sábado, 26 de outubro de 2013

Fotografia - por Siegfried Modola (Reuters - Yahoo!)

Refugiados somalis olham através de uma cerca de arame em campo de refugiados no Quênia.

PT: A despedida de Emanuel Cancella, do Sindipetro

http://www.youtube.com/watch?v=qgzYtHnO3cI

À Direção Nacional do Partido dos Trabalhadores, PT

C/C À direção Municipal e Estadual do PT do Rio de Janeiro

É com tristeza que me despeço dos companheiros! Durante décadas ajudei a construir o PT. Dediquei grande parte de minha vida ao partido, e o único partido ao qual me filiei. Nunca tive cargo no partido e em nenhuma empresa e governo, como também nunca o desejei. Que fique claro que não tenho nada contra quem ocupa cargos, muito pelo contrário, acho legítimo! O leilão de Libra, para mim, é a gota dagua que faltava para me afastar definitivamente de um partido que, a cada dia, se torna mais entreguista e neoliberal.

O Partido dos Trabalhadores se coloca agora contra uma das principais bandeiras do povo brasileiro, o qual foi para as ruas na década de 40 e 50, na campanha “O petróleo é Nosso!”, a maior campanha cívica que este país conheceu! Continuarei a participar ativamente dos movimentos sindicais e sociais, mas não posso levar nas costas o peso de um partido que tão importante para a organização da classe trabalhadora e a democratização do país, transformando-se hoje num partido burguês, a serviço do grande capital dos patrões e a defender privatizações, com ajuda até do exército, diga-se de passagem.

Como se não bastasse, o PT continua a defender o governador do Rio, Sérgio Cabral, símbolo da corrupção no país, e apóia também o prefeito do Rio, Eduardo Paes. Sérgio Cabral e Eduardo Paes mandaram a PM bater em professores! Não dá para um militante socialista, com o mínimo de dignidade e de compromisso com a classe trabalhadora e a soberania de nosso país, continuar no PT.

Levo saudades de muitos companheiros. Muitos dependem do partido para sobreviver, esqueceram-se da vida e se dedicaram integralmente ao partido e hoje são reféns dessa política. Outros que merecem nosso respeito são aqueles que tentam mudar o partido por dentro. Honestamente, para mim não dá mais! Muitos dirão:” já vai tarde…,..mas ele já não tinha saído do partido?” Com certeza, muitos destes são os grandes culpados pela deterioração das políticas do PT.

Saudações Socialistas,

Rio de Janeiro, 19 de outubro de 2013.


Emanuel J. A. Cancella

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

Fotografia - por Paul Berrif Productions (site homônimo)

Uma traição imperdoável

É um crime privatizar o pré-sal, diz a Dilma Rousseff em seu programa eleitoral. Isto esta gravado como pode ser visto aqui, é história, e ela, sabendo que é um crime, resolveu cometê-lo, irá privatizar o maior campo de petróleo da história do Brasil descoberto no pré-sal, o de Libra, onde são estimadas reservas de 8 a 12 bilhões de barris de petróleo.
Para que se possa imaginar, pelos valores envolvidos, este leilão é pior do que a privatização da Companhia Vale do Rio Doce (que o PT tanto usa a seu favor nas campanhas eleitorais).
Para garantir a realização do leilão, a grande democrata vai utilizar tropas do Exército, homens da Força Nacional de Segurança, da Polícia Federal (PF) e da Polícia Rodoviária Federal (PRF). Deve ter aprendido bem com seus algozes, não é mesmo?
Que grande exemplo ela esta dando ao convocar todas estas forças, confia bem no apoio que o povo dá para seus atos, não é mesmo?

Escreve em pedra: nesta traidora eu não voto nunca mais. Tenho consciência plena de que um governo do PSDB é pior do que um do PT sobre todos os aspectos, porém, o PSDB não é base de referência pra nada, é a excrescência completa, todos politicamente informados sabem disso. A questão é que eu quero votar em um bom governo, não em um menos pior.
Estamos vendo o maior crime de lesa-pátria cometido na história do Brasil. E esta sendo cometido pelo PT.

É uma lástima.


quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Noam Chomsky e o labirinto americano - por Noam Chomsky (Znet / Outras Palavras)

Chomsky sustenta: na Síria, Washington adotou lógica da Máfia, e perdeu; no Congresso, Obama é vítima da ultradireita, que age como os nazistas

Entrevista a Harrison Samphir, no Znet | Tradução: Vinícius Gomes | Imagem de HikingArtist

Noam Chomsky é, aos 84 anos, um dos maiores intelectuais no mundo. Seu trabalho e suas realizações são bem conhecidos – ele é linguista norte-americano, professor emérito no Massachussets Institute of Technology (MIT) há mais de 60 anos, analista e ativista político constante, crítico original do capitalismo e da ordem mundial que tem como centro os Estados Unidos

Nesse entrevista, Chomsky debate a paralisação do governo norte-americano, por disputas incessantes no sistema político e, em especial, chantagem das forças de direita mais primitivas. Também aborda os sinais de perda de influência de Washington na Síria e da emegência, na América do Sul, de um conjunto de governos que afasta-se dos EUA, pela primeira vez em dois séculos.

Harrison Samphir: Gostaria de começar com a paralisação recente do governo dos EUA. Por que ela é diferente dessa vez, se já aconteceu no passado?
Noam Chomsky: Paul Krugman fez há dias, no New York Times, um ótimo comentário a respeito. Lembra que o partido republicano é minoritário entre a opinião pública. Controla a Câmara [House of Representatives], que junto do Senado representa o Legislativo nos EUA]. Está levando o governo à paralisação e talvez ao calote de suas dívidas. Conseguiu a maioria por conta de inúmeras artimanhas. Obteve uma minoria de votos, mas a maioria das cadeiras. Está se utilizando disso para impor uma agenda extremamente nociva para a sociedade. Foca particularmente a questão do sistema de saúde público.

Os EUA são o único, entre os países ricos e desenvolvidos, que não possue um sistema nacional de saúde pública. O sistema norte-americano é escandaloso. Gasta o dobro de recursos de países comparáveis, para obter um dos piores resultados. E a razão para isso é ser altamente privatizado e não-regulado, tornando-se extremamente ineficiente e caro. Aquilo que alguns chamam de “Obamacare” é uma tentativa de mudar esse sistema de forma suave – não tão radicalmente como seria desejável – para torná-lo um pouco melhor e mais acessível.

O Partido Republicano escolheu o sistema de saúde como alavanca para conquistar alguma força política. Quer destruir o Obamacare. Essa posição não é unânime entre os republicanos, é de uma ala do partido – chamada de “conservadora”, de fato, profundamente reacionária. Norman Orstein, um dos principais comentaristas conservadores, descreve o movimento, corretamente, como uma “insurgência radical”.

Então, há uma insurgência radical, que implica grande parte da base republicana, disposta a tudo – destruir o país, ou qualquer coisa, com o intuito de acabar com a Lei de Assistência Acessível (o Obamacare). É a única coisa a que foram capazes de se agarrar. Se falharem nisso, terão de dizer a sua base que mentiram para ela, ao longo dos últimos cinco anos. Por isso, estão dispostos a ir até onde for necessário. É um fato incomum – penso que único – na história dos sistemas parlamentaristas modernos. É muito perigoso para o país e para o mundo.

