sábado, 31 de março de 2012

A santa ceia - Leonardo da Vinci



O que eu acho fantástico desta pintura é olhar para o teto e observar a perfeição da perspectiva de Leonardo da Vinci. Isto é que é 3D.

Caso Policarpo-Cachoeira: será pior que Murdoch? - por Brasil 247

Silêncio de Veja, que ainda não se manifestou sobre as duzentas ligações grampeadas pela Polícia Federal entre o editor-chefe Policarpo Jr. e o contraventor Carlinhos Cachoeira, que está preso, desperta dúvidas; o Brasil assiste a um escândalo de tipo semelhante ao que levou ao fechamento do The News of the World, de Rupert Murdoch? Será possível encobri-lo?

Relações incestuosas e, portanto, desvirtuadas entre jornalistas e fontes já causaram prisões e fecharam uma publicação secular. Na Inglaterra, ano passado. Diretora executiva da News Corp., o conglomerado de mídia do magnata Ruppert Murdoch, a jornalista Rebekah Brooks chegou a ser presa pela polícia inglesa, interrogada por 12 horas e libertada sob fiança somente após contar o que sabia a respeito do trabalho de apuração que incluía escutas ilegais sobre personalidades do país e aquisição de informações com policiais mediante pagamentos em dinheiro.

O jornal The News of the World, que veiculava o material obtido na maior parte das vezes por aqueles métodos, teve de ser fechado por Murdoch, depois de mais de cem anos de publicação, por força dos protestos dos leitores e do público em geral. Eles se sentiram ultrajados com o, digamos, jeitinho que a redação agia para obter seus furos. Os patrões Ruppert e seu filho James precisaram dar explicações formais ao Parlamento Britânico sobre as práticas obscuras. Ali, foram humilhados até mesmo por um banho de espuma a contragosto.

No Brasil, neste exato momento, a revista impressa de maior circulação do país está com seus métodos de apuração igualmente colocados em xeque. Afinal, o caso das duzentas ligações telefônicas grampeadas pela Polícia Federal, nas investigações da Operação Monte Carlo, envolve num circuito fechado, e privilegiado, um contraventor especializado em se infiltrar em grandes estruturas do establishment e o atual número dois da revista. O jornalista Policarpo Jr., que acumula o cargo de diretor da sucursal de Brasília, pode até ser visto como o número três ou quatro na hierarquia interna, à medida em que, em seu último arranjo de poder, o diretor de redação Eurídes Alcântara estabeleceu o singular modelo de ter três editores-chefe na publicação. Mas com pelo menos quinze anos de serviços prestados à revista no coração do poder, Policarpo, reconhece-se, é “o cara”. Ele foi repórter especial e seu estilo agressivo de atuar influenciou a atual geração de profissionais de Veja. Eles são temidos por sua capacidade de levantar escândalos, promover julgamentos morais e decretar o destino de reputações. A revista, a cada semana, se coloca como uma espécie de certificadora da moral e dos bons costumes no País, sempre pronta a baixar a marreta sobre o que julga fora dos seus padrões.

O problema, para Veja, é que o jogo de mão entre Policarpo Jr. e Carlinhos Cachoeira pode ter sido pesado, apesar de ainda não estar claro. O silêncio da revista a respeito não contribui em nada para o seu esclarecimento. A aparente relação de intimidade pessoal entre editor-chefe e o contraventor não apenas não é um fato como outro qualquer, como pode ser a ponta do maior escândalo de mídia já visto no Brasil. A não publicação, na edição de Veja que está nas bancas, da surpreendente descoberta de ligações perigosas entre o senador Demóstenes Torres (DEM-GO) – que na terça-feira 26, sob intensa pressão, renunciou ao posto de líder do partido no Senado – e Cachoeira acentuou a percepção generalizada de que o bicheiro e o jornalista tinham um ou alguns pactos de proteção e ajuda. Será?

Em nome de ter a notícia em primeira mão, é admissível, do ponto de vista ético, ao profissional da mídia, manter relacionamentos privilegiados com quem ele considerar importante para este fim. Inclusive contraventores. O que não é eticamente aceitável é fazer com que esses relacionamentos derivem para a não publicação de notícias ou a divulgação parcial dos fatos.

O ex-governador José Serra, recentemente, foi apontado pelo ex-ministro em plena queda Wagner Rossi como um dos pauteiros (aquele que define os assuntos a serem abordados) de Veja. Pode ter sido um efeito de retórica do Rossi flagrado pela revista como dono de uma mansão incompatível com seu histórico de homem público. Mas jamais, como agora, houve a suspeita real de que um contraventor pudesse exercer o mesmo papel de, digamos, pauteiro externo da revista. A interrogação é procedente à medida em que, especialmente em Brasília, circulam rumores de que Policarpo comentaria abertamente com Cachoeira os assuntos que seriam abordados em edições futuras da revista e as angulações editoriais das reportagens.

Para qualquer um que trabalhe com informação, conhecer por antecipação o conteúdo de Veja é uma grande vantagem competitiva. Um assessor de imprensa, por exemplo. A posse desse tipo de ativo pode representar a diferença entre um bom contrato e nenhum contrato. Se se abre o espaço para a indicação de assuntos, então, ai o lobista entra no paraíso, passando a ter condições de posicionar seus interesses em espaços nobres que vão da capa à última folha do papel tipo bíblia de Veja, passando pela prestigiada sessão de entrevistas, as páginas amarelas. Será?

Na Inglaterra, em meio às primeiras informações sobre o real modo de agir dos jornalistas do The News of the World, a primeira reação da casa foi também a de silêncio. Em seguida, negativas. Mas os desdobramentos do caso, que incluíram o suicídio de um ex-alto funcionário do governo britânico, levantaram o véu da farsa e a verdade, finalmente, mostrou sua face. Na versão tupi, a suspeita é de que tenha ocorrido, entre Policarpo e Cachoeira, bem mais do que acontece num relacionamento normal entre jornalista e fonte de informação. Cachoeira, via Policarpo, talvez tenha se tornado um observador privilegiado da construção semanal da pauta política da revista, especialmente durante a eclosão do escândalo do mensalão, como afirmou ao 247 o ex-prefeito de Anápolis, Ernani de Paula.

Em nome de ter a notícia em primeira mão, é admissível, do ponto de vista ético, ao profissional da mídia manter relacionamentos privilegiados com quem ele considerar importante para este fim. Mas quase nunca é aceitável fazer com que esses relacionamentos derivem para a não publicação de notícias ou a divulgação parcial dos fatos.

Normalmente, o mundo político espera uma edição da revista Veja para conhecer o conteúdo que ela apresenta sobre os outros. Neste final de semana, o que se quer saber é o que Veja falará dela mesma.

Comentário
Parece que o escândalo do senador Demóstenes “Cachoeira” Torres também serviu para desnudar os podres poderes da revista Veja. É pena que por aqui a mídia possa fazer de tudo - o mesmo não ocorre na Inglaterra.
Decerto que o senador Cachoeira, aquele que habilitou o rádio Nextel em Miami para não ser investigado pela PF, poderá dizer agora em alto e bom som:
– Esta é a minha vida, este é o meu clube.
No clubinho dele, além de Cachoeira, vão juntos a Veja e, possivelmente, Gilmar Mendes.

Fotografia manipulada - por Marcela Bolívar (Inspiration Hut)

Anistia: jovens desmoralizam os militares e os partidos – por Paulo Henrique Amorim (Conversa Afiada)




Comentário
"Por enquanto, a batalha contra a Lei da Anistia do Ministro Eros Grau tem que ser travada pelos que não precisam obedecer à disciplina paralisante dos partidos.


E à mediocridade de seus líderes."


De fato,uma argumentação irretorquível. Especialmente no que toca a mediocridade.

quinta-feira, 29 de março de 2012

As Danaides - John Willian Waterhouse



Sem tempo para escrever, recorro à wikipédia:
O irmão gémeo de Dánao, Egipto, tinha cinquenta filhos, que foram instruídos a casarem-se com as cinquenta filhas de Danao, as Danaides. Dánao preferiu fugir para Argos, onde foi recebido pelo rei (algumas fontes dão o nome de Pelasgo, outras de Gelanor). Houve uma disputa pelo trono, mas Pelasgo entregou-o após receber a determinação de um oráculo. Entretanto os filhos de Egipto perseguiram Dánao até Argos, e para evitar uma guerra ele concordou finalmente com o casamento das suas filhas. Porém, intruiu-as para matarem os seus esposos na noite de núpcias. Todas cumpriram o combinado, excepto Hipernestra (ou Amimone). Danao puniu-a por isso, mas Afrodite interveio e salvou-a. Mais tarde, Dánao perdoou-a e permitiu-lhe permanecer casada com o seu marido, Linceu. As restantes quarenta e nove Danaides tiveram como noivos os vencedores de várias competições organizadas pelo seu pai. Danao foi mais tarde morto por Linceu como vingança pela morte dos seus irmãos.
Em algumas versões, as Danaides que assassinaram os seus esposos foram punidas, no Hades, a encherem de água uma jarra com furos, por onde a água voltava a sair.

