quarta-feira, 18 de janeiro de 2017
Comemorando a recessão - por André Araujo (Jornal GGN)
A pergunta é clássica, estão comemorando o que? A inflação ficou dentro
da meta por causa de uma gigantesca recessão e qual é a vantagem
disso? Para os que têm renda certa e segura, como funcionários concursados,
rentistas que vivem de aplicação financeira, é ótimo inflação zero mesmo com o
país em ruína econômica, são os beneficiários da economia improdutiva, aquela
que nada produz e só consome e não precisa competir no mercado, o grupo chamado
de "férias em Miami".
Mas para a economia da produção a famosa inflação "dentro da
meta" foi conseguida a custa de muito sofrimento, 13 milhões de empregos
sacrificados, empresas quebradas, milhares de lojas fechadas, aumento da
criminalidade, lares destruídos, suicídios, jovens fora da escola.
A longo prazo, a queda da arrecadação que é decorrente da crise, pode
colocar em risco os salários dos concursados e os juros dos aplicadores. Mas
serão os últimos a perder.
A inflação de 6,29% foi conseguida pela derrocada da economia, é um
resultado vicioso e não virtuoso, não há vantagem, mérito ou impulso ao
crescimento nesse resultado, é a dieta por falta de comida e não por
recomendação médica e não tem comida porque não tem dinheiro para comprá-la.
Estabilidade monetária com prosperidade é a meta virtuosa, aquilo que os
estatutos do Federal Reserve, o banco central americano, exigem de sua direção.
Mas se tiver que ser feita uma escolha exclusiva, o emprego vem à frente da
estabilidade monetária porque a prosperidade significa emprego e este preserva
a sobrevivência da população mesmo com alguma inflação. A inflação incomoda, a
fome mata.
Como é possível tantos economistas endossarem essa politica? Os
cânones da ciência econômica ensinada nas escolas de economia dos países
centrais seguiram cartilhas majoritariamente ortodoxas nos anos do pós guerra,
porém com algumas correntes minoritárias de grande solidez intelectual que
apontavam caminhos fora do mainstream da ortodoxia, especialmente até os anos
70, destacando-se nesse grupo Albert Hirschman, Gunnar Myrdal, Raul Prebish, o
nosso Celso Furtado. O grupo dos economistas do desenvolvimento ganhou
prestígio e a eles devemos a industrialização do Brasil, fortemente combatida
por ortodoxos da época como Eugenio Gudin, criador do primeiro curso de economia
no País.
Com o advento do neoliberalismo de Friedrich von Hayek nos anos 70 e do
monetarismo de Milton Friedman com sua expressão política nos governos
Thatcher-Reagan, a escola do desenvolvimento perdeu força e uma nova e grande
safra de "economistas de mercado" emergiu das faculdades americanas,
um grupo de economistas de países emergentes que fizeram pós graduação no MIT,
Chicago, Northwestern, Cornell, especialmente.
Outras escolas como Harvard, Stanford e New School of Social Research
mantiveram-se mais equilibradas, mas os centros universitários do mainstream
ortodoxo moldaram a cabeça dos nossos "economistas de mercado" que,
aqui voltando, passaram a ensinar e propagar o "evangelho"
monetarista cujo apóstolo foi Milton Friedman com seguidores importantes como
Alan Meltzler, hoje sucessor do legado de Friedman. A escola de economia da PUC
Rio, depois suas derivações como a economia da FGV, o Ibmec e o Insper se
encarregaram de propagar o credo Hayek-Friedman até hoje. Sobre a construção
ideológica na alma mater dos "economistas de mercado" brasileiros
escrevi em 1995 o livro " A Escola do Rio", narrando a trajetória,
influência e importância da escola de economia da PUC Rio, dominante no Brasil
desde o Plano Real até hoje, é força central do "mainstream" que
controla a economia brasileira mesmo nos anos do PT.
Nos EUA apos a mega crise de 2008, o credo cego no monetarismo e no
neoliberalismo foi revisto profundamente nas catedrais da ortodoxia, como a
Universidade de Chicago. O que se ensinava antes foi considerado como uma
receita da crise de 2008, um excesso de poder do mercado financeiro sobre a
macroeconomia que quase liquida com a economia americana, só salva pelo plano
TARP, uma profunda intervenção do Estado na economia, o que desmontou todos os
argumentos de que o mercado deixado livre faz funcionar sozinho a economia.