Como a paralisação poderia terminar?
Noam Chomsky: Bem, a paralisação por si só é ruim – mas não devastadora. O perigo real surgirá nas próximas semanas. Há, nos Estados Unidos, uma legislação rotineira – aprovada todo ano – que permite ao governo tomar dinheiro emprestado. Do contrário, ele não funciona. Se o Congresso não autorizar a continuação da tomada de empréstimos, talvez o governo peça moratória. Isso nunca aconteceu e um calote do governo norte-americano não seria muito prejudicial apenas aos EUA. Ele provavelmente afundaria o país, de novo, numa profunda recessão – mas talvez também quebre o sistema financeiro internacional. É possível que encontrem maneiras para contornar a situação, mas o sistema financeiro mundial depende muito da credibilidade do Departamento do Tesouro dos EUA. A credibilidade dos títulos de dívida emitidos pelos EUA é vista como “tão boa quanto ouro”: esses papéis são a base das finanças internacionais. Se o governo não conseguir honrá-los, eles não possuirão mais valor, e o efeito no sistema financeiro internacional poderá ser muito severo. Mas para destruir uma lei de saúde limitada, a extrema direita republicana, os reacionários, estão dispostos a fazer isso.

No momento, os EUA estão divididos sobre como o tema será resolvido. O ponto principal a observar é a divisão no Partido Republicano. O establishment republicano, junto com Wall Street, os banqueiros, os executivos de corporações não querem isso – de maneira nenhuma. É parte da base que deseja, e tem sido muito difícil controlá-la. Há uma razão para terem um grande grupo de delirantes em sua base. Nos últimos 30 ou 40 anos, ambos os partidos que comandam a política institucional dos EUA inclinaram-se para a direita. Os democratas de hoje são, basicamente, aquilo que se costumava chamar, há tempos, de republicanos moderados. E os republicanos foram tanto para a direita que simplesmente não conseguem votos, na forma tradicional.

Tornaram-se um partido dedicado aos muito ricos e ao setor corporativo – e você simplesmente não consegue votos dessa maneira. Por isso, têm sido compelidos a mobilizar eleitores que sempre estiveram presentes no sistema político, mas eram marginais. Por exemplo, os extremistas religiosos. Os EUA são um dos expoentes no que se refere ao extremismo religioso no mundo. Mais ou menos metade da população acredita que o mundo foi criado há alguns milhares de anos; dois terços da população está aguardando a segunda vinda de Cristo. A direita também teve de recorrer aos nativistas. A cultura das armas, que está fora de controle, é incentivada pelos republicanos. Tenta-se convencer as pessoas de que devem se armar, para nos proteger. Nos proteger de quem? Das Nações Unidas? Do governo? Dos alienígenas?

Uma enorme parcela da sociedade é extremamente irracional e agora foi mobilizada politicamente pelo establishment republicano. Os líderes presumem que podem controlar este setor, mas a tarefa está se mostrando difícil. Foi possível perceber isso nas primárias republicanas para a presidência, em 2012. O candidato do establishment era Romney, um advogado e investidor em Wall Street – mas a base não o queria. Toda vez que a base surgia com um possível candidato, o establishment fazia de tudo para destruí-lo, recorrendo, por exemplo, a ataques maciços de propaganda. Foram muitos, um mais louco que o outro. O establishment republicano não os quer, tem medo deles, conseguiu nomear seu candidato. Mas agora está perdendo controle sobre a base.

Sinto dizer que isso tem algumas analogias históricas. É mais ou menos parecido com o que aconteceu na Alemanha, nos últimos anos da República de Weimar. Os industriais alemães queriam usar os nazistas, que eram um grupo relativamente pequeno, como um animal de combate contra o movimento trabalhista e a esquerda. Acharam que podiam controlá-los, mas descobriram que estavam errados. Não estou dizendo que o fenômeno vai se repetir aqui, é um cenário bem diferente, mas algo similar está ocorrendo. O establishment republicano, o bastião corporativo e financeiro dos ricos, está chegando em um ponto em que não consegue mais controlar a base que mobilizou.

Na política externa, as notícias sobre a Síria sumiram da mídia convencional, desde a aprovação do acordo para confiscar as armas químicas do arsenal de Assad. Você pode comentar esse silêncio?
Noam Chomsky: Nos EUA, há pouco interesse sobre o que acontece fora das fronteiras. A sociedade é bem insular. A maioria das pessoas sabe bem pouco sobre o que acontece no mundo e não liga tanto para isso. Está preocupada com seus próprios problemas, não têm o conhecimento ou o compreensão sobre o mundo ou sobre História. Quando algo, no exterior, não é constantemente martelado pela mídia, esta maioria simplesmente não sabe nada a respeito.

A Síria vive uma situação muito ruim, atrocidades realmente terríveis, mas há lugares muito piores no mundo. As maiores atrocidades das últimas décadas têm ocorrido no Congo – na região oriental –, onde mais ou menos 5 milhões de pessoas foram mortas. Nós – os EUA – estamos envolvidos, indiretamente. O principal mineral em seu celular é o coltan, que vem daquela região. Corporações internacionais estão lá, explorando os ricos recursos naturais Muitas delas bancam milícias, que estão lutando umas contra as outras pelo controle dos recursos, ou de parte deles. O governo de Ruanda, que é um cliente dos EUA, está intervindo maciçamente, assim como Uganda. É praticamente uma guerra mundial na África. Bem, quantas pessoas sabem disso? Mal chega à mídia e as pessoas simplesmente não sabem nada a respeito.

Na Síria, o presidente Obama fez um discurso sobre o que chamou de sua “linha vermelha”: não se pode usar armas químicas; pode-se fazer de tudo, exceto utilizar armas químicas. Surgiram relatórios credíveis, afirmando que a Síria utilizou essas armas. Se é verdade, ainda está em aberto, mas muito provavelmente é. Nesse ponto, o que estava em jogo é o que se chama de credibilidade. A liderança política e os comentaristas de política externa indicavam, corretamente, que a credibilidade norte-americana estava em jogo. Algo precisava ser feito para mostrar que nossas ordens não podem ser violadas. Planejou-se um bombardeio, que provavelmente tornaria a situação ainda pior, mas manteria a credibilidade dos EUA.

O que é “credibilidade”? É uma noção bem familiar – basicamente, a noção principal para organizações como a Máfia. Suponha que o Poderoso Chefão decida que você terá que pagá-lo, para ter proteção. Ele tem de “bancar” essa afirmação. Não importa se precisa ou não do dinheiro. Se algum pequeno lojista, em algum lugar, decidir que não irá pagá-lo, o Poderoso Chefão não deixa a ousadia impune. Manda seus capangas espancá-lo sem piedade, ainda que o dinheiro não signifique nada para ele. É preciso estabelecer credibilidade: do contrário, o cumprimento de suas ordens tenderá a erodir. As relações exteriores funcionam quase da mesma maneira. Os EUA representam o Poderoso Chefão, quando dão essas ordens. Os outros que cumpram, ou sofram as consequências. Era isso que o bombardeio na Síria demonstraria.

Obama estava chegando a um ponto do qual, possivelmente, não seria capaz de escapar. Não havia quase apoio internacional nenhum – sequer da Inglaterra, algo incrível. A Casa Branca estava perdendo apoio internamente e foi compelida a colocar o tema em votação no Congresso. Parecia que seria derrotada, num terrível golpe para a presidência de Obama e sua autoridade. Para a sorte do presidente, os russos apareceram e o resgataram com a proposta de confiscar as armas químicas, que ele prontamente aceitou. Foi uma saída para a humilhação de encarar uma provável derrota.

Faço comentário adicional. Você perceberá que este é um ótimo momento para impor a Convenção sobre Proibição de Armas Químicas no Oriente Médio. A verdadeira convenção, não a versão que Obama apresentou em seu discurso, e que os comentaristas repetiram. Ele disse o básico, mas poderia ter feito melhor, assim como os comentaristas. A Convenção sobre Proibição de Armas Químicas exige que sejam banidas a produção, estocagem e uso delas – não apenas o uso. Por que omitir produção e estocagem? Razão: Israel produz e estoca armas químicas. Consequentemente, os EUA irão evitar que tal convenção seja imposta no Oriente Médio. É um assunto importante: na realidade, as armas químicas da Síria foram desenvolvidas para se contrapor às armas nucleares de Israel, o que também não foi mencionado.

