domingo, 28 de julho de 2013

Violoncelo - por Stefan Valkanov (Arte digital - Coolvibe)

Debate com Wanderley Guilherme dos Santos sobre os protestos

O futuro do atual levante niilista – por Wanderley Guilherme dos Santos (O Cafezinho)

Regras democráticas e direitos constitucionais não transferem suas virtudes às ações que os reivindicam como garantia. Máfias e cartéis econômicos também são organizações voluntárias e nem por isso o que perpetram encontra refúgio na teoria democrática ou em dispositivos da Constituição. Esgueirar-se entre névoas para assaltar pessoas ou residências não ilustra nenhum direito de ir e vir, assim como sitiar pessoas físicas ou jurídicas em pleno gozo de prerrogativas civis, políticas e sociais, ofendendo-as sistematicamente, nem de longe significa usufruir dos direitos de agrupamento e expressão. Parte dos rapazes e moças que atende ao chamamento niilista confunde conceitos, parte exaure a libido romântica na entrega dos corpos ao martírio dos jatos de pimenta, parte acredita que está escrevendo portentoso capítulo revolucionário. São estes os subconjuntos da boa fé mobilizada. Destinados à frustração adulta.

É falsa a sugestão de que se aproximam de uma democracia direta ou ateniense da idade clássica. Essa é a versão de jornalistas semi-cultos que ignoram como funcionaria uma democracia direta e que crêem na versão popularesca de que Atenas era governada pelo Ágora – uma espécie de Largo da Candelária repleto de mascarados e encapuzados trajando luto. Os Ágoras só tratavam de assuntos locais de cada uma das dez tribos atenienses. Em outras três instituições eram resolvidos os assuntos gerais da cidade, entre elas a Pnyx, que acolhia os primeiros seis mil atenienses homens que lá chegassem. Ali falava quem desejasse, apresentassem as propostas que bem houvessem e votos eram tomados. Os nomes dos proponentes, porém, ficavam registrados e um conselho posterior avaliava se o que foi aprovado fez bem ou mal à cidade. Se mal, seu proponente original era julgado, podendo ser condenado ao confisco de bens, exílio ou morte. A idéia de democracia direta como entrudo, confete e um cheirinho de loló é criação de analistas brasileiros.

As cicatrizes que conquistarem nos embates que buscam não semearão, metaforicamente, sequer a recompensa de despertar o País para a luta contra uma ditadura (pois inexistente), apesar de derrotados, torturados e mortos – reconhecimento recebido pelos jovens da rebelião armada da década de 70. Estão esses moços de atual boa fé, ao contrário, alimentando o monstro do fanatismo e da intolerância e ninguém os aplaudirá, no futuro, pelo ódio que agora cultivam, menos ainda pelas ruínas que conseguirem fabricar. Muito provavelmente buscarão esconder, em décadas vindouras, este presente que será o passado de que disporão. Arrependidos muitos, como vários dos participantes do maio de 68, francês, cuja inconsequência histórica (e volta dos conservadores) é discretamente omitida nos panegíricos.

Revolução? – Esqueçam. Das idéias, táticas e projetos que difundem não surgirá uma, uma só, instituição política decente, democrática ou justa. Não é essa a raiz dessa energia que os velhotes têm medo de contrariar. É uma enorme torrente de energia, sem dúvida, mas é destrutiva tão somente. E mais: não deseja, expressamente, construir nada. Sob cartolinas e vocalizações caricaturais não se abrigam senão balbucios, gagueira argumentativa e proclamações irracionais. Os cérebros do niilismo juvenil sabem que não passam de peões, certamente alguns muitíssimo bem pagos, talvez em casa, a atrair bispos, cavalos e torres para jornadas de maior fôlego. Afinal, os principais operadores da ordem que se presumem capazes de substituir são seus pais e avós. Em cujas mansões se escondem, no Leblon e nos Jardins.


Os problemas inerentes à democracia representativa - por ex-aluno do Wanderley (Blog do Nassif)

A análise de Wanderley G.Santos é instigante. Mas, a meu ver, desconsidera disfuncionalidades crônicas inerentes ao funcionamento da democracia representativa - problemas reconhecidos por vários teóricos da Ciência Política.

Em primeiro lugar: o usufruto das liberdades políticas é desigual para diferentes classes e grupos sociais, devido à desigualdade na distribuição dos recursos (capital financeiro, capital simbólico, tempo livre, acesso aos meios de comunicação).

Num país como o Brasil, onde metade da população economicamente ativa recebe até dois salários mínimos, esta disparidade é ainda mais aguda.

Em segundo lugar, a cristalização das burocracias estatais e partidárias tende a sufocar o encaminhamento político das reivindicações populares.

Forma-se um grupo relativamente homogêneo de políticos profissionais, socialmente muito vinculados entre si - parentes, compadres, amigos e colegas - unidos, para além de qualquer fronteira partidária, pelo interesse comum de assegurar suas carreiras, posições e privilégios.

Esses personagens vivem cada vez menos “para” a política, e mais “da” política. Mantêm relações incestuosas uns com os outros e com diversos grupos de interesses econômicos.

A corrupção, a troca de favores, o financiamento privado milionário de campanhas, a chantagem através da mídia, etc., são alguns dos muitos mecanismos que o grande capital utiliza para definir a agenda política segundo seus próprios interesses, e influenciar as ações dos governos. Decisões políticas essenciais são tomadas em negociações de bastidores envolvendo as burocracias estatais, diferentes instâncias de poder, e os grupos de interesse dominantes na sociedade.

Muitas vezes, as reivindicações populares são rejeitadas com a utilização de alegações de natureza técnica ou “orçamentária” que não são postas em discussão. Foi o caso dos famosos "20 centavos" do aumento das passagens de ônibus em S. Paulo.

Se um prefeito ou governador tenta confrontar grandes grupos de interesse, estes têm poder para sabotar e até inviabilizar o seu mandato. Das brigas intermináveis na Justiça aos assassinatos de reputação na mídia, dos locautes e operações tartaruga não declarados ao bloqueio nas câmaras legislativas, chega-se à paralisia de governos, quando não ao caos puro e simples. Revejam a trajetória de Luíza Erundina quando tentou implantar o passe livre em São Paulo!

Os políticos fecham acordos e compromissos de bastidores em todos os níveis, sem consultar seus eleitores. São obrigados a fazê-lo mesmo quando queiram pôr em prática um programa de esquerda. É o custo da famosa "governabilidade". 

Não surpreende que os jovens rebelados pelas ruas tenham gritado, insistentemente, a respeito dos partidos e dos políticos "tradicionais": "Não nos representam!"

Mas é infinitamente mais fácil denunciar os vícios do poder estabelecido que construir alternativas factíveis a esse poder. Wanderley G.Santos aponta, com razão, a superficialidade, ignorância, arrogância e despreocupação com a realidade dos jovens manifestantes, muito mais propensos a derrubar governadores (especialmente aqueles que compõem a problemática "base aliada" do PT, e não por acaso) que a definir o que querem pôr no lugar. 

Com o advento da Internet, pode ser que tenhamos nas mãos novas ferramentas capazes de ajudar numa reinvenção da democracia. Pode ser que estejamos diante, efetivamente, de algo novo, sem precedentes na história do fazer político.

Com a Internet, a circulação de informação, o debate, o compartilhamento de imagens em tempo real, os "vazamentos" etc., podem minar o poder das mídias tradicionais, clássicas aliadas dos grandes grupos de interesse. A Internet permite violar pactos de silêncio, expondo negociatas, denunciando malfeitos e omissões; permite divulgar experiências ocorridas em outros países, abrir espaços de discussão virtual, compartilhar ideias etc. Permite também convocar manifestações de rua massivas e rápidas.

É bem verdade que muita mentira, muito lixo, muita manipulação, também circula na Internet.

Trava-se aí uma verdadeira batalha de informação.

Mas é indiscutível que a  Internet viabiliza novas e inéditas formas de mobilização da cidadania.

Com isso, nasceu o sonho da "democracia 2.0", na qual os atuais sistemas de representação política seriam complementados, controlados, oxigenados pela participação direta dos cidadãos.

No Brasil, esse sonho esbarra nas disparidades na distribuição de renda, riqueza e capital simbólico. Eleitores muito pobres não têm acesso às ferramentas da Informática nem a todos os termos de debates que interessam a seus destinos.

Isso limita a democracia participativa, mas não deve desanimar-nos de viabilizá-la.

Os movimentos de rua recentes são majoritariamente constituídos pelas camadas médias letradas e informatizadas da população.

Bandeiras populares e inclusivas têm sido abraçadas pelos manifestantes, mas ainda é cedo para saber se eles - quantos deles - estarão realmente dispostos a pagar o preço da sua implantação no mundo real.

Além do custo cifrável em impostos e incertezas, o fazer político é muito mais trabalhoso, cansativo e exigente que gritar "fora isso" e "abaixo aquilo". Urrar de indignação em passeatas é muito mais divertido que participar de reunião de condomínio, sindicato ou conselho popular. A participação cotidiana nos assuntos da pólis, mesmo arejada e democratizada, terá de disputar corações e mentes com os lazeres privados e o ethos individualista do capitalismo. A conferir.


