Enquanto a Comunidade Europeia patina, o Brasil atravessa um momento positivo. Mas um maior controle fiscal, para melhorar a execução do Orçamento e reduzir a relação dívida/PIB, é fundamental se quisermos evitar problemas futuros e manter o ritmo de crescimento
O Brasil reagiu com sucesso, nesses 20 meses de crise financeira, aos problemas da recessão que atingiu as maiores economias do globo e, mais recentemente, desvendou o enorme desequilíbrio das finanças públicas em quatro países da Comunidade Europeia. Os primeiros números da gastança dizem respeito às finanças do Estado grego e são espantosos: 1 trilhão de dólares, quase meio PIB brasileiro, não são suficientes para arrumar a casa, segundo constatou desanimada a chanceler alemã, Angela Merkel, depois de abrir a bolsa... As revelações continuam com a abertura das contas de Irlanda, Portugal e Espanha, curiosamente todos eles com atestado de bom comportamento dos órgãos reguladores da própria Comunidade, do Fundo Monetário Internacional e das famosas agências de avaliação de risco. O que nos sugere esta sucessão de sustos?
Ora, o Brasil está neste momento numa situação muito especial, a economia vai crescer 6% ou 6,5% este ano, com bastante equilíbrio interno e equilíbrio externo razoável, uma taxa de 6% de inflação e um déficit de 50 bilhões a 60 bilhões de dólares em contas correntes que é manobrável, não é de assustar. O susto que tomou conta de grande parte da Eurolândia, no entanto, sugere que está na hora de todo mundo botar as barbas de molho. Inclusive nós. E como?
É evidente que precisamos de um maior controle fiscal para melhorar a execução do Orçamento e reduzir a relação dívida/PIB. São duas coisas fundamentais para se poder administrar o País adequadamente e evitar problemas futuros. É algo comprovado que sem uma política fiscal sólida a política monetária tem um efeito muito reduzido e não produz o resultado que se espera.
Os acontecimentos na Grécia mostram mais uma vez que não se pode negligenciar a política fiscal. O desequilíbrio fiscal é uma doença insidiosa: primeiro começa a violar lentamente os limites dos gastos previstos na execução orçamentária, depois concede aumentos generosos ao funcionalismo na tentativa de melhorar sua qualidade e ter um reconhecimento em votos e deixa afrouxar os controles dos gastos correntes. Quando se acorda, estamos em meio a um processo que gera despesas extraordinárias para os próximos 25 anos.
Um dos problemas que mais desconforto trazem aos governos é o trato da questão previdenciária. E aí não é só a inapetência do Executivo que funciona da direção errada, é preciso contabilizar a acomodação dos Parlamentos que têm urticária só de ouvir falar no assunto. Na maioria dos países, o que se fez nos anos recentes foi permitir que as pessoas se aposentassem mais cedo, tanto no setor público como nos setores privados. Parece muito bom reduzir o período de trabalho, trocar um pouco do suor por uma vida de lazer mais agradável. Mas, se não for providenciada essa compra do futuro melhor mediante o estabelecimento de um nível de contribuição adequado, pode se esperar o pior dos futuros.
A tragédia da política fiscal (e nós já vivemos isso em muitas ocasiões) é que as facilidades concedidas hoje serão pagas du-ramente nos 20 anos seguintes. Por sorte, aprendemos recentemente que a estabilidade de uma política fiscal é o que existe de mais importante para manter um ritmo de crescimento econômico e social sem grandes sobressaltos. O que não há é espaço para negligência nesse campo. Isso vai exigir a cobrança do compromisso dos candidatos nas eleições gerais deste ano.
O que está acontecendo nesses países da Comunidade Europeia serve de lembrança do velho aforismo de que “não há almoço grátis”. Pouco adianta condenar o FMI como se fosse o causador do incêndio, quando ele é apenas um bombeiro e está lá para tentar apagar as chamas. Essas, na realidade, foram ateadas pelos governos piromaníacos escolhidos por eleitores que acreditaram que era possível consumir mais do que produziam, gastando sem trabalhar, até que chega o dia em que o credor exige de volta o que emprestou. É nessa hora que cai a ficha: é preciso voltar ao trabalho...
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