sábado, 29 de agosto de 2015

Fotografia - por Zuzana Mitošinková (mitosinkovie)

‘‘A nossa troika está aqui’’ - por Márcia Pinheiro (Revista Brasileiros)

A crise brasileira tem similaridade com a da Grécia, pela ideia de que o ajuste vai fazer com que seja restaurada a confiança dos investidores e a irrealidade da meta. Mas a nossa Alemanha está aqui dentro, representada pelo mercado financeiro, diz Luiz Gonzaga Belluzzo
A economia nacional tem vários “cadáveres”, que apareceram com mais contundência neste ano.
Um deles é a valorização do câmbio, segundo Belluzzo.
Foto: Marcos Coil
     O economista Luiz Gonzaga Belluzzo afirma que a crise brasileira se assemelha à da Grécia. Com uma única diferença: “A nossa troika está aqui. É representada pelo mercado financeiro e pela visão truncada e míope de seus economistas”.

     Professor da Unicamp, sócio da FACAMP, da consultoria Una e da revista Carta Capital, Belluzzo diz que a presidenta Dilma Rousseff deveria ter negociado o ajuste fiscal – de resto, necessário – com os sindicatos e os movimentos sociais, que a reelegeram.

     Infelizmente, não é o único problema. Para Belluzzo, a economia nacional tem vários “cadáveres”, que apareceram com mais contundência neste ano. A valorização do câmbio nos últimos 20 anos é um deles, o que provocou um processo de desindustrialização. Um segundo é o injusto sistema tributário. Nada menos do que 58% da receita dos impostos é paga pelas camadas de renda de até dois salários mínimos.

     O economista defende uma total reestruturação nas empresas envolvidas na operação Lava Jato. A exemplo do que fizeram os Estados Unidos na crise das hipotecas, o governo deveria assumir as companhias, saneá-las e, posteriormente, vendê-las em leilões ou em operações de abertura de capital.

     Ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda (governo Sarney), Belluzzo recebeu a reportagem da Brasileiros em seu apartamento em São Paulo, que mais se assemelha a uma bem cuidada e catalogada biblioteca. A seguir, os principais trechos da entrevista.

Brasileiros – Por que a recessão no Brasil chegou com uma velocidade tão acentuada?
Luiz Gonzaga Belluzzo – Temos algumas vulnerabilidades que se manifestaram agora. É preciso traçar a trajetória real do que aconteceu. Vamos voltar à reação da economia brasileira à crise de 2008. Foi muito rápida. O Brasil vinha em um ritmo de expansão, impulsionado pelo ciclo de commodities e pelo crescimento da economia mundial. Nossa economia cresceu com base no consumo. Naquele momento, entre 2004 e 2008, fomos muito bem, também amparados pelas políticas sociais e pelos reajustes reais do salário mínimo. Isso elevou o poder de compra de grande parte da população. E houve uma queda muito pronunciada dos preços dos bens duráveis, por conta da agressividade chinesa nas exportações, principalmente os eletroeletrônicos. Isso fez com que a renda real, sobretudo das pessoas que ascenderam economicamente, tivesse o auxílio dos preços relativos. Eu sempre dou o exemplo da televisão de tela plana. Na Copa do Mundo de 2006, comprei uma de 42 polegadas por R$ 12 mil; hoje, custa R$ 2 mil. Além disso, veio a expansão do crédito consignado e a ampliação do crédito imobiliário, com o programa Minha Casa, Minha Vida. O cenário todo colaborou para o aumento do bem-estar das famílias. Conseguimos recuperar rapidamente o crédito em 2009. A crise era de contágio, uma vez que no Brasil não havia calote de hipoteca, como nos Estados Unidos. Mas, em 2011, o ciclo de consumo foi perdendo força. 

“A OPERAÇÃO LAVA JATO FOI A PÁ DE CAL NA CRISE. O PROGRAMA DE CONCESSÕES DE INVESTIMENTO PÚBLICO FICOU DANIFICADO GRAVEMENTE E A FUZILARIA MORALISTA ACABOU APAVORANDO O GOVERNO”

Mas do ponto de vista fiscal a situação não foi se deteriorando?
A relação entre o crescimento do PIB e da renda é de 2,5 por um. Quando a economia desacelera, isso se reverte. Se olharmos os primeiros anos do governo Dilma, é muito claro que a receita e o superávit primário continuaram a crescer, mas em menor ritmo. Em 2015, o superávit já é negativo na ponta. Portanto, a desaceleração da economia abriu espaço para o desequilíbrio fiscal. Outro dia, li uma análise de uns economistas mais ortodoxos, que dizia que as políticas sociais não cabem no PIB. Até brinquei: vai ver que eles querem jogar os velhos do penhasco.

Quais são as maiores deficiências do Brasil?
Há vários cadáveres enterrados. O primeiro deles, que os conservadores não gostam de discutir, é a valorização do câmbio nos últimos 20 anos. Agora, por exemplo, o câmbio está desvalorizando. E muitos dizem que isso prejudica a inflação. O efeito é maior, dado o percentual de componentes importados dos produtos feitos no País, que é de 27%. O problema não começa quando se deixa o câmbio desvalorizar, mas quando permite que ele se valorize, porque há uma mudança total nas cadeias produtivas. O Brasil passou 30 anos se afastando das cadeias produtivas globais. Os conservadores dizem – e isso é binário: precisa abrir a economia. Foi o que fizeram no governo Fernando Henrique. Quando Lula foi eleito, a taxa de câmbio se desvalorizou e o dólar foi a R$ 4, por medo do PT. Na média, ficou em R$ 3,58. Essa desvalorização foi acompanhada do ciclo de commodities. No fim de 2003 e início de 2004, a economia começou a crescer. Nós fomos muito bem em exportações de manufaturados. A Argentina cresceu 8% depois da crise da dívida de 2001/2002, o que elevou a demanda por produtos industrializados brasileiros. Havia superávit comercial de manufaturados e commodities. Em 2006/2007, a economia ainda estava bombando, mas esse efeito sobre a indústria foi se tornando menor, dada a política adotada pelo Antonio Palocci e seus agregados. No ano passado, o déficit comercial da indústria foi de US$ 117 bilhões. O agronegócio segurou a balança. Mas agora, o superávit desse setor está menor. Aumentamos as quantidades exportadas, mas os preços caíram. O que estava programado? O Brasil iniciar investimentos em infraestrutura. O Brasil é um importador líquido. Tínhamos uma participação importante no comércio internacional, durante o governo dos militares, com programas como o BEFIEX (Concessão de Benefícios Fiscais e Programas Especiais de Exportação). Isso era coisa do Delfim Netto e do Roberto Campos. O Delfim era desenvolvimentista e o Campos era sem saber. Ele se dizia liberal, mas não era. A partir dos anos 1990, a curva da competitividade da indústria brasileira começa a declinar de uma maneira impressionante. No campeonato da indústria nacional, o Brasil caiu para a terceira divisão.