O quadro retrata a punição, de se tentar eternamente encher um vaso com furos - tarefa similar a de Sísifo.

Ciro Gomes faz análise do atual cenário político e econômico brasileiro (Record News)

Yuki Onna 2 - por Northern Banshee (coolvibe)

Medíocres e perigosos - por Matheus Pichonelli (CartaCapital)

O reacionário é, antes de tudo, um fraco. Um fraco que conserva ideias como quem coleciona tampinhas de refrigerante ou maços de cigarro – tudo o que consegue juntar mas só têm utilidade para ele. Nasce e cresce em extremos: ou da falta de atenção ou do excesso de cuidados. E vive com a certeza de que o mundo fora da bolha onde lacrou seu refúgio é um mundo de perigos, pronto para tirar dele o que acumulou em suposta dignidade.

Para ele, tudo o que é diferente tem potencial
de destruição
 

 Como tem medo de tudo, vive amargurado, lamentando que jamais estenderam um tapete à sua passagem. Conserva uma vida medíocre, ele e suas concepções e nojos do mundo que o cerca. Como tem medo, não anda na rua com receio de alguém levar muito do pouco que tem (nem sempre o reacionário é um quatrocentão). Por isso, só frequenta lugares em que se sente seguro, onde ninguém vai ameaçar, desobedecer ou contradizer suas verdades. Nem dizer que precisa relaxar, levar as coisas menos a sério ou ver graça na leveza das coisas. O reacionário leva a sério a ideia de que é um vencedor.

A maioria passou a vida toda tendo tudo ao alcance – da empregada que esquentava o leite no copo favorito aos pais que viam uma obra de arte em cada rabisco em folha de sulfite que ele fazia – e cultivou uma dificuldade doentia em se ver num mundo de aptidões diversas. Outros cresceram em meios menos abastados – e bastou angariar postos na escala social para cuspir nos hábitos de colegas de velhos andares. Quem não chegou aonde chegou – sozinho, frise-se – não merece respeito.

Rico, ex-pobre ou falidos, não importa: o reacionário clássico enxerga em tudo o que é diferente um potencial de destruição. Por isso se tranca e pede para não ser perturbado no próprio mundo. Porque tudo perturba: o presidente da República quer seu voto e seus impostos; os parlamentares querem fazê-lo de otário; os juízes estão doidos para tirar seus direitos acumulados; a universidade é financiada (por ele, lógico) para propagar ideias absurdas sobre ideais que despreza; o vizinho está sempre de olho na sua esposa, em seu carro, em sua piscina. Mesmo os cadeados, portões de aço, sistemas de monitoramento, paredes e vidros anti-bala não angariam de todo a sua confiança. O mundo está cheio de presidiários com indulto debaixo do braço para visitar familiares e ameaçar os seus (porque os seus nunca vão presos, mesmo quando botam fogo em índios, mendigos, prostitutas e ciclistas; índios, mendigos, prostitutas e ciclistas estão aí para isso).

Como não conhece o mundo afora, a não ser pelas viagens programadas em pacotes que garantem o translado até o hotel, e despreza as ideias que não são suas (aquelas que recebeu de pronto dos pais e o ensinaram a trabalhar, vencer e selecionar o que é útil e o que é supérfluo), tudo o que é novo soa ameaçador. O mundo muda, mas ele não: ele não sabe que é infeliz porque para ele só o que não é ele, e os seus, são lamentáveis.

Muitas vezes o reacionário se torna pai e aprende, na marra, o conceito de família. Às vezes vai à igreja e pede paz, amor, saúde aos seus. Aos seus. Vê nos filhos a extensão das próprias virtudes, e por isso os protege: não permite que brinquem com os meninos da rua nem que tenham contato com ideias que os retirem da sua órbita. O índice de infarto entre os reacionários é maior quando o filho traz uma camisa do Che Guevara para casa ou a filha começa a ouvir axé e namorar o vocalista da banda (se ele for negro o infarto é fulminante).

Mas a vida é repleta de frestas, e o tempo todo estamos testando as mais firmes das convicções. Mas ele não quer testá-las: quer mantê-las. Por isso as mudanças lhe causam urticárias.

Nos anos 70, vivia com medo dos hippies que ousavam dizer que o amor não precisava de amarras. Eram vagabundos e irresponsáveis, pensava ele, em sua sobriedade.

Depois vieram os punks, os excluídos de aglomerações urbanas desajeitadas, os militantes a pedir o alargamento das liberdades civis e sociais. Para o reacionário, nada daquilo fazia sentido, porque ninguém estudou como ele, ninguém acumulou bens e verdades como ele e, portanto, seria muito injusto que ele e o garçom (que ele adora chamar de incompetente) tivessem o mesmo peso numa urna, o mesmo direito num guichê de aeroporto, o mesmo lugar na fila do fast food.
O reacionário vive com medo. Mas não é inofensivo
Foto: Galeria de GorillaSushi/Flickr
 

Para não dividir espaços cativos, frutos de séculos de exclusão que ele não reconhece, eleva o tom sobre tudo o que está errado. Sabendo de seus medos e planos de papel, revistas, rádios, televisão, padres, pastores e professores fazem a festa: basta colocar uma chamada alarmista (“Por que você trabalha tanto e o País cresce tão pouco?”) ou música de suspense nas cenas de violência (“descontrolada!”) na tevê para que ele se trema todo e se prepare para o Armagedoon. Como bicho assustado, volta para a caixinha e fica mirabolando planos para garantir mais segurança aos seus. Tudo o que vê, lê e ouve o convence de que tudo é um perigo, tudo é decadente, tudo é importante, tudo é indigno. Por isso não se deve medir esforços para defender suas conquistas morais e materiais.

E ele só se sente seguro quando imagina que pode eliminar o outro.

Primeiro, pelo discurso. No começo, diz que não gosta desse povinho que veio ao seu estado rico tirar espaço dos seus. Vive lembrando que trabalha mais e paga mais impostos que a massa que agora quer construir casas em seu bairro, frequentar os clubes e shoppings antes só repletos de suas réplicas. Para ele, qualquer barberagem no trânsito é coisa da maldita inclusão, aqueles bárbaros que hoje tiram carta de habilitação e ainda penduram diplomas universitários nas paredes. No tempo dele, sim, é que era bom: a escola pública funcionava (para ele), o policial não se corrompia (sobre ele), o político não loteava a administração (não com pessoas que não eram ele).

Há que se entender a dor do sujeito. Ele recebeu um mundo pronto, mas que não estava acabado. E as coisas mudaram, apesar de seu esforço e sua indignação.

Ele não sabe, mas basta ter dois neurônios para rebater com um sopro qualquer ideia que ele tenha sobre os problemas e soluções para o mundo – que está, mas ele não vê, muito além de um simples umbigo. Mas o reacionário não ouve: os ignorantes são os outros: os gays que colocam em risco a continuidade da espécie, as vagabundas que já não respeitam a ordem dos pais e maridos, os estudantes que pedem a extensão de direitos (e não sabem como é duro pegar na enxada), os maconheiros que não estão necessariamente a fim de contribuir para o progresso da nação, os sem-terra que não querem trabalhar, o governante que agora vem com esse papo de distribuir esmola e combater preconceitos inexistentes (“nada contra, mas eles que se livrem da própria herança”), os países vizinhos que mandam rebas para emporcalhar suas ruas.


Muitas vezes o reacionário se torna pai e aprende o
conceito de família. Vê nos filhos a extensão das próprias
virtudes, e por isso os protege: não permite que brinquem
com os meninos da rua nem que tenham contato com
ideias que os retirem da sua órbita

O mundo ideal, para o reacionário, é um mundo estático: no fundo, ele não se importa em pagar impostos, desde que não o incomodem.

Como muitos não o levam a sério, os reacionários se agrupam. Lotam restaurantes, condomínios e associações de bairro com seus pares, e passam a praguejar contra tudo.