Você afirmou recentemente que o poder norte-americano no mundo está em declínio. Para citar sua frase em Velhas e Novas Ordens Mundiais, de 1994, isso limitará a capacidade dos EUA para “suprimir o desenvolvimento independente” de nações estrangeiras? A Doutrina Monroe está completamente extinta?
Noam Chomsky: Bem, isso não é uma previsão, isso já aconteceu. E aconteceu nas Américas, muito dramaticamente. O que a Doutrina Monroe dizia, de fato, é que os EUA deviam dominar o continente. No último século isso de fato foi verdade, mas está declinando – o que é muito significativo. A América do Sul praticamente se libertou, na última década. Isso é um evento de relevância histórica. A América do Sul simplesmente não segue mais as ordens dos EUA. Não restou uma única base militar norte-americana no continente. A América do Sul caminha por si só, nas relações exteriores. Ocorreu uma conferência regional, cerca de dois anos atrás, na Colômbia. Não se chegou a um consenso, nenhuma declaração oficial foi feita. Mas nos assuntos cruciais, Canadá e EUA isolaram-se totalmente. Os demais países americanos votaram num sentido e os dois foram contra – por isso, não houve consenso. Os dois temas eram admitir Cuba no sistema americano e caminhar na direção da descriminalização das drogas. Todos os países eram a favor; EUA e Canadá, não.

O mesmo se dá em outros tópicos. Lembre-se de que, algumas semanas atrás, vários países na Europa, incluindo França e Itália, negaram permissão para sobrevoo do avião presidencial do boliviano Evo Morales. Os países sul-americanos condenaram veementemente isso. A Organização dos Estados Americanos, que costumava ser controlada pelos EUA, redigiu uma condenação ácida, mas com um rodapé: os EUA e o Canadá recusaram-se a subscrever. Estão agora cada vez mais isolados e, mais cedo ou mais tarde, penso que os dois serão, simplesmente, excluídos do continente. É uma brusca mudança em relação ao que ocorria há pouco tempo.

A América Latina é o atual centro da reforma capitalista. Esse movimento poderá ganhar força no Ocidente?
Você está certo. A América Latina foi quem seguiu com maior obediência as políticas neoliberais instituídas pelos EUA, seus aliados e as instituições financeiras internacionais. Quase todos os países que se orientaram por aquelas regras, incluindo nações ocidentais, sofreram – mas a América Latina padeceu particularmente. Seus países viveram décadas perdidas, marcadas por inúmeras dificuldades.

Parte do levante da América Latina, particularmente nos últimos dez a quinze anos, é uma reação a isso. Reverteram muitas daquelas medidas e se moveram para outra direção. Em outra época, os EUA teriam deposto os governos ou, de uma maneira ou de outra, interrompido seu movimento. Agora, não podem fazer isso.

Recentemente, os EUA testemunharam o surgimento de seus primeiros refugiados climáticos – os esquimós Yup’ ik – na costa sul na ponta do Alaska. Isso coloca em mórbida perspectiva o impacto humano no meio ambiente. Qual é sua posição acerca dos impostos sobre emissões carbono e quão popular pode ser tal medida nos EUA ou em outro país?
Acho que é basicamente uma boa ideia. Medidas muito urgentes têm de ser tomadas, para frear a contínua destruição do meio ambiente. Um imposto sobre carbono é uma maneira de fazer isso. Se isso se tornasse uma proposta séria nos EUA, haveria uma imensa propaganda contrária, desencadeada pelas corporações – as empresas de energia e muitas outras –, para tentar aterrorizar a população. Diriam que, em caso de criação do tributo, todo tipo de coisa terrível aconteceria. Por exemplo, “você não será mais capaz de aquecer sua casa”… Se isso terá sucesso ou não, dependerá da capacidade de organização dos movimentos populares.

Leão mecânico - por Aleksandr Kuskov (Arte digital - Coolvibe)

Abraço de afogado de FHC – por Diogo Costa (Jornal GGN / Blog do Nassif)

O maior dos problemas do PSDB mora em Higienópolis... O mundo presencia em tempo real ao desdobramento da maior crise econômico-financeira desde o Crash de 1929. As receitas, com variações e graduações mais ou menos acentuadas, caminham em direções opostas, por exemplo, n'alguns países da América do Sul e na Europa.

A receita ortodoxa pró-cíclica ministra os remédios do corte de investimentos estatais, do arrocho salarial e da demissão em massa de funcionários públicos. O outro modelo propugna por mais intervenção do estado, diretamente ou como indutor e regulador da atividade econômica.

Quais são as receitas do PSDB para o Brasil atual? O governo Dilma Rousseff vem pesando a mão (para os padrões brasileiros dos últimos 20 anos) na intervenção econômica. Interveio nas concessões de geradoras de energia elétrica, nos juros da taxa SELIC e não abre mão do reforço ao PAC. Qual é a política do PSDB para o salário mínimo, para as relações internacionais do país, para as comunicações, para o pré-sal, etc?

Ao que parece Aécio Neves resolveu ressuscitar Fernando Henrique Cardoso (e toda a sua antiga equipe econômica), renegado duas vezes por José Serra (2002 e 2010) e renegado por Alckmin em 2006.

Isto representa, na prática, uma ode ao passado neoliberal que ruiu em 15 de setembro de 2008. Será que trazendo economistas dos 'áureos' tempos de globalização neoliberal, será que resgatando as teses do Consenso de Washington o PSDB conseguirá conquistar os corações e mentes do povo brasileiro?

Gostem ou não, a América do Sul viveu em pouco tempo experiências distintas, diametralmente opostas e que deixou como herança alguns símbolos políticos importantes. Os símbolos da era que ruiu são justamente os ex presidentes Carlos Menem, Alberto Fujimori e Fernando Henrique Cardoso, para citar apenas os mais conhecidos.

Os símbolos da era pós neoliberal são os presidentes Hugo Chávez, Evo Morales, Rafael Correa e Dilma Rousseff. Por mais esforço que um analista político queira fazer nos dias atuais para negar determinados fatos, pelo menos um ele não conseguirá negar.

Qual seja, o fato de que os presidentes neoliberais dos anos 90 do século passado figuram no imaginário das populações de seus respectivos países como recordações desagradáveis de um tempo de submissão canina ao FMI, ao Clube de Paris, um tempo de 'relações carnais' com os EUA, de desregulamentação financeira, de solapamento de direitos trabalhistas, de aumento das desigualdades sociais, de arrocho salarial e desemprego galopante, etc.

Soa incompreensível para o mais principiante cientista político o fato de que Aécio Neves pretenda subir a rampa do Palácio do Planalto no dia primeiro de janeiro de 2015 empunhando bandeiras de triste memória. Se fossem apenas bandeiras de triste memória, tudo bem, mas a questão é que além da triste memória são bandeiras que levaram o mundo ao impasse atual, são teses que faliram fragorosamente.

Em que pese o tempo da política e das massas não ser o tempo da economia real, não há possibilidade no Brasil de hoje de que alguém ganhe musculatura eleitoral negando os 10 anos de governos do PT, ou fazendo-lhe oposição frontal. Isso seria nada mais do que um improducente suicídio eleitoral.

O PSDB precisa dizer ao povo brasileiro, de forma convincente, qual é o seu novo credo em matéria de economia política. Precisa dizer se permanece fiel aos dogmas moribundos do passado que ruiu ou se foi capaz de construir uma nova síntese.