Quais são os outros cadáveres?
O segundo cadáver é o sistema fiscal e tributário brasileiro, que é dos mais regressivos do mundo. As alíquotas, que eram elevadíssimas após a Segunda Guerra, começaram a retroceder. Nos Estados Unidos, começaram a taxar menos os riscos, porque supostamente são eles que investem, o que foi um desastre. E as pessoas no Brasil continuam a repetir essa besteira. No nosso sistema, 58% da receita fiscal é extraída das camadas de renda de até dois salários mínimos. O curioso é que dividendo não paga imposto; nem na fonte, nem na declaração. É a mesma lógica americana. O dividendo pertence ao acionista e supõe-se que, se ele receber mais, vai investir. É uma tolice, porque precisamos proteger a empresa, e não os acionistas. Portanto, nosso sistema fiscal é iníquo, além de ser muito sensível às flutuações da renda. Quando se fala em ajuste fiscal, eu penso: por que não temos um sistema tributário que taxe os mais ricos? Por que não taxar a renda, os ganhos de capital? Bill Clinton quando fez superávit, foi possível por cobrar imposto dos lucros em bolsa. No caso brasileiro, o sistema é todo marcado pela desigualdade. Qual é a participação dos juros da dívida pública no PIB? É 8% e vai crescer. De 2007 a 2011, o País pagou um PIB de juros. É uma transferência de renda perversa. Isso tem muito a ver com o conservadorismo de uma fração da sociedade.

E a Operação Lava Jato?
Foi, como dizia o general Ernesto Geisel, a pá de cal. A operação produziu uma paralisia na economia. O programa de concessões de investimento público ficou danificado gravemente e a fuzilaria moralista acabou apavorando o governo, que ficou imobilizado. Ninguém quer ver livres as ações inidôneas das empresas. Mas é preciso separar as coisas. Parece que agora o juiz Sérgio Moro acertou, pois disse ser preciso fazer acordos de leniência. É necessário fazer uma reestruturação das empresas envolvidas, e fazer com que paguem multas pesadas, entregando as ações que têm para o governo, que eventualmente poderá revendê-las em leilões ou aberturas de capital. Nos Estados Unidos, isso foi feito com os bancos, como o Citibank, a General Motors e a Ford.

A presidenta Dilma Rousseff agiu acertadamente ao baixar a meta fiscal?
Eu tenho dois cachorrinhos: o Karl Marx e o John Maynard Keynes. Eles me falavam: esse ajuste fiscal não vai dar certo. É óbvio. A economia em 2014 já começou a desacelerar fortemente. Em cima disso, a equipe econômica fez uma série de cortes na boca do caixa. Simultaneamente, para colocar a inflação na meta, o Banco Central subiu os juros de maneira agressiva. A dívida pública cresceu 3,5% somente em junho. Eles dizem que a dívida em 2018 vai chegar a 66% do PIB; é uma conta bastante frágil. Porque o mercado já aponta que ela vai além de 70% ainda neste ano.

“DILMA FOI ELEITA COM O COMPROMISSO DE MANTER AS CONQUISTAS SOCIAIS. MAS O ATUAL AJUSTE PROVOCA DESEMPREGO. O ERRO FUNDAMENTAL É QUE O CORTE DE GASTOS FOI FEITO DE CIMA PARA BAIXO”

De alguma forma, a crise brasileira tem similaridade com o que acontece na Grécia?
Tem sim, pela ideia de que o ajuste vai fazer com que seja restaurada a confiança dos investidores e a irrealidade da meta. É uma falsificação da ideia de Keynes de confiança. O economista dizia que, para progredir, os empresários precisariam melhorar as condições de seus balanços. Mas o que vai acontecer é a piora dos balanços. Para os consumidores, a mensagem é: vocês correm o risco de ficar desempregados. A população, então, corta gastos. Como os empresários estão vendo isso, os setores de bens de consumo não investem. Os indivíduos olham uns aos outros e chegam à conclusão de que não vai dar certo.

Qual seria a alternativa a esse modelo para o Brasil?
A situação fiscal não era, de fato, das melhores. As pessoas não gostam de falar de capitalismo; elas fogem do conceito. Dilma foi eleita com o compromisso de manter as conquistas sociais. A crise fiscal hoje tem um fundamento político. A independência do econômico do político é ingênua e de má-fé. Mas o atual ajuste atinge setores e pessoas diferentemente. Se provoca o desemprego, quem paga é o sujeito que chega em casa e diz: perdi meu trabalho. Qual foi o erro fundamental? Não foi a necessidade de se fazer um rearranjo das contas públicas. Foi feito de cima para baixo, na base tecnocrática. O governo deveria ter consultado as bases sociais que votaram na presidenta. Ela foi eleita com 54% dos votos. E quem a escolheu? Foram os eleitores do Lula, das regiões mais pobres do Brasil, cuja vida melhorou muito; cidadãos que subiram na escala social com a valorização do salário mínimo e o Bolsa Família. Os sindicatos e os movimentos sociais deveriam ter sido consultados. A Dilma vai me perdoar, e eu gosto muito dela, mas tem uma visão tecnocrática da situação. Isso não deu certo em nenhum lugar do mundo. Nisso somos muito parecidos com a Grécia. Só que a nossa Alemanha está aqui dentro. Não está fora. A nossa Troika está aqui: é representada pelo mercado financeiro e pela visão truncada e míope de seus economistas.

Além de um ajuste mais criterioso, quais seriam medidas que conduziriam o País ao crescimento?
Tenho grande resistência em aceitar a dicotomia pessimismo/otimismo. Nós devemos ter esperança. Ou seja, todos vamos trabalhar para que as coisas deem certo. Temos de deixar o câmbio desvalorizar mesmo, para proteger a indústria brasileira e recuperar a capacidade de coordenação do Estado brasileiro dos investimentos de infraestrutura.