Wall Street perdeu prestígio, os grandes fundos de investimento como
Black Rock (ativos de 6 trilhões de dólares) Fidelity Johnson (4 trilhões) e
outros 19, com ativos de mais de 1 trilhão, mais os grandes fundos de pensão e
gestores de fortuna como Bessemer Trust, Norhtern Trus, State Street,
U.S.Trust, as grandes casas de administração de patrimônio dos EUA, Canadá e
Holanda, passaram a desconfiar de Wall Street, que lhes empurrou ardilosamente
os papéis subprime, sabendo que eram "podres". Esses fundos passaram
a desprezar a assessoria dos bancos de investimento e a operar diretamente com
seus departamentos de pesquisa, desprezando também agências de rating, uma
mudança substancial do mundo financeiro, algo QUE NÃO FOI CAPTADO NO BRASIL por
preguiça, acomodação, estupidez e elitismo de muitos economistas sentados em
seus louros.
Os "economistas de mercado", do qual o líder hoje é o
presidente do Banco Central, continuam com o evangelho de Chicago dos anos pré-crise
de 2008, seu capital político é aquilo que aprenderam numa cartilha hoje
SUPERADA mas que continuam a aplicar aqui porque é o que eles sabem, é o
aparelhamento intelectual que eles adquiriram antes de 2008 nos EUA e que
continuam transmitindo a seus alunos e é esse evangelho que os comentaristas da
mídia brasileira conhecem e propagam. Estão todos completamente defasados.
Hoje o conceito de austeridade foi revisado até pelo Fundo Monetário
Internacional que, no seu relatório anual sobre a Grécia em 2016, foi crítico
da política de austeridade que, segundo o próprio relatório do FMI, aprofundou
a crise, exatamente o que estamos vendo no Brasil.
O mesmo Fundo Monetário Internacional REVIU para baixo, em 16 de janeiro
deste ano, a previsão de crescimento do Brasil para 2017, de 0,5% para 0,2%,
quer dizer, a política econômica é um ABSOLUTO FRACASSO porque não produz
prosperidade. Só estabilidade monetária era a meta do regime de Salazar em
Portugal por 40 anos e fez dois terços da população masculina emigrar para não
morrer de fome.
O monetarismo de Chicago está hoje morto e enterrado no mundo mas
vivíssimo no Brasil, tal qual o positivismo, enterrado na França e sobrevivo no
Brasil. Temos o curioso hábito nacional de acolher doutrinas velhas,
agasalhá-las, ressuscitá-las, incensá-las e mantê-las vivas. É o que o
Brasil faz hoje com o monetarismo e o neoliberalismo. Pior ainda, recepciona
tais doutrinas mal e porcamente por retalhos e não pela sua integridade,
privatiza-se o presídio de Manaus apenas para justificar um custo-preso três
vezes maior que em São Paulo, algo sem lógica econômica alguma mas usando a
privatização como capa e trem pagador da política.
O monetarismo praticado pelo Banco Central é uma completa aberração
intelectual. Fazer política sueca em um País emergente e cheio de carências,
pior ainda uma política que nem sequer tem como desculpa ser eficiente do ponto
de vista das elites produtivas, é ruim para todos menos para rentistas de dois
tipos: os pendurados na folha do Estado com altos salários e os que vivem de
juros de aplicações financeiras, ambas classes improdutivas mas que drenam
recursos escassos de toda a população. São estas castas que pilotam o Banco
Central desde o Plano Real e representam nele a economia improdutiva cujo porta
voz é o Boletim FOCUS e a sua assessoria de comunicação é a GLOBONEWS, que se
congratula (Programa Fatos e Versões de 14 de janeiro) com duas vitórias, a
inflação dentro da meta e a baixa da taxa Selic, completando com "Henrique
Meirelles, o esteio do governo", na opinião da âncora (Cristiana Lobo) e
dos dois convidados. A inflação dentro da meta foi conseguida pelo desemprego e
paralisia econômica e a baixa da Selic não é vitória, é ato de vontade do BC.