Até o presente momento, o partido apresenta velhas fórmulas que se aplicadas como panaceia para os males de Pindorama, em menos de seis meses transformariam o Brasil numa Grécia ou numa Espanha. É isso que pretendem apresentar como solução para o país? Enfim, se alguém ainda tem dúvida de que Dilma Rousseff é favoritíssima para vencer a eleição de 2014, pode 'tirar o cavalinho da chuva'...

Mesmo com eventuais falhas aqui e acolá na condução da política e da economia nacionais, Dilma Rousseff está a frente de um trem que avança no rumo certo para vencer a crise. O povo brasileiro está muito amadurecido politicamente e não trocará um trem que avança (mesmo que lentamente) pelo caminho certo por um trem que pretende avançar (ao que parece rapidamente) rumo ao precipício da volta aos tempos do estado mínimo.

A onda moralista, neo udenista, será capaz de suprir a falta de um projeto alternativo (não neoliberal) ao capitaneado hoje pelo PT? Não foi capaz em 2006 e nem em 2010, porque seria em 2014?

Alguma alma caridosa deveria avisar Aécio Neves de que ao abraçar tão decididamente a figura de Fernando Henrique Cardoso, ele corre o sério risco de acabar sem oxigênio, num autêntico abraço de afogados. A questão que fica é a seguinte, o PSDB tem atualmente entre seus quadros capacidade e desejo de superar o seu passado de principal partido neoliberal do Brasil?

Se não conseguir virar a página com uma nova formulação programática, pode sucumbir antes mesmo de um dia ter feito jus ao 'social democracia' que ostenta em seu nome partidário. Enquanto isto, o PT segue nadando de braçadas.


Comentário
Esconderam FHC nas campanhas presidenciais porque, obviamente, seu governo foi um desastre, porém, a linha ideológica do PSDB – de ser o partido do mercado financeiro, conservador, elitista, arrogante, sem base social, brutalmente dependente da imprensa marrom, etc. – permanece intacta. Não mudarão isto nunca. O PSDB representa o capitalismo financeiro. Dilma, tenta representar o capitalismo industrial... Nenhum dos dois é ou foi a solução para os problemas brasileiros – a Dilma é apenas menos pior.
Se há alguma dúvida quanto a isso, é de se perguntar porque a juventude foi as ruas este ano. Porque nenhum dos dois partidos, bem como a própria forma como a política brasileira se manifesta não os representa.

sábado, 12 de outubro de 2013

Fotografia - por Ammar Abdullah (Reuters-Yahoo!)


Rebeldes sírios ajudam um companheiro que levou um tiro das forces leais ao governo sírio na cidade de Aleppo, Síria.

Malandro demais vira bicho - por Miguel do Rosário (O Cafezinho)

Há dias que um samba do Bezerra da Silva toca na minha vitrola interior. “Eu já disse a você que malandro demais/ vira bicho”, cantava o inesquecível filósofo das favelas. A letra é uma advertência àqueles que falam demais, contam vantagem e se acham o centro do mundo. E conclui que o sujeito, na verdade, é um “tremendo fim de festa, um pisa na bola, um zé mané”.

Não tem como deixar de pensar na nova dupla dinâmica da política nacional: Marina Silva e Eduardo Campos.

De início, achávamos que Eduardo havia dado uma tacada brilhante, mas que Marina seria apagada e oprimida pela contradição de se mostrar tão ávida pelo poder a ponto de entrar num partido como PSB, legenda que jamais teve qualquer protagonismo no debate ambiental e se notabilizou, nos últimos anos, pelo mais escancarado pragmatismo político de que se tem notícia.

O PSB cresceu, aliás, na esteira desse pragmatismo. Aliando-se ao PT aqui, ao PSDB acolá. Eduardo Campos, quando iniciou suas articulações, também se notabilizou pela incrível desenvoltura com que se aliou aos nomes mais tradicionais do antipetismo – e isto ainda participando do governo petista e aliado aos petistas em seu estado.

Pouco antes de Marina se juntar a Campos, o pragmatismo socialista atingira seu apogeu, com a filiação de Heráclito Fortes e Paulo Bornhausen, e a adesão entusiástica de Ronaldo Caiado a seu projeto.

É justamente neste momento que chega Marina, unindo-se ao PSB numa pirueta absolutamente… pragmática. Mais que isso, numa pirueta inacreditavelmente antidemocrática e voluntarista, visto que ela decide sozinha atrelar a Rede ao PSB. Toda aquela historinha de um novo fazer político, de ativismo autoral, horizontalidade, política em rede, se esvai na primeira dificuldade. Mais importante que os princípios é a perspectiva de poder. O poder pelo poder.

E ai de quem criticar! Na contramão do seu falso discurso paz e amor, acima das polaridades, Marina não hesitou em lançar calúnias contra quem não partilha de suas ideias, ao sugerir que todos que a criticam recebem “verba pública”. Ela criou uma nova polaridade: marineiros do bem X militantes do mal.

A coisa, no entanto, é muito pior. Ao perder a votação no TSE, Marina Silva envereda por um caminho sinistro. Ao invés de, humildemente, admitir que falhou, ao deixar para recolher assinaturas em cima da hora, a ex-ministra opta por desqualificar a justiça eleitoral, uma das raras instituições públicas que os vira-latas, até então, jamais ousaram criticar.

Marina se acha tão boa, tão importante, tão perfeita, que se considera acima da justiça eleitoral, a qual deveria se curvar à sua magia. Malandro demais, dizia Bezerra, vira bicho…

Ela está acima dos partidos, da política e da lei. Paira num olimpo ético tão imaculado, tão higiênico, que pode se dar ao luxo de aderir, oportunisticamente, a uma legenda tão suja, pragmática e contraditória como qualquer outra do sistema partidário brasileiro e se manter pura como um suíno fantasmagórico a vagar incólume por um chiqueiro enlameado.

Como íamos dizendo, a impressão inicial, de que a novidade era uma cartada genial de Campos se desfez, dando lugar a uma outra, bem menos positiva ao pernambucano. Quem parece ter sido esperta mesmo foi Marina. Em questão de dias, ela engoliu Eduardo Campos, inclusive traindo sua promessa de apoiar a candidatura “já posta” do socialista. Ela conseguiu dar outra pirueta e agora é ela, não Campos, a candidata do PSB.

Pior, Marina passou subitamente a dar as cartas na legenda, transformada do dia para noite numa agremiação “marineira”. Seu ataque à Ronaldo Caiado gerou um prejuízo enorme a Campos, porque colou nele a imagem de um político volúvel e desleal. Seria natural que houvesse mudanças nos arranjos após a entrada de Marina. Mas esse tipo de coisa se faz com cuidado, após debates internos, alguns privados, outros públicos. Marina chegou dando ordens ao PSB, pelos jornais!

O dano foi grande porque o PSB não perdeu apenas Caiado, que aqui entre nós não vale nada mesmo. Ele perdeu o agronegócio inteiro, ou seja, o setor econômico mais importante e mais dinâmico do país. Todas as lideranças rurais assistiram, estupefatas, a grosseria de Marina contra Caiado. Grosseria sim, porque foi Campos quem procurou Caiado. Foi Campos quem prometeu o Ministério da Agricultura a Caiado. E daí, de um segundo para outro, ele rifa o seu principal aliado no Centro-Oeste? O que ele fez com Caiado, à direita, pode ser feito a qualquer aliado à esquerda. Basta Marina dar uma entrevista aos jornais.

Marina já está usando sua vantagem nas pesquisas de intenção de voto para se impor monocraticamente ao partido, sem necessidade de negociar politicamente. E isso tende a piorar.