Ao mestre Wanderley Guilherme dos Santos - por Luis Nassif (Blog do Nassif)

Nesses tempos de turbulência, de profundo corte na política, na mídia e nas formas de organização, mais que nunca é fundamental o papel dos cientistas políticos. E, dentre eles, o mais ilustre, Wanderley Guilherme dos Santos.

No entanto, seu artigo “O futuro do atual levante niilista” permite reparos. Alguns muito bem colocados no artigo “Os problemas inerentes à democracia representativa” por alguém que assina como “ex-aluno de Wanderley” e se mostra à altura do mestre.

No seu artigo, Wanderley investe contra as manifestações de rua, como se constituíssem em um caos articulado (perdão pelo paradoxo) contra a ordem democrática tradicional. “Sob cartolinas e vocalizações caricaturais não se abrigam senão balbucios, gagueira argumentativa e proclamações irracionais”. Ironiza os “semicultos” que pretendem enxergar um novo Ágora ateniense. E garante que “das ideias, táticas e projetos que difundem não surgirá uma, uma só, instituição política decente, democrática ou justa”.

Deles, claro que não. De Wanderley, certamente que sim, assim que aceitar o ativismo online como um dado da realidade, irreversível, e o caos atual como a desordem que precede a nova ordem, uma realidade que surgiu com o advento das novas tecnologias e com as quais se terá que conviver, disciplinar e institucionalizar. E esse processo civilizatório será pavimentado pelo conhecimento, sabedoria e engenho dos verdadeiramente cultos, como Wanderley.

Civilizando as demandas políticas

Recentemente, o mestre participou de um Brasilianas defendendo a atual pulverização partidária. Ensinou ele que, graças a essa multiplicidade de partidos, nos mais distantes rincões a selvageria política é canalizada para formas institucionais e civilizadas de luta política.

Esse mesmo processo civilizatório precisa ser aplicado ao universo amplo das redes sociais, para a constituição da futura democracia digital, criando um novo modelo institucional que dê conta do fenômeno.

Onde Wanderley enxerga cartolinas e palavras balbuciantes, existe o caos que precede a nova ordem, com os seguintes elementos:

1. A mídia como elemento de pressão sobre as políticas públicas.

Na democracia representativa, os meios de comunicação se constituem no instrumento mais eficiente de influenciar políticas econômicas. Os grandes grupos midiáticos sempre responderam às demandas dos grandes anunciantes e grandes grupos econômicos, estabelecendo uma não isonomia com outros setores.

Por exemplo, dois dos principais preços da economia – câmbio e juros – são manipulados por meia dúzia de consultorias influenciando dois ou três jornais.

No passado, foi o poder da mídia (em um país quase totalmente de analfabetos) que legitimou os gastos públicos das políticas cafeeiras e demonizou gastos em outras regiões.

O simples fato do modelo convencional ter implodido muda o cenário de políticas públicas – gostando-se ou não do novo modelo.

2. As instituições capilares como meio de arregimentação política

Os principais agentes da política brasileira são os partidos tradicionais, sindicatos, igrejas e interesses difusos influenciados pela mídia. Todos com capilaridade garantindo massa crítica de votos.

Com as redes sociais, muda o modelo. É importante notar que grande parte da visibilidade conquistada por movimentos sociais deve-se ao uso pioneiro da Internet.

3. O novo Ágora

Wanderley não gostou da comparação das redes sociais com o Ágora grego. Mostrou que o Ágora grego legislava sobre pontos muitos específicos das cidades gregas e obedecia a regras claras de participação.

Não é esse o ponto em comum das redes sociais com o Ágora, mas o fato de que toda discussão pública se dá dentro de uma mesma plataforma tecnológica.

Quando éramos jovens, fora da mídia o campo de difusão do discurso eram as assembleias e os mimeógrafos. Agora, todos – movimentos sociais, militantes de esquerda e direita, etc. – atuam sobre a mesma plataforma tecnológica. Um comentário bem posto de um blog é capaz de derrubar a matéria do maior jornal brasileiro pelo simples efeito viral. Há implicações radicais sobre o jogo de pressões democrático.

4. A rapidez do ativismo digital e o ritmo da democracia.

Democracias embutem processos inevitavelmente lentos, seja de incorporação de novos atores ou aceitação de novos conceitos. O ativismo digital trouxe um componente de urgência incompatível com os ritos democráticos tradicionais. Não se trata de gostar ou não: são dados da realidade. O desafio consistirá em aceitar a nova realidade e debruçar-se sobre as formas capazes de dar organicidade e disciplina a essas demandas.

A democracia digital

No modelo convencional, partidos políticos, sindicatos, associações são  dominados por militantes com maior disponibilidade de tempo e vontade para participar. E a cooptação ocorre a partir de reuniões presenciais, assembleias que garantem o tiro de partida para os passos seguintes, de conquista do eleitorado e da hegemonia do setor.

Agora, a participação pode-se dar a partir da casa do sujeito. E não se trata de mera militância digital porque – e as manifestações estão aí para provar – seu poder de mobilização transcende o computador e a rede social.


Mais que isso: o mundo digital permitiu a ascensão de novos tipos de influência e de lideranças, perfis de redes sociais que jamais teriam visibilidade nos sistemas tradicionais de exposição.

Por outro lado, não é possível supor que o sistema de decisões seja submetido aos movimentos radicais de manada, que ganharam uma dinâmica inédita com as redes sociais. É necessária a montagem de uma nova estrutura institucional, com a definição das informações estruturadas necessárias para a tomada de consciência; o desenho de um novo sistema de instâncias decisórias; a rediscussão dos sistemas de freios e contrapesos.

Enfim, um desafio ciclópico, à altura de mestres como Wanderley Guilherme dos Santos, assim que ele perder a implicância com o mundo digital.


De Wanderley ao Nassif - por Wanderley Guilherme dos Santos (Blog do Nassif)


Prezado Nassif,

Além do artigo a que vc. generosamente se referiu, o suplemento Eu& do Valor Econômico traz outra participação minha (esta na imprensa tradicional) no debate sobre o momento.

Não tenho discutido os problemas dos sistemas representativos, suas deficiências arqui-conhecidas e apontadas em tom algo caricatural por alguém que me lisonjeia com a declaração de ex-aluno. Agradeço, mas anônimos não me sensibilizam.

Minhas observações sobre essas limitações estão em diversos trabalhos meus que não vêem ao caso citar. Também não me faz justiça a crítica de que implico com o mundo digital, vocês é que afirmam que o sistema representativo está superado – o que nego com argumentos, não xingamentos ou implicâncias.

Se me permite uma auto referência, foi em meio digital que levantei o tema de que o discurso de ódio que permeia parte considerável das manifestações e de mensagens digitais encontraram seu paradigma no espetáculo que foi o julgamento da Ação Penal 470, transmitido justamente por meios convencionais. Não discuto meios, mas as mensagens que são relevantes para o que estamos debatendo.

Reconheço e saúdo o fato de que esse novo universo já tem produzido fenômenos importantes para a sociedade democrática. Também estimo, como você, que exista um potencial de avanço civilizatório significativo embutido nessa ferramenta. Mas não estou tratando de promessas de futuro, de potencialidades, de aspectos positivos. Estou tratando de aspectos de hoje e negativos. Um discurso fascista é fascista seja qual for o meio em que esteja vazado. E tanto levo a sério o meio que tenho participado dele, afinal você está me fazendo restrições em virtude da minha participação.

Tenho repetido uma proposta para enriquecer a democracia representativa brasileira: tornar os analfabetos elegíveis nas mesmas condições dos alfabetizados. Ninguém se manifesta. Acho que consideram chocante, a esta altura do século XXI, internético, alguém se preocupar com os direitos políticos dos analfabetos. Enquanto isso, aguardo uma proposta, não promessas de futuro, de como aproveitar de forma produtiva a sensacional vantagem que é a velocidade de decisão por meio digital.

Abraço cordial,

Wanderley Guilherme

sexta-feira, 26 de julho de 2013

Fotografia da terra à noite (Nasa - Pravda - Blog do Nassif)

Sérgio Cabral, 12%, com viés de baixa – por Maria Inês Nassif (GGN)

O governador do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), venceu a disputa pela reeleição com 66% dos votos, em 2010. Segundo a pesquisa CNI-Ibope divulgada na quinta-feira, não dispõe atualmente de mais de 12% de aprovação ao seu governo. Até o final do ano passado, considerava-se forte o suficiente para ameaçar a presidente Dilma Rousseff de se retirar do  palanque da reeleição, se o PT fluminense não recuasse da decisão de lançar o senador Lindbergh Farias ao governo do estado, contra o candidato do PMDB, o vice Pezão. Hoje, estuda seriamente apoiar Lindbergh se o governo arrumar uma saída política honrosa para a situação em que se encontra - apoio, aliás, que não conta com o entusiasmo do senador petista.