Há no mundo hoje um claro ciclo "anti-globalização" cujos
símbolos são o BREXIT e a eleição de Trump. Enquanto isso o Brasil aprofunda
seu atrelamento negativo à globalização cujo símbolo é a PETROBRAS convidar 30
empreiteiras estrangeiras e nenhuma nacional pra completar as obras do Comperj,
ao mesmo tempo a mesma PETROBRAS refuta veemente a ideia de comprar
equipamentos no Brasil, como se isso fosse pecado mortal. No mesmo momento a
plataforma Trump é na linha do protecionismo e no "buy american".
Estamos portanto na contramão da História e da economia mas, aqui
dentro, aparentemente ninguém sabe disso, nem o Governo, nem a academia,
nem a Globonews, nem a Jovem Pan e nem o grupo social dos ricos, uma vez que
hoje na prática inexiste uma elite brasileira, só há ricos de Miami, pelo menos
podiam ser ricos obcecados por Florença ou Salamanca em busca de cultura e
refinamento e não apenas nas bolsas Prada para suas peruas.
Os economistas realmente inteligentes, não são muitos, sabem que o CUSTO
DA RECESSÃO é infinitamente maior do que o custo da expansão monetária para
criar demanda. No artigo acima do New York Times está a ideia de que JOGAR
DINHEIRO DE HELICÓPTERO para o povo é mais barato para a economia do que ter
milhares de fábricas operando a 30% da capacidade, milhões de desempregados,
arrecadação de tributos em queda livre.
Quanto custa para o Tesouro Nacional e para os Tesouros Estaduais a
atual recessão brasileira? 500 bilhões de Reais? Muito mais. A queda de 3,8% do
PIB de 2015 sobre R$ 7 trilhões do ano anterior (grosso modo) representa
R$ 280 bilhões de perda de riqueza real. Mas tem mais, se o crescimento fosse
de 3%, que é a media mundial de 2015, haveria mais R$ 210 bilhões de PIB não
gerado, portanto o Brasil perdeu quase R$ 500 bilhões de riqueza real, sobre a
qual seria gerada uma arrecadação (carga fiscal) de 38% ou seja R$ 190 bilhões,
fora receita da previdência, estaria aí completamente coberto o déficit fiscal
de 2015, com sobra.
Já para 2016 a queda de 3,5% do PIB significa R$ 245 bilhões de perda de
riqueza e se houvesse crescimento de 3% (ainda abaixo da média mundial) seriam
mais R$ 210 bilhões de riqueza não criada.
Somadas as duas quedas do PIB mais os dois crescimentos não havidos,
temos R$ 915 bilhões de perda de riqueza em dois anos, sobre a qual a
arrecadação perdida seria de R$ 347 bilhões.
Então o custo da recessão é muito superior ao custo de evitar a recessão
pela expansão monetária a ser aplicada em um mega plano de obras de infra
estrutura. Enquanto isso os Samuéis, as Monicas, os José Márcios, os Luis
Robertos, os Mansuetos e os demais entrevistados de sempre da mídia
econométrica da GLOBONEWS, estão obcecados com o "ajuste fiscal", que
fica absurdamente mais difícil POR CAUSA DA RECESSÃO, ajuste que seria
manejável com crescimento. Mas para entender isso precisa massa cinzenta e a
decoração de cartilhas da velha economia das universidades americanas pré-2008
não é suficiente para entender, e muito menos resolver, a crise econômica, que
exige visão geopolítica muito acima e além da economia de cartilha.
O "helicopter money" foi em primeiro lugar proposto por ninguém
menos que Milton Friedman e a ideia hoje tem apoiadores nos países centrais,
incluindo Ben Bernanke, o anterior Chairman do Fed, o principal articulista do
FINANCIAL TIMES, Martin Wolff, o economista chefe do CITIGROUP Willem Butler,
economistas de grande reputação como Brad DeLong, da Universidade da
Califórnia, outros como William Butler e John Muelbauer (Oxford), Steven Keen,
Mark Blyth, Roger Farmer, Eric Longerman, todos de universidades top.
Mas no Brasil não precisamos jogar dinheiro de helicóptero, basta
investir em infraestrutura, dinheiro público, R$1 trilhão em 40 meses, R$ 25
bilhões por mês, para isso precisa mandar Meirelles de volta à Nova York e Goldfajn
para o Itaú e trocar toda a diretoria do Banco Central, os que aí estão nem
amarrados vão aprovar qualquer expansão monetária, gostam de tirar sangue da
economia, que já perdeu nos últimos dois anos R$1 trilhão de liquidez, é o que
fez nascer e aprofundar a recessão que não terá fim sem expansão monetária.
