideranças do PSDB e de partidos aliados. Nunca acatou uma sugestão sequer.

Seu mundo se resume a algumas poucas pessoas do seu círculo íntimo. E vem sua campanha martelar essa questão da experiência política? Será que se esqueceram da definição de política, do papel político da mediação?

Se eleito, como administraria uma sociedade civil que ganhou musculatura e aprendeu a ser ouvida, que passou a se organizar em torno de conferências nacionais (processo que vem desde os anos 90 e ganhou impulso nos últimos anos) ou a participar da elaboração de programas, como em Minha Casa, Minha Vida? Como administraria demandas do agrobusiness e da agricultura familiar, dos estados e municípios, da economia real e da financeira, dos movimentos sociais? Como aprenderia com as críticas, se qualquer arremedo de crítica oxida seus nervos de aço e provoca ou reações infantis (como nas pressões sobre jornalistas) ou travamento de suas ações (como na greve da Polícia Civil e nas enchentes de São Paulo).

Globo acusa o golpe (literalmente?!) – por Adilson (E agora?)

Depois da gigantesca repercussão na blogosfera sobre as entrevistas do casal do JN a emissora é forçada a divulgar nota oficial tentando convencer o público de que não é golpista.

Lembro que essa já é a TERCEIRA vez que prestam esclarecimentos em menos de 45 dias pra dizer que "não são".

1º Na Globo News e no Fantástico, ao mesmo tempo, foi lida uma carta onde explicavam que não torciam contra a seleção.

2º No principal programa de esporte, o apresentador vem a público se retratar, explicando que a emissora não tem nenhum preconceito contra o povo do Paraguai.

3º Agora, divulgam nota pra dizer que o telejornal da Globo é imparcial e que o papel do jornalismo global não é levantar nem derrubar nenhum candidato, ou seja, afirmam que não possuem DNA golpista.

Mais do que uma bandeira sem precedentes, o que estamos assistindo é histórico no Brasil, um sinalizador inequívoco dos tempos em que vivemos. Eles não armam e nem mutretam mais nada "impunemente" no nosso país. Distorcem, mentem e manipulam de lá que a gente pressiona, pressiona e pressiona de cá e eles tem que vir a público pra esclarecer tudo.

E quando fazem isso se entregam, claro, pois parafraseando o saudoso Barão de Itararé, do mesmo jeito que quem é não diz que é, quem muito diz que não é na verdade é justamente aquilo que jura de pé junto que não é".

Eu poderia me estender sobre isso, mas prefiro divulgar um trecho da fala do deputado Brizola Neto sobre o assunto, muito pertinente:

"..A Globo tenta desmentir o que todo mundo viu. Aliás, essa é uma tendência da emissora desde que a sua direção foi assumida por Ali Kamel, que se dedica a provar que não existe preconceito racial no Brasil. Kamel tenta reescrever a história do Brasil e da TV Globo sob sua ótica. Garante que a Globo não ocultou ao máximo a campanha das Diretas Já, que não atuou no caso Proconsult, que tentou roubar de meu avô a eleição a governador do Rio, em 1982, e que não manipulou a edição do debate entre Lula e Collor, em 1989. O diretor da Globo vive no país do faz de conta e acha que alguém acredita nele..."

Eu não resisto e concluo, Ali Kamel, vive sim no mundo mágico de sua ilusão, absorto em seus pensamentos e idéias ultra-conservadoras/reacionárias; completamente distante da realidade do Brasil, do nosso Brasil que mudou e só a Globo não viu..

O padrão Globo de manipular, distorcer e surrupiar a realidade para convencer os leitores e telespectadores mais incautos está com os dias contados e acho, sinceramente, que eles já começam a perceber isso.

O fato de nunca terem sido forçados a lidar com o contraditório – como agora acontece com a força crescente e inexorável da mídia alternativa eletrônica – os fizeram também descansar e relaxar em suas artimanhas - é só notar como ficam completamente desnorteados, desconfortáveis, perdidos mesmo, quando seus velhos métodos são revelados e repercutidos.