O senhor tem conversado com a presidenta Dilma? 
Não. A última vez que conversei com ela foi em um almoço, junto com João Manuel Cardoso de Mello, em Campinas. Somos amigos dela. Mas isso não quer dizer que vamos concordar com o que ela está fazendo.

E com o Lula?
Com o Lula converso sempre. Ele sempre tem uma atitude muito positiva e criadora. Não se deixa abater, a despeito do que têm feito com ele. Isso de querer processá-lo por ter jantado com empresários, francamente! Eu gostei muito de uma entrevista com Ciro Gomes. Ele não tem medo e afirmou: “Ninguém vai dar golpe aqui, não! Nós vamos nos mobilizar”.

Fotografia - por Cole Rise (colerise.carbonmade)

Uma técnica nazista para explicar a queda de 1,9% do PIB no trimestre - por J.Carlos de Assis (Jornal GGN)

     O mantra dos economistas neoliberais martelado pela grande mídia para explicar a queda de 1,9% do PIB no segundo trimestre em relação ao primeiro é a falta de “confiança” na economia. Isso é mais ou menos como dizer que a culpa pelo sentimento de culpa é a culpa. Se o PIB caiu, é óbvio que muitos empresários deixaram de investir; e se deixaram de investir, é óbvio que não tiveram confiança no desempenho futuro da economia. Mas por que não tiveram confiança? Os neoliberais e a mídia que lhes serve nada dizem a respeito.

     Um garoto esperto da cadeira de Introdução à Economia poderia esclarecer isso com um comentário na ponta da língua: deixaram de investir porque não tem demanda; não tem demanda porque o investimento caiu; e o investimento caiu porque o único investidor que pode investir sem se preocupar com a demanda é o Estado, e os investimentos e gastos do Estado, em vez de aumentarem, foram cortados em função do arrocho de Joaquim Levy. O investimento público, eis a questão, é a chave da queda e da retomada.

     O que disse acima é uma síntese da doutrina keynesiana. Por que, então, os neoliberais falam em “confiança” como o elemento mágico de empurrar a economia? Simplesmente porque querem um Estado mínimo, com medo de um Estado maior e mais eficaz que implicaria transferência de renda para os pobres através de impostos e do gasto público. Contudo, como a queda da economia é um fato, e não ideologia, eles são obrigados a arranjar um culpado, e o culpado passa a ser a repetição de um mantra, confiança, que não explica nada pois é pura empulhação.

     Em outra oportunidade disse que a técnica nazista de controle da opinião pública era se apropriar de determinadas palavras e distorcer seu significado, fazendo uma lavagem cerebral nas pessoas pela repetição. Estamos vendo que não é necessário um Goebels para fazer a mesma coisa no Brasil contemporâneo. Temos um Goebels coletivo na grande imprensa, que, curiosamente, não faz isso por um partido, mas exclusivamente em favor do sistema financeiro especulativo. Claro, não é de graça. A banca são seus maiores anunciantes.

J. Carlos de Assis é jornalista, economista, doutor pela Coppe/UFRJ, autor do recém-lançado “Os sete mandamentos do jornalismo investigativo”, ed. Textonovo, SP.

quarta-feira, 26 de agosto de 2015

Gollum - por Mike Lim (Arte digital - Coolvibe)

O PT matou o petismo - por Aldo Fornazieri (Jornal GGN)

     O risco imediato do impeachment foi afastado, embora a inoperância do governo e a ação de alguns conspiradores – notadamente Aécio Neves e Gilmar Mendes – sempre ameacem recolocá-lo na ordem do dia. Não foram as raquíticas manifestações da última quinta-feira que barraram o impeachment, mas a constatação, por parte de setores da elite e setores da oposição, de que seu custo político, econômico e social seria alto demais e de que o país poderia mergulhar num cenário de consequências imprevisíveis. Assim, foram as notas das Federações de indústrias, o editorial de O Globo, as manifestações de presidentes dos grandes bancos nacionais pedindo estabilidade, que barraram, ao menos temporariamente, o agravamento da crise política. Lula e o governo negociaram pelo alto, procuraram Sarney e outros setores, para construir um arranjo de concessões e garantias. Mesmo assim, a situação está tão frágil e existem tantos fios desencapados que a lerdeza do governo ou uma fagulha política qualquer podem precipitar o incêndio.

     A observação dos acontecimentos políticos recentes permite concluir que nem o PT e nem o governo tiveram força política suficiente para manterem suas posições de poder. Essas forças faltaram no Congresso, no sistema político como um todo, e também nas ruas. Somente no entardecer do desfecho da crise, quando a chancela das elites para a continuidade de Dilma já tinha sido lavrada, é que as forças contra o impeachment saíram as ruas e, mesmo assim, com críticas variadas à condução da política econômica do governo.

     Esta situação demonstra o quanto o PT se enfraqueceu; o quanto não organizou os movimentos sociais de forma autônoma; o quanto não mudou a cultura política dos beneficiários dos programas sociais; o quanto não tensionou as suas alianças políticas; o quanto não apostou na realização de reformas estruturantes;   o quanto desmoralizou a própria militância de esquerda e o quanto matou as virtudes da militância antiga, que tinha orgulho em freqüentar as portas de fábrica, as periferias, as universidades, os movimentos sociais para distribuir panfletos, sustentando ideias e sonhos, enfrentando repressões e rejeições.

     Tudo isto acabou. As virtudes do ativismo e a coragem dos enfrentamentos se transformaram em escombros morais, em desmoralização e vergonha por um partido que se corrompeu, em ressentimentos e impotência pelas transformações não realizadas pelos governos petistas e em nostalgias por sonhos generosos que se desfizeram nas brumas dos enganos.

     Sim, foi legítimo sonhar. Foi legítimo sonhar porque o PT e o petismo de outrora representaram o ideal da justiça social e da igualdade, os valores da ética na política, a força da organização autônoma dos trabalhadores, a perspectiva da participação cívica e política da sociedade organizada. Ocorreram conquistas, não se pode negar. Os programas sociais são evidentes; a fome e a desigualdade foram reduzidas; o ensino foi ampliado; pobres e negros tiveram acesso à universidade; as condições de vida melhoraram de forma geral.