Muita coisa aconteceu de lá para cá. As manifestações de rua, que o tornam alvo diário de hostilidades, são apenas o fim de um inferno astral que começou no início de seu segundo mandato, e que desde então não o livra de um permanente viés de baixa.

Cabral foi um fenômeno político menos por sua capacidade de mobilizar massas ou liderar partidos, e mais pelo seu senso de oportunidade. Iniciou na política muito jovem - jamais teve outra profissão -, escolheu bem os seus amigos e fez o seu próprio grupo político. Chegou ao governo numa das eternas vagas abertas na política fluminense pela decepção com a política tradicional, e após o PSDB fluminense sangrar todo o seu capital político com um governo considerado pouco eficiente e pouco afeito às delicadezas da probidade, comandado pelo falecido Marcelo Alencar.

O PMDB do Rio, sob sua liderança, manteve uma trajetória solo do partido nacional: Cabral nunca foi ligado ao vice-presidente Michel Temer, ou aos líderes pemedebistas na Câmara e no Senado. Desde que foi eleito governador do Rio pela primeira vez, em 2006, o PMDB do estado é o seu quintal exclusivo, compartilhado com pessoas que privam da sua intimidade ou têm senso de oportunidade suficiente para mover interesses políticos do governador no estado ou fora dele.

Foi como "terceira via" do PMDB que impôs o nome do deputado Eduardo Cunha para a liderança do partido na Câmara -  uma tentativa de colocar o pé na política nacional, depois dos abalos de popularidade sofridos no estado, que o afastaram ainda mais do partido em Brasília.

O grande cacife do primeiro e festejado mandato de Cabral, de 2007 a 2010, foi também o seu senso de oportunidade: aproximou-se muito do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que já estourava em popularidade. Era mamão com açúcar para um governador que, sem partido sólido no estado e sem apoio do partido nacional, fazia um eleitorado fácil usando a popularidade do presidente Lula, que era de outro partido, e dinheiro e programas do governo federal para a chamada pacificação de favelas e para a urbanização das regiões mais pobres da região metropolitana – esta abriga cerca de 70% da população do estado e o correspondente em eleitores.

Quando chegou o ano de disputar a reeleição, Cabral faturou junto ao eleitorado pobre. Mas reassumiu um segundo mandato convivendo com a presidente Dilma Rousseff, com quem não tinha grandes relações. O programa de pacificação das favelas começou a fazer água quando a polícia "pacificadora", na maioria das favelas, começou a cobrar da população, e também para liberar o tráfico (desarmado, mas atuante no comércio) e mesmo para a realização de bailes funks nos morros cariocas, a exemplo dos milicianos que foram  expulsos por operações que antecederam a criação dessas zonas teoricamente "libertadas" pela polícia.

Conforme a polícia passou a operar nessas zonas da capital, a violência chegou às cidades mais pobres da região metropolitana, para onde o tráfico armado foi empurrado. A imagem do governo que resolveu o problema da violência no estado foi ruindo, conforme o tráfico e a banda podre da polícia se acomodaram às exigências da política de ocupação das favelas.

Enquanto perdia popularidade nas regiões mais pobres do Estado, o governador pemedebista não ganhava na Zona Sul, onde uma oposição estridente se mantém à sua porta, no Bairro do Leblon, pedindo que vá embora, há quase dois meses. Na opinião de uma fonte carioca, Cabral foi juntando contra si evidências de que acumularia todos os defeitos indesculpáveis em um político, no momento em que a população critica a política tradicional: arrogância, ligação com empresários de fama duvidosa, pendor para o fausto e a riqueza, exibicionismo e pouca consistência entre suas posses, sua origem social e sua vida profissional.

O primeiro grande golpe foi a queda de um helicóptero, em junho de 2011, com a namorada de seu filho. A tragédia, que vitimou várias pessoas, trouxe à tona relações demasiado estreitas com o então presidente da Construtora Delta, Fernando Cavendish. O helicóptero era de Cavendish, e transportava um grupo que vereaneava em um caro resort na Bahia, o governador incluído. Ele e o filho apenas não morreram no acidente porque foram transportados no voo anterior deste mesmo helicóptero.

Em maio do ano seguinte, Cavendish entra com nova contribuição ao inferno astral do governador. Ele foi apontado como participante do esquema do contraventor Carlinhos Cachoeira, e a suspeita era a de que Cachoeira fosse sócio oculto da empreiteira. Cabral ficou devendo ao PMDB, ao PSDB e a uma parte do PT o favor de livrá-lo de depor na CPI do Cachoeira. No decorrer do escândalo, seu adversário local, o deputado Anthony Garotinho, divulgou foto em que Cabral, Cavendish e um grupo de assessores do governo do Rio comemoram alguma coisa em um restaurante em Paris, todos eles com um guardanapo na cabeça e uma taça e champanhe na mão.

Às denúncias, sucederam-se as obras de reforma no Maracanã – que, caríssimas, acabaram por resultar em ingressos igualmente caros. Não se deve menosprezar o efeito Maracanã sobre a popularidade de Cabral, segundo fontes ouvidas pelo Jornal GGN. Os gastos feitos na obra, e a distância cada vez maior do carioca comum do grande feito administrativo do governador, estão na sua conta.

Ao longo desses três anos e meio do segundo governo, Cabral também apartou o seu eleitorado do de Lula. O senador Lindbergh Farias, do PT, cavou na marra uma candidatura ao governo – hoje está muito à frente de Pezão, e não existem razões para que o PT o tire do páreo para beneficiar o protegido de Cabral. Lindbergh é um político petista jovem, mais chegado a uma política de massas do que a maioria dos quadros do PT do momento. Por essa razão, não tem sido desincentivado por Lula, ao contrário do que aconteceu nas eleições passadas. Aliás, tem sido tratado com bastante simpatia pelo ex-presidente, que o coloca na cota de políticos que podem rejuvenescer um partido que, num diagnóstico seu muito anterior às manifestações de julho, está precisando renovar seus quadros. Lindbergh tem comido pelas bordas das intenções de voto do eleitorado pobre que, aos poucos, abandona Cabral à própria sorte.

quinta-feira, 25 de julho de 2013

Pintura - por Sergio Lopez (Inspiration hut)

Amaury Ribeiro Jr.: Documentos das Ilhas Virgens sobre Globo e Fifa comprovam que MPF prevaricou – por Conceição Lemes (Vi o mundo)

Nessa quinta-feira 18, a Folha de S. Paulo publicou reportagem assinada por Cátia Seabra e Fernando Mellode, afirmando que:

O Ministério Público denunciou o jornalista Amaury Ribeiro e outras quatro pessoas acusadas de quebras pelo sigilo de pessoas ligadas a José Serra em 2009. A Procuradoria pediu ainda a abertura de inquérito para identificar mentores da ação.

Em 2010, quando Serra enfrentou Dilma Rousseff na corrida pela Presidência, dados sigilosos do ex-ministro tucano Eduardo Jorge foram encontrados num dossiê em posse da equipe da pré-campanha petista. Segundo investigação da PF, o sigilo de Veronica Serra, filha do ex-governador, também foi quebrado.

“Eu não quebrei sigilo de quem quer que seja”, rebate o jornalista Amaury Ribeiro Jr. “Este processo está quatro anos no Ministério Público Federal. Agora, justamente no dia em que recebo do exterior a documentação sobre o processo contra a Rede Globo por sonegação, lavagem de dinheiro, crime contra o sistema financeiro, utilização de empresas nas Ilhas Virgens Britânicas para pagar à Fifa pelos direitos de transmissão da Copa de 2002, o Ministério Público Federal decide me denunciar.”

“Aliás, essa mesma documentação já havia sido encaminhada ao procurador-geral da República, Roberto Gurgel”, observa Amaury. “Acho uma coincidência absurda, porque os documentos, que acabo de receber das Ilhas Virgens sobre as movimentações da Globo e da Fifa, comprovam que a cúpula do Ministério Público tucano, ligada a Robalinho, prevaricou feio.”

A denúncia contra Amaury foi feita pelo procurador José Robalinho Cavalcanti, do 2º ofício criminal do Ministério Público Federal, em Brasília.

O  dr. Robalinho é filho do médico Guilherme José Robalinho Cavalcanti, ex-secretário municipal de Saúde de Recife.

Em 2008, segundo o JusBrasil, o juiz Frederico Koehler, da 2ª Vara da Justiça Federal em Pernambuco, recebeu ação por  improbidade administrativa contra Guilherme Robalinho devido a irregularidades ocorridas na implantação do Programa Leite é Saúde, que fazia parte de um convênio entre o Município do Recife e a União Federal, com o objetivo de atender aos desnutridos e às gestantes sob risco nutricional.

Em matéria publicada pelo Estadão em 2006, a advogada Marília Cardoso disse que” Guilherme Robalinho foi várias vezes citado em depoimentos de envolvidos na Máfia dos Vampiros. Robalinho, que tinha bom relacionamento com o então ex-ministro da Saúde José Serra (PSDB), teria um suposto envolvimento com um dos representantes da multinacional suíça Octapharma, Jaisler Jabour, também denunciado na Máfia dos Vampiros, que teria financiado campanhas políticas em Pernambuco”.