Quando as queixas não são mais suficientes, eles juntam as suas solidões e ódio à coletividade (ironia) e passam a se interessar por política. Juntos, eles identificam e escolhem os porta-vozes de suas paúras em debates nacionais. Seus representantes, sabendo como agradar à plateia, são eleitos como guardiões da moralidade. Sobem a tribunas para condenar a devassidão, o aborto, a bebida alcoolica, a vida ao ar livre, as roupas nas escolas. Às vezes são hilários, às vezes incomodam.

Mas, quando o reacionário se vê como uma voz inexpressiva entre os grupos que deveriam representá-lo, bota para fora sua paranóia e pragueja contra o sistema democrático (às vezes com o argumento de que o sistema é antidemocrático). E se arma. Como o caldo cultural legitima seu discurso e sua paranoia, ele passa a defender crimes para evitar outros crimes – nos Estados Unidos, alvejam imigrantes na fronteira, na Europa, arrebentam árabes e latinos, na Candelária, encomendam chacinas e, em QGs anônimos, planejam ataques contra universitários de Brasília que propagam imoralidades (leia mais AQUI).

O reacionário, no fim, não é patrimônio nacional: é um cidadão do mundo. Seu nome é legião porque são muitos. Pode até ser fraco e viver com medo de tudo. Mas nunca foi inofensivo.

Você esta com meu velho amigo - por Coolvibe

O que mais virá à tona com caso Demóstenes – por Luana Luna (Blog do Nassif)

Em outras palavras, como este novelo envolve muita gente e tem muita coisa que o povo brasileiro não sabe e que virá à tona com isto aí, começa-se pela Justiça, sim, a Justiça que uma própria magistrada falou que há bandidos de toga e o povo brasileiro sabe disto há muito tempo, começa-se o palanque para que ninguém seja punido e com a aquiescência mais uma vez da Justiça não dê em nada e veremos as firulas/silogismos jurídicos improcedentes e o joguinho de sempre de suas Excelências.

Mas vejamos a situação disto tudo, ou seja, o que se vislumbra:

Um senador que é promotor de Justiça, que exerceu secretaria de Justiça no seu estado, que conhece os meandros da lei e que, pela hierarquia jurídica, por ser procurador, este senhor não fala com o juiz, (o promotor fala com o juiz) o procurador fala com o desembargador, vestido devidamente com suas roupas talares.

Pois bem, este senhor como procurador conhece os meandros da lei o tribunal dialogando a partir dos desembargadores. Como secretário de Justiça do seu estado (cargo público de livre nomeação e exoneração). Não fala apenas com desembargadores, mas com policiais, civis e militares, políticos e sociedade civil. Como senador eleito, fala como representante legítimo do seu estado.

Mas aí é que está, a serem verdadeiras as declarações do prefeito de Anápolis, este senhor queria algo mais e, ao não conseguir, partiu para algo arriscado que deu certo: criou, armou ao lado do PIG, contraventor e de segmentos da própria Justiça ( a comprovar o grampo sem áudio de Gilmar Mendes e Demóstenes), armou com um grupo pesado da própria elite brasileira, uma forma de eliminar, desestruturar, derrubar, causar instabilidade no país, espetacularizar, tornar-se o Catão da República, o projeto de derrubada do presidente Lula.

O espetáculo do mensalão que hoje o próprio PIG quer o STF continue a julgar com a faca no pescoço, como disse Rodrigo Vianna, o próprio PIG definiu a data pelo julgamento, dia 18 e querem a cabeça do José Dirceu. Mas isto não é suficiente, o ódio, a jogada rasteira, a falta de escrúpulos, se não todos, mas a maioria do povo brasileiro sabe que isto é jogada da direita.

Mas pior do que tudo isto é o ódio contra Lula, durante todo este tempo. As pessoas agem motivadas pelo ódio e então passa-se a compreender a inaceitação pelo fato de ele ser nordestino, mestiço, pobre e dialogar com este próprio povo de onde veio fazendo que comecem a compreender as coisas que, ao longo do tempo, é e tem sido trabalhada para que o povo não desperte disto.

O ódio contra Lula, o trabalho incessante dos intelectuais e jornalistas da direita é todo o dia, todo instante, todo minuto. Não há um dia que esta gente não destile seu ódio contra ele. Se analisarmos um pouco mais, não é um ódio apenas contra Lula, mas contra o próprio povo brasileiro que tem o mesmo perfil social que Lula tem.

É um trabalho incessante para impedir que outros líderes de esquerda surjam a fim de que o povo não acorde. E tem mais, se não for contido, o país caminhará para uma intolerância sem precedente, não esperem do Serra uma estratégia política diferente do que foi a campanha dele em 2010. E não é apenas ele, isto se aplica, também, aos candidatos do DEM. Aguardem este falso moralismo e conservadorismo ser retomado.

E o que assusta e deixa indignado, é a tentativa do PT tentar se aproximar da direita imaginando que será aceito. Não adianta porque não vai. É melhor, se não quiser se tornar um partido menor do que o PDT de Brizola e o PTB de Vargas, depois que Lula tiver cumprido sua missão.

Mas chama atenção, também, o silêncio obsequioso do PIG em relação à revista Veja. Ninguém fala nada de Policarpo envolvido e, logicamente, a própria revista que tramou ao lado de outros, a derrubada do presidente. Enfim, tem muita coisa para vir à tona, há muita água para ser rolada e as tratativas que cuidarão para que esta água no role. Vamos aguardar os próximos capítulos.

Fotografia - por Roelof

Serra Candidato - por Marcos Coimbra (Correio Braziliense)

O PSDB paulista poderia ter comemorado no último domingo um grande dia. Um dia de olhar para a frente e se renovar.

Poderia.

Mas foi um domingo sem brilho, em que velhos personagens encenaram uma antiga história. Ao invés de rejuvenescer, a seção paulista do partido reenvelheceu. A vitória de Serra na prévia tucana foi a derrota da mudança – por mais que alguns tenham tentado fazer do limão uma limonada, apregoando que suas correntes saíram dela unificadas.

No terreno do realismo político, não haveria porque lamentar o ocorrido. Suas lideranças são adultas e sabem o que fazem - ou deveriam sabê-lo. Se é assim que querem ser, que o sejam.

Para quem olha o sistema político brasileiro de fora, no entanto, o episódio é de lamentar. Ele ilustra a imensa dificuldade que nossos partidos têm de passar de instituições fechadas a abertas. De evoluir de organizações de quadros para organizações de massa, na consagrada terminologia de Maurice Duverger.

Chegou a parecer que o PSDB paulista teria a coragem de fazer a transição. Até o início do ano, tudo indicava que era para valer o desejo de reinventar-se.

Quatro pretendentes ofereceram o nome e entraram em campo. Arregaçaram as mangas e foram fazer campanha, percorrendo bairros e comparecendo a debates com apoiadores e militantes, alguns de intensa participação.

Pela primeira vez, o PSDB estava a caminho de prévias partidárias em uma eleição grande, de importância nacional. Não que nunca tivesse realizado alguma, mas não de tal significado.

O que acontecia era a realização de algo que, até então, os tucanos apenas imaginavam. Quando, por exemplo, em 2009, Aécio sugeriu que o partido escolhesse o candidato a presidente através de prévias, todos sabiam que a proposta era inexequível – ele incluído. O PSDB não tinha condições operacionais de realizá-las em âmbito nacional, pela simples razão de que não dispunha de instrumentos para fazê-las nos estados e em quase nenhum município.

Se tivesse avançado, o processo paulista deste ano seria um marco na história do partido. Depois dele, seria difícil evitar que surgissem pré-candidatos “independentes” – isto é, não ungidos pelos líderes - e que as bases partidárias – mesmo que não sejam lá tão grandes - quisessem ser ouvidas na escolha de candidatos a qualquer cargo.

Mas, movidos, pela enésima vez, pela sua peculiar maneira de ler as pesquisas de intenção de voto – em que o que importa é de quanto parte um candidato e não aonde pode chegar -, os próceres peessedebistas não admitiram que o processo fosse adiante. Na última hora, melaram o jogo e resolveram que o candidato seria Serra.

Bem que eles – a começar pelo próprio – preferiam cancelar as prévias, marcadas para dias depois do “lançamento” da candidatura. Mas seria traumático demais para aqueles que haviam acreditado nelas, que ficariam com cara de bobo. Foram apenas adiadas, dando tempo ao candidato para que reunisse apoio entre os filiados.