     Mas tudo isto foi pouco porque as condições estruturais da desigualdade e da injustiça não foram removidas; tudo isto foi pouco porque essas conquistas ameaçam retroceder por conta da crise econômica; tudo isto foi pouco porque o andar de cima ganhou muito mais do que ganharam os pobres; tudo isto foi pouco porque os que foram incluídos não se reconhecem num conteúdo político e organizativo da inclusão; tudo isto foi pouco porque a corrupção do PT e do governo derreteram o conteúdo e o sentido simbólicos dos avanços e tudo isto foi pouco porque foi pouco de fato.

     Para mostrar que foi pouco, não se fale aqui dos bilionários ganhos dos bancos, das suas isenções tributárias ou dos R$ 500 bilhões de sonegação de impostos por ano. Fale-se apenas de algumas extravagâncias dos governos petistas. O Bolsa Família custa cerca de R$ 25 bilhões anuais. Nos últimos três anos, o Banco Central acumula perdas de R$ 86 bilhões apenas para tentar conter a alta do dólar. Cálculos do próprio Ministério da Fazenda mostram que, nos próximos anos, os empréstimos do BNDES feitos desde 2009, a juros subsidiados, custarão R$ 184 bilhões aos cofres públicos. Desse custo total, R$ 97,5 bilhões recairão no período de 2015 a 2018. A lista e os valores das extravagâncias são enormes.

As muralhas de Jerusalém do PT ruíram

     O processo de formação do PT acabou precocemente com a chegada do partido ao poder. O partido ainda não havia elaborada uma consistência programática estratégica, uma sólida base de valores e princípios e ainda não contava com uma militância bem formada politicamente quando venceu as eleições em 2002. Tanto os líderes, quanto os militantes tinham uma frágil formação republicana. A jeremiada política, o discurso da advertência e dos riscos que as diversas formas e práticas da corrupção poderiam trazer ao partido e ao Brasil, nunca foi algo forte na retórica dos líderes petistas.

     A chegada ao poder sempre representa um momento de apogeu a qualquer forma de organização política. Neste momento a questão é: a forma perdura no poder pelo seu exemplo virtuoso, pela sua renovação política e moral e pela sua permanente retificação mediante a retórica da advertência (jeremiada), ou ela se corrompe e declina. Como já foi enfatizado muitas vezes, ao não possuir a ideologia republicana da virtude e da frugalidade, o PT se corrompeu. A ideologia dos palácios e dos gabinetes se sobrepôs à ideologia das ruas e das praças. A ideologia dos hotéis de luxo e dos restaurantes caros afogou a ideologia da militância combativa e do ativismo cívico. O PT dependente do Estado e do financiamento privado derrotou o PT-movimento da militância ativa. Os líderes do partido passaram a conviver com os endinheirados, não mais com os trabalhadores, com os humildes, com os intelectuais, com os estudantes. Estes só foram procurados nas campanhas eleitorais.

     A semente da erva daninha foi sendo cultivada pelo dinheiro fácil, pelas benesses dos ambientes luxuosos, pelos grandes interesses dos negócios inescrupulosos. A ambição e a cobiça dominaram corações e mentes de muitos petistas. Sequer as prisões do mensalão foram suficientes para estabelecer um freio. Os dirigentes e militantes honestos se sentiram inibidos e foram incapazes de assumir o discurso da advertência. Neste ambiente de dissolução política e moral, nenhum Jeremias surgiu para que a voz do correto e do honesto se fizesse ouvir com força. O escândalo da Petrobrás e as novas prisões de petistas já indicavam um realidade de devastação na cidadela petista. E, finalmente, a segunda prisão de José Dirceu, o homem que, junto com Lula, havia construído a fortaleza partidária, representou a ruína das muralhas da Jerusalém petista e do seu templo.

     Simbolicamente, a essa destruição da Jerusalém petista não se assemelha àquela promovida por Nabucodonosor em 586 a. C. Se assemelha mais àquela promovida pelo imperador romano Tito, em 70 depois de Cristo. O que sobreveio à destruição foi a diáspora dos hebreus. O claro-escuro com que hoje a crítica pinta o PT significa que sua forma antiga envelheceu e que está acabada. Não pode mais rejuvenescer. Não significa que o PT desaparecerá, mas que é outra coisa do que era outrora. A virtude política, o ativismo cívico e o partido-movimento terão que nascer em uma nova forma.

Aldo Fornazieri – Professor da Escola de Sociologia e Política de São Paulo.

quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Fotografia - por National Geographic

O crime perfeito - por Vladimir Safatle (CartaCapital)


     O Brasil não é para amadores, já dizia Tom Jobim. De fato, enquanto vários outros países latino-americanos tiveram longos períodos de conflitos violentos no interior de suas elites, com rupturas muitas vezes traumáticas, o Brasil conseguiu apresentar continuidades impressionantes. Sua elite tem o dom do acordo e da autopreservação. Ela sabe como criar situações nas quais toda tentativa de entrar em confronto contra seus interesses sai perdendo.
Há de se admirar a astúcia da elite
brasileira na defesa de seus interesses
José Cruz/Agência Brasil

     Mas há de se reconhecer que existem momentos nos quais a inteligência animal de nossa elite supera toda expectativa, demonstrando laivos de genialidade mefistofélica. Um desses momentos é exatamente o presente. Se eu fosse afeito à teoria da conspiração, diria que estaríamos vendo atualmente o crime perfeito.

     No fim da eleição de 2014, o Brasil demonstrou-se radicalmente clivado. Era óbvio que tal clivagem não passaria, pois o nível de descontentamento e expectativa era muito alto para todos voltarem aos negócios de sempre. Em uma situação como essa, a primeira coisa a fazer é fortalecer a mobilização de seu próprio grupo. Você governa primeiro para quem te elegeu, ou seja, levando em conta as expectativas de quem te elegeu, pois são essas pessoas que te defenderão em contextos de tensão.

     Mas eis que algum grande estrategista palaciano sugeriu uma manobra radical. O governo deveria esvaziar o discurso da direita, ao realizar o que Lula fez várias vezes, a saber, aplicar ações propostas pelo próprio adversário, colhendo nomes na seara do adversário para construir seu ministério. Assim, Dilma daria um sinal para os opositores e para a elite rentista do País. Algo como: “Fiquem tranquilos, pois não haverá conflitos de interesses com o governo”. A ala de esquerda da população que votou no governo viria por gravidade. Afinal, não haveria nenhuma outra opção para eles, gente que pode gritar, espernear, mas no final vota no governo e ainda faz campanha mobilizada pelo medo de a direita voltar.