A expansão monetária para mega investimentos em infraestrutura fará o
Brasil sair da recessão e com isso os problemas sociais terão maiores chances
de solução, a tensão nas ruas e nas periferias diminui, o Estado passa a ter
mais recursos para a saúde e a educação, a economia deve ser manejada por
mentes com visão política e não por bitolados de um prato só, de uma visão
estratificada do mundo, justamente agora que Trump nos lembra que não há fórmulas
prontas, que a História não é racional, que os ciclos econômicos e políticos
não são gerais, o mundo não é todo certinho, o mundo é um caos e o político
deve agir dentro do caos porque a ordem das cartilhas só existe no papel, a
realidade é fluida, é preciso navegar na tempestade.
terça-feira, 10 de janeiro de 2017
segunda-feira, 9 de janeiro de 2017
O governo Temer e o triunfo da razão criminosa – por Aldo Fornazieri (Jornal GGN)
A degradação da democracia brasileira e a
existência do governo Temer não são fruto acidental da conjuntura política, dos
muitos erros do PT e do governo Dilma, da mera vontade moralizadora da Lava
Jato, da parcialidade manipuladora de setores da grande mídia, da permanente
disposição do assalto ao botim por parte do PMDB e dos partidos do centrão, do
inconformismo golpista de Aécio Neves e do PSDB em face da derrota eleitoral.
Sim, todos esses fatores contribuíram para degradar a democracia e viabilizar o
governo Temer.
Mas ele é expressão de algo mais profundo,
de um mal entranhado na genética política, social e moral da sociedade
brasileira, de uma vocação criminosa, de uma vontade de morte. Algo que dormita
sobre as cinzas de um passado escravocrata e criminoso e que emerge de tempos
em tempos com toda a sua virulência trágica que degrada e degrada, sem
sublimar, sem produzir uma força de transcendência desta realidade mutilada de
sentido histórico e de força e virtude morais.
A qualidade da política e dos políticos
brasileiros é da pior espécie. Os motivos são vários, mas alguns são cardeais:
herança do patrimonialismo orientado para a privatização do poder público;
prevalência dos interesses de grupos econômicos e do particularismo dos
interesses partidários postos acima do bem comum e da perspectiva
universalizante do Estado; ausência de uma cultura política elevada de debate e
formulação de ideias e programas; ausência de uma cultura republicana; visão
instrumentalista da moralidade pública e ausência de efetiva prática moral
orientada para os fins éticos da coisa pública.
Os políticos não são possuidores e não
cultuam as virtudes republicanas da prudência, da simplicidade, da frugalidade
e da humildade. Ao assumirem posições de poder – seja num partido ou no Estado –
se tornam pequenos tiranos. Tornam-se fascinados pelo brilho do poder e deixam
as causas em segundo plano. Aliás, manejam as causas de forma instrumental para
alimentar a vaidade. Terminam querendo o poder pelo poder e subordinam os fins
aos meios.
Atavismo
e vontade de morte
Esse atavismo social, político e cultural
criminoso, antissocial, anti-povo, com sua existência recorrente e com
frequentes surtos eruptivos, aprisiona o país à desigualdade, à violência e a
incultura. Mantém o Brasil dentre os países mais violentos do mundo, mais
violento que as guerras e somente quando a erupção despadronizada da morte se
evidencia a sociedade percebe a dimensão dos massacres. Mas no dia-a-dia são
massacrados índios, jovens negros, mulheres, trabalhadores, camponeses num país
que tem como pedras fundamentais o sangue e a violência, a escravidão prolongada,
a injustiça e a desigualdade sistêmica. Esse atavismo se evidencia no
apoio que teve o agente da chacina de Campinas, em manifestações nas redes
sociais, no desejo de que novos massacres ocorram nos presídios, na
desumanização tornada um elemento da opinião pública, nos campos de
concentração que são as nossas cadeias, na transformação da política em
atividade criminosa.