“O dr. Robalinho deveria se declarar impedido de atuar no meu caso devido às ligações do pai dele com José Serra, que é alvo das investigações no meu livro. Tenho muitas provas que comprovam a ligação. Vou apresentá-las na minha defesa na hora certa”, afirma Amaury. “Estou pronto para briga. Carregado de munição para implodir a ala tucana que se apoderou do Ministério Público. Não vai sobrar nenhuma pena.”

O premiadíssimo Amaury Ribeiro (que, por precaução, já repassou cópias de todo o material recebido para outras pessoas de sua confiança), acrescenta:

“Se esse procurador queria me expor na mídia para agradar seus amigos, aviso: isso não me atinge mais. Até tiro de traficante já levei. Sou honesto, com  trabalhos prestados à sociedade no combate à injustiça social. E, acima de tudo, um sobrevivente, que sobreviveu com sucesso (200 mil livros vendidos) ao bombardeiro da imprensa canalha nas últimas eleições. Será que ele e seu pai Robalinho têm o mesmo preparo? Vamos ver. A batalha só está recomeçando com uma diferença: estou mais forte, com milhares de brasileiros que me apoiam do fundo de seus corações”.

OS RESULTADOS DOS PROCESSOS DE RUI FALCÃO E JOSÉ SERRA CONTRA AMAURY

A propósito da denúncia do MPF, Amaury Ribeiro Jr. atenta:

1) Como eu havia mencionado em depoimento à Polícia Federal e no Privataria Tucana, a história do grupo de inteligência não foi uma invenção do atual presidente do PT, Rui Falcão, que compilou dados do livro do meu computador (Folha, por favor, não são dados sigilosos).

Esses dados foram entregues à Veja por Falcão e o ex-ministro Antônio Palocci com o propósito de derrubar Fernando Pimentel e Luiz Lanzeta do comando da campanha da então candidata à presidência da República, Dilma Rousseff.

Ruy Falcão me processou. E o que aconteceu? A Justiça julgou que havia provas suficientes que mostravam que eu estava dizendo a verdade.

Em outras palavras, eu tenho agora o aval da Justiça para dizer que o presidente do partido da presidenta do país traiu seus próprios companheiros.

2) O personagem principal do livro Privataria Tucana, José Serra, também entrou com processo na Justiça contra mim por danos morais. Faminto por dinheiro, Serra exigia todos os recursos arrecadados com a venda dos livros. Teve de se contentar com R$ 1.000,00 devido a uma legenda infeliz da publicação. Mas acabou sendo humilhado com a ironia do Juiz, que alegou que Serra não precisava mais de dinheiro, porque já tinha milhões em paraísos fiscais.

3) O caixa de campanha do PSDB, Ricardo Sérgio, também havia se dado mal ao tentar me processar. Além de perder o processo, a Justiça mandou a CPI do Banestado enviar toda papelada que comprova o pagamento de propina do processo de privatização. Diante das sucessivas derrotas, não restou ao PSDB se não entrar com novo processo em que afirma não ter nenhum vínculo com o ex-piloto dos consórcios das privatizações. Que piada!

4) Em resumo: a Justiça se manifestou várias vezes sobre a fé pública dos documentos publicados no Privataria Tucana. No entanto, o procurador Robalinho, que teve acesso aos autos, não pediu nenhuma investigação para apurar os crimes praticados pelos tucanos.

Por quê? Isso é respondido por um estudo jurídico elaborado por uma empresa internacional de renome contratada pelo autor, que analisou todas as ações impetradas por Robalinho durante sua passagem pelo Ministério Público Federal. O resultado é uma bomba, que será entregue ao Conselho Nacional do Ministério Público no momento certo.

5) Desde pequeno, tenho a convicção, por defender o mais pobres e injustiçados, que sou protegido por uma força divina. Mais uma vez, essa força está me levando em frente. É vitória em cima de vitória. Estou ansioso para ver o resultado final desse processo e de outros que pretendo mover no futuro. Com paciência, paciência e mais paciência, como aconselhou o pai de meu advogado, meu conterrâneo do Paraná, Adriano Bretãs.

Ilustração - por Victo Ngai (victo-ngai.com)

Os desafios do papa Francisco – por Luis Nassif (Blog do Nassif)

O publicitário Alex Periscinoto dizia que a Igreja Católica foi a primeira organização mundial a adotar ferramentas de marketing. Incluía ai o sino, o cerimonial das missas, a figura dos santos.

Pode parecer uma dessacralização excessiva da fé. Mas o recente avanço das chamadas igrejas eletrônicas em todo mundo mostra que a disputa entre as religiões se dá no campo da fé, mas também do marketing e das estratégias de comercialização de seu principal produto: o apoio espiritual/emocional.

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Nas últimas décadas, a Igreja Católica se distanciou extraordinariamente dos países emergentes, no justo momento em que eles... emergiam.

Do lado asiático, o mercado da fé já estava ocupado pelas religiões históricas da região das asiáticas às arábicas. O grande mercado católico se situava no sul, nos países latinoamericanos e nas migrações latinas para outros continentes.

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Em outros momentos, a Igreja avançava em todas as frentes. Nos anos 60 a 80, havia uma Igreja oficial, de dom Carlos Carmello Mottas, de dom Eugênio Salles, de grande peso político; outra que atuava na periferia e junto aos movimentos sociais; uma terceira, que atendia à demanda por apoio espiritual. E, também, uma Igreja interessada em participar da vida das famílias, os famosos encontros de casais dos anos 60 e 70 que juntavam de famílias de cabeça aberta de São Paulo às famílias de cidades pequenas, recém-urbanizadas..

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Um a um a Igreja foi perdendo esses públicos. Os antigos príncipes da Igreja, cardeal Motta, dom Eugênio Salles, dom Paulo Evaristo Arns, os irmãos Lorscheider, independentemente da inclinação política, tinham ascendência sobre vastos setores relevantes da opinião pública. A geração atual de cardeais é inexpressiva no debate político.

Nas periferias, junto ao público mais politizado e o mais crente, a Igreja assistiu a invasão das religiões evangélicas. Enfrentou a modernização dos costumes ferozmente encastelada em princípios estáticos, sem entender os novos tempos. Os seminários deixaram de atrair quadros de bom nível. A bandeira da evangelização - que sempre foi o maior motor da Igreja, não apenas para os padres seculares como para as congregações - esgarçou-se. Sem a utopia da evangelização, sem uma bandeira maior para defender, houve uma profunda deterioração da ética interna, como uma empresa que perdeu valores e chefia. O resultado foi o estouro de escândalos em várias partes do mundo.

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Por trás dessa crise, a doença que afeta toda grande organização: o encastelamento em si, o comando centralizado que perde o contato com as pontas; as disputas internas que colocam o jogo interno de poder acima dos objetivos maiores da companhia; o deslumbramento e a submissão ao fausto e ao poder. Em suma, a burocracia do Vaticano.

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Esse será o duplo desafio do papa Francisco. De um lado, superar a cúpula do Vaticano, que enredou a Igreja em um universo de corrupção financeira e sexual. De outro, ampliar novamente o escopo de atuação da Igreja, voltando a dar atenção preferencial às novas classes que emergem nos países do sul.

Apenas um Papa logrou dominar essas duas frente: João 23. Até hoje provoca enormes saudades na juventude daquela época, dos religiosos aos que perderam a fé.

Comentário
Há muitas outras coisas a dizer sobre a igreja, mas cito este texto porque o antepenúltimo parágrafo é brilhante: pode ser aplicado ao que aconteceu com a Igreja, com a União Soviética, com o PT,  com o atual sindicalismo brasileiro, etc.

quarta-feira, 24 de julho de 2013

Fotografia - por National Geographic

Brizola substitui Irineu Marinho em nome de rua após manifestação pacífica e surpreendente - por Gilberto de Souza (Correio do Brasil)

O alerta na redação do diário conservador carioca O Globo soou por volta das 14h da sexta-feira. As pesadas portas de ferro na saída para a Rua Irineu Marinho, Centro do Rio, seriam fechadas, pontualmente, às 15h, como avisava o boletim interno distribuído aos funcionários. Ninguém mais entrou ou saiu das garagens após às 15h30. Estava decretado o pavor na sede de uma das organizações mais visadas desde o início das manifestações que tomaram conta das ruas, nas principais cidades brasileiras. Entre os repórteres, redatores e editores do jornal, uma ponta de apreensão, pois imaginavam – diante das cenas de pura revolta, no Leblon, noite passada – que uma turba mascarada, saída das marchas contra o governador do Estado do Rio, Sérgio Cabral Filho, adentraria o ambiente refrigerado da redação, pronta a quebrar terminais de computadores, aquários de blindex e até as preciosas máquinas de café. Estas, com certeza, produzem um resultado menos amargo do que as denúncias, do site O Cafezinho, do jornalista Miguel do Rosário, sobre uma fraude bilionária de seus patrões ao fisco.