No mesmo dia em que Campos perde o apoio do agronegócio, que apesar de ser ideologicamente conservador, é ao menos um setor ligado à produção, à segurança alimentar, ao comércio exterior, no mesmo dia a imprensa nos informa que Marina irá apresentar Campos a executivos do banco Itaú, seu principal patrocinador.

Ora, quer dizer que os “sonháticos” rejeitam os fazendeiros, mas caem de amores pelos banqueiros? Elas por elas, os bancos são infinitamente piores que os produtores rurais. Estes são conservadores, mas plantam a soja e o milho que alimentam vacas e frangos que suprem necessidades proteicas do Brasil e do mundo. Os fazendeiros são contra os juros altos, porque dependem de financiamentos bancários. Os banqueiros são A FAVOR dos juros altos, porque vivem de rendas. Os fazendeiros, mal ou bem, são nacionalistas, ligados à terra, e querem obras de infra-estrutura, para escoarem suas safras. Os banqueiros são ligados apenas ao capital, independente de sua nacionalidade, e não se importam com obras, porque o dinheiro não precisa de estradas, ferrovias ou portos.

Ao rifar o agronegócio para se aliar ao Itaú, Campos dá um passo decisivo na direção do rentismo, que é, seguramente, o pior tipo de parasita da nossa economia.

Voltando à mesma canção de Bezerra, há uma estrofe que também parece se encaixar perfeitamente na situação de Marina. Basta trocar Swat (apelido antigo do Bope da PM) por Globo…

Em toda área
Que você pinta
Diz logo que tá
Com a cabeça feita
Mas não vê que a moçada da Swat
Tá olhando você pela direita

Fotografia - por Gordon Gahan (National Geographic)

A volta da velha senhora, os juros de dois dígitos - por Luis Nassif (Jornal GGN/Blog do Nassif)

A decisão do Copom (Comitê de Política Monetária) de aumentar a taxa Selic para 9,5% ao ano e os termos do comunicado indicam que poderá voltar novamente aos dois dígitos. E mostra – mais uma vez – a enorme dificuldade do país em definir estratégias claras de desenvolvimento.

O organismo econômico brasileiro se assemelha a de um viciado que não pode viver sem drogas, sob risco de crises de abstinência.

***

Nos dois últimos anos, o governo Dilma Rousseff deu início à mais ousada estratégia monetária dos últimos vinte anos, de tentar trazer as taxas de juros aos níveis internacionais e proceder a alguma correção do câmbio.

E aí se observou um fenômeno típico de organismos viciados.

A economia está dividida entre os grandes grupos – capitalizados e ofertantes de recursos – e pequenas e médias empresas – demandantes de crédito.

As grandes empresas vinham apresentando bons níveis de rentabilidade. Reduzida a Selic, constatou-se que caíram as margens de lucros.

Percebeu-se, então, que eram garantidas pelos ganhos financeiros. A reação de empresas maiores foi promover reajustes de preços, visando recompor margens.

Para permitir a recomposição sem repasses, muitos setores foram agraciados com redução nos encargos trabalhistas, fruto do festival de desonerações fiscais do Ministro Guido Mantega.

***

O segundo movimento foi no câmbio.

Desde que assumiu, a presidente Dilma Rousseff estava convencida da necessidade de promover desvalorizações controladas do real, para devolver um mínimo de competitividade à economia interna.

Nos últimos meses, houve forte instabilidade no dólar, com a perspectiva de elevação das taxas de juros dos Estados Unidos. O Banco Central aproveitou a brecha e promover uma desvalorização controlada do real, que bateu nos R$ 2,30.

Com isso, reduziu os riscos de crise externa, mas à custa de uma elevação nos preços internos, especialmente dos chamados comercializáveis (produtos cujos preços são regulados pelas cotações internacionais).

***

O ritmo de crescimento baixo da economia poderia amenizar o repasse para os preços. Mas, ao mesmo tempo, abriria espaço para que a mídia do eixo Rio-São Paulo voltasse a exercitar o terrorismo.

Algum tempo atrás, os dois maiores jornais de São Paulo estamparam, na primeira página, a falsa informação de que famílias estariam retornando aos hábitos de consumo do período hiperinflacionário. Durante semanas, o Jornal Nacional bateu diariamente na tese da perda do controle inflacionário.

Esse movimento gerou um efeito cascata que se espalhou por diversos setores e acabou sendo contido pela decisão de elevar a Selic.

***

Agora, retorna-se ao mesmo jogo anterior. Aumentam-se os juros, os grandes grupos recompõem os lucros com ganhos financeiros. E a rapa, o enorme contingente dos tomadores de crédito – pequenas e médias empresas, consumidores pessoa física passam a pagar mais.

A melhoria de caixa das empresas – com a alta da Selic – será bancada com a redução dos recursos disponíveis para educação, saúde, investimento. Há que se poupar mais, para garantir os juros, os ganhos financeiros dos grandes e a tranquilidade da velha mídia.

sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Fotografia subaquática - por Ilse Moore (behance.net/ilsemoore)


Pragmática e não programática

Creio que politicamente, Marina Silva, a nossa guerreira itaú-guarani-kaiowá segue apresentando quase como sua identidade eleitoral os vinte milhões de votos que obteve. É bom lembrar Alckmin obteve quase o dobro disto e não é sequer aventado como candidato para as próximas eleições. Ademais, a guerreira itaú-guarani-kaiowá se esquece de salientar que obteve estes vinte milhões de votos especialmente por três motivos:

1 - A ampla benevolência e apoio que obteve da imprensa marrom (ademais se considerando que era uma candidatura nanica), com o intuito de gerar um segundo turno em que o candidato do mercado financeiro viesse a vencer. Quando era ministra do governo Lula, era tratada como um estorvo administrativo, uma péssima gestora. Assim que “passou para o lado de lá”, foi tratada como a deusa do verde – alterou sua ideologia (se é que algum dia teve alguma) e foi regiamente recompensada por isto.

2 - Não pelos méritos próprios, mas por cansaço/desgaste eleitoral, mesmo, a guerreira itaú-guarani-kaiowá congregou os votos dos que desejavam fugir da polarização PT X PSDB.

3 – E, o ponto mais importante de todos, ela recebeu o tétrico voto religioso – consequência da campanha abjeta feita pelo senhor José Serra.

Foram votos, que contam como outros quaisquer, mas votos em sua maioria dados pelos motivos errados, manipulados, sem estrutura social, ideologia ou programa que os sustentassem se ela viesse a ganhar a eleição.


Quanto a sua candidatura em si, não há ideologia nenhuma no assunto. A guerreira itaú-guarani-kaiowá saiu do PT depois de ter sido filiada por 23 anos e também depois ter ficado como ministra em seis dos oito anos do governo Lula. Ela, então, passa a deplorar o PT – como se fosse muito diferente o que esta acontecendo agora do que foi feito quando ela compunha o governo. Não foi. O PT realmente teve uma mudança ideológica enorme em sua história – para pior em minha singela opinião – mas esta mudança ocorreu, é bom notar, antes da eleição do Lula. Depois que ele assumiu e nomeia um Palocci para o Ministério da Fazenda e um Henrique Meireles para a presidência do Banco central, não há mais dúvida quanto a que lado Lula escolheu, tampouco veleidades em disfarçar a abjuração da própria história de seu partido – traição que gerou o expurgo que resultaria na criação do P-Sol. Muito bem, não foi neste momento que ela saiu do partido. Muito menos quando eclodiu o “escândalo” do mensalão. Agora a guerreira itaú-guarani-kaiowá quer passar por diferente do que aí esta? Será que em todos os anos de filiação ao PT ela não havia percebido o que hoje aponta de errado? Por que ela ficou longos 23 anos lá, então? E por que passou 6 anos como ministra do governo Lula, então?