Domingo, Serra teve a vitória mais pífia de sua carreira: o comparecimento foi decepcionante e sua votação surpreendentemente baixa. Ganhou de José Aníbal por pouco mais de mil votos.

Mais relevante, porém, é a marcha ré que levou ao resultado – e que o explica. Na hora em que as portas estavam abertas para que o PSDB deixasse de ser um típico partido de quadros, recuou.
Parece que os tucanos não aprendem a lição: o PT só é o que é por ser um partido. De verdade, e não uma agremiação de notáveis – que há tempo deixaram de ser fortes.

terça-feira, 27 de março de 2012

Fotografia com pitadas surreais - por Cara-Lee Gevers (Inspiration Hut)

Carlinhos Cachoeira, Demóstenes Torres, Roberto Gurgel e a revista veja - por Luis Nassif

O Procurador Geral, o Senador e o bicheiro - por Luis Nassif

A revelação das ligações do senador Demóstenes Torres com o bicheiro Carlinhos Cachoeira lança uma sombra de suspeita sobre o procurador geral Roberto Gurgel.

Demóstenes foi elemento central na recondução de Gurgel ao cargo de Procurador Geral, desempenhando papel bastante conhecido em assembléias de acionistas.

Nessas assembléias há um estratagema corporativo que consiste em canalizar as insatisfações dos minoritários para um deles. O sujeito esbraveja, fala alto e torna-se o líder da resistência contra os controladores. Depois, à medida em que a AGE avança, ele cede rapidamente aos argumentos dos controladores, esvaziando a reação dos demais.

Demóstenes desempenhou esse papel no processo de recondução de Gurgel ao cargo de Procurador Geral.

Primeiro esbravejou, exigindo de Gurgel a abertura de processo contra Antonio Palocci, ameaçando não votar a favor da sua recondução ao cargo. Depois, recuou, disse que, infelizmente, as alegações de Gurgel - de que não havia nenhum elemento que comprovasse origem ilícita dos recursos de Palocci - eram corretas e só lhe restava acatar a lei.

Independentemente do mérito dos argumentos de Gurgel, os movimentos iniciais de Demóstenes lhe conferiram o papel de líder dos minoritários; e seu convencimento final matou toda a reação contra a indicação do Procurador Geral.

Poderia ser apenas um caso de um Senador procurador reconhecendo o mérito da alegação de outro, não fosse a circunstância de que Gurgel há dois anos estava sentado em cima de um inquérito que denunciava as ligações espúrias de Demóstenes com Cachoeira.

Demóstenes só chegou a essa posição de destaque no Senado, a ponto de ser figura chave na aprovação do Procurador Geral, graças à cobertura que recebia da revista Veja - que, por sua vez, se associou ao bicheiro Carlinhos Cachoeira em diversas denúncias. E foi graças a essa posição de destaque que Demóstenes tornou-se suspeito da mais grave armação contra as instituições desde o Plano Cohen: a farsa do grampo sem áudio.

É importante entender que essa promiscuidade mídia-político-criminoso - que não é generalizada na velha mídia, mas específica da revista Veja - não é apenas um caso de exorbitância jornalística: é algo que ameaça a própria normalidade institucional do país, abrindo espaço inédito para que o crime organizado ascenda aos mais altos escalões da República, constrangendo autoridades diversas. No caso Daniel Dantas, a revista fuzilou reputação de Ministro do STJ que havia confirmado uma liminar contra o banqueiro.

Até agora, apenas alguns blogs, isoladamente, têm atuado como contrapeso a esse poder avassalador de um jornalismo sem limites. Mas somos vítimas de uma judicialização da discussão - com torrentes de ações desabando sobre nós. Em nome de uma visão equivocada sobre os limites da liberdade de imprensa, o Judiciário é condescendente. Quando age, sempre é com enorme atraso, devido aos problemas processuais conhecidos. Os demais veículos se calam ante os abusos da Veja.

Gurgel terá que provar, daqui para diante, sua independência - e não propriamente em relação ao Executivo. E os poderes públicos - especialmente o Judiciário - terão que acordar para a realidade de que, hoje em dia, são reféns da escandalização praticada pelo mau jornalismo. E que a melhor maneira de defender a liberdade de imprensa é expurgar as práticas criminosas que se escondem debaixo do seu manto.


Como funcionava a parceria Veja-Cachoeira - por Luis Nassif

"O araponga e o repórter", da série "O caso de Veja", de 2008

A matéria foi bombástica e ajudou a deflagrar a crise do “mensalão”. Uma reportagem de 18 de maio de 2005, de Policarpo Jr., da sucursal da Veja em Brasília, mostrava o flagrante de um funcionário dos Correios – Mauricio Marinho – recebendo R$ 3 mil de propina (clique aqui)



A abertura seguia o estilo didático-indagativo da revista:

(…) Por quê? Por que os políticos fazem tanta questão de ter cargos no governo? Para uns, o cargo é uma forma de ganhar visibilidade diante do eleitor e, assim, facilitar o caminho para as urnas. Para outros, é um instrumento eficaz para tirar do papel uma idéia, um projeto, uma determinada política pública. Esses são os políticos bem-intencionados. Há, porém, uma terceira categoria formada por políticos desonestos que querem cargos apenas para fazer negócios escusos – cobrar comissões, beneficiar amigos, embolsar propinas, fazer caixa dois, enriquecer ilicitamente.

A revista informava que tinha conseguido dar um flagrante em um desses casos na semana anterior:

Raro, mesmo, é flagrar um deles em pleno vôo. Foi o que VEJA conseguiu na semana passada.

Anotem a data que a revista menciona que recebeu a gravação: semana passada. Será importante para entender os lances que serão mostrados no decorrer deste capítulo.

A matéria, como um todo, não se limitava a descrever uma cena de pequena corrupção explícita, embora só esta pudesse ser comprovada pelo grampo. Tinha um alvo claro, que eram as pessoas indicadas pelo esquema PTB, especialmente na Eletronorte e na BR Distribuidora. O alvo era o esquema; Marinho, apenas o álibi.

O que a matéria não mostrava eram as intenções efetivas por trás do dossiê e do grampo. Os R$ 3 mil eram um álibi para desmontar o esquema do PTB no governo, decisão louvável, se em nome do interesse público; jogo de lobby, se para beneficiar outros grupos.

Antes de voltar à capa, uma pequena digressão sobre as alianças espúrias do jornalismo.

Os dossiês e os chantagistas

A partir da campanha do “impeachment” de Fernando Collor, jornalistas, grampeadores e chantagistas passaram a conviver intimamente em Brasília. Até então, havia uma espécie de barreira, que fazia com que chantagistas recorressem a publicações menores, a colunistas da periferia, para montar seus lobbies ou chantagens. Não à grande mídia.

Com o tempo, a necessidade de fabricar escândalo a qualquer preço provocou a aproximação, mais que isso, a cumplicidade entre alguns jornalistas, grampeadores e chantagistas. Paralelamente, houve o desmonte dos filtros de qualidade das redações, especialmente nas revistas semanais e em alguns diários.

Foi uma associação para o crime. Com um jornalista à sua disposição, o grampeador tem seu passe valorizado no mercado. A chantagem torna-se muito mais valiosa, eficiente, proporcional ao impacto que a notícia teria, se publicada. Isso na hipótese benigna.

É uma aliança espúria, porque o leitor toma contato com os grampos e dossiês divulgados. Mas, na outra ponta, a publicação fortalece o achacador em suas investidas futuras. Não se trata de melhorar o país, mas de desalojar esquemas barra-pesadas em benefício de outros esquemas, igualmente barra-pesadas, mas aliados ao repórter. E fica-se sem saber sobre as chantagens bem sucedidas, as que não precisaram chegar às páginas de jornais.

Por ser um terreno minado, publicações sérias precisam definir regras claras de convivência com esse mundo do crime. A principal é o jornalista assegurar que material recebido será publicado – e não utilizado como elemento de chantagem.

Nos anos 90 esses preceitos foram abandonados pelo chamado jornalismo de opinião. No caso da Veja a deterioração foi maior que nos demais veículos. O uso de matérias em benefício pessoal (caso dos livros de Mario Sabino), o envolvimento claro em disputas comerciais (a “guerra das cervejas” de Eurípedes Alcântara), o lobby escancarado (Diogo Mainardi com Daniel Dantas), a falta de escrúpulos em relação à reputação alheia, tudo contribuiu para que se perdessem os mecanismos de controle.