Tenho certeza que seus dias de armações ilimitadas (e impunes) estão contados. Como tenho certeza que não tardará muito ver um Brasil onde cada vez mais e mais pessoas – de qualquer ideologia, cor, raça, crença ou time de futebol - terão vergonha de dizer que leram no Globo, que viram na Globo que ouviram na CBN etc_ pois revelar isso será como passar atestado de ingênuo, desinformado, de tolo mesmo.

sábado, 14 de agosto de 2010

Milagre da Genética: Pres. Zezinho transforma Pitbull em carneirinho – por Tia Carmela e o Zezinho

http://byebyeserra.wordpress.com/2010/08/12/milagre-da-genetica-pres-zezinho-tranforma-pitbull-em-carneirinho/

NOTA DE ESCLARECIMENTO do ministério dos transportes

Ministério dos Transportes contesta afirmações do presidenciável José Serra sobre o setor

Com relação às afirmações feitas pelo presidenciável José Serra na edição do Jornal Nacional da TV Globo, exibida nesta quarta-feira (11), sobre as condições da malha rodoviária federal, sobre dois importantes trechos de rodovias concedidos à iniciativa privada e sobre a aplicação dos recursos da Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico Cide Combustíveis) o Ministério dos Transportes esclarece:

1ª afirmação: "... de cada 10 estradas federais, sete estão esburacadas", afirmação que usou como referência a Pesquisa CNT/2009, cumpre esclarecer:

- Em pesquisa realizada pela Confederação Nacional do Transporte (CNT) em 2009, a condição de pavimento das estradas pesquisadas, que envolveu uma extensão de 89.552 km, dos quais 60.784 km de rodovias federais, foi a seguinte: 94,3% não apresentavam buracos. Em 95,3% da malha, a condição do pavimento não obrigava a redução de velocidade. No que se refere especificamente às condições do pavimento das rodovias federais, a conclusão é a de que 88,2% das rodovias estão em condição regular, em bom ou em ótimo estado. (Fonte: Relatório Gerencial Pesquisa Rodoviária 2009, págs. 33, 34 e 105)

a- A boa condição exibida pelas rodovias federais é resultado do expressivo crescimento nos investimentos em manutenção rodoviária. No período entre 1995 e 2002, foram investidos R$ 3,8 bilhões, enquanto que no período entre 2003 e 2010 os investimentos são da ordem de R$ 16 bilhões.

Portanto, as afirmativas do candidato José Serra traduzem uma interpretação equivocada das conclusões a que chegou a pesquisa rodoviária da CNT/2009.

2ª afirmação: "As concessões do governo federal não estão funcionando. A Régis Bittencourt continua sendo a Rodovia da Morte e a Fernão Dias está fechada", cabe corrigir:

- A rodovia Régis Bittencourt (BR-116/SP/PR que liga São Paulo a Curitiba) está toda duplicada em sua extensão de 400 km, à exceção de um segmento de 30 km na região denominada Serra do Cafezal, no estado de São Paulo. Hoje é explorada em regime de concessão, cabendo à concessionária a duplicação desse trecho, o mais crítico da rodovia. A demora na duplicação do trecho da Serra do Cafezal, obra iniciada recentemente, se deveu às históricas dificuldades para obtenção do licenciamento ambiental, que se desdobrou inclusive na instância judicial. A obra está estimada em R$ 376 milhões, deverá estar concluída até 2012 e sua execução não implicará em aumento de valores de pedágio.

-A rodovia Fernão Dias (BR-381/SP/MG, que liga São Paulo a Belo Horizonte) não está fechada, como afirmou o candidato José Serra. Encontra-se com desvio de tráfego em um único ponto de toda a sua extensão (560 km), provocado pelo deslizamento de encosta, em conseqüência de fortes chuvas, que afetou as fundações de um viaduto, na altura do quilômetro 77 obra construída pelo Departamento de Estradas de Rodagem do Estado de São Paulo. A concessionária responsável pelo trecho tomou iniciativas para estabilizar a pista e evitar o colapso total da estrutura do viaduto. Considerando o tempo necessário para recuperação da estrutura, optou-se provisoriamente pelo alargamento da pista remanescente, tornando possível a liberação do tráfego no mês de junho passado. Atualmente estão em execução as novas fundações do viaduto, para que seja possível sua integral recuperação até outubro.