A questão não é programática, é pragmática, como ela bem “acertou quando errou” em seu discurso de filiação ao PSB. Marina só saiu do PT, é preciso deixar claro, porque sabia que ela jamais seria candidata pelo partido a presidência da república. Só por isto.

Entrou no PV única e exclusivamente para ser candidata à presidência. Como não virou proprietária do partido como pretendia (e Eduardo Campos é exatamente isto, dono do partido, e não seu presidente), novamente saiu do partido que era filiada. Como não conseguiria ser proprietária de nenhum partido – a não ser que o criasse, inventou a tal Rede Sustentabilidade. Com interesses única e exclusivamente eleitorais, e não “sonháticos”.

A guerreira itaú-guarani-kaiowá me lembra muito o caso da Soninha, ex-VJ da MTV. Como a Soninha não conseguiria ser candidata à prefeita de SP pelo PT, se desfiliou do partido. O tempo passa, ela faz críticas pontuais ao seu ex-partido, tudo normal. Passa um pouco mais de tempo, e ela começa a bombardear o PT como se este fosse o próprio anti-cristo – e, por fim, dá um abraço de afogado em José Serra. O PT da Soninha mudou tanto assim de quando ela saiu dele para o que ele é hoje? Não. Quem mudou foi ela.

É triste notar que não há na questão das duas figuras absolutamente nenhum componente ideológico, nenhum constrangimento por estarem atacando não só o partido que compunham, mas também atacando os companheiros que fizeram ao longo de sua jornada – e, especialmente, atacando sua própria história, pois elas também compuseram o partido, também foram o PT (não dá pra apagá-las das fotos, como fazia o “camarada” Stálin). E, no caso da Marina, ela não só foi um militante do PT, mas também uma pessoa de destaque dentro do partido, candidata a cargos relevantes, como senadora e saiu do partido enquanto ministra, era prestigiada. E agora, porta-se simplesmente como uma traidora.

De fato, parece que a sanha pelo poder suplanta qualquer resquício moral, ideológico ou intelectual que uma pessoa possa ter.


Não só por este motivo, mas também, cada vez tenho menos esperança que um governo – qualquer governo – possa de fato ter ser a solução para os problemas que afligem o país. Qual seria a solução, então? Talvez, a abolição conjunta do Estado e da propriedade privada.

Mensageiro andróide - por Oliver Wetter (Arte digital - Coolvibe)

Marina, você se pintou - por Wanderley Guilherme dos Santos (O Cafezinho)

Em 48 horas de fulminante trajetória a ex-senadora Marina Silva provocou inesperados solavancos no panorama das eleições em 2014. Renegando o que há meses dizia professar aderiu ao sistema partidário que está aí, mencionou haver abrigado o PSB como Plano C, sem mencioná-lo a desapontados seguidores, e declarou guerra a um suposto chavismo petista. De quebra, prometeu enterrar a aniversariante república criada pela Constituição de 88, desprezando-a por ser “velha”. Haja água benta para tanta presunção.

Marina e seguidores não consideravam incoerente denunciar o excessivo número de legendas partidárias e ao mesmo tempo propor a criação de mais uma. Ademais, personalizada. O “Rede” sempre foi, e é, uma espécie de grife monopolizada pela ex-senadora. Faltando o registro legal, cada um tratou de si, segundo o depoimento de Alfredo Sirkis. Inclusive a própria Marina. Disse que informou por telefone ao governador Eduardo Campos que ingressaria no Partido Socialista Brasileiro para ser sua candidata a vice- presidente. Ainda segundo declaração de Marina, o governador ficou, inicialmente, mudo. Não era para menos. Em sua estratégia pública, Eduardo Campos nunca admitiu ser um potencial candidato à Presidência, deixando caminhos abertos a composições. Eis que, não mais que de repente, o governador é declarado candidato por sua auto-indicada companheira de chapa. Sorrindo embora, custa acreditar que Eduardo Campos esteja feliz com o papel subordinado que lhe coube no espetáculo precipitado pela ex-senadora.

Há mais. Não obstante a crítica às infidelidades de que padecem os partidos que aí estão, Marina confessou sem meias palavras que ingressava no PSB, mas não era PSB, era “Rede”, e seria “Rede” dentro do PSB. Plagiando o estranho humor da ex-senadora, o “Rede” passava a ser, dali em diante, não o primeira partido clandestino da democracia, mas o primeiro clandestino confesso do Partido Socialista Brasileiro. Não deixa de ser compatível com a sutil ordem de preferência de Marina Silva. Em primeiro lugar vinha a criação da Rede, depois a pressão para que a legenda fosse isenta de exigências fundamentais para a constituição de um partido conforme manda a lei e, por fim, aceitar uma das legendas declaradamente à disposição.

Decidiu-se por uma quarta opção e impor-se a uma legenda que não é de conhecimento público lhe tenha sido oferecida. Enquanto políticos trocam de legenda para não se comprometerem com facções, a ex-senadora fez aberta propaganda de como se desmoraliza um partido: ingressar nele para criar uma facção. Deslealdade com companheiros de percurso, ultimatos e sabotagem de instituições estabelecidas (no caso, o PSB), não parecem comportamentos recomendáveis a quem se apresenta como regeneradora dos hábitos políticos.

O campo das oposições vai enfrentar momentosas batalhas. Adotando o reconhecido mote da direita de que o Partido dos Trabalhadores constitui uma ameaça “chavista”, Marina pintou-se com as cores da reação, as mesmas que usa em suas preferências sociais: contra o aborto legal, contra o reconhecimento das relações homoafetivas, contra as pesquisas com células tronco, enfim, contra todos os movimentos de progresso ou de remoção de preconceitos. Abandonando a retórica melíflua a ex-senadora revela afinal a coerência entre suas posições políticas e as sociais. Empurrou o PSB para a direita de Aécio Neves, a um passo de José Serra. É onde Eduardo Campos vai estar, queira ou não, liderado por Marina Silva. As oposições marcham para explosivo confronto interno pelo privilégio de representar o conservadorismo obscurantista.

quinta-feira, 10 de outubro de 2013

Fotografia - por Jason DeCrow (AP Photo-Yahoo!)


Final do dia na cidade de Bandar Seri Begawan, em Brunei.

Marina Silva jogou a Rede na bacia das almas - por Luciano Alvarenga (Blog do Nassif)

A Marina Silva está no PSB, mas há dois anos estava no PV e antes no PT. Entre o PT e o PSB, Marina resolveu fundar um partido, a Rede. O principio da Rede é que não fosse partido, mas virou para Marina fazer ideias não partidárias caberem num partido.

A Marina foi ministra do Meio Ambiente durante quase todo o governo Lula. Saiu dois anos antes de findar o segundo. E saiu por que se viu num embate com a futura candidata do Lula, Dilma. Marina era uma liderança dos movimentos ecológicos, Dilma o nome que Lula escolheu pra continuar seu projeto político.

Foi para o PV e se lançou candidata com vinte milhões de votos à presidente. No PV deu tudo errado pós-eleição. Ao contrário do que possa ter pensado a Marina, o PV não mudou uma linha de sua histórica posição, à direita, à esquerda, ao centro. A Marina não conseguiu nesse partido o espaço que imaginou que teria direito com suas duas dezenas de milhões de votos.

Entre os vinte milhões de votos e a saída do PV, foram dois anos.

