A votação do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), rejeitando a formalização do partido de Marina Silva, e o voto contrário do Ministro Gilmar Mendes são exemplos eloquentes da importância do detalhismo na Constituição brasileira.
Hoje de manhã entrevistei o jurista Michel Temer - ocasionalmente vice-presidente da República, mas permanentemente um dos grandes constitucionalistas do país - sobre a constituição de 1988. Antes mesmo de deputado constituinte, corria o país em palestras sobre a importância da nova Constituição. Constituinte eleito, foi das peças centrais da montagem de uma constituição que casou respeito a direitos individuais com direitos sociais.
A maneira como foi organizada, com ampla participação popular e com uma organização interna de comissões temáticas, somadas aos ventos democratizantes das diretas, transformou a Constituição no passaporte do país para a modernidade, não de imediato, mas à medida que o Judiciário e o Ministério Público foram entendendo o espaço aberto e aplicando os princípios previstos. Conceitos como a saúde e a educação como direito de todos deixaram de ser sonhos vagos para se transformarem em ferramentas de inclusão.
O detalhismo
Uma das críticas à Constituição foi o que se considerou detalhismo excessivo. Como Temer lembrou, na entrevista, foi esse detalhismo que garantiu as bases da consolidação da democracia brasileira e dos direitos sociais posteriores, ao restringir o campo de discricionariedade das interpretações constitucionais.
Os Estados Unidos tem princípios consolidados e uma estrutura social e política que impede abusos. Pode-se dar ao luxo de uma constituição fundada em princípios e construída no dia a dia das interpretações da Corte.
E o Brasil, com sua pouca tradição democrática?
Analise o voto solitário de Gilmar Mendes - a favor do reconhecimento do partido de Marina Silva. Independentemente do mérito maior ou menor de Marina, a lei é clara quanto ao número de assinaturas reconhecidas para a formalização de partidos. Marina não alcançou o número necessário e o partido não foi legalizado. Simples assim.
Ministro do STF que mais se incomoda com os limites impostos pela Constituição à sua atuação, Gilmar alegou uma conspiração dos cartórios e o prejuízo sofrido por Marina em votações recentes de leis destinadas a coibir novos partidos.
Ora, nada disso está previsto na lei. Assim, 6 juízes votaram contra Marina e Gilmar ficou sozinho com seus sofismas.
A catarse do STF
Transporte, agora, esse subjetivismo para o clima feérico que dominou o STF no julgamento da AP 470 e nos períodos posteriores. Com o poder de que se julgavam ungidos pela mídia, Ministros aventureiros avançaram em cima das atribuições do Congresso com uma semcerimônia à altura de um Chico Ciência - o inspirador da Polaca, a Constituição autoritária do Estado Novo.
Foi o detalhismo da Constituição que permitiu a reação dos legalistas e o enquadramento dos jovens turcos.
Se a Constituição fosse uma exposição de princípios aberta ao exercício discricionário das interpretações, dependendo de maiorias ocasionais - como a que dominou o órgão no ano passado - a democracia desmoronaria, não pelo peso dos canhões, mas das togas do STF.
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