De todos os danos estruturais na economia brasileira provocados pelo programa neoliberal, nada
mais emblemático do que a venda das maiores usinas hidroelétricas da CEMIG, adquiridas
por multinacionais. Elas representam o pior tipo de capital estrangeiro porque
não representam a criação de ativos novos, nem empregos, nem agregam valor ao
País, mas aumenta a base para remessa de dividendos de um ativo construído
por brasileiros com recursos nacionais. E pior, ainda comemoram.
A maior compradora foi uma companhia estatal chinesa. É do sistema
chinês importar toda engenharia e equipamentos para suas empresas no exterior
vindos da China, também usam suas empresas para empregar chineses ao máximo.
É o pior tipo de
comprador para a pior das privatizações que se pode imaginar.
É uma regressão histórica que poucos países viram acontecer em tempos de
paz.
A CEMIG foi fundada por Juscelino Kubitschek que construiu um grande
parque hidroelétrico em Minas Gerais, até então Estado carente de energia,
suprida que era especialmente por empresas americanas que não investiam no
potencial hidroelétrico do Estado.
As usinas, começando por Três Marias, foram construídas com recursos do
Estado de Minas Gerais, recursos nacionais, projeto nacional, engenharia
nacional, mão de obra nacional.
Agora quatro das maiores usinas da CEMIG, mais de um terço de sua
capacidade de geração, são vendidas para fazer caixa para a União, caixa que
será queimada em poucos dias para pagar juros e supersalários, os recursos da
venda não têm nenhuma destinação estratégica, vão sumir na fogueira do déficit
federal continuado, que segue ainda maior em 2018.
Mas o déficit continuará até aumentado no próximo ano, o que será então
vendido?
Que tal a Amazônia? Imagine o valor da madeira serrada na floresta.
Venda de terras férteis para chineses também seria um bom negócio, faz caixa
rápido, ao gosto dos “ajustistas”.
O insano plano econômico tem como objetivo maior manter o valor do
capital rentista que consome a maior rubrica do orçamento federal, o
pagamento de juros da dívida pública. O plano não tem qualquer meta de
investimento público, hoje no seu nível mais baixo na história econômica do
Brasil, não se investe nada e nem há ideia de investir, a infraestrutura já
feita vai deteriorar, nova não será construída por falta de dinheiro, que só
falta na ideologia rentista, governos mais inteligentes sabem fazer dinheiro e
investir no País. O Brasil não é um País pobre de recursos como a Grécia, que
tem que importar comida e combustível.
O objetivo principal do plano é assegurar inflação cada vez menor para
com isso garantir o capital rentista que beneficia as classes mais altas e o
capital especulativo estrangeiro.
Para atingir tal objetivo não há espaço para investimentos públicos, que
são exatamente aqueles que dariam empregos aos brasileiros de mais baixa renda.
Construção de obras de infraestrutura gera empregos na faixa mais crítica do
desemprego, aquela onde está a maior crise social de hoje. Investimentos
em infraestrutura geram também empregos técnicos na área de engenharia, setor
no qual o Brasil já foi campeão mundial em vários setores, como construção de
barragens, hoje um deserto de engenheiros desocupados.
O programa econômico não tem nada para o crescimento do Brasil, é apenas
um plano de tesouraria, de administração de caixa, de fazer dinheiro para
garantir os juros do rentismo.
O plano econômico Meirelles/Goldfajn tem metas definidas, garantir o
capital financeiro.
Não tem meta alguma para o emprego, alegando que este virá do
investimento privado.
Não há na história econômica saída de recessão sem ação do Estado, mas a
ação do Estado não pode existir no atual plano econômico. Ao contrário, as
privatizações visam diminuir o papel do Estado na economia, usando o dinheiro
das privatizações na fogueira dos juros e dos salários da alta burocracia, em
uma operação de curto prazo sem qualquer horizonte.
CUIDANDO DE TRINTA MILHÕES DE BRASILEIROS
Grosso modo, há no Brasil uma classe abonada que, na melhor das
hipóteses, chega a 30 milhões de brasileiros e é para essa classe que se faz a
atual política econômica.