Todas as rodovias federais concedidas estão em pleno funcionamento.

3ª afirmação: "Nunca o Brasil esteve com estradas tão ruins. De 2003 para cá, foram arrecadados R$ 65 bilhões na Cide. Sabe quanto foi gasto disto pelo Governo Federal? R$ 25 bilhões. Ou seja, foram R$ 40 bilhões arrecadados para investir em estradas do Governo Federal que não foram utilizados", cabe corrigir:

- Em relação à condição das estradas, no item anterior foi cabalmente demonstrada a improcedência dessa afirmação.

- A arrecadação dos recursos da Cide entre 2003 e 2010 (até junho) foi de R$ 54 bilhões e não de R$ 65 bilhões como afirmou o presidenciável. Dos R$ 54 bilhões arrecadados, R$ 12,3 bilhões foram transferidos a estados e municípios por vinculação constitucional, restando para a União o valor líquido de R$ 41,9 bilhões.

- Desses R$ 41,9 bilhões, R$ 32,6 bilhões foram destinados ao Ministério dos Transportes, que os investiu em infraestrutura de transporte, conforme as disposições constitucionais. O restante dos recursos arrecadados foi aplicado na forma da lei pelos ministérios de Minas e Energia, Ministério do Meio Ambiente, das Cidades e Secretaria Especial de Portos. Cabe registrar que apenas os investimentos em rodovias no período 2003-2010, independentemente da Cide, hoje já montam a R$ 34,5 bilhões e até o final do ano deverão superar o valor total da Cide que coube à União no período.

Conclusão: os recursos da Cide estão sendo aplicados, como manda a legislação, não só em rodovias mas também em portos, ferrovias e hidrovias. A dimensão dos investimentos em rodovias e o satisfatório estado geral das mesmas derrubam a tese de subinvestimento nesta área e de que só os recursos da Cide seriam capazes de manter as estradas em bom estado.


Comentário

É de fato uma audácia enorme José Serra ainda tratar sobre pedágios e conservação de rodovias.

Deve pensar que somos idiotas e nos esquecemos do abandono completo durante o governo FHC e que não vemos os pedágios paulistas.

A turma da Kombi faz a hora - por Lula Miranda (Escrevinhador e Carta Maior.)

A comunicação no Brasil está mudando. Graças à internet. O Brasil está mudando. Graças ao bafejar dos ventos mudancistas soprados por uns tais "militantes da utopia", por aqueles que combatem, desde sempre, seja enfrentando a sordidez da real política seja militando na blogosfera, por uma democracia plena.


O texto que segue versa sobre o poder da internet [mais precisamente da chamada "blogosfera"] na modificação do paradigma da comunicação e da mídia no país, e, como conseqüência ou instância última, na transformação da sociedade. É um "corte". Apesar de longo [peço-lhe desculpas de antemão por ser demasiado prolixo] esse artigo é um pequeno-grande capítulo dessa história. O título, para aqueles que ainda não perceberam, alude a certa frase de um certo ex-presidente da Suprema Corte do país, e também àquela antiga canção de protesto "Para não dizer que não falei de flores" mais conhecida como "Caminhando e Cantando". A alusão a essa canção, por sua vez, pretende remeter àqueles tempos em que alguns jovens "idealistas" sonhavam mudar o Brasil. A tal "turma da Kombi" seria, na visão dos "reacionários", o povo da blogosfera que, agora, "faz a hora, não espera acontecer".

A comunicação no Brasil está mudando. Graças à internet. O Brasil está mudando. Graças ao bafejar dos ventos mudancistas soprados por uns tais "militantes da utopia", por aqueles que desejam e combatem, desde sempre, seja enfrentando a sordidez da real política seja navegando/militando na blogosfera, por uma democracia plena e, mais ainda, desejosos que este país seja, de fato, um país de/para todos os brasileiros.