É apenas depois de sair do PT, entrar no PV, ser candidata a presidente e sair do PV é que Marina saca a Rede. A pergunta: se a Rede não é casuísmo, por que não veio à existência tão logo a Marina saiu do PT em 2008? Se os procedimentos para a criação desse partido tivessem se iniciado em 2008 ou, tão logo acabou a eleição de 2010, Marina seria candidata agora.

A julgar pelos movimentos políticos de Marina desde que saiu do PT, a impressão que se tem é que a Rede é uma ideia surgida, casuísmo, da inviabilidade de a Marina estar em qualquer partido. Ou seja, a Rede não é uma Idea nova pra novos tempos, a Rede é “o partido” de sempre tentando sugar energias novas numa ideia velha. Isso fica claro na opção da Marina de se filiar ao PSB de Eduardo Campos.

Se o projeto de Marina fosse a Rede, no que essa ideia pode conter de novo, ela deixaria de ser candidata agora e se dedicaria a concretização da Rede no cenário nacional. O que importa não seria ela como candidata, mas o projeto. E o projeto dando certo, ela seria a candidata. Ficaria fora da eleição agora ou, se manteria a distancia promovendo uma eleição paralela, discutindo, palestrando, tematizando e organizando.

Marina não entendeu que seus vinte milhões de votos foram um movimento de uma parte importante da sociedade civil que via nela o vetor pra outras coisas, ideias e atitudes diferentes de tudo aquilo que ai está. A Marina não entendeu que seus votos não são seus, são de uma ideia, de um outro tempo que se quer construir.

Mas Marina tem um problema, não engoliu até agora que saiu do governo do Lula numa derrota para a então ministra Dilma Rousseff. Marina não resolveu seu problema com o PT; é natural, depois de uma vida no partido, uma história juntos, é difícil aceitar, muitos ex-petistas não aceitam também. Isso é compreensível à luz da primeira frase da Marina quando anunciou filiar-se ao PSB; algo como, ‘precisamos acabar com o chavismo que o PT instalou no país, salvar a democracia’. Frase forte. A frase poderia ser, ‘é fundamental para manter a Rede viva, minha aliança com o PSB’.

A frase traz à tona o fato que, mais importante que a Rede é acabar com o chavismo e salvar a democracia. Mesmo que pra isso seja necessário abandonar a Rede, simbolicamente, e embarcar, concretamente, no PSB como filiada. A indignação que tomou conta de sonháticos e marineiros, com a atitude eleitoral e partidária da Marina, é a contra prova de que a sonhática maior nunca teve outra intenção na vida que não ser candidata, ainda que vice, contra o PT de todos os ódios que ela sente e que não conseguiu expelir da alma.

A Rede foi vendida. A Marina não tem plano, objetivo nem nenhum foco, sua trajetória política desde que saiu do PT evidencia isso e; sua filiação ao PSB nas condições colocadas, quando poderia se dedicar ao invento social e político que deu inicio, comprova o que está sendo afirmado. A Rede viverá agora um processo acelerado de apodrecimento por falta de vitalidade e seiva que era produzida pela liderança da Marina. Ou, será o que Marina queria mesmo que ela fosse, um partido político.

Marina será tragada pra dentro da eleição com tudo o que isso significa. Daqui um ano ela poderá não ter quase nada do capital eleitoral e político que amealhou em 2010. Com a Rede paralisada por um ano por falta de liderança, e por tudo o que vai acontecer no cenário eleitoral, ainda mais com Marina numa coligação que pode assumir o papel de oposição maior na eleição, o que pode acontecer não é o novo que a Rede já almejou ser, mas a Marina como a maior voz, ao lado de Eduardo Campos, de uma oposição renovada

Fotografia - por Michael Melford (National Geographic)

Vice-líder do PT na Câmara ataca governo Dilma: “Nunca pensamos que chegaríamos a uma situação como essa” – por Roldão Arruda (Estadão)

Vice-líder do PT na Câmara ataca governo Dilma: “Nunca pensamos que chegaríamos a uma situação como essa”

A lentidão nos processos de desapropriação de terras para a reforma agrária está tornando insustentável a situação dos sem-terra no País. A avaliação é do deputado baiano Valmir Assunção, vice-líder do PT na Câmara. Para o parlamentar, a forma como a presidente Dilma Rousseff conduz a reforma contradiz a história do partido.

“Na nossa história nunca pensamos, qualquer militante de esquerda ou de movimento social, que chegaríamos a uma situação como essa, em um processo de reforma agrária num governo do PT”, afirmou o deputado, que é agricultor e militante do Movimento dos Sem-Terra (MST).

Em e-mail enviado ao repórter, comentando matéria publicada no domingo pelo Estado, com a revelação de que Dilma não assinou nenhum decreto de desapropriação de terras neste ano, ele observa: “Enquanto isso os conflitos decorrentes da concentração de terra continuam a imperar no campo brasileiro. São mortes e disputas que o governo precisa dar respostas, com a democratização da terra.”

Na mensagem, o deputado petista também contesta informações dadas ao Estado pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) sobre o número de assentamentos efetuados em 2012. Segundo declarações do presidente da instituição, Carlos de Guedes, foram assentadas 23 mil famílias. O número real, porém, segundo Assunção, é três vezes menor: “Em 2012, foram assentadas, somente, 7.318 mil novas famílias. É o índice mais baixo de toda a história do Brasil”.

A principal causa da diferença se deve a critérios de contagem. Para o deputado devem ser contabilizadas apenas famílias assentadas em novas áreas da reforma agrária – o que seria o melhor indicador para redistribuição de terras. O Incra, no entanto, soma também as famílias enviadas para lotes abandonados em assentamentos antigos.

Assunção revela que, por causa do baixo desempenho, o governo utilizou apenas 33% do total do orçamento destinado a ações de Cadastro, Seleção e Homologação de Famílias Beneficiadas do Programa de Reforma Agrária. Em relação ao Crédito de Instalação, o resultado foi pior: somente 15,3% do total dos recursos saíram dos cofres. “Isso significa que, de uma meta de R$ 741,5 milhões, foram pagos somente R$ 113 milhões”, diz.

O deputado contesta ainda as declarações do presidente do Incra de que o governo estaria mais preocupado com o desenvolvimento dos assentamentos já existentes. “A obtenção de terras é o marco zero de qualquer política de reforma agrária, sendo prioritária a execução máxima dos recursos destinados e sua gerência melhorada”, diz. “Infelizmente, não é isto que está acontecendo.”

O deputado também tratou do assunto em pronunciamento feito nesta terça-feira, 8, na Câmara. Ele mencionou a informação publicada pelo Estado de que, “do ponto de vista da redistribuição de terras, 2013 pode ser o pior ano da reforma agrária desde o início do período da redemocratização, em 1985″.


Comentário

Daí o governo diz assim: estamos mais focados nos já assentados. É a mentira (quase) perfeita. Permanece o Brasil sendo um imenso latifúndio, a terra concentrada, e passamos a produzir cada vez mais grãos ao invés de comida (que, por conseguinte, fica mais cara – basta ver o susto do tomate no início deste ano, por exemplo). E isto, é sempre bom frisar, num governo do PT.


Era melhor que nomeassem logo o Raul Jungmann como ministro, e o governo assumisse logo que não possui nenhum interesse em realizar a reforma agrária, mas apenas dar mundos e fundos e tudo o mais para o agronegócio. Ao menos seria um discurso mais íntegro e coerente.



Então, o governo Dilma esta assim: por um lado, graves problemas nas obras de infra-estrutura:  nas estradas (as que andam são via privatização), nos aeroportos (para citar um exemplo, basta ver o indesculpável atraso do aeroporto de Vitória, uma absoluta vergonha), o tanto de problemas no PAC do saneamento, a interminável transposição do rio São Francisco, etc., eu questiono amargamente a tal capacidade de gestão atribuída a presidente Dilma.