     Infelizmente, desta vez, o truque não funcionou. Ele foi aplicado de maneira muito farsesca para funcionar. Cansados de confiar em um governo que não temeu abraçar a nata do liberalismo econômico nacional, a ala de esquerda da população virou as costas e se desmobilizou. A ala conservadora sentiu o campo aberto e colocou seu sistema de pressão na rua. Pela primeira vez na história tal pressão não teve contrapressão. O desejo de impeachment cresceu, alimentado pela tentativa desesperada do presidente da Câmara de escapar da Operação Lava Jato.

     Mesmo com o governo nas cordas, ficou claro, contudo, que a oposição não tinha unidade, que certamente entraria em fagocitose se assumisse o poder. O estilo brutalizado de Cunha era incapaz de aglutinar. Até que o golpe de mestre apareceu. Aterrorizado pela possibilidade de perder o poder, o governo foi procurado pelo presidente do Senado para um acordo em prol da “governabilidade”, agora defendida abertamente pela Fiesp, pela Globo e pelo sr. Trabuco, o verdadeiro chefe do ministro da Economia.

     Na pauta, um conjunto de propostas para explodir de alegria qualquer liberal defensor dos interesses da elite rentista. O que seria visto, em situação normal, como proposições inaceitáveis por colocar em questão a natureza pública de certos serviços e direitos trabalhistas aparece agora como uma agenda positiva e responsável para tirar o Brasil da crise política.

     Assim, tudo o que a direita sonhou será aplicado pelo governo dito esquerdista. É ele que pagará todo o preço, alcançando, enfim, o grau zero de apoio popular. Mas como o espantalho Cunha continuará amedrontando, tudo o que vier do agora esteio da responsabilidade da República, Renan Calheiros, será visto como um mal menor.

     Assim, o crime perfeito se completa. Toda a pauta mais radical do liberalismo brasileiro será aplicada sem que os liberais tenham de arcar com o peso de aplicar tal política. Ela será aplicada não pelos liberais de plantão, mas por uma esquerda em vias de autoeliminação. Há de se admirar a astúcia da elite brasileira na defesa de seus interesses. Realmente, um trabalho de profissionais. 

segunda-feira, 17 de agosto de 2015

Ilustração - por Paul Calle (pinterest)