Qual projeto existe para os outros 170 milhões de brasileiros? Um
projeto para esse grupo majoritário simplesmente não existe no atual plano
econômico, como se essas pessoas fossem uma nuvem invisível ou um estorvo para
a economia.
Na realidade falar em plano é inapropriado, trata-se de algo menor, é um
simples programa financeiro para garantir câmbio favorável para o capital
voltar protegido de qualquer risco de conversão e garantir câmbio barato para
as férias da classe média alta.
Trata-se do primeiro programa na História econômica moderna do Brasil,
desde 1930, que não tem qualquer papel para a indústria e para o emprego. O
foco único é a garantia do capital e de seus juros, especialmente o capital
especulativo de fundos estrangeiros.
Nesse contexto é que se explica a traumática privatização de usinas
construídas com capital e trabalho exclusivamente nacionais, vendidas a grupos
chineses e europeus, processo que não vai gerar um único quilowatt adicional e
um único emprego novo. (...)
Nas atuais privatizações não há projeto algum, é só fazer caixa, nada
mais. A entrada de caixa é imediatamente jogada na fogueira das despesas
correntes, sem pensar no dia seguinte.
Ao fim do processo queimou-se o patrimônio físico do País, não se
resolveu o desequilíbrio fiscal de forma permanente, no ano seguinte o
desequilíbrio continua e já não há mais o que vender porque o estoque de ativos
é finito, na primeira Era das Privatizações já se vendeu boa parte do
patrimônio nacional, agora trata-se da venda do que sobrou.
A MÍDIA ECONÔMICA
Na mídia econômica da grande imprensa, que no Brasil segue a linha
oficial, caso único no mundo, a privatização de usinas prontas e amortizadas
apenas para fazer caixa não mereceu qualquer reparo. Ao contrário, o feito foi
saudado nessa mídia como prova de confiança no País. Entrega-se patrimônio
nacional a chineses e isso é visto como uma vitória. (...)
LIQUIDAÇÃO DE ATIVOS
Privatizações de ativos importantes e estratégicos estão sendo
executadas a toque de caixa para fazer caixa, sem qualquer ideia sequer remota
de interesse nacional a longo prazo.
Essa é a consequência de se entregar o controle absoluto da economia do
País a delegados do capital financeiro internacional sem nenhuma ligação com um
projeto de País.
Lembra certos diretores financeiros (CFO) de empresas em dificuldades
contratados por “headhunters” a peso de ouro que adotam medidas de curtíssimo
prazo de geração de caixa, salvam o balanço do ano e seu salário e bônus, mas
matam o futuro da empresa.
Há casos clássicos desse tipo de atuação, corta-se toda manutenção,
pesquisa, vende-se todo o estoque com grandes descontos, dispensa os
funcionários mais experientes e mais caros, vende as melhores máquinas, vende o
prédio e passa a pagar aluguel, tudo isso gera caixa no curto prazo mas
inviabiliza a empresa no longo prazo.
O caso mais clássico desses “salvadores do caixa” é o de Alfred Dunlap,
CEO da fabricante de aparelhos eletrodomésticos SUNBEAM em 1996, apontado como
gênio na capa da revista BUSINESS WEEK. Dos 36.000 funcionários reduziu
para 10.000, cortou tudo e fez promoções de vendas dando desconto de 50% em
grandes magazines. Com isso fez caixa rapidamente mas liquidou com a marca,
destruiu a enorme rede de pequenas oficinas distribuidoras que viram as grandes
lojas venderem barbeadores por preços abaixo do que eles já tinham pago à
fábrica, causando grandes prejuízos a esses pequenos revendedores que
abandonaram a marca. Acabou com o estoque de matérias primas, a fábrica não
conseguiu mais operar e a marca foi queimada. Dois anos depois da capa da
BUSINESS WEEK, Dunlap foi considerado o pior executivo do País, mas no primeiro
ano na Sunbeam ele surfou no sucesso, ninguém percebeu o buraco que ele estava
cavando para a empresa, mas com grande lucro pessoal.