Esse atavismo criminoso distorce a moral
mesmo daqueles que defendem um país mais justo. Na velha prática da
subordinação dos fins aos meios e da transformação dos meios em fins, aceitam
práticas criminosas contra a res publica em nome de que todos os partidos as
praticam, aceitam que campões nacionais sejam erguidos com o suor dos
trabalhadores e com o assalto aos cofres públicos. O atavismo criminoso
entorpeceu ou apodreceu até mesmo a consciência dos "bons" e dos
"justos".
O país não precisa viver uma condenação
eterna a este atavismo. Mas para libertar-se dele será preciso que surjam
líderes com novas qualidades e novas virtudes, partidos que sejam capazes de
amalgamar uma nova vontade coletiva, práticas efetivamente democráticas e
republicanas. É preciso extrair as duras lições do passado, rever o nosso
presente e repensar o futuro com novas visões e concepções. Muito do que foi e
é a nossa política precisa receber a extrema unção para ser enterrado, sem
esperança de salvação, pois não há o que ser salvo.
O
colapso moral do país
Mesmo que hoje o governo Temer seja
rejeitado pela imensa maioria da população, o fato é que essa maioria o aceitou
como uma solução de conveniência. Esse governo não tem apenas os requisitos de
legitimidade para existir, mas não tem também os requisitos morais. O
ex-Secretário Nacional da Juventude, Bruno Julio, é a expressão moral desse
governo. Trata-se de um agressor de mulheres e um defensor de massacres. Isto
não pode ser individualizado, mas é uma expressão do que esse governo
representa.
Qual é o significado ou o papel de um
Secretário Nacional de Juventude? Ele deve ser a manifestação do que se quer
para o futuro, do que se exige dos novos líderes, do que se vislumbra para o
amanhã, o exemplo para a juventude brasileira. Quem Temer escolheu como expressão
simbólica desse futuro? Exatamente um agressor de mulheres, um defensor
de massacres, um catecúmeno do mal, um noviço da degradação moral. Mais do
que em qualquer outro lugar e pela sua relevância simbólica, a ocupação dessa
Secretaria por tal tipo, expressa, de agressiva, o triunfo da razão criminosa.
Que governo é esse que manteve até ontem
sob seu auspícios tal infame representação do futuro? Que governo é esse que
mantém como seu articulador político principal um criminoso ambiental, um
acusado de grilagem, um condenado em juízo que não paga a dívida da condenação?
Que governo é esse cujo ministro da Justiça mente publicamente acerca de um
pedido de ajuda do Estado de Roraima para evitar a violência nas prisões?
E que governo é esse cujo presidente
demora três dias para se manifestar acerca de um brutal massacre e ainda
o classifica como acidente? Acidente, senhor Temer, é algo que acontece por
acaso, por imprevisto, é algo fortuito. Ali não foi acidente, foi um massacre
eruptivo, somado a massacres menores que vêm se prolongando ao longo dos anos.
Alguém que se pretende condutor de uma nação não tem o direito de se comportar
de forma leviana como se comportou Temer.
Neste país dilacerado, desigual, com
milhões de desempregados, violento, corroído e corrompido, cada vez mais
dominado pelo crime organizado, com a juventude da periferia sendo recrutada
pelo narcotráfico a sociedade está à procura de um amálgama moral, de um
conforto espiritual, de uma esperança material. Mas o que se encontra são consciências
embotadas, líderes embotados, partidos degradados, palavras estéreis, discursos
vazios. O que se vê é um governo que é a expressão do triunfo da razão
criminosa, que dá vazão a violências e massacres, que investe com vigor contra
a segurança social dos cidadãos e contra os seus direitos.
O que se vê são os representantes do povo
agindo contra o povo. O que se vê é um Judiciário que aceita a violação
da Constituição e que condena à degradação e à morte centenas e milhares de
presos. Prendem ladrões de salames e de galinhas, mas não prendem
sonegadores e outros altos criminosos. O que se vê é uma oposição pálida,
impotente, quando não conivente com isto que está aí. O que se vê é um país que
aumenta a verba para a construção de presídios onde se formam os criminosos e
reduz os recursos da saúde e da educação. É preciso até mesmo colocar em dúvida
se temos capacidades de nos livrar desse atavismo social e cultural perverso e
de construir uma perspectiva mais promissora para o futuro.
Aldo Fornazieri - Professor da
Escola de Sociologia e Política.
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