A direção precaveu-se. Mandou blindar as vidraças com tapumes, lacrar as entradas e usou do costumeiro prestígio com as forças estatais de repressão para convocar o Batalhão de Choque da Polícia Militar. No final da tarde, um contingente de mais de 100 homens posicionou-se, estrategicamente, nos pontos de acesso às preciosas placas da rua que, horas depois, passaram a homenagear a memória do governador gaúcho e carioca, Leonel de Moura Brizola. Munidos de cacetetes longos, escudos blindados, capacetes e couraças; armados de bombas de efeito moral, gás de pimenta e muita bala de borracha, os PMs estavam prontos a proteger a propriedade da terceira geração do titular daquele logradouro público de apenas cento e poucos metros de extensão, mas longo o suficiente para para cruzar décadas de colaboração com o regime militar que o tornou o maior império de comunicação da América Latina. Um dos maiores do mundo.

Àquela altura, no meio da tarde, o adiantamento da edição de domingo já estava tumultuado. A manifestação fora confirmada pelas redes sociais e no Correio do Brasil, primeiro diário a publicar que a Rua Irineu Marinho, a partir da noite passada, passaria a se chamar Rua Leonel Brizola, por força das redes sociais e dos manifestantes. Ainda que por um breve momento, tão curto quanto a rua que seu nome batizou, o velho Briza novamente desafiaria o poderio das Organizações Globo e as colocaria, mais uma vez, em xeque perante a opinião pública brasileira.

A bandinha do Sindicato dos Petroleiros, engalanada, estava a postos em frente ao edifício Balança mas não cai, na esquina da Rua de Santana com a Avenida Presidente Vargas. Um sistema de projeção passava imagens do governador do Rio, na década de 80, nas paredes que encontrava disponíveis, em tamanho gigante, como se fluíssem da memoria dos manifestantes que, aos poucos, chegavam ao ponto de encontro. A retreta estava animada, mas o público tardava a chegar. Os organizadores do ato público, a começar por Alexandre Cesar Costa Teixeira, editor do blog Megacidadania; Theófilo Rodrigues, cientista social e dirigente do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé; e coordenadores do movimento Frente Ampla pela Liberdade de Expressão (FALE-Rio), resolveram partir assim mesmo. O grupo era pequeno, mas animado.

No início da marcha, pela contramão da Rua de Santana, havia perto de três PMs para cada manifestante e, naquele momento, o comandante do grupamento começara a perceber o fiasco a que o setor de Inteligência da Secretaria de Segurança Pública o obrigara a passar. Ainda assim, coordenaram o trânsito e postaram meia-dúzia de batedores no final do séquito até a chegada ao primeiro alvo: a placa afixada no prédio ganhou o adesivo com o nome de Brizola e o aplauso, agora, por uma multidão um pouco maior, ecoou para os edifícios em volta, de onde surgiram moradores acenando com panos na janela, em sinal de apoio. Mas havia outras surpresas guardadas para os policiais do Choque, ainda incrédulos diante daquele pequeno e organizado grupo de manifestantes. Possibilidade zero de haver confrontos, quebra-quebras e cenas de violência generalizada contra a sede do império midiático. O ato seguinte do protesto, então, seria ainda mais surrealista, tanto para o aparato truculento convocado pelas Organizações Globo, quanto p
ara as dezenas de funcionários da casa, que se amontoavam na passarela que liga a redação às antigas oficinas do jornal.

Dez, nove, oito, sete, seis, cinco, quatro, três, dois e bolas de papel gigantes voaram na direção do logotipo do Globo, para lembrar a armação desvendada pela blogosfera na campanha de 2010, quando o então candidato José Serra (PSDB) foi atingido por um objeto na cabeça, durante caminhada no subúrbio carioca. Não passava de uma bolinha de papel, mas o representante tucano chegou a gastar uma ressonância magnética e horas de trabalho de um perito contratado para provar que o incidente seria quase que um atentado à vida do representante das forças da direita. A fraude, uma vez desvendada, custou-lhe preciosos votos e a memória eterna de seus adversários acerca da patifaria.

Jogadas as bolinhas de papel, colados os adesivos sobre as placas da “antiga” Rua Irineu Marinho, teve início a leitura dramática do mais mais célebre direito de resposta já imposto à Rede Globo:

“Todo sabem que eu, Leonel Brizola, só posso ocupar espaço na Globo quando amparado pela Justiça. Aqui, citam o meu nome para ser intrigado, desmerecido e achincalhado perante o povo brasileiro. Ontem, neste mesmo Jornal Nacional, a pretexto de citar o editorial de O Globo, fui acusado na minha honra e, pior, chamado de senil.

Tenho 70 anos, 16 a menos que o meu difamador, Roberto Marinho. Se é esse o conceito que tem sobre os homens de cabelos brancos, que use para si. Não reconheço na Globo autoridade em matéria de liberdade de imprensa, e, basta, para isso, olhar a sua longa e cordial convivência com os regimes autoritários e com a ditadura que por 20 anos dominou o nosso país.

Todos sabem que critico, há muito tempo, a TV Globo, seu poder imperial e suas manipulações. Mas a ira da Globo, que se manifestou ontem, não tem nenhuma relação com posições éticas ou de princípio. É apenas o temor de perder negócio bilionário que para ela representa a transmissão do carnaval. Dinheiro, acima de tudo.

Em 83, quando construí a Passarela, a Globo sabotou, boicotou, não quis transmitir e tentou inviabilizar, de todas as formas, o ponto alto do carnaval carioca. Também aí, não tem autoridade moral para questionar-me. E mais: reagi contra a Globo em defesa do Estado e do povo do Rio de Janeiro que, por duas vezes, contra a vontade da Globo, elegeu-me como seu representante maior. E isto é o que não perdoarão nunca.

Até mesmo a pesquisa mostrada ontem revela como tudo na Globo é tendencioso e manipulado.

Ninguém questiona o direito da Globo mostrar os problemas da cidade. Seria, antes, um dever para qualquer órgão de imprensa. Dever que a Globo jamais cumpriu quando se encontravam no Palácio Guanabara governantes de sua predileção. Quando ela diz que denuncia os maus administradores, deveria dizer, sim, que ataca e tenta desmoralizar os homens públicos que não se vergam diante de seu poder. Se eu tivesse pretensões eleitoreiras de que tentam me acusar, não estaria aqui, lutando contra um gigante como a Rede Globo. Faço-o porque não cheguei aos 70 anos de idade para ser um acomodado.

Quando me insultam por minhas relações administrativas com o Governo Federal, ao qual faço oposição política, a Globo vê nisso bajulação e servilismo. É compreensível. Quem sempre viveu de concessões e favores do poder público não é capaz de ver nos outros senão os vícios que carrega em si mesmo.

Que o povo brasileiro faça seu julgamento, e, na sua consciência lúcida e honrada, separe os que são dignos e coerentes daqueles que sempre foram servis e gananciosos”.

Diante do término iminente do ato público, sem nenhuma confirmação das previsões catastróficas, discretamente, o aparato militar começava a ser desfeito e o sorriso nos semblantes dos soldados, armados até os dentes, demonstrava a incredulidade diante do ato público que, de acordo com os organizadores, foi “a mais bem sucedida ação pública contra o gigante midiático que lidera a concentração dos meios de comunicação do país”, segundo o jornalista Marcos Pereira, também coordenador do Barão de Itararé.

– Mais importante do que o número de pessoas na manifestação foi o seu peso simbólico. Hoje, as Organizações Globo temem a população. Mais do que nunca, sabem que já não são mais capazes de manipular as notícias, na tentativa de enganar os brasileiros. Hoje, vamos às ruas para mostrar que os tempos mudaram e é preciso acabar com o cartel que tenta impedir a democratização da comunicação no país – afirmou, enquanto um grupo puxava slogans como “o povo não é bobo, abaixo a Rede Globo” e “a verdade é dura, a Rede Globo apoiou a ditadura”.

“E ainda apoia”.

Robô apaixonado - por Coolvibe (Arte digital)

Das empresas que funcionária da Receita envolveu em suas fraudes, só Globopar escapou de testemunhar na Justiça – por TC (Vi o mundo)

Dos quinze processos a que Cristina Maris Meinick Ribeiro responde ou respondeu na Justiça Federal do Rio de Janeiro, os donos, sócios ou funcionários de empresas que ela teria beneficiado — ou que foram citadas nos processos — acabaram incluídos como réus ou testemunhas em todos, com uma única exceção: a Globopar, empresa controladora das Organizações Globo, nem foi chamada para testemunhar na ação em que foi citada pelo significativo valor de R$ 600 milhões.

Agora, sete anos depois da autuação da Receita, com o vazamento da existência do processo a Procuradoria da República no Distrito Federal (PR-DF) abriu apuração criminal preliminar para investigar suspeitas de sonegação.

Cristina Ribeiro era agente administrativa da Receita Federal. Em 23 de janeiro de 2013, o juiz Fabrício Antonio Soares condenou-a a 4 anos e 11 meses no processo no qual ela foi acusada de, através de fraude eletrônica no sistema da Receita, ajudar as empresas Mundial S/A Produtos de Consumo, Forjas Brasileiras S/A e P&P Porciúncula, além de dar sumiço num processo relativo à Globopar.