Os executivos dirigentes do banco de investimentos LEHMAN BROTHERS
ganharam bônus no ano em que o banco quebrou. Até a semana anterior à quebra
eles pareciam geniais, mas era tudo no curto prazo, para ganhar o trimestre, o
depois não interessava.
O leilão das usinas da CEMIG lembra essa feitiçaria do curto prazo, um
desastre para empresas e países, vendem a casa para pagar o almoço, no dia
seguinte não tem casa e nem almoço.
O AJUSTISMO
Enquanto o “ajustismo” à outrance segue como única política econômica do
Ministério da Fazenda, o Banco Central cuida com exclusividade e total
independência da política monetária e cambial, não tem meta de emprego, como
tem o FED em seus estatutos.
Só estabilizar a moeda, sem nenhum outro compromisso é algo relativamente
fácil. O que exige inteligência e capacidade é ESTABILIDADE com PROSPERIDADE,
obrigação legal do Banco Central americano, o Federal Reserve System, os
dirigentes tem que cumprir esses dois objetivos. Aqui é um só, o mais fácil,
acabar com a inflação paralisando o País.
O “ajustismo” marca de forma indelével seu fanatismo ao inviabilizar,
por anos à frente, a capacidade do BNDES alavancar o crescimento. Ao retirar
todas as reservas do Banco para operar nos próximos anos, o Ministério da
Fazenda sinaliza que sua única prioridade é pagar os juros de uma dívida
pública estável que não se desvaloriza pela inflação, secular método dos
Tesouros nos últimos 200 anos para aliviar seu endividamento, a começar pelo
Tesouro americano. Hoje o dólar vale um vigésimo do que valia em 1945 e com
isso que o Tesouro dos EUA conta para manter sua solvência. Estabilidade
artificial da moeda é um veneno mortal para os Tesouros, tornando sua dívida
pública impagável nem que se venda o País inteiro, os fanáticos das metas de inflação
preferem matar o País do que aliviar a dívida.
O Ministério da Fazenda saca R$ 280 bilhões do capital do BNDES para
jogar na fogueira do déficit público visando proteger os rentistas da dívida
pública, seu único objetivo.
O DESEMPREGO
Para mascarar a recessão induzida por essa política dá-se brilho a
truques estatísticos, como dizer que o desemprego está caindo, algo irreal à
luz da observação empírica.
O IBGE aponta a criação de 658 mil empregos entre maio e agosto deste
ano. Empregos criados onde e porque se não há investimento produtivo digno de
registro, público ou privado? E, claro que não se criou emprego algum de
carteira assinada, isso o próprio IBGE reconhece, então onde estão os “novos”
empregos criados pelas trombetas da GLOBONEWS?
O próprio IBGE declara que são empregos informais onde tudo pode entrar,
de motoqueiro entregando pizza a guardador de carro. São basicamente
subempregos de baixíssima renda.
O grave problema que nenhuma estatística de emprego aponta é uma
realidade cruel.
Depois de procurar emprego por dois anos um engenheiro com excelente
formação e boa experiência teve que aceitar qualquer coisa, hoje trabalha no
almoxarifado de um grande supermercado, seu valor de mercado seria de 20 mil reais,
ganha 3.500, para não morrer de fome. Esse tipo de situação é GERAL hoje na
economia brasileira, são dezenas de milhares de bons engenheiros desempregados,
acabou a indústria naval, a indústria de bens de capital está paralisada porque
não há investimentos, há pouca construção de usinas, portos, estradas e
aeroportos, existe então uma imensa reserva de mão de obra técnica
desempregada.
Quando um engenheiro vira motorista de UBER e existem centenas nessa
situação, o IBGE conta como um novo emprego e a GLOBONEWS festeja com rojão MAS
na realidade nua e crua é apenas um infeliz que aceita QUALQUER emprego para
não passar forme, ele e sua família, um homem com mulher e filhos para criar
faz literalmente qualquer coisa para manter a família, é essa a realidade real
da economia brasileira de hoje.
