Comentário ao post "O vale-tudo da política, por Mino Carta".
Recoloco uma referência que fiz em um comentário de outra postagem, muito elucidativa para analisar o praticismo em voga - o texto Crítica do Praticismo Revolucionário, de Sérgio Lessa:
http://www.sergiolessa.com/artigos_92_96/praticismo_1995.pdf
"Com o abandono do esforço teórico, a cada geração os “revolucionários” são mais ignorantes, e exibem uma maior estreiteza na sua concepção de mundo. São crescentemente incapazes de apreender a essência do processo histórico, perdendo-se nos seus meandros fenomênicos e fugazes. Sem a compreensão do mundo em que agem, suas práticas são marcadas pelo taticismo, pela absoluta falta de estratégia."
(...)
"Pari passu a esta disjunção entre prática e teoria, ocorre um outro processo, a ela intimamente articulado. Com o esgotamento da crise revolucionária dos anos vinte e os primeiros movimentos de estruturação do que viria a ser chamado, posteriormente, de Estado do Bem Estar Social, a luta política nos países capitalistas avançados é cada vez menos luta de massas contra a exploração capitalista, e cada vez mais a disputa burocratizada pelo poder no interior dos “aparelhos” políticos (partidos, sindicatos, associações, etc.): os militantes vão deixando de ser autênticos revolucionários para se converterem em “aparatchiks”, ou seja, funcionários burocráticos de estruturas stalinistas ou reformistas (não nos esqueçamos que, grosso modo, o stalinismo é contemporâneo à gênese e ao apogeu do Estado de Bem Estar Social) que há muito abandonaram a luta contra a exploração do homem pelo homem. Estes dois processos (a cisão teoria-prática e o abandono da luta revolucionária) se determinam reflexivamente, evoluem como faces de uma mesma moeda.
(...)
"Com isso as reviravoltas políticas se sucedem e são justificadas como acertadas continuações das igualmente justas linhas anteriores. É pífio o argumento de fundo a que sempre se recorre nessas ocasiões, mas suficiente para convencer o obediente militante stalinista: a concepção dialética da história “prova” que as coisas, com o tempo, se transformam “em seu contrário”. Assim, as reviravoltas são imprescindíveis. Cabe apenas, “dialeticamente”, demonstrar como elas são corretas."
(...)
"Isto tem duas conseqüências fundamentais para o nosso tema. Frente à incapacidade para entender o momento histórico, assim como para compreenderem a si próprios, os revolucionários terminam por fazer, da necessidade, virtude: como são incapazes de se constituírem enquanto uma alternativa estratégico-global ao mundo burguês, passam a compreender o “fazer política” como a busca de uma eficiência cotidiana no enfrentamento com a burguesia, centrando todos os seus (parcos) esforços teóricos na busca de uma alternativa ao poder burguês que não implique na revolução. Raciocinam eles que, se temos que ser alternativa à burguesia, temos que saber como administrar o Estado burguês melhor do que a própria burguesia, mostrando assim ao “povo” (pois a esta altura, a centralidade da classe operária já foi perdida) que os revolucionários são confiáveis e, por isso, a eles deve ser entregue o poder político.
Não percebem que este reformismo não tem a menor possibilidade de sucesso, pois administrar o Estado burguês tem apenas um significado histórico possível: se colocar a serviço da burguesia. Pequenas melhorias na administração pública, aqui e ali, são os melhores resultados possíveis de se colocar a serviço dos donos do capital, e tais “sucessos” apenas reforçam a ordem burguesa! Com isto não queremos sugerir uma condenação in totum da luta parlamentar, mas apenas sublinhar que ela pode ser taticamente necessária, mas jamais deixará de ter este conteúdo essencial.
Esse reformismo político, inerente ao praticismo contemporâneo, não é sua única consequência. Ao correr atrás dos fatos como o jumento atrás da cenoura, a militância se transforma numa roda viva que torna o estudo uma atividade impossível. Como toda ação é desprovida de uma orientação estratégica, apenas um enorme volume de prática pode manter o militante à tona na luta política. Busca-se, antes de mais nada, conquistar ou manter “postos” em sindicatos, associações ou no poder Legislativo e Executivo. Isto requer uma politicagem cotidiana, de conchavos e articulações, que exaure as suas energias. Além disso, nas “frentes de massa”, a luta por um lugar ao sol não é menos esgotante, tornando o cotidiano impermeável à “prática teórica”. Ao invés do revolucionário elevar o nível teórico das massas oprimidas (ou, se isto não é possível em todos os momentos históricos, ao menos de suas lideranças), o praticista termina por se rebaixar ao nível cultural a que a alienação burguesa reduziu os trabalhadores.”
Um comentário:
Mino Carta como sempre: Extraordinário.
É a base da crítica luxemburguista à assertiva breinsteriana, reformista e burguesa. Qualquer semelhança com o movimento sindical brasileiro é pura concidência...
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