Picadinhas

206 ossos, 650 músculos, mais de 50 bilhões de células, espero que entenda que levantar tudo isso da cama de uma só vez é muito complicado.
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Bomba no Instituto Lula foi caso isolado. Tiro em haitianos foi caso isolado. Facada em trans foi caso isolado. SP, capital do isolamento. (Maurício Santoro)
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Tô precisando tirar dinheiro do caixa eletrônico. O problema é que tô sem dinamite.
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O Brasil tem uma espécie de pessoa especial: acredita na meritocracia e tem medo de perder emprego pra imigrante haitiano.
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Pode parecer piada, mas não é: o programa esquenta da Regina Casé foi a uma instituição de caridade, gravou as crianças recebendo alguns brinquedos, e depois da gravação, pasmem, a produção pegou os brinquedos de volta e levaram embora!
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Se não lutas, tem ao menos a decência de respeitar aqueles que o fazem. (José Martí)
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Namora comigo. Eu te pago um mcdonalds e fico olhando você comer (não tenho dinheiro pra comprar 2).
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Um trabalhador, um banqueiro e um imigrante estão sentados diante de uma bandeja com 20 biscoitos. O banqueiro então pega 19 biscoitos e diz para o trabalhador: cuidado, o imigrante vai tomar o seu biscoito!
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O segredo é falar a verdade e colocar uns risinhos no final para não perder a amizade.
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E aí? Já colocou o despertador para acordar na hora que seu patrão acha que você deve acordar? (Diego Quinteiro)
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Indignômetro da revista argentina Barcelona:
- Indignação pela caça do leão Cecil - 73%
- Indignação pela morte de 3 mil africanos em 2015 no Mediterrâneo - 27%
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Sério, gente, como faz pra ganhar dinheiro, pq me falaram que era trabalhando, mas não é. (napaula)
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Os Revoltados Online falaram que Lula vai virar ministro da Dilma pra poder ganhar imunidade. Meus queridos, se ele quisesse imunidade se filiaria ao PSDB.
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Recado pra quem come de tudo e não engorda: Quando sua lombriga der cria, me dá uma?
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A veja já falou como conseguiu aquele documento falso incriminando Romário ou vai ficar só naquela confissão de crime disfarçada de errata?
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Criatura, se for demorar pra me responder no whatsapp me avisa que conversamos por carta.
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A gente podia fazer um aplausaço toda vez que o Aécio aparecesse na TV. Ô homem ético e maravilhoso!
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A adúltera é a mais pura porque está salva do desejo que apodrecia nela. (Nélson Rodrigues)
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Uma ditadura tão corrupta que o judiciário aparelhado mandava sua polícia aparelhada colocar os líderes do partido do governo na cadeia.
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Os homens grosseiros e ignorantes castigam-se a si mesmos. (Jonathan Littell)
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Me avisem quando será o programa político do PMDB e do PSDB que eu quero ir pra sacada bater palmas.
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Jesus amava até os caras que o mataram, imagina se ele não amaria os viados que só querem ouvir Beyonce no seu canto…
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É contra “toda essa corrupção”. Mas não bateu panela enquanto a câmara aprovava o financiamento privado de campanha.
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Uma revolução não é um mar de rosas. É uma luta de morte entre o futuro e o passado. (Fidel Castro Ruz)
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Vocês sabiam que se comerem frutas, legumes e verduras, se exercitarem todos os dias, não beberem, não fumarem, vocês ainda vão morrer??? (NaoKahlo)
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Se sou a favor da descriminalização da maconha, eu sou um maconheiro vagabundo. Agora, se for o porte de armas, eu sou um cidadão de bem. Ué?! (deboasnarevo)
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O pastor fala em línguas estranhas o culto todo. Mas na hora do dízimo fala em português.
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Apaixonada pela desigualdade social, a elite brasileira sempre defendeu uma noção muito curiosa de “progresso”: queria ser europeia nas artes e costumes, mas servida eternamente por escravos negros, domesticados e evangelizados.
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Antes de postar um indireta, pense: será que isso pode gerar interpretações erradas, tretas e guerra?
Se a resposta for sim, poste.
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Quem se aproxima da igreja deve encontrar as portas abertas – e não fiscais da fé. (Papa Francisco)
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Alguém entende de vírus de celular? Tá complicado aqui, eu digito VASCO e acende a lanterna...
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Estude educação física. Pra que? Pra jogar bola na quadra e ficar no whatsapp.
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Claustrofobia: medo de lugares fechados. Ex.: medo de ir ao bar e ele estar fechado.
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Dezenove corpos tombados e nenhum barulho de panela. O silêncio que aplaude!
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A globo poderia comprar os direitos das manifestações e exibir todo sábado… Seria mais engraçado que zorra total.
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3 bilhões de manifestantes segundo a PM na paulista. #Carnacoxinha arrebentando.
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Agora que a trans que encenou a crucificação na parada LGBT levou facadas de cristãos, quem ainda não entendeu a analogia da crucificação? (Adrieli_S)
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A Nasa anunciou que está estudando a experiência de Anderson Silva com viagras contaminados para a propulsão do foguete Aranha I.
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O jornalista Ricardo Noblat não vê qualquer sentido em ser apenas sórdido. É preciso ser também todinho podre.
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Xuxa não vai falar de religião mas confessa que tem linha direta com Hebe.
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O evento coxinha de domingo na Paulista perigou virar mero protesto contra o reatamento EUA-Cuba no vão livre do Masp.
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Depois que me disseram que o signo de peixes não combina com aquário eu parei de acreditar em astrologia.
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Podem dormir tranquilos: a PM do Alckmin vai encontrar daqui a pouco e punir os autores da chacina na Grande SP.
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Critérios de Afinidade para um relacionamento: Reclamar das mesmas coisas que eu reclamo.
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Retrato da mídia há pouco no cinemax: "As perguntas mais importantes são aquelas que os jornalistas não fazem."
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Após traição a Gisele, Deus finalmente admite que sexo masculino precisa de recall.
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Cunha desistiu do shopping e pediu urgência urgentíssima para a construção de um bunker, à maneira daquele do Hitler, na Câmara.
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Dizer que não entra no Facebook há dias não faz você ser mais interessante, diz estudo.
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Enquanto isso, na Globo...
-- Já pensou a Marcha das Margaridas com ampla cobertura da TV?
-- Eu hein? Nem pensar!
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Traição: Gisele Bundchen pediu divórcio após flagrar o marido vendo NET e usando xampu Seda.
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O inferno em festa. Morreu Manoel Contreras, general de Pinochet.
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Depois de tentar proibir o uber, Eduardo Paes vai multar quem tirar foto com celular em vez de lambe lambe.
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Em caso de dúvida, coxinha não duvida: veste a camisa da CBF e sai pela Paulista bradando contra a corrupção.
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Solteira e traída, Gisele passa o sábado comendo sorvete e engorda 100 gramas.
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O sol da liberdade em raios fúlgidos dos novos tempos vem com Caiado no cavalo branco e Lobão na garupa. Aiô!
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Nota do Brasil cai e pais de Dilma são chamados para reunião.
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Hildebrando Pascoal, o deputado da motosserra, esta saindo da cadeia. Taí um homem de DEM.
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Mulher dada como sequestrada estava em banheiro público olhando o Facebook.
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Patrícia Poeta saiu da bancada do Jornal Nacional direto para um comercial de detergente. Faz sentido.
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Bela Gil ensina mães a trocar Hipoglós por catupiry em bebês.
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João Dória Jr. promete trabalhar por SP tanto quanto trabalhou pela seleção brasileira na Copa América.
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“Tentei não fazer nada na vida que pudesse envergonhar o menino que fui.” (José Saramago)
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Sobre o atentado ao Instituto Lula: “O Merval defende a liberdade de explosão.” (Rogério)
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“Em Montevidéu, existe um menino que explica: – Eu não quero morrer nunca, porque quero brincar sempre.” (Eduardo Galeano)
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Para o PSDB, compensa apoiar Cunha pelo desgaste que impõe a Dilma. Para os tucanos o crime sempre compensa.
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Amadurecer é um pouco isso, deixar de ser esperto. (Humberto Gessinger)
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Brevemente a Folha vai abrir espaço em Tendências/Debates para "baderneiro" explicar que lançou bomba em defesa da liberdade de expressão.
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No fim, apenas se tem o que se deu. (Isabel Allende)
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A Globo, que inventou o Caçador de Marajás junto com a Veja, dá claros sinais de que abandonou a cria de PC Farias na beira da estrada.
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“E me deu vontade de rezar, e de ter amigos, o pai vivo, e um automóvel. E fui rezando lá por dentro e imaginando coisas, se tivesse pai ia beijar ele no rosto, e na mão tomando benção, e seria seu amigo e seríamos ambos pessoas diferentes.” (Rubem Fonseca)
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Chega de plano de metas. Datena vem ai com o Plano de Mata.
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Vocês não sabem o que é ter estudado interno cinco anos num colégio de padres jesuítas: chegava a Semana Santa e a gente se sentia culpado pela morte de Jesus Cristo...” (Roberto Drummond)
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SP vai trocar nome de rua de quem serviu à ditadura. Começa pela Av. Roberto Marinho. (Carioca ilustre)
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A América não é lugar para artistas: ser artista é ser um leproso moral, um desajustado econômico, uma obrigação social. Um porco alimentado a milho tem vida melhor que um escritor criativo, um pintor ou um músico. (Henry Miller)
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Personagem de Umberto Eco em Número Zero: "Não são as notícias que fazem o jornal e sim o jornal que faz as notícias”
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Casando ou deixando de casar, a gente se arrepende sempre. (Fernando Sabino)
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Datena ainda não foi chamado para garoto-propaganda da Seara ou Perdigão, mas adianta que gosta mesmo é de presunto crivado de azeitonas.
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Deus é o existirmos e isto não ser tudo. (Fernando Pessoa)
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Após investigações, justiça concluiu que diretório do PT é que agrediu a bomba caseira.
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Eu tentei correr de mim, mas pra onde eu ia, eu tava. (Juraílde da Cruz)
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Instituto Rabo Azul realiza estudo e afirma que 90% dos problemas do Brasil são culpa do PT, os outros 90% é culpa do Lula.
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– A Bíblia diz: “Amai ao próximo”.
– Isso poderia significar algo como “deixe-o em paz”.
(Charles Bukowski)
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Todo mundo pagou ou recebeu propina da FIFA e da CBF. Menos a Globo, que detém exclusividade sobre todos os campeonatos. Claro!
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O céu protege os parvos como nós. (António Lobo Antunes)
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"Vai pra Grécia!" é a tendência de insulto nessa velha estação.
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A esta altura nenhum de nós tem mais remédio. (Mario Benedetti)
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Os tucanos trocam as bolas, e confundem, diretas já com direita já...
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Namora comigo - eu nunca vou te trair. (Na verdade eu não consigo nem uma pessoa que me queira, imagina duas ao mesmo tempo).
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Ciro Gomes abusa da delicadeza e define Cunha como "pilantra de quinta categoria".
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Amiguinha, você já é toda gorda e ainda coloca a mão na cintura para tirar uma foto? Fica parecendo uma xícara.
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Em linhas gerais, pesquisa da Unifesp-USP feita domingo na Paulista revela que manifestantes do CarnaCoxinha dão bom dia a cavalo.
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Entendi o revisionismo cristão: se alguém repartir o pão, cobre royalties.
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Pois a Arte é a vida, mas num outro ritmo. (Muriel Barbery)
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Brecht alertou: infeliz o país que precisa de heróis. O Brasil até nisso se mostrou mais canalha: infeliz o país que precisa de vilões.
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“Quem inventou o coração humano? Responda-me, e depois mostre-me o lugar onde foi enforcado.” (Lawrence Durrel)
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Enquanto a economia naufraga, os bancos batem recordes de lucro. Levy e Tombini são muito bem sucedidos em seus objetivos.
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O tolo é vitalício e impermeável. Por isso dizia Anatole France que o néscio é muito mais funesto que o malvado. Porque o malvado descansa algumas vezes; o néscio, jamais. (Ortega y Gasset)
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Vou ali tamborilar na panela da vizinha. Volto.
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By Zombozo Kropotkin, Palmério Dória, Sensacionalista.com, e adicionais.