Tudo bem que estes problemas elencados no artigo acontecessem assim que o atual governo tivesse assumido o poder, já que Collor e FHC, de fato arrasaram o estado brasileiro. A questão é que o PT não assumiu agora – e sim há onze anos. Não dá pra culpar outrem, não dá pra se escusar tamanha incompetência. Já deu.


Por outro lado, no quesito ideológico, temos o leilão do campo de libra, o PL 4330, a reforma agrária paralisada, etc.


O governo Dilma, pela ótica da gestão, vai mal. Pelo lado ideológico, pior ainda. Se a ela não vir a ser reeleita, terá bem feito por onde.

quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Fotografia - por David Carlier (redbullillume)

Marina e o chavismo - por Paulo Nogueira (Diário do Centro do Mundo)

O povo pobre venezuelano na morte de seu líder
Que Marina quis, exatamente, dizer com “chavismo”?

Bem, coisa boa não foi. Chávez foi usado por ela mais ou menos como Zé Dirceu por Serra num debate com Haddad na disputa pela prefeitura de São Paulo.

“Você é amigo do Dirceu, não é?”, perguntou Serra, uma, duas vezes. Ele parecia achar que o eleitor de São Paulo é um fundamentalista cujo Corão é a Veja. Deu no que deu a estratégia de Serra para derrubar Haddad à base de uma amizade.

Marina demonizar Hugo Chávez é algo que diminui não a ele, que já entrou na história como um homem que não se conformou em ver seu país ser tratado como quintal pelos Estados Unidos e mudou isso com coragem, abnegação, sacrifícios e colossal integridade.

Diminui a ela, porque mostra – se não oportunismo baixo, como foi o caso de Serra – falta de compreensão histórica.

A Venezuela era boa, até Chávez, para uma minúscula elite que vivia em Miami. O petróleo venezuelano acabava fazendo coisas como asfaltar Nova York e inflar a fortuna de uns poucos nativos — pouquíssimos, é mais apropriado.

Os chamados 99% — no caso venezuelano, 99,99% — eram desprezados e mantidos numa pobreza abjeta comparável à das periferias brasileiras.

Chávez acabou com isso.

Colocou os pobres no topo das prioridades quando chegou ao poder, pelas urnas. Os recursos do petróleo passaram a ser canalizados para os próprios venezuelanos, o que valeu a ele um ódio sem limites – e golpista – da parte dos Estados Unidos.

Chávez chegou a ser vítima de um golpe orquestrado pelos americanos e mais a plutocracia contrariada venezuelana, mas dois dias depois voltou ao poder por pressão popular.

Chávez pôs foco na educação e na saúde pública. Deu petróleo a Cuba, e em troca médicos cubanos não apenas foram atender venezuelanos pobres que jamais tinham visto um consultório como também passaram a lecionar em escolas de Medicina.

As urnas consagraram Chávez repetidas vezes. Foi tamanho o impacto de Chávez na Venezuela que Caprilles, o principal líder da oposição, assegurou que manteria os programas sociais chavistas caso vencesse as eleições presidenciais.

No ano passado, uma pesquisa sobre os países mais felizes do mundo colocou os venezuelanos no topo na América do Sul. Chávez elevou a auto-estima de um povo que era invisível para seus governantes.

Um esplêndido documentário mostra o que foi o chavismo: “A revolução não será televisionada”. Recomendo vivamente que seja visto.

As cenas de devoção e tristeza do povo pobre da Venezuela em sua morte foram extraordinariamente tocantes. Jornalistas de todo o mundo se perguntavam: onde se veria tal comoção na morte de um líder? Na França, na Inglaterra, nos Estados Unidos?

Pausa para rir.

No Brasil, Chávez foi submetido  a um linchamento criminoso e incessante por uma mídia que temia acima de tudo que Lula combatesse privilégios – a começar pelos dela, mídia – com a intensidade de Chávez.

O chavismo é um marco fundamental na nova atitude dos líderes sul-americanos diante da predação centenária dos Estados Unidos.

Se Marina não sabe disso, é ignorante. Se sabe, é uma oportunista que está em busca dos afagos da mídia como os políticos dos quais ela diz ser diferente. Fora dessas duas hipóteses, existe a possibilidade de que ela seja uma mistura de ambas as coisas.

Sythril - por Saeed Jalabi (Arte digital - Coolvibe)

O que explica a sinceridade desconcertante da ombudsman da Folha? - por Paulo Nogueira (Diário do Centro do Mundo)

O jornalismo chapa branca, hoje, se pratica no interior das grandes empresas de jornalismo. Já escrevi sobre isso. Os jornalistas, lá, estão numa gaiola: só podem escrever o que os patrões querem que eles escrevam.

Isso quer dizer o seguinte: eles defendem os interesses particulares das empresas para as quais trabalham. Eles são, portanto, a voz do 1%.

Nunca foi tão claro isso. Compete aos jornalistas produzir, mecanicamente, textos, fotos, legendas, primeiras páginas e demais itens que compõem uma publicação.  Mas não pensar. Não ter ideias.

As ideias são exclusividade dos donos. Os jornalistas não podem pensar diferente deles. Ou melhor: podem. Mas não podem transformar isso em reportagens, artigos, entrevistas etc.

Não é um trabalho exatamente excitante. É mais parecido com propaganda do que com jornalismo propriamente: você vende ao seu público, como se fosse sabonete, os interesses de um pequeno grupo que fez o Brasil ser o que é, a terra da desigualdade.

Quanto isso pode durar?

É verdade que a internet abre aos jornalistas uma nova possibilidade – defender coisas que vão além dos interesses do 1%.

Mas para quem está engaiolado nas corporações o prolongamento de uma situação em que pensar é proibido pode tornar a situação mais e mais exasperante.

Entendo que isso possa explicar, ao menos em parte, o desabafo franco – e talvez suicida – da ombudsman da Folha, Suzana Singer.

Ao comentar a cobertura de uma pesquisa sobre a situação dos brasileiros, ela se referiu ao tradicional “catastrofismo” da Folha.

Os destaques dados pela Folha foram, todos eles, negativos. As más notícias estavam longe de representar o conjunto. Isso significou que foi oferecido ao leitor um quadro distorcido.

O desafio de um editor é ajudar o leitor a entender o mundo. Uma das armas, para isso, é buscar uma visão de floresta sobre as coisas, e não se limitar a uma árvore ou outra.

A Folha fez o oposto. Se conheço a vida numa redação, os editores da reportagem sobre a pesquisa acharam que, pinçando as estatísticas ruins, estavam agradando a seus patrões.

O acúmulo deste tipo de expediente pode ter esgotado a paciência da ombudsman. Catastrofismo é uma acusação séria. É desvio de caráter numa publicação. Não é um problema ocasional. É um drama no dia a dia do jornal e, sobretudo, dos seus leitores.

Outro episódio que tinha me chamado a atenção, na mesma linha, foi uma surpreendente crítica de Ricardo Noblat no site do Globo a Joaquim Barbosa. Sempre tão obediente à linha de pensamento dos Marinhos, ali Noblat foi para o lado oposto.

Cansaço? Exaustão? Frustração? Alguma preocupação com a posteridade? Problemas de consciência?

Situações extremas não podem perdurar por muito tempo. O jornalismo chapa branca que se faz hoje nas redações brasileiras – um ofício em que você faz pouco mais que beijar as mãos dos donos – é a negação do real jornalismo.

A beleza do jornalismo é dar voz a quem não tem. O jornalismo brasileiro dá voz a quem tem o monopólio da voz.

Uma hora a gaiola fica incômoda demais, por maiores que sejam os salários.