Como notou o juiz, o processo da Globopar envolvia uma cobrança superior a 600 milhões de reais – 183 milhões de imposto devido, 157 milhões de juros e 274 milhões de multa. Foi resultado do Processo Administrativo Fiscal de número 18471.000858/2006-97, sob responsabilidade do auditor Alberto Sodré Zile. Como ele constatou crime contra a ordem tributária, pelo menos em tese, abriu a Representação Fiscal para Fins Penais sob o número 18471.001126/2006-14.

Fisicamente, os dois estavam anexados.

A existência da cobrança foi primeiro revelada pelo blogueiro Miguel do Rosário, n’O Cafezinho. Posteriormente, Miguel atuou em parceria com tuiteiros e blogueiros, especialmente com O Tijolaço, de Fernando Brito. Especulou-se sobre o sumiço do processo, até a revelação de que Cristina tinha sido condenada pela retirada da papelada relativa à Globo de uma repartição da Receita no Rio.

Rodrigo Vianna, do Escrevinhador, testou a hipótese de que o sumiço teria relação com um acordo entre Globo e o governo Lula, fechado entre o primeiro e o segundo turnos das eleições de 2006.

Fernando Brito, d’O Tijolaço, apresentou uma cronologia importante, reproduzida parcialmente abaixo:

1– A Globo é autuada em 16 de outubro de 2006 por sonegação de impostos devidos pela compra dos direitos de transmissão da Copa de 2002. Total da autuação: R$ 615 milhões.

2 — No dia 7 de novembro, José Américo Buentes, advogado da Globo, passa recibo de que recebeu cópia da autuação.

3 – No dia 29 deste mesmo mês, a Globo apresentou uma alentada defesa, de 53 páginas, pedindo a nulidade da autuação.

4 — No dia 21/12/06, a defesa da Globo foi rejeitada pelos auditores.

5 — No dia 29/12/2006, o processo é remetido da Delegacia de Julgamento I, onde havia sido examinado, para o setor de Sistematização da Informação, de onde são expedidas as notificações. Uma sexta-feira, anote.

6 — Sábado, 30; Domingo, 31; Segunda, 1° de janeiro, feriado. Dia 2, primeiro dia útil depois da remessa do processo ao setor, a servidora Cristina Maris Meirick Ribeiro, que estava de férias, vai à repartição, pega o processo, enfia numa sacola e o leva embora.

A Globo nega qualquer relação com o sumiço do processo. Em nota, disse que só ficou sabendo da condenação de Cristina pelo “extravio” em 9 de julho deste ano. Acrescentou: “A Globo Comunicação e Participações não é parte no processo, não conhece a funcionária e não sabe qual foi sua motivação”.

A empresa havia informado, em nota anterior, que não tem qualquer dívida com a Receita relativa ao fato que motivou a acusação de sonegação, a compra dos direitos de TV da Copa do Mundo de 2002. Para a Receita, a Globo usou indevidamente uma empresa de nome Empire no refúgio fiscal das ilhas Virgens britânicas. Investiu nela e, um ano depois, se desfez da empresa. Com o capital, pagou pelos direitos de TV sem recolher os impostos devidos ao Fisco, aplicáveis na compra dos direitos de eventos internacionais.

“A pessoa jurídica realizou operações simuladas, ocultando as circunstâncias materiais do fato gerador de imposto de renda na fonte”, escreveu um funcionário da Receita no processo.

“Todos os procedimentos de aquisição de direitos de transmissão da Copa do Mundo de 2002 pela TV Globo deram-se de acordo com as legislações aplicáveis, segundo nosso entendimento. Houve entendimento diferente por parte do Fisco. Este entendimento é passível de discussão, como permite a lei, mas a empresa acabou optando pelo pagamento”, disse a Globo em nota.

No processo que levou à condenação de Cristina Ribeiro, a Globopar não foi ouvida nem como testemunha. O mesmo não valeu para outras empresas em tese beneficiadas por Cristina.

Como revelou o Viomundo, o dono e dois funcionários da empresa Forjas Brasileiras — incluída na mesma ação em que a Globopar é citada — foram condenados.

Localizamos outros 14 processos que envolvem o nome de Cristina na Justiça Federal do Rio de Janeiro.

A maioria é por fraude em créditos de compensação tributária. Também há um processo no qual Cristina é acusada de emitir novos CPFs para pessoas com nome sujo na praça. No caso das empresas, há desde multinacionais até loja de material de construção.

Em todos os casos, funcionários, diretores e até presidentes das companhias são réus no processo, exceto no caso da Globopar.

Por sinal, é o único em que foi registrado o furto do processo, já que a maioria das ações é por inserção de dados falsos no sistema da Receita Federal. O da Globopar é o processo com o maior valor registrado.

Cristina nega tudo e argumenta que a senha dela teria sido usada por outra pessoa.

Todos os processos estão acessíveis no site da Justiça Federal do Rio de Janeiro.

São os seguintes:

1 – 0006497-41.2012.4.02.5101

07ª Vara Federal do Rio de Janeiro

AÇÃO CIVIL PÚBLICA/IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

Histórico: Cristina é acusada de adulterar o sistema e trocar o CPF de 12 pessoas que estavam com problemas no Serasa e ficaram com o crédito reabilitado. Entre as pessoas, há uma recepcionista terceirizada que trabalhava com ela na Receita.

2 – 0011843-12.2008.4.02.5101  

20ª Vara Federal do Rio de Janeiro

AÇÃO CIVIL PÚBLICA/IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

Histórico: Desdobramento do processo acima. Também são réus dois homens que trocaram o número do CPF e abriram empresas fraudulentas com o CPF novo.

3 – 0013029-31.2012.4.02.5101    

02ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro

AÇÃO PENAL

Empresa beneficiada: Cor e Sabor Distribuidora de Alimentos

Histórico: Cristina é acusada de criar créditos tributários fictícios para a empresa, que usou para compensação fiscal. É uma empresa que fornece quentinhas para o Governo do Rio.

4 – 0027491-90.2012.4.02.5101    

08ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro

AÇÃO PENAL

Empresa beneficiada: TORRE DE PARIS MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO

Histórico: Cristina é acusada de criar créditos tributários fictícios para a empresa, que usou para compensação fiscal. Entre os réus está um advogado tributarista.

5 – 0802017-60.2007.4.02.5101   

01ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro

AÇÃO PENAL/PECULATO

Não há maiores informações sobre este processo

6 – 0803728-66.2008.4.02.5101    

02ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro

AÇÃO PENAL

Empresa beneficiada: Megadata Computações Ltda

Histórico: Cristina é acusada de criar créditos tributários fictícios para a empresa, que usou para compensação fiscal. Cristina alterou os dados de uma mulher deficiente física que pediu isenção de IPI para um pedido de habilitação de crédito e usou para criar os créditos para a empresa. A Megadata é uma empresa do grupo Ibope e realiza todo o processamento do seguro obrigatório (DPVAT) do país. Um dos réus é Homero Frederico Icaza Figner, presidente da Megadata. Ele é sócio de Carlos Augusto Montenegro.

7 – 0803937-35.2008.4.02.5101    

04ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro

AÇÃO PENAL

Empresa beneficiada: Banas Calçados e Componentes Ltda

Histórico: Cristina é acusada de criar créditos tributários fictícios para a empresa, que usou para compensação fiscal. A Banas é da cidade de Canindé, no Ceará.

8 – 0806856-31.2007.4.02.5101    

03ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro

AÇÃO PENAL

Empresas beneficiadas: Mundial S/A Produtos de Consumo, Forjas Brasileiras S/A, P&P Porciúncula e Globopar.

Histórico: Caso da Globo já revelado anteriormente.

9 – 0809204-22.2007.4.02.5101

08ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro

AÇÃO PENAL

Empresa Beneficiada: Prevcor Ipanema S/A

Histórico: Cristina é acusada de criar créditos tributários fictícios para a empresa, que usou para compensação fiscal. A Prevcor é uma rede de clínicas de cardiologia no Rio de Janeiro. Eles usaram títulos da Eletrobras que estavam prescritos e com a ajuda de Cristina conseguiram habilitar o crédito de mais de R$ 600 mil.

10 – 0814243-63.2008.4.02.5101    

07ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro

AÇÃO PENAL/ESTELIONATO

Histórico: Não há dados disponíveis com detalhes da ação. O réu é o advogado tributarista Walmir Antonio Barroso, que possui um grande escritório no Rio de Janeiro.

11- 0814324-46.2007.4.02.5101   

04ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro

AÇÃO PENAL

Empresa beneficiada: Vicari Indústria e Comércio de Madeira

Histórico: Cristina é acusada de criar processo falso de habilitação de crédito tributário reconhecido por decisão judicial para compensação tributária. Este tipo de procedimento exige que a empresa apresente os documentos à Receita para o andamento do processo. No entanto, a empresa foi habilitada a compensar mais de R$ 4 milhões sem entregar nenhum papel. A Vicari é uma empresa de São Paulo que fabrica embalagens e pallets de madeira.