Moonliner - por Sebastian Magnani (Fotografia manipulada - site homônimo)

Não era amor, era cilada - por Gregório Duvivier (Folha de São Paulo)

     Amor, Ordem e Progresso. O binômio positivista na verdade era uma tríade –assim como a Liberdade-Igualdade-Fraternidade dos franceses, só que sem rimar. Nosso trinômio era ainda mais chique, em verso livre. "O amor vem por princípio, a ordem por base/ O progresso é que deve vir por fim/ Desprezastes esta lei de Augusto Comte/ E fostes ser feliz longe de mim", cantava Noel.

     O amor estava no princípio, antes do Verbo. Ou talvez o amor fosse um verbo  da quarta conjugação, daqueles verbos terminados em "or": por, depor, transpor, amor.
     
     Imagina que lindo ter amor na bandeira – mas os inventores do país tiraram o elemento fundamental da tríade positivista. Amputaram a fraternidade da nossa tríade, e assim nasceu nossa república: amorfóbica.

     Não sou o primeiro a levantar essa bandeira de uma outra bandeira. Jards Macalé fez campanha pela volta do amor na flâmula. Chico Alencar fez um projeto de lei. Suplicy (saudades) tentou emplacar o projeto. Nada. Ao contrário da bíblia, do boi e da bala, o amor não tem bancada. O amor não faz lobby e ficou do lado de fora da festa da democracia. Talvez aí tenham começado os nossos problemas: no recalque da fraternidade.

     Lembro que uma vez reclamei para um francês que eles eram pouco afetivos, enquanto nós brasileiros vivíamos numa cultura mais amorosa. E o professor, roxo de raiva, perguntava, aos berros, onde estava, na história do Brasil, o amor pelos negros, pelos gays, pelos índios, pelas crianças de rua.

     O carinho que temos pelos nossos semelhantes é proporcional ao ódio que temos pela diferença. Nossa fraternidade é seletiva. Só temos fraternité com quem é cliente personnalité.

     Nossa cultura é muito erótica – e muito pouco amorosa. O amor líquido aqui já tá gasoso. Ou como dizia o Poeta: não era amor, era cilada. Cilada. Cilada.

     Não quero engrossar o coro dos que acreditam que protesto é coisa de gente mal amada. Acho que pode haver muito amor no protesto.

     Mas não encontrei nesse. Houvesse mais amor, não estariam protestando contra o fato do DOI-Codi não ter enforcado a Dilma quando teve oportunidade. Não teria gente dizendo que "tinham que ter matado todos os comunistas em 64".

     Houvesse mais amor, estariam pedindo o fim do programa nuclear brasileiro. 

     Houvesse mais amor, estariam pedindo o fim do incentivo à indústria bélica. 
     
     Houvesse mais amor, estariam protestando contra a polícia que acaba de cometer uma chacina – não estariam tirando selfie com ela.

     Toda revolução é uma obra de amor – caso contrário, é golpe.

Comentário:
Em outros tempos bem disseram: Hay que endurecer...

quarta-feira, 12 de agosto de 2015

Pintura surreal - por Joel Rea (site homônimo)

Ninguém nasce com ódio. Mas somos tão bons em cultivá-lo que dá medo - por Leonardo Sakamoto (Blog do Sakamoto)

     Lideranças de taxistas inflamam a categoria contra motoristas de Uber. Quando um grupo espanca um motorista, essas lideranças dizem que não têm nada a ver com isso.

     Pastores e padres de certas igrejas inflamam seus fieis contra aquilo que consideram um desrespeito às leis de seu deus. Quando um grupo espanca um gay ou uma travesti, esses pastores e padres dizem que não têm nada a ver com isso.

     Figuras públicas da TV inflamam a população contra a degradação da civilização e das famílias de bem. Quando um grupo resolve amarrar alguém em um poste e linchar até a morte, essas figuras públicas dizem que não têm nada a ver com isso.