[Contextualizando: a atmosfera que se respirava na época ou a "ambiência". Vivia-se a retomada da anima esquerdista, incorporava-se o espírito das reuniões do Fórum Social Mundial que nos ensinava que "um outro mundo era possível". Se um outro mundo era possível, então uma nova comunicação também era possível e, mais que isso, necessária. Diversas reuniões e conferências sobre comunicação "pipocavam" por todo o país]

Os blogs, no começo utilizados por alguns como uma espécie de singelo diário eletrônico ou virtual, evoluiu, amadureceu bastante [mas ainda não o suficiente] e se transformou, nos dias que correm, em vital instrumento de comunicação e combate aos humores do "mercadismo" e à grande mídia oligopolista, que, sabemos, era pretensa detentora do monopólio da verdade. Ou seja: a versão deles dos fatos [e da história] era a que prevalecia, posto que apenas veiculava-se essa versão "única", apenas essa única maneira de ver o mundo tinha espaço. Hoje, não mais. Graças ao poder da participação do cidadão. Graças à força da cidadania.

"Cidadania.com" era, a propósito, o nome de um desses blogs precursores. Pilotado por um comerciante, um cidadão comum que, inconformado com as manipulações e inverdades publicadas diuturnamente pelos grandes jornais, resolvera ir à luta e "botar a boca no trombone". Esse homem comum foi, decerto, a princípio, utilizado/manietado como um "inocente útil" pelos colunistas e editores desses "jornalões". Mas, quando passou obstinadamente a buscar "a verdade", tal qual um Quixote redivivo, foi logo descartado e rotulado de "louco" por esses mesmos colunistas e editores que antes lhe davam guarida e paparicavam. O espírito ali já se revelava outro: o homem comum, o leitor, buscava participar da tessitura da realidade, da notícia. Quem sabe faz a hora. O homem ordinário desejava ser extraordinário.

Eduardo Guimarães [este é o nome desse personagem], talvez após constatar que a solução para aquele problema que lhe incomodava deveras [e a muitos como ele] não passava somente pelo estratagema, digamos, bem intencionado, mas talvez ingênuo, de melhorar o jornalismo praticado pelos grandes veículos/grupos de comunicação utilizando-se tão-somente de esporádicas manifestações nos espaços dedicados aos leitores, teve então a idéia de criar um movimento agrupando aqueles que, como ele, se sentiam sem vez e voz, incomodados com o "duplipensar" e a "novilíngua" daquela imprensa que, desde sempre – agora, enfim, ele comprovara – esteve a serviço dos chamados "donos do poder". Guimarães [e muitos com ele] naquele instante apreendeu a lição. Nascia então o MSM – Movimento dos Sem Mídia.

E foi exatamente esse mesmo MSM que, a despeito das suas fragilidades e insuficiências, dentre as várias ações que realizou, empreendeu uma que marcou, de modo indelével, definitivo a história dessas eleições de 2010. O movimento, agora uma ONG, entrou com uma representação na Procuradoria Geral Eleitoral (PGE) ajuizando a abertura de um processo em que solicita auditoria, fiscalização e acompanhamento das pesquisas realizadas por todos os institutos, pois havia fortes indícios de manipulação nessas sondagens [as principais suspeitas recaíam sobre DataFolha e Ibope]. O inquérito foi aberto e o processo instaurado (Nº 4559.2010-33). A Polícia Federal está investigando. Daí em diante, as empresas de pesquisas, e também o PIG, colocaram as barbas de molho. Não dava mais para mexer nos dados, dar uns 10 ou 12 pontos de vantagem ao candidato da oposição de direita e dizer-lhe: "Vai que a gente garante!". Esse "empurrãozinho" fraudulento o conduziria direto ao abismo.

Porém, nessa breve história que lhes conto aqui existem outros, vários protagonistas e precursores. E é essa exatamente a principal característica da "blogosfera": o chamado "protagonismo cidadão". Leitores e articulistas-militantes se envolvem numa quase-perfeita sintonia. As notícias e opiniões são comentadas e, muitas vezes, contestadas em tempo real. Os comentários postados são, algumas das vezes, mais ricos e esclarecedores que os próprios artigos ou "posts" originais. Os leitores são agentes ativos do debate nacional, não mais passivos.