Submetida a um processo de deterioração corporativa poucas vezes visto, a Abril deixou de exercer seus controles internos. E a direção da revista abriu mão dos controles externos, ao abolir um dos pilares do moderno jornalismo – o direito de resposta – e ao intimidar jornalistas de outros veículos com seus ataques desqualificadores.

É nesse cenário de deterioração editorial que ocorre o episódio Maurício Marinho.

A parceria com o araponga

Nas alianças políticas do governo Lula, os Correios foram entregues ao esquema do deputado Roberto Jefferson. Marinho era figura menor, homem de propina de R$ 3 mil.

Em determinado momento, o esquema Jefferson passou a incomodar lobistas que atuavam em várias empresas. Dentre eles, o lobista Arthur Wascheck.

Este recorreu a dois laranjas – Joel dos Santos Filhos e João Carlos Mancuso Villela – para armar uma operação que permitisse desestabilizar o esquema Jefferson não apenas nos Correios. como na Eletrobrás e na BR Distribuidora. É importante saber desses objetivos para entender a razão da reportagem da propina dos R$ 3 mil ter derivado - sem nenhuma informação adicional - para os esquemas ultra-pesados em outras empresas. Fazia parte da estratégia da reportagem e de quem contratou o araponga.

A idéia seria Joel se apresentar a Marinho como representante de uma multinacional, negociar uma propina e filmar o flagrante. Como não tinham experiência com gravações mais sofisticadas, teriam decidido contratar o araponga Jairo Martins.

E, aí, tem-se um dos episódios mais polêmicos da história do jornalismo contemporâneo, um escândalo amplo, do qual Veja acabou se safando graças à entrevista de Roberto Jefferson à repórter Renata Lo Prete, da Folha, que acabou desviando o foco da atenção para o “mensalão”.

Havia um antecedente nesse episódio, que foi o caso Valdomiro Diniz, a primeira trinca grave na imagem do governo Lula. Naquele episódio consolidaram-se relações e alianças entre um conjunto de personagens suspeitos: o bicheiro Carlinhos Cachoeira (que bancou a operação de grampo de Valdomiro), o araponga Jairo Martins (autor do grampo) e o jornalista Policarpo Jr (autor da reportagem).

No caso Valdomiro, era um contraventor – Carlinhos Cachoeira – sendo achacado por um dos operadores do PT, enviado pelo partido ao Rio de Janeiro, assim como Rogério Buratti, despachado para assessorar Antonio Palocci quando prefeito de Ribeirão.

Jairo era um ex-funcionário da ABIN (Agência Brasileira de Inteligência), contratado pelo bicheiro para filmar o pagamento de propina a Valdomiro Diniz.

Tempos depois, Jairo foi convidado para um almoço pelo genro de Carlinhos Cachoeira, Casser Bittar.

Lá, foi apresentado a Wascheck, que o contratou para duas tarefas, segundo o próprio Jairo admitiu à CPI: providenciar material e treinamento para que dois laranjas grampeassem Marinho; e a possibilidade do material ser publicado em órgão de circulação nacional.

Imediatamente Jairo entrou em contato com Policarpo e acertou a operação. O jornalista não só aceitou a parceria, antes mesmo de conhecer a gravação, como avançou muito além de suas funções de repórter.

O grampo em Marinho foi gravado em um DVD. Jairo marcou, então, um encontro com Policarpo. Foi um encontro reservado - eles jamais se falavam por telefone, segundo o araponga -, no próprio carro de Policarpo, no Parque da Cidade. Policarpo levou um mini-DVD, analisou o material e atuou como conselheiro: considerou que a gravação ainda não estava no ponto, que havia a necessidade de mais. Recebeu a segunda, constatou que estava no ponto. E guardou o material na gaveta, aguardando a autorização do araponga, mesmo sabendo que estava se colocando como peça passiva de um ato de chantagem e achaque.

Wascheck tinha, agora, dois trunfos nas mãos: a gravação da propina de R$ 3 mil e um repórter, da maior revista do país, apenas aguardando a liberação para publicar a reportagem.

Quando saiu a reportagem, a versão do repórter de que havia recebido o material na semana anterior era falsa e foi desmentida pelos depoimentos dados por ele e por Jairo à Policia Federal e à CPI do Mensalão.

Pressionado pelo eficiente relator Osmar Serraglio, na CPI do Mensalão, Jairo negou ter recebido qualquer pagamento de Wascheck. Disse ter se contentado em ficar com o equipamento, provocando reações de zombaria em vários membros da CPI.

Depois, revelou outros trabalhos feitos em parceria com a Veja. Mencionou série de trabalhos que teria feito e garantiu que sua função não era de araponga, mas de jornalista. O único órgão onde seus trabalhos eram publicados era a Veja. Indagado pelos parlamentares se recebia alguma coisa da revista disse que não, que seu objetivo era apenas o de "melhorar o pais".

Segundo o depoimento de Jairo:

‘Aí fiquei esperando o OK do Artur Washeck pra divulgação do material na imprensa. Encontrei com ele pela última vez no restaurante, em Brasília, no setor hoteleiro sul, quando ele disse: ‘Eu vou divulgar o fato. Quero divulgar’. E decorreu um período que essa divulgação não saía. Aí foi quando eu fiz um contato com o jornalista e falei: ‘Pode divulgar a matéria’’.

Clique aqui para ler os principais trechos do depoimento do araponga Jairo à CPI.

E aqui para acessar o relatório final da CPMI.

Reações na mídia
A revelação do episódio provocou reações acerbas de analistas de mídia.

No Observatório da Imprensa, Alberto Dines publicou o artigo “A Chance da Grande Catarse do Jornalismo”


O atual ciclo de denúncias não chega a ser uma antologia de jornalismo mas é uma preocupante coleção de mazelas jornalísticas. Busca-se a credibilidade mas poucos oferecem transparência, pretende-se a moralização da vida pública mas os bastidores da imprensa continuam imersos na sombra:
Tudo começou com uma matéria de capa da Veja sobre as propinas nos Correios, clássico do jornalismo fiteiro.


(...) Carece de (...) transparência a ouverture desta triste e ruidosa temporada através da Veja. Dois meses depois, a divulgação do vídeo da propina nos Correios continua envolta em sombras, rodeada de dúvidas e desconfianças. E, como não poderia deixar de acontecer com fatos mantidos no lusco-fusco da dubiedade, cada vez que a matéria é examinada ou discutida sob o ponto de vista estritamente profissional, mais interrogações levanta.


Caso da entrevista ao Jornal Nacional (Rede Globo, quinta-feira, 30/6) do ex-agente da ABIN, Jairo Martins de Souza, autor da gravação. O araponga — que, aliás, se diz jornalista [veja abaixo comentários de Ricardo Noblat] e faz negócios com jornalistas — revelou que ofereceu o vídeo ao repórter Policarpo Júnior, da sucursal da Veja em Brasília, e que este aceitou-o antes mesmo de examinar o seu teor [abaixo, a transcrição da matéria do JN].


Na hora da entrega, o jornalista teria usado um reprodutor portátil de DVD para avaliar a qualidade das imagens. De que maneira chegou ao jornalista e por que este aceitou o vídeo são questões que até hoje não foram esclarecidas.


Tanto o repórter como a revista recusam-se terminantemente a oferecer qualquer tipo satisfação ou esclarecimento aos leitores. Não se trata de proteger as fontes: elas seriam inevitavelmente nomeadas quando o funcionário flagrado, Maurício Marinho, começasse a depor. Foi exatamente o que aconteceu e hoje Veja carrega o ônus de ter se beneficiado de uma operação escusa – chantagem de um corrupto preterido ou ação formal da Abin para desmoralizar um aliado incômodo (o PTB, de Roberto Jefferson).


(...) Araponga não é jornalista, vídeo secreto ainda não é reconhecido como gênero de jornalismo. Talvez o seja num futuro próximo.

O episódio mereceu comentários do blogueiro Ricardo Noblat:

Ao ser contratado para filmar Marinho e grampear André Luiz, a primeira coisa que ele disse que fez foi procurar a Veja e oferecer o material. ‘Foi um trabalho puramente jornalístico’, garantiu.

A amigos, nas duas últimas semanas, Jairo confessou mais de uma vez que espera ganhar o próximo Prêmio Esso de Jornalismo. Ele se considera um sério candidato ao prêmio.

Não é brincadeira não, é serio! Porque ele está convencido de que filmou e grampeou como free-lancer da Veja – embora jamais tenha recebido um tostão dela por isso. Recebeu dos que encomendaram as gravações.