     Certas famílias inflamam seus filhos contra jovens negros e pobres da periferia e pessoas em situação de rua, dizendo que são uma ameaça à vida nas grandes cidades e não valem nada. Quando um grupo resolve despejar preconceito ou dar pauladas e por fogo nessas pessoas, as famílias dizem que não têm nada a ver com isso.

     Políticos, de governo e oposição, inflamam seus eleitores, desumanizando o adversário e transformando o jogo democrático em uma luta do bem contra o mal. Quando um grupo passa a agredir fisicamente o outro, os políticos dizem que não têm nada a ver com isso.

     Alguns jornalistas, progressistas e conservadores, inflamam seus leitores, ouvintes, telespectadores, repassando conteúdo violento, sem checar e de forma acrítica. Quando um grupo passa a assediar, de forma injusta, pessoas ou instituições com base nesse conteúdo, os jornalistas dizem que não têm nada a ver com isso.

     Dada à sistemática falta de responsáveis, realizei uma extensa investigação.

     E, após anos de trabalho de campo, cruzamento de bases de dados e uso do supercomputadores do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, descobri que o culpado por tudo isso é o agricultor Sobral Pinto da Silva, que mora sozinho em um barraco de madeira de cômodo único, em Eldorado dos Carajás, no Pará. Ele confessou que cultiva cerca de meio hectare de ódio em um pedaço de terra à beira da rodovia PA-150.

     As autoridades já foram avisadas.

     Espera-se que, com Sobral sob custódia, tudo isso acima se resolva o quanto antes.

Ilustração - por Randy Mora (site homônimo)

Não chame um nazista de nazista: a reação da extrema direita a uma nota de jornal - por Kiko Nogueira (Diário do Centro do Mundo)

A bandeira integralista esta aqui por completo e absoluto acaso
     A extrema direita brasileira adjetiva todo e qualquer cidadão com o qual tenha divergências, reais ou imaginárias, de “comunista”. Eu sou comunista. Você. Sua mãe. Seu cunhado. Qualquer ser vivente que não concorde, digamos, com uma manifestação coxa é, cuspido e escarrado, um vermelho e deve se mudar para Cuba.

     Agora, experimente chamá-los de “nazistas”. Experimente, ainda, dizer que alguns — alguns — desses grupos direitistas usam símbolos nazistas. A reação a uma nota na coluna do jornalista Ilimar Franco no Globo dá a dimensão das convicções democráticas desses grupelhos.

     Ao comentar o desempenho de Jair Bolsonaro numa pesquisa eleitoral da MDA, ele escreveu o seguinte:

     O Movimento Brasil Livre, o Revoltados Online e o S.O.S. Forças Armadas, vinculados ao que se define como direita, foram a vanguarda e usaram as redes sociais para chamar o protesto de 15 de março. Pregam contra o comunismo, pelo combate à corrupção e contra a interferência do Estado na economia. O Revoltados elegeu Jair Bolsonaro como maior porta-voz de suas ideias. O S.O.S. prega a intervenção militar. Todas essas organizações vão às ruas atacando as cotas, os nordestinos, os sem-teto e alguns usam símbolos como a suástica nazista. A corrupção (nos governos do PT) e o descrédito do Congresso e dos partidos (pesquisa MDA) criam a química perfeita para o ressurgimento dessa força.

     A histeria coletiva diante de uma observação expressada em mirradas linhas inundou a internet de uma indignação desproporcional, que só pode significar o seguinte: acusamos o golpe.

     Um certo Renan Santos, co-líder do Movimento Brasil Livre juntamente com Kim Kataguiri, gravou um vídeo — ou melhor, um “pronunciamento oficial” — em que aparece apoplético, sugerindo que o jornalista deveria ter sido censurado.

     “Não aconteceu nada. A equipe editorial do jornal (?!?), a equipe de produção (?!?) deixaram passar numa boa”, grita. Santos acusa Ilimar de ser um “militante escondido”. “Você vai ter que nos engolir”, ameaça, babando, para emendar numa conversa maluca e no aviso de que Ilimar será processado.
     É um pessoal tolerante. Um sujeito já fala numa “guerra midiática”. Outro afirma que “tem que soprar forte o vento contra estes jornalistas de porta de zona”. Olavo de Carvalho anuncia que “tem que pegar o Otário Frias, o João Roberto Marinho e chamar de filho da puta, vagabundo”.

     Outro, ainda, sugeriu eugenia num email a Ilimar Franco:  “O Brasil precisa ser limpo, das estatais aparelhadas pelos petistas até certo jornalismo emporcalhado pelos Ilimares”.

     E por aí afora.

     É claro que apelou-se à Lei de Godwin (aquela que reza que qualquer pessoa perde uma discussão ao invocar os nazis). Mas, se alguém age como nazista, com que você deve compará-lo?

     Marcello Reis, o chefão dos Revoltados On Line, com seu uniforme eterno, sua retórica assassina, a preconização da violência física, a intenção de eliminar um partido, parece o quê?

     Gente que vai a protestos com uma camiseta amarela estampada com quatro dedos sujos de óleo, tirando sarro de um defeito físico, parece o quê? O discurso rasteiro e seletivo contra a corrupção foi usado amplamente pelo nacional socialismo para atacar a República de Weimar. Remete a quê?

     “Os comunistas estão buscando destruir nosso país”, dizia o velho Adolf. Lembra quem?

     O nacionalismo biruta do pessoal que prega a intervenção militar e desfila em carro aberto com torturadores e uma bandeira integralista — qual é a inspiração? O messianismo, a ideia fixa de que esses homens e mulheres de bem estão salvando a pátria de um mal maior, é similar a quê?

     A tendência de negar realidades desagradáveis, mesmo enquanto eles estão ocorrendo, é arriscada. Na pior das hipóteses, é perigoso: as pessoas não vão lutar contra algo que supõem ser um exemplo extremo e uma impossibilidade.

     Ironicamente, esse povo faz o que acusa a “ditadura bolivariana” de fazer: tentar calar a boca de vozes dissonantes na marra.

     Tudo com a ajuda de Deus, naturalmente. “Não podemos parar”, gosta de repetir Marcello Revoltado Reis. “Juntos somos mais fortes e com Deus na nossa frente somos imbatíveis”. Ou, como dizia o führer: “Eu acredito que estou agindo de acordo com a vontade do Criador e lutando pelo trabalho do Senhor”.
Cartaz nazista denunciando a corrupção no governo alemão