É um homem que vive momentos de desgraça pessoal. É um doente em estado terminal. Um prisioneiro na cela esperando o enforcamento
Após uma estrela nascer, se estabilizar e queimar fusionando por dez bilhões de anos, um processo irrefreável de morte acomete o astro. Dependendo do tamanho, a estrela termina lentamente, enquanto as maiores viram buracos negros.
A frase do cientista Dr. Eldon Tyrell, da Tyrell Corporation, criadora de replicantes do filme “Blade Runner, o caçador de androides” (do diretor Ridley Scott) é ontológica: “Uma luz que brilha o dobro, vai também brilhar a metade do tempo... e você brilhou com muito, muito brilho, Roy”. Com essa frase, o Dr. Tyrell dá consciência ao replicante Roy, fugitivo de Deckard (Harrison Ford), dos poucos momentos de vida que ainda lhe restam. Roy, ao descobrir que irá morrer imediatamente, retribui seu criador com a morte.
Cunha é também uma pessoa que brilhou com muito brilho na ótica de um nazifascista. O filho pródigo do financiamento eleitoral, o elo perdido dos valores corporativos e escravo dos seus senhores. O que não se sabia é que represava tanta energia destrutiva.
Como um sol que expande em até cem vezes o seu tamanho e se contrai até virar um ponto de gravidade pura, um buraco negro, tão denso que nem a luz consegue escapar, e como as reações de um império em decadência são mais perigosas que em apoteose, Cunha, no seu desespero pela sobrevivência, dá também seus espasmos finais: arrasta toda a matéria para seu buraco negro.
Não penso em tentar prever os próximos movimentos, até porque são inesgotáveis as hipóteses de manipulação das normas produzidas pelo inconsciente maquínico de Eduardo Cunha. Está provado que Cunha está disposto a fazer qualquer coisa para preservar sua imputabilidade, até mesmo colocar um inocente no banco dos réus.
Não penso em desumanizar o inimigo, pois assim supriria o elemento ético que me diferencia; pretendo investigar seu sofrimento. Cunha é um homem que vive momentos de desgraça pessoal. É um doente em estado terminal. Um prisioneiro na cela esperando o enforcamento. A consciência de seus últimos momentos como presidente da Câmara dos Deputados, como deputado, como homem livre, como cidadão elegível, está sendo substituída por uma imagem insuportável: cassado pelos seus pares, destituído de tudo o que suas tramas financeiras pode comprar e, finalmente, sem o direito à liberdade. Essa nova realidade deve ser muito perturbadora. No filme, outro androide disse: “Quanto tempo eu tenho? É doloroso viver com medo, não é?”
Os momentos finais de “Blade Runner” são épicos. Após perseguir incessantemente Roy, Deckard cai e fica pendurado com a única mão em uma viga, impossibilitado de subir novamente. A reação do replicante Roy é surpreendente: ao invés de se livrar do seu algoz, salva Deckard da queda e, em suas últimas palavras dá, a impressão que sabia o que era sentir emoções e estar vivendo. Com voz pausada e calma, diz: “Eu vi coisas que vocês não acreditariam. Naves de ataque em chamas nas bordas de Órion. Vi a luz do farol cintilar no escuro na Comporta Tannhauser. Todos estes momentos se perderão no tempo... como lágrimas, na chuva”.
Imagino como deve ser difícil para Eduardo Cunha dormir pensando qual será o último dia que dormirá em sua cama, que gozará de seu patrimônio e que celebrará a última ceia com seus familiares e correligionários.
A obra “Os últimos dias da humanidade”, de Karl Kraus, prognostica as vantagens do enfrentamento pelo PT: “As guerras são uma benção, não apenas pelos ideais que defendem, mas também pela purificação que trazem ao povo que as trava em nome dos mais preciosos bens. Os tempos de paz são tempos perigosos. Ocasionam com demasiada facilidade relaxamento e alienação”.
A sociedade encontra-se atônita ao desenlace das conspurcações na Câmara dos Deputados, e temporariamente imóvel, porém ansiosa para reação nas ruas. Enquanto a República não se livra do mal supremo, regozijaremos os últimos dias de Eduardo Cunha.
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