Jairo ganhava como araponga e pensava em brilhar como jornalista.

É, de certa forma faz sentido."

Tempos depois, a aliança com o araponga renderia a Policarpo a promoção para chefe de sucursal da Veja em Brasília. A revista já caíra de cabeça, sem nenhum escrúpulo, no mundo nebuloso dos dossiês e dos pactos com lobistas. E o grande pacto do silêncio que se seguiu na mídia, permitiu varrer para baixo do tapete as aventuras de Veja com o araponga repórter.

O final da história

Parte da história terminou em agosto de 2007. Sob o titulo “PF desmonta nova máfia nos Correios”, o Correio Braziliense noticiava o desbaratamento de uma nova quadrilha que tinha assumido o controle dos Correios (clique aqui).

No comando, Arthur Wascheck, que assumiu o comando da operação de corrupção dos Correios graças ao serviço encomendado a Jairo - grampo mais publicação do resultado na Veja.

Durante a Operação Selo, foram presas cinco pessoas, em dois estados mais o Distrito Federal.

Segundo o jornal:

Entre os presos estão Sérgio Dias e Luiz Carlos de Oliveira Garritano, funcionários dos Correios, além dos empresários Antônio Félix Teixeira, Marco Antônio Bulhões e Arthur Wascheck, considerado pela PF como líder do grupo e acusado de ter sido o responsável pela gravação feita no dia em que Marinho recebia a propina. Os investigadores não quantificaram o volume de recursos envolvidos nas fraudes, mas calculam que seja de dezenas de milhões de reais.

De acordo com os investigadores, “o grupo agia como traficantes nos morros".

“Havia uma quadrilha na ECT (Empresa de Correios e Telégrafos), que foi desbaratada e afastada. A outra organização tomou o lugar dela. Assim como os traficantes fazem, quando saem, morrem ou são presos, acontece a mesma coisa no serviço público. Quando uma quadrilha sai do local, entra outra e começa a praticar atos ilícitos no lugar da que saiu”, explica o delegado Daniel França, um dos integrantes do grupo de investigação.

A corrupção tinha apenas trocado de mãos:

Para o Ministério Público Federal, o entendimento era o mesmo.

“Não se pode dizer que a corrupção terminou ou se atenuou. O que houve foi uma substituição de pessoas, alijadas do esquema”, afirma o procurador da República Bruno Acioli.


Segundo ele, há pelo menos 20 empresas, muitas delas ligadas a Wascheck, estão envolvidas nas fraudes que podem atingir outros órgãos públicos, conforme investigações da PF.

A ficha de Wascheck era ampla e anterior ao episódio do qual Veja aceitou participar:

O empresário, conforme os investigadores, atuava na área de licitações desde 1994, sendo que um ano depois ele fora condenado por irregularidades em licitação para aquisição de bicicletas pelo Ministério da Saúde.

O valor das fraudes chegava a milhões de reais:

Segundo a polícia, o grupo de Wascheck vendia todo tipo de material para os Correios. De sapato a cofres, sendo que muitos integrantes do esquema eram também procuradores de outras empresas envolvidas nas concorrências. Com a análise dos documentos, que começou a ser feita ontem, os investigadores devem chegar aos valores das fraudes. “O que posso dizer é que esse prejuízo é de milhões de reais. Dezenas de milhões de reais”, diz o procurador da República, ressaltando que seu cálculo se baseia em alguns casos específicos. “Existem licitações na casa de bilhões de reais”, afirma o procurador.

No sistema de buscas da revista, as pesquisas indicam o seguinte:

Operação Selo Wascheck: 0 ocorrências

Operação Selo (frase exata) Período 2007: 0 ocorrências

Revista de 8 de agosto de 2007: nenhuma menção

Na edição de 15 de agosto, nenhuma menção. Mas uma das materias especiais atende pelo sugestivo título de “Porque os corruptos não vão presos”

"Frágil como papel

A Justiça brasileira é incapaz de manter presos assassinos
confessos e corruptos pegos em flagrante. Na origem da
impunidade está a própria lei".

A reportagem fala do mensalão, insinua que os implicados até melhoraram de vida, menciona símbolos midiáticos de corrupção (Quércia, Maluf, Collor etc). Nenhuma palavra sobre a Operação Selo e sobre o papel desempenhado pelas reportagens de escândalo da própria revista no jogo das quadrilhas dos Correios.

Seus aliados foram protegidos.

A associação da mídia com o crime - por Luis Nassif


Está na hora de se começar a investigar mais a fundo a associação da Veja com o crime organizado. Não é mais possível que as instituições neste país - Judiciário, Ministério Público - ignorem os fatos que ocorreram.

Está comprovado que a revista tinha parceria com Carlinhos Cachoeira e Demóstenes. É quase impossível que ignorasse o relacionamento entre ambos - Demóstenes e Cachoeira.

No entanto, valeu-se dos serviços de ambos para interferir em inquéritos policiais (Satiagraha), para consolidar quadrilhas nos Correios, para criar matérias falsas (grampo sem áudio).

Até que a Polícia Federal começasse a vazar peças do inquérito, incriminando Demóstenes, a posição da revista foi de defesa intransigente do senador (clique aqui), através dos mesmos blogueiros das quais se valeu para tentar derrubar a Satiagraha.

Aproveitando a falta de coragem do Judiciário, arvorou-se em criadora de reputações, em pauteira do que deve ser denunciado, em algoz dos seus inimigos, valendo-se dos métodos criminosos de aliados como Cachoeira. Paira acima do bem e do mal, um acinte às instituições democráticas do país, que curvam-se ao seu poder.

O esquema Veja-Cachoeira-Demóstenes foi um jogo criminoso, um atentado às instituições democráticas. Um criminoso - Cachoeira - bancava a eleição de um senador. A revista tratava de catapultá-lo como reserva moral, conferindo-lhe um poder político desproporcional, meramente abrindo espaço para matérias laudatórias sobre seu comportamento. E, juntos, montavam jogadas, armações jornalísticas de interesse de ambos: do criminoso, para alijar inimigos, da revista para impor seu poder e vender mais.

Para se proteger contra denúncias, a revista se escondeu atrás de um macartismo ignóbil, conforme denunciei em  "O caso de Veja".

Manteve a defesa de Demóstenes até poucas semanas atrás, na esperança de que a Operação Monte Carlo não conseguisse alcançá-lo. Apenas agora, quando é desvendada a associação criminosa entre Cachoeira e Demóstenes, é que resolve lançar seus antigos parceiros ao mar.


Demóstenes Torres e as Vestais - por Theófilo Silva (Blog de Jorge Bastos Moreno) (citado em Blog do Nassif)



Confesso que o envolvimento do senador Demóstenes Torres com o mafioso Carlinhos Cachoeira foi uma surpresa para mim, um choque, na verdade. E sei que milhões de brasileiros estão tão chocados quanto eu. Sabemos que não existem santos em política, mas ninguém esperava que esse promotor de justiça, secretário de segurança de Goiás, paladino da ética pública, fosse apanhado pela justiça federal em conversas com Cachoeira, numa operação em que 80 pessoas – vários delegados e policiais – foram indiciadas e outras presas, por formação de quadrilha e outros crimes graves. Descobriu-se que Demóstenes fez 300 ligações telefônicas para Cachoeira, num prazo de sete meses, e detinha um telefone exclusivo para falar com o criminoso.

Foi triste ver Demóstenes Torres ser defendido por dezenas de senadores enquanto fazia seu tosco discurso de defesa no senado. Ele, que parecia desprezar os colegas, como se fosse uma rosa em uma floresta de espinhos! Foi deprimente ver Demóstenes, um advogado, procurador de justiça, diante das câmeras de televisão, consultando um advogado criminalista, e se negando a responder uma simples pergunta sobre o uso de um telefone. Demóstenes morreu ali, naquele momento. Terminava naquela entrevista a carreira da Vestal da política brasileira.

Deixem-me dizer o que é uma vestal. Na Roma antiga, antes da chegada de Cristo, Vesta era a deusa mais importante dos romanos, detentora de um belíssimo templo consagrado a ela. O santuário era guardado pelas vestais, jovens escolhidas aos dez anos de idade, que ficavam encarregadas, durante 30 anos, de zelar para que o fogo sagrado nunca apagasse. Durante esse tempo, elas deveriam permanecer virgens, e levar uma vida de castidade e pureza. Se uma delas quebrasse os votos, o crimen incesti, era condenada a morte por decapitação ou tapocrifação (enterrada viva).