A INSTITUIÇÃO CEMIG
Em Minas Gerais a CEMIG é uma instituição. As usinas vendidas, que
representam 36% da geração da CEMIG, não são apenas bens físicos. São parte de
uma grande estrutura corporativa, que em 2010 era a 2ª maior empresa de energia
do País, após a Petrobras.
Com um excepcional corpo de técnicos, departamentos de pesquisa e
ecologia, até um importante setor de piscicultura para prover de peixes seus
grandes reservatórios, a CEMIG tem um papel crucial no desenvolvimento de Minas
Gerais, liquidar parte de seu melhor ativo é algo inacreditável em termos de
projeto de PAÍS. Os chineses vão cuidar dos peixes dos reservatórios ou vão só
se preocupar com os dividendos? Em 2008 a CEMIG fez um magnífico levantamento
do potencial eólico do Estado de Minas, um trabalho de fôlego, de excelência
técnica, algo que investidores privados dificilmente fariam, a CEMIG tem uma
visão pública, de interesse geral, além do puro negócio financeiro. Seu
Conselho de Administração, do qual fiz parte por muitos anos, teve luminares
como João Camillo Pena, ex-Ministro da Indústria e Comércio, Francelino
Pereira, ex-Governador do Estado, Guy Vilella, um dos maiores especialistas
brasileiros em barragens. Uma verdadeira instituição de elevado espírito
público operando um negócio empresarial, mas com olhar de interesse público
além do balanço.
Vender o coração de seus ativos é um ato contra o interesse público,
custa a crer que um Estado Nacional, um dos maiores países do mundo, com
capacidade de levantar recursos, com visão de futuro, cometa essa insanidade.
Mas fizeram. Agentes do capital financeiro internacional no comando da economia
não tem qualquer ligação com o País e com suas instituições, a CEMIG é uma
instituição, como era a outrora poderosa CESP, empresas emblemáticas, com
grandes engenharias, construtoras do País, retalhadas a pedaços.
A China nunca faria isso com suas poderosas estatais de energia, nem a
França com a EdF, nem a Itália com a ENEL. São corporações que fazem parte da
estrutura óssea do Estado, importantes para a construção do futuro para as
novas gerações, para pesquisas e novos empreendimentos, a CEMIG foi pioneira em
energia eólica, pesquisa carro elétrico, novas baterias, redes de transmissão
de dados através das linhas elétricas, não é só dividendo.
OS ECONOMISTAS DE MERCADO E OS NEOLIBERAIS
Há uma categoria de brasileiros cuja adesão ao pensar neoliberal
corrói sua adesão ao País onde nasceram e ao qual deveriam ter lealdade.
O neoliberal clássico NÃO tem pátria, são apátridas de alma, se sentem bem em
qualquer lugar do mundo desde que ligado a grandes corporações, já esqueceram
até a bandeira e o hino do País onde nasceram, sua cultura não tem raiz e ao
fim e ao cabo tem uma tênue lealdade a uma ideologia economicista que limita a
vida à carreira, ao bem-estar pessoal, para esse grupo o País não existe.
Para uma dessas voltas do Destino são essas figuras que hoje dirigem a
economia brasileira.
A Avenida Faria Lima e a Rua Dias Ferreira não são parte do Brasil, são
enclaves financeiros, paraísos fiscais que vivem como apêndices da finança
internacional, para eles o País é só um detalhe.
São esses núcleos que estouram champanhe com venda de ativos nacionais a
estrangeiros que titulam como “prova de confiança”, dançam em clima de festa
sobre os escombros de um projeto nacional, um Brasil usado apenas como
plataforma de capital internacional.
Comentário
Dizer que o governo se preocupa com 30 milhões de brasileiros é um excesso de generosidade. Se muitos, são uns 300 mil brasileiros para quem este governo trabalha.
Ou, mais bem dizendo, a quem ele serve.
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