Para assomo de alguns "puristas", alguns jornalistas egressos da grande mídia também se engajaram nessa intrincada, árdua e aparentemente inglória tarefa de construir e trilhar os caminhos de uma nova comunicação. Antes, você deve se lembrar, esse mister, esse ofício era atribuído à chamada imprensa alternativa. Surgem, porém, nomes de "celebridades" proscritas da grande mídia como "o impagável" Paulo Henrique Amorim e "o mineiríssimo" Luis Nassif, bem como nomes mais ou menos célebres como Luiz Carlos Azenha e Rodrigo Vianna, dentre outros.

Nassif tatuou a ferro e fogo seu nome nessa história quando publicou em seu blog o "Dossiê Veja", onde revela os bastidores sombrios e pútridos desse semanário e da grande imprensa em geral – em decorrência disso responde hoje a inúmeros processos com custos (ou seriam custas?) de difícil mensuração. Atravessou para o lado de cá e queimou as caravelas que poderiam conduzir-lhe de volta. Nassif comeu o pão que o diabo amassou. Hoje pilota uma das mais instigantes e competentes experiências em jornalismo colaborativo na blogosfera.

Paulo Henrique Amorim, com seu jeito bonachão e galhofeiro de "bom carioca" foi intrépido e arriscou: deu vez e voz ao valente e "ínclito" delegado Protógenes Queiroz em sua luta contra o "banqueiro bandido" [nas palavras deste último]. Bateu de frente com gigantes das telecomunicações e foi "saído" do portal IG. É dele a "tirada": "O supremo presidente do Supremo, Gilmar Dantas – como diria o Noblat". Paulo Henrique também responde a inúmeros processos na Justiça. É inegável a importante contribuição que esses "traidores" da grande imprensa, por assim dizer [com o auxílio da ferina ironia do destino], deram à causa desses aqui chamados "militantes da utopia" ou, como querem alguns, dessa "turma que não enche uma Kombi".

A estes se somam, como disse, outros, vários, diversos personagens anônimos [já nem tão anônimos assim] e protagonistas nesse "levante" dos "utopistas". Ouso citar alguns só para cometer o pecado de me esquecer de muitos.

São importantes personagens dessa nova comunicação veículos como Carta Maior, Caros Amigos [faço aqui uma referência e reverência ao saudoso Sergio de Souza], Revista Carta Capital, ConversaAfiada, Nassif OnLine, Vi o Mundo, Escrevinhador, Blog da Cidadania, Vermelho.org.br [e o blog do Miro], Revista Fórum [revista, site e blog capitaneado por Renato Rovai], Revista do Brasil [alô, alô, Paulo Donizette!], RS Urgente, Abunda Canalha, Amigos do Presidente Lula [alô, alô, Helena Stephanowitz!], Óleo do Diabo, Cloaca News, Tijolaço [blog do jovem e valente deputado Brizola Neto - como o nome "entrega", neto do saudoso e valoroso Leonel Brizola].

Não tenho aqui a pretensão de contar toda essa grande história em toda sua magnitude e dimensão; de enumerar/citar todos os seus mais importantes feitos, fatos e personagens – pois são muitos os seus aguerridos combatentes. Tampouco tenho a pretensão de mostrar a melhor visão ou enfoque desse rico movimento, essa onda que hoje se levanta diante de nossas retinas já tão fatigadas cristalizando o tal "quem sabe faz a hora acontecer".

Trata-se apenas, como disse, de um "corte", um "primeiro capítulo" de uma obra em construção. Mais um olhar, mais uma palavra semeada que, característica inerente a essa nova comunicação libertária, soma-se à sua visão e palavra, prezado leitor-cidadão, e se espalha. Enredo que se enreda rede adentro, mundo afora, por intermédio da internet e da blogosfera.

Não mais a serviço de um único tutor ou "dono", seja esse "dono" uma empresa, um "coroné", um partido ou uma determinada oligarquia. Sempre a serviço da "causa". Qual seja: uma comunicação revolucionária, democrática e um Brasil para todos.

* Lula Miranda é poeta e cronista. Foi um dos nomes da poesia marginal na Bahia na década de 1980. Publica artigos em veículos da chamada imprensa alternativa, tais como Carta Maior, Caros Amigos, Observatório da Imprensa, Fazendo Média e blogs de esquerda.