Nem Gilberto Kassab ao construir o PSD atingiu tão mortalmente o Democratas como Demóstenes. A reserva moral do DEM, o homem que partiu para cima de Roberto Arruda, por muito menos do que é agora acusado, foi flagrado em uma relação estreitíssima com um notório criminoso. Um senador moralista, draconiano, competente, rigoroso receber presentes, e falar diariamente com um sujeito desse tipo, e dizer que era conselheiro sentimental... Nem criancinhas acreditam em Demóstenes.

Demóstenes acabou-se. Virou um Zumbi no Senado, e seus colegas senadores estão felizes com isso. Ele agora vai dizer amém pra todo mundo, vai votar todos os projetos, irá a todas as reuniões de comissões, fará tudo para salvar seu mandato. Aquela voz que fazia tremer os corruptos do Brasil calou-se. Virou um cordeirinho! Demóstenes Torres agora vai andar com Gim Argello, Ivo Cassol, Jáder Barbalho, os “queimados” do Senado. Se não fosse senador da república, estaria preso ao lado de Carlinhos Cachoeira e sua quadrilha. Tentar anular as provas contra ele, junto ao STF, como está fazendo, só piora sua situação. A sociedade já entendeu tudo.

Demóstenes é o maior exemplo de que a sociedade precisa desconfiar de homens públicos que se dizem imaculados – Vestais – principalmente, se esse homem é pago pelo estado para promover justiça. O fato de Demóstenes Torres ser promotor de justiça agrava ainda mais sua situação. Ela agora junta-se a Leonardo Bandarra e Débora Guerner, como mais um membro defenestrado do MP.
Dizem os brasileiros: “Desgraçado Demóstenes, que as vestais romanas rezem por ti, tu apagaste o fogo sagrado e, para a sociedade, cometeste o crimen incesti! E se não vivêsseis no século XXI, serias condenado a tapocrifação”!

Theófilo Silva é articulista colaborador da Rádio do Moreno.

sábado, 24 de março de 2012

Wolverine - por Mike Deodato

Discurso do Presidente João Goulart - Comício da Central do Brasil – 13/03

João Goulart e sua esposa Maria Teresa Fontela Goulart
Devo agradecer às organizações sindicais, promotoras desta grande manifestação, devo agradecer ao povo brasileiro por esta demonstração extraordinária a que assistimos emocionados, aqui nesta cidade do Rio de Janeiro. Quero agradecer, também, aos sindicatos que de todos os estados mobilizaram os seus associados, dirigindo minha saudação a todos os patrícios, neste instante mobilizados em todos os recantos do país, e ouvindo o povo através do rádio ou da televisão. Dirijo-me a todos os brasileiros, e não apenas aos que conseguiram adquirir instrução nas escolas. Dirijo-me também aos milhões de irmãos nossos que dão ao Brasil mais do que recebem e que pagam em sofrimento, pagam em miséria, pagam em privações, o direito de serem brasileiros e o de trabalhar de sol a sol pela grandeza deste país. Presidente de oitenta milhões de brasileiros, quero que minhas palavras sejam bem entendidas por todos os nossos patrícios. Vou falar em linguagem (...) rude, mas que é sincera e sem subterfúgios. É também a linguagem de esperança, de quem quer inspirar confiança no futuro, mas de quem tem a coragem de enfrentar sem fraquezas a dura realidade que vivemos.

Aqui estão os meus amigos trabalhadores, pensando na campanha de terror ideológico e de sabotagem, cuidadosamente organizada para impedir ou perturbar a realização deste memorável encontro entre povo e o seu Presidente, na presença das lideranças populares mais representativas deste país, que se encontram também conosco, nesta festa cívica.
Chegou-se a proclamar, trabalhadores brasileiros, que esta concentração seria um ato atentatório ao regime democrático como se no Brasil a reação ainda fosse dona da democracia, ou proprietária das praças e ruas. Desgraçada democracia a que tiver de ser defendida por esses democratas. Democracia para eles não é o regime da liberdade de reunião para o povo. O que eles querem é uma democracia de um povo emudecido, de um povo abafado nos seus anseios, de um povo abafado nas suas reivindicações. A democracia que eles desejam impingir-nos é a democracia do anti-sindicato, ou seja, aquela que melhor atenda aos seus interesses ou aos dos grupos que eles representam. A democracia que eles pretendem é a democracia dos privilégios, a democracia da intolerância e do ódio. A democracia que eles querem, trabalhadores, é para liquidar com a Petrobrás, é a democracia dos monopólios, nacionais e internacionais, a democracia que pudesse lutar contra o povo, a democracia que levou o grande Presidente Vargas ao extremo sacrifício. Ainda ontem eu afirmava no Arsenal de Marinha, envolvido pelo calor dos trabalhadores de lá, que a democracia jamais poderia ser ameaçada pelo povo, quando o povo livremente vem para as praças – as praças que são do povo. Para as ruas – que são do povo.

Democracia, trabalhadores, é o que o meu governo vem procurando realizar, como é do meu dever. Não só para interpretar os anseios populares, mas também para conquistá-los pelo caminho do entendimento e da paz. Não há ameaça mais séria para a democracia do que tentar estrangular a voz do povo, dos seus legítimos líderes populares, fazendo calar as sua reivindicações.

Estaríamos, assim, brasileiros, ameaçando o regime se nos mostrássemos surdos aos reclamos da Nação, desta Nação e desses reclamos que, de Norte a Sul, de Leste a Oeste, levantam o seu grande clamor pelas reformas de base e de estrutura, sobretudo pela reforma agrária, que será o complemento da abolição do cativeiro para dezenas de milhões de brasileiros, que vegetam no interior, em revoltantes condições de miséria. Ameaça à democracia, enfim, não é vir confraternizar com o povo na rua. Ameaça à democracia é empulhar o povo brasileiro, é explorar os seus sentimentos cristãos, na mistificação de uma indústria do anticomunismo, insurgindo o povo até contra os grandes e iluminados ensinamentos dos grandes e santos Papas que informam notáveis pronunciamentos, das mais expressivas figuras do episcopado nacional. O inolvidável Papa João XXIII é que nos ensina, povo brasileiro, que a dignidade da pessoa humana exige normalmente, como fundamento natural para a vida, o direito e o uso dos bens da terra, ao qual corresponde a obrigação fundamental de conceder uma propriedade para todos. É dentro desta autêntica doutrina que o governo brasileiro vem procurando situar sua política social, particularmente no que diz respeito à nossa realidade agrária. O cristianismo nunca foi o escudo para privilégios condenados para o Santo Padre, nem também, brasileiro, os rosários podem ser levantados contra a vontade do povo e as suas aspirações mais legítimas. Não podem ser levantados os rosários da fé contra o povo, que tem fé numa justiça social mais humana e na dignidade das suas esperanças. Os rosários não podem ser erguidos contra aqueles que reclamam a discriminação da propriedade da terra, hoje ainda em mãos de tão poucos, de tão pequena maioria.

Àqueles que reclamam do Presidente da República uma palavra tranqüila para a Nação, àqueles que em todo o Brasil nos ouvem nesta oportunidade, o que eu posso dizer é que só conquistaremos a paz social através da justiça social. Perdem seu tempo, também, os que temem que o governo passe a empreender uma ação subversiva na defesa de interesses políticos ou pessoais, como perdem também seu tempo os que esperam deste governo uma ação repressiva dirigida contra o povo, contra os seus direitos ou contra as suas reivindicações. Ação repressiva, trabalhadores, é a que o governo está praticando e vai ampliar cada vez mais e mais implacavelmente, aqui na Guanabara e em outros Estados, contra aqueles que especulam, contra as dificuldades do povo, contra os que exploram o povo, que sonegam gêneros alimentícios ou que jogam com seus preços. Ainda ontem, dentro de associações de cúpula de classes conservadoras, ibadianos de ontem levantaram a voz contra o Presidente pelo crime de defender o povo contra os que o exploram na rua e em seus lares, através da exploração e da ganância.