12 – 0814710-76.2007.4.02.5101    

01ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro

AÇÃO PENAL

Empresa beneficiada: Bem Nutritiva Comércio de Alimentos Ltda

Histórico: Cristina é acusada de criar créditos tributários fictícios para a empresa, que usou para compensação fiscal. A Bem Nutritiva é uma empresa de merenda que fornece para a rede pública de ensino do Rio de Janeiro. Um dos réus era sócio do Canecão.

13 – 00814711-61.2007.4.02.5101    

05ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro

AÇÃO PENAL

Empresa beneficiada: KRONES DO BRASIL LTDA

Histórico: Cristina é acusada de criar processo falso de habilitação de crédito tributário reconhecido por decisão judicial para compensação tributária. Ocorre que foi habilitado o crédito de uma empresa do Rio Grande do Sul para uma empresa de São Paulo em uma agência da Receita do Rio de Janeiro. Além disso, os créditos tributários de mais de R$ 8 milhões foram cedidos por uma pequena fábrica de sapatos de Sapiranga (RS), a Musa Calçados, para uma multinacional alemã, gigante no setor de embalagens para bebidas, a Krone. A legislação não autoriza este tipo de cessão. O presidente da empresa alemã, da empresa de calçados e Cristina são réus no processo.

14- 0814756-65.2007.4.02.5101    

07ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro

AÇÃO PENAL

Empresa beneficiada: AGRÍCOLA FERRARI LTDA

Histórico: Cristina é acusada de criar processo falso de habilitação de crédito tributário reconhecido por decisão judicial para compensação tributária. A Agrícola Ferrari é uma empresa de Passo Fundo (RS) produtora de milho de pipoca, entre outros produtos. Nesta ação, o Ministério Público federal informa que eles identificaram mais de 70 empresas que se beneficiaram do esquema fraudulento.

15 – 0817045-34.2008.4.02.5101    

02ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro

AÇÃO PENAL

Empresa beneficiada: Profarma Distribuidora de Produtos Farmacêuticos

Histórico: Cristina é acusada de criar processo falso de habilitação de crédito tributário reconhecido por decisão judicial para compensação tributária. A Profarma teria adquirido créditos tributários da empresa Artur Lange S/A, uma pequena indústria de cosméticos que fica em Turucu (RS). O dono da empresa, Manoel Birmarcker, presidente do Sindicato do Comércio Atacadista de Drogas e Medicamentos, foi absolvido. A Justiça entendeu que a culpa era dos consultores que ele contratou – e de Cristina.

PS do Viomundo: *TC é experiente repórter investigativo que por enquanto prefere não se identificar.

sábado, 13 de julho de 2013

Fotografia - por Tito Dalmau (Everyday I Show)

O ataque de Augusto Nunes a Lula é pedagógico

Ele prova quanto a sociedade está indefesa diante de agressões.

Nunes
Um texto de Augusto Nunes na Veja ilustra a necessidade torrencial de discutir os limites da mídia no Brasil.

Todo país socialmente avançado tem regras e limites em nome do interesse público.

Para recordar, a Inglaterra, berço da liberdade de imprensa, recentemente promoveu esta mesma discussão depois que um jornal de Rupert Murdoch foi pilhado invadindo a caixa postal do celular de uma garota de 13 anos sequestrada e morta.

Um juiz – o discreto, sereno e brilhante Brian Leveson, que ao contrário dos nossos guarda uma distância intransponível da mídia e dos políticos – comandou os debates, travados sob o seguinte consenso: a mídia existe para servir a sociedade e não o oposto. E não está acima da lei e nem de regras.

O texto de Augusto Nunes me chegou por duas fontes, o que mostra o quanto ele incomodou quem não é fanático de direita.

Numa tentativa bisonha de humor, ele compila títulos de um livro com o qual Lula se candidataria à ABL. Os nomes são sugestões de leitores, e ali você pode ver o nível mental de quem lê Nunes.

Lula é chamado de bêbado, ladrão, molusco, burro, afanador, cachaceiro, larápio e cachaceiro, entre outras coisas.

É um texto que jamais seria publicado na Inglaterra por duas razões. A primeira é cultural: há décadas já não se aceita entre os ingleses este tipo de jornalismo insultuoso e boçal. A segunda é jurídica: a Justiça condenaria rapidamente o autor e imporia uma multa exemplar não só a ele, autor, mas ao veículo que publicou a infâmia.

Não se trata, como cinicamente se poderia argumentar, de censura. Mas de proteção à sociedade contra excessos da mídia.

Em outra circunstância, se alguém quisesse escrever o que quisesse do próprio Augusto Nunes, ele também estaria protegido. Esta a beleza da proteção.

Liberdade de expressão não significa licença para publicar tudo. Um juiz americano mostrou isso de uma forma didática ao falar na hipótese de alguém que chegasse a um auditório lotado e gritasse “fogo”.

Pessoas poderiam morrer no caos resultante do pânico. A liberdade de expressão não poderia ser invocada por quem falasse em fogo.

Murdoch foi obrigado a se submeter a duas sabatinas em que o juiz
Leveson questionou o tipo de jornalismo feito em seus jornais
A desproteção à sociedade no Brasil é tamanha que, num caso clássico, diretores da Petrobras tiveram que processar Paulo Francis pela justiça americana depois de repetidas vezes serem chamados de corruptos.

Para sorte dos diretores da Petrobras, as acusações de Francis foram feitas em solo americano, no Manhatan Connection. A ação seguiu seu curso – sem que ninguém conseguisse interferir, o que fatalmente teria ocorrido sob a justiça brasileira. (Serra e FHC se mobilizaram a favor de Francis.)

Tudo que a justiça americana pediu a Francis foram provas. Ele não tinha. Diante da possibilidade de uma multa que o quebraria, ele se aterrorizou e morreu do coração.

No Brasil, Ayres Britto – autor de um absurdo prefácio num livro de Merval – acabou com a Lei da Imprensa quando era do STF, e deixou a sociedade sem sequer direito de resposta e exposta a arbitrariedades e a agressões de quem tem muito poder e pouco escrúpulo em usá-lo.

Para as empresas de mídia, foi mais uma vantagem entre tantas outras. Para a sociedade, foi um recuo pavoroso: ela foi posta em situação subalterna perante a imprensa.

O bom jornalista Flávio Gomes, no Twitter, afirmou que Lula deveria processar Nunes.

Isso se ele pudesse processar nos Estados Unidos, e não no Brasil. Aqui seria simplesmente inútil: o processo seria usado freneticamente como prova de intolerância de Lula à “imprensa livre”, aspas e gargalhada.

E não daria em nada.

Melhor respirar fundo e seguir em frente, para Lula ou para quem enfrente tanta infâmia.

Mas isso não elimina o fato de que o texto é uma prova do primitivismo da mídia brasileira e da legislação que deveria colocar limites claros e intransponíveis.


Não fazer nada em relação a isso – debater limites como a Inglaterra — é um caso de lesa pátria.

quinta-feira, 11 de julho de 2013

Princesa Dayak (etnia Bornéu) - Fotografia - por Inspiration Hut

Sobre a greve geral, o PT, a política e a burguesia brasileira

     A greve geral foi um sucesso, com uma pauta nobre, íntegra, bem elaborada, que ataca as piores mazelas da sociedade brasileira.
     É evidente que um protesto contra a corrupção é positivo, porém, é limitado. Ser contra a corrupção (ao menos no discurso) todo mundo é. Difícil é defender pautas que trazes impactos a burguesia, que confrontam interesses arraigados, que ajudam os trabalhadores a majorarem seus benefícios:

PAUTA UNIFICADA DAS CENTRAIS SINDICAIS E DOS MOVIMENTOS SOCIAIS

- Redução da Jornada de Trabalho para 40h semanais, sem redução de salários;
- Fim do fator previdenciário;
- 10% do PIB para a Educação;
- 10% do Orçamento da União para a Saúde;
- Transporte público e de qualidade;
- Reforma agrária;
- Fim dos Leilões do Petróleo e todo tipo de privatização;
- Contra o PL 4330, sobre Terceirização;
- Reforma política e realização de plebiscito popular;
- Reforma urbana;
- Democratização dos meios de comunicação;
- Contra o genocídio da juventude negra e dos povos indígenas;
- Contra a repressão e a criminalização das lutas e dos movimentos sociais;
- Pela punição dos torturadores da ditadura.


     Alguns reacionários de merda não quiseram apoiar porque seria um movimento da CUT ou do PT. Bem, é extremamente lamentável ouvir alguém falar desta maneira, com um pré-conceito porque alguém participa de determinada corrente sindical ou partido político. Por que não avaliaram a pauta - e tomaram a decisão de apoiar ou rejeitar o movimento a partir do que ali era defendido?

     Eu não sou petista, meu candidato nas últimas eleições presidenciais foi o Plínio de Arruda Sampaio (P-SOL), porém, fico extremamente consternado todas as vezes que vejo alguém com uma postura preconceituosa, caluniando pessoas que sequer conhece apenas porque participa de alguma agremiação política (qualquer que seja ela). Além do mais, conheço vários petistas, pessoas sérias e honesta e, cada vez que vejo alguém dizer estas infâmias fico sinceramente ofendido, porque caluniam pessoas pelas quais tenho respeito.
     Pergunto: qual é o tamanho da ignorância de uma pessoa que calunia alguém por participar do PT, partido que possui mais de um milhão de filiados? Como pode identificar característica singular no meio de tanta gente? Este erro já se repetiu, já identificaram e caluniaram grandes grupos apenas por terem alguma religião (judaica) ou raça (negra), que supostamente acarretaria defeitos na personalidade. É um absurdo completo, a história se repetindo como farsa, como disse Marx.
     Todas as vezes que vejo a expressão “petralha”, sinto um nojo absoluto, vejo a repetição deste erro histórico, um pré-conceito, uma calúnia, uma diminuição do ser humano sem ao menos conhecê-lo, apenas porque participa de um agrupamento qualquer. É uma tragédia e, os fascistas que repetem este discurso, sequer identificam que estão sendo movidos pelos piores interesses possíveis, dando coro a corja mais putrefata que existe em nosso país, a direita mais abjeta, mais totalitária, que despreza o voto, o povo e a democracia, que tenta demonizar seu adversário político porque não tem discurso, não tem ética, muito menos voto para se contrapor a ele. Daí parte para a calúnia, posto que é o mais fácil, o que dispensa inteligência, caráter, história ou eficiência.
     É como o famoso aforismo de Pierre Beaumarchais: “Caluniai, caluniai: alguma coisa sempre fica”.
     Justamente os maiores corruptos da história do Brasil repetem um discurso caluniador, posto que não tem absolutamente nada, nada de melhor a oferecer.

     Sou um admirador frustrado do PT, reconheço que é um partido que possui uma bela história, foi a personificação da causa trabalhista brasileira nas décadas de 80 e 90, porém, o Brasil mudou, o mundo mudou e o PT também, o partido fez concessões que eu não estou disposto a fazer (aliás, “as concessões são a ante-sala da traição”, disse certa vez Che Guevara), o PT fez alianças com uma parte reconhecidamente corrompida do estamento (aquela que acompanha todos os governos, independente de quem lá esteja, visando se locupletar do Estado), adotou uma política econômica pra lá de controversa, especialmente no governo Lula (pra se ter uma ideia, Lula chegou a se gabar diversas vezes em entrevistas dizendo que os banqueiros nunca tiveram tanto lucro como em seu governo – um escândalo), não reviu a lei da anistia, fez péssimas indicações ao STF e a PGR (e sofreram na pele por estas concessões), não fez a reforma agrária, etc. Enfim, não fez um governo de esquerda – para o qual foi eleito, frise-se. Quisesse o país um governante de direita, teria dado sequência ao PSDB no poder e eleito o Serra em 2002.

     Há diversas partes positivas também a se destacar, as políticas sociais (aumento do salário mínimo – a maior política social do governo Lula –, programas de cotas, bolsa-família), retorno dos investimentos estatais, apoio a indústria naval, política externa mais independente, ampliação do papel do estado – mesmo no combate a corrupção, com aumento drásticos dos quadros da polícia federal e da CGU –, e, um dos maiores feitos, a grande ampliação de investimentos na educação, mais do que dobrando o número de escolas técnicas, mais do que dobrando o número de vagas em instituições federais de ensino, afora o grande pessoal do Pró-uni, etc.
     Ou seja, a depender da ótica que se avalie, pode-se apreciar, pode-se depreciar o governo. Sempre penso que a análise definitiva do governo Lula depende do parâmetro que adotaremos. Se a comparação for com o que o governo poderia ter sido, ele foi muito mal. Se a comparação for com o governo FHC, foi um sucesso.


A burguesia brasileira e sua representação política

     Avalio que a elite brasileira possa ser dividida em três grandes grupos. O primeiro é a sequência da própria corte portuguesa, é aquela já aqui destacada, que se apodera do Estado, que vive as expensas dele, que quer estar no governo independente do partido que esteja no comando do país: é representada politicamente por diversos partidos, notoriamente o PMDB, mas também diversos outros (PP, PR, DEM, PSD, PSB, PTB, PDT – estes dois últimos tinham uma bela história que se esfarelou no tempo –, etc.).
     Não possuem ideologia nenhuma, são agrupamentos de interesses, possuindo eventualmente bons quadros (como Ciro Gomes no PSB, por exemplo), mas são no quadrante geral uma força do atraso para o país. 

     A segunda divisão, é a burguesia industrial, que foi a majoritária no mundo dos anos 40 ao final dos 70 e, que com todas as suas antinomias (lucros abusivos, danos ambientais, exploração da mão-de-obra, etc.), ainda assim, também possui rescaldos positivos, quais sejam: geração de emprego, renda e impostos. Esta parcela da burguesia foi a que o PT nasceu combatendo e, pasmem, é justamente a qual ela representa hoje.
     Esta parcela da direita, até por uma questão de classe, não se sente plenamente representada pelo PT, mas, avaliando-se criticamente, não há nem haverá dentro do quadrante político brasileiro um governo tão favorável aos empresários como o de Dilma Roussef. Ela, keynesiana clássica, acredita no desenvolvimento do país via indústria, via consumo, via produção. Não à toa o governo promove tantas concessões, desonerações diversas, estimula o BNDES a emprestar bastante, etc.

     A terceira divisão (para mim a pior delas), é a burguesia financeira, aquela vinculada ao mercado financeiro, que possui sua expressão política no PSDB. O PSDB é o partido do mercado financeiro e esta parcela da burguesia não traz rescaldo positivo nenhum. É concentradora de renda, não gera emprego, não gera impostos, faz uma corrupção límpida, por cima, se apropria dos recursos públicos muitas vezes sem sequer precisar “sujar as mãos”.
     Para citar um único caso, o da privatização do Banestado (banco estatal do Paraná), através do PROER, o governo FHC deu 5,2 bilhões de reais para que o Banestado fosse “saneado”. Em seguida, ele foi privatizado, por R$ 1,5 bilhão de reais, sendo que tinha, só de créditos a receber, R$ 1,6 bilhão de reais. Estes valores, frise-se, são da época. Esta é a corrupção moral, corrupção bilionária, a qual FHC fez em todo seu governo. Mas isto não dá notícia, não é escândalo, provavelmente quem leu agora nunca tivesse ouvido falar (já do mensalão...).
     Isto não implica dizer, claro, que também não sujassem as mãos, pra quem quiser saber da corrupção clássica no governo FHC, basta procurar saber sobre o próprio Banestado, tudo que ocorreu por lá afora sua privatização (há coisas, pasmem, piores ainda).
     O governo FHC, como já foi dito, foi majoritariamente dominado pela burguesia financeira. Porém, uma coisa até cômica, é que esta parte do conservadorismo nacional olhava com desprezo a outra parte também representada no governo tucano, eles viam com desprezo a parte corrupta vinculada ao Estado, na época, representada pelo então PFL (que sempre muda de nome de modo a esconder suas práticas).

     Uma coisa interessante é que a mídia brasileira e global foi totalmente dominada pelos interesses da burguesia financeira, é esta parcela do conservadorismo que eles representam. Por que a mídia se tornou neoliberal e “abandonou” os empresários? Porque hoje é no mercado financeiro que o dinheiro rola mais fácil, o mercado possui dinheiro fácil, muito dinheiro circulando o tempo todo. Já os empresários possuem grandes recursos, porém, investidos, não tem tanto dinheiro a mão.
     Não à toa há tanto apoio da mídia ao PSDB.

     Aliás, esta é outra coisa a se pontuar: não é a mídia que trabalha para o PSDB, é o PSDB que trabalha para (os financiadores d)a mídia. Daí o enorme apoio que o PSDB recebe.
     Não parece, mas interessa ao mercado financeiro, interessa a mídia um PSDB fraco, completamente dominado, cerceado, dependente fundamentalmente da mídia, interessa a ela que o PSDB seja um partido que não tenha base social – como não tem. Por que? Porque desta maneira o PSDB jamais, jamais poderá se contrapor a qualquer desígnio do mercado financeiro. Será sempre um cachorrinho de suas vontades. No dia em que discordar, cai – porque não possui base social nenhuma.
     É interessante, porque os próprios tucanos não conseguem compreender a extensão do domínio a que eles estão submetidos.
     Um candidato como Aécio Neves é a crua expressão desta tentativa de dominação.
     Qualquer pessoa minimamente séria e informada sabe que Aécio não possui capacidade nenhuma de governar um país, é um personagem muito mais preocupado com as noites do RJ do que com o futuro da nação. Por que então ele? Porque é justamente uma peça facílima de se dominar.
     Aliás, no caso nem precisava. Aécio Never não tem as ideias dominadas pelo mercado financeiro: ele simplesmente não tem ideia alguma.