Mas não tiram o sono as manifestações de protestos dos gananciosos, mascaradas de frases patrióticas, mas que, na realidade, traduzem suas esperanças e seus propósitos de restabelecer impunidade para suas atividades antipopulares e anti-sociais. Por outro lado, não receio ser chamado de subversivo pelo fato de proclamar – e tenho proclamado e continuarei proclamando nos recantos da Pátria – a necessidade da revisão da Constituição. Há necessidade, trabalhadores, da revisão da Constituição da nossa República, que não atende mais aos anseios do povo e aos anseios do desenvolvimento desta Nação. A Constituição atual, trabalhadores, é uma Constituição antiquada, porque legaliza uma estrutura sócio-econômica já superada, uma estrutura injusta e desumana. O povo quer que se amplie a democracia, quer que se ponha fim aos privilégios de uma minoria; quer que a propriedade da terra seja acessível a todos; que a todos seja facilitado participar da vida política do país, através do voto, podendo votar e ser votado; que se impeça a intervenção do poder econômico nos pleitos eleitorais e que seja assegurada à representação de todas as correntes políticas, sem quaisquer discriminações, ideológicas ou religiosas.
Todos, todos os brasileiros, todos têm o direito à liberdade de opinião, de manifestar também sem temor seu pensamento. É um princípio fundamental dos direitos do homem, contido na própria Carta das Nações Unidas, e que temos o dever de assegurar a todos os brasileiros. Está nisso, trabalhadores, está nisso, povo brasileiro, o sentido profundo desta grande e incalculável multidão que presta, neste instante, sua manifestação ao Presidente, que vem também lhe prestar conta de seus problemas, mas também de suas atitudes e de suas convicções nas lutas que vem enfrentando, luta contra forças poderosas, mas confiando sempre na unidade do povo e das classes trabalhadoras, unidade que há de encurtar o caminho da nossa emancipação. É apenas de se lamentar que parcelas ainda ponderáveis que tiveram acesso à instrução superior continuem insensíveis, de olhos e ouvidos fechados à realidade nacional. São, certamente, trabalhadores, os piores surdos e os piores cegos, porque poderão com tanta surdez e com tanta cegueira, ser, amanhã, responsáveis, perante a História, pelo sangue brasileiro que possa ser derramado, ao pretenderem levantar obstáculos à caminhada do Brasil e à emancipação do povo brasileiro.

De minha parte, à frente do Poder Executivo, tudo continuarei fazendo para que o processo democrático siga o caminho pacífico, para que sejam derrubadas as barreiras que impedem a conquista de novas etapas e do progresso. E podeis estar certos, trabalhadores, de que juntos, governo e povo, operários, camponeses, militares, estudantes, intelectuais e patrões brasileiros que colocam os interesses da Pátria acima de seus interesses, haveremos de prosseguir, e prosseguir de cabeça erguida, a caminhada da emancipação social do país. O nosso lema, trabalhadores do Brasil, é progresso com justiça, e desenvolvimento com igualdade. A maioria dos brasileiros já não se conforma com a ordem social imperfeita, injusta e desumana. Os milhões que nada têm se impacientam com a demora, já agora quase insuportável, em receber os dividendos de um progresso tão duramente construído também com o esforço dos trabalhadores e o sacrifício dos humildes. Vamos continuar lutando pela construção de novas usinas, pela abertura de novas estradas, pela implantação de mais fábricas, de novas escolas, de hospitais para o povo sofredor; mas sabemos, trabalhadores, que nada disso terá sentido profundo se ao homem não for assegurado o sagrado direito ao trabalho e a uma justa participação no desenvolvimento nacional.

Não, trabalhadores; não, brasileiros: sabemos muito bem que de nada vale ordenar a miséria neste país. Nada adianta dar-lhe aquela aparência bem comportada com que alguns pretendem iludir e enganar o povo brasileiro. Meus patrícios, a hora é a hora da reforma, brasileiros, reforma de estrutura, reforma de métodos, reforma de estilo de trabalho e reforma de objetivo para o povo brasileiro. Já sabemos que não é mais possível produzir sem reformar, que não é mais possível admitir que esta estrutura ultrapassada possa realizar o milagre da salvação nacional, para milhões e milhões de brasileiros, da portentosa civilização industrial, porque dela conhecem apenas a vida cara, as desilusões, o sofrimento e as ilusões passadas. O caminho das reformas é o caminho do progresso e da paz social. Reformar, trabalhadores, é solucionar pacificamente as contradições de uma ordem econômica e jurídica superada, inteiramente superada pela realidade dos momentos em que vivemos.

Trabalhadores, acabei de assinar o decreto da Supra. Assinei-o, meus patrícios, com o pensamento voltado para a tragédia do irmão brasileiro que sofre no interior de nossa Pátria. Ainda não é aquela reforma agrária pela qual lutamos. Ainda não é a reformulação do nosso panorama rural empobrecido. Ainda não é a carta de alforria do camponês abandonado. Mas é o primeiro passo: uma porta que se abre à solução definitiva do problema agrário brasileiro.

O que se pretende com o decreto que considera de interesse social, para efeito de desapropriação, as terras que ladeiam eixos rodoviários, leitos de ferrovias, açudes públicos federais, e terras beneficiadas por obras de saneamento da União, é tornar produtivas áreas inexploradas ou subtilizadas, ainda submetidas a um comércio especulativo, odioso e intolerável.

Não é justo que o benefício de uma estrada, de um açude ou de uma obra de saneamento vá servir aos interesses dos especuladores de terra, que se apoderam das margens das estradas e dos açudes. A Rio-Bahia, por exemplo, que custou setenta bilhões de dinheiro do povo, não deve beneficiar os latifundiários, pela multiplicação do valor de suas propriedades, mas sim do povo.

Não o podemos fazer, por enquanto, trabalhadores, como é de prática corrente em todos os países do mundo civilizado: pagar a desapropriação de terras abandonadas em títulos da dívida pública e a longo prazo.
Reforma Agrária com pagamento prévio do latifúndio improdutivo, à vista e em dinheiro, não é reforma agrária. Reforma agrária, como consagrado na Constituição, com pagamento prévio e a dinheiro é negócio agrário, que interessa apenas ao latifundiário, radicalmente oposto aos interesses do povo brasileiro. Por isso de decreto da Supra não é a reforma agrária.
Sem reforma constitucional, trabalhadores, não há reforma agrária autêntica. Sem emendar a Constituição, que tem acima dela o povo, poderemos ter leis agrárias honestas e bem intencionadas, mas nenhuma delas capaz de modificações estruturais profundas.

Graças à colaboração patriótica e técnica das nossas gloriosas Forças Armadas, em convênios realizados com a Supra, graças a essa colaboração, meus patrícios, espero que dentro de menos de sessenta dias já comecem a ser divididos os latifúndios das beiras das estradas, os latifúndios ao lado das ferrovias e dos açudes construídos com o dinheiro do povo, ao lado das obras de saneamento realizadas com o sacrifício da Nação. E, feito isto, os trabalhadores do campo já poderão, então, ver concretizada, embora em parte, a sua mais sentida e justa reivindicação, aquela que lhes dará um pedaço de terra para cultivar. Aí, então, o trabalhador e sua família irão trabalhar para si próprios, porque até aqui eles trabalharam para o dono da terra, a quem entregam, como aluguel, metade de sua produção. E não se diga, trabalhadores, que há meio de se fazer à reforma sem mexer a fundo na Constituição. Em todos os países civilizados do mundo já foi suprido do texto constitucional aquela parte que obriga a desapropriação por interesse social, a pagamento prévio, a pagamento em dinheiro.

No Japão de pós-guerra, há vinte anos, ainda ocupado pelas forças aliadas vitoriosas, sob o patrocínio do comando vencedor, foram distribuídos dois milhões e meio de hectares das melhores terras do país, com indenizações pagas em bônus com vinte e quatro anos de prazo, juros de 3,65% ao ano. E quem é que se lembrou de chamar o Gen. Macarthur de subversivo ou extremista?

Na Itália, ocidental e democrática, foram distribuídos um milhão de hectares, em números redondos, na primeira fase de uma reforma agrária cristã e pacífica iniciada há quinze anos. Cento e cinqüenta mil famílias foram beneficiadas.

No México, durante os anos de 1932 a 1945, foram distribuídas trinta milhões de hectares, com pagamento das indenizações em títulos da dívida pública, vinte anos de prazo, juros de 5% ao ano, e desapropriação dos latifúndios com base no valor fiscal.

Na Índia foram promulgadas leis que determinam a abolição da grande propriedade mal aproveitada, transferindo as terras para os camponeses. Essas leis abrangem cerca de sessenta e oito milhões de hectares, ou seja, a metade da área cultivada da Índia.

Portanto, não existe argumento capaz de poder afirmar que no Brasil, uma nação jovem, que se projeta para o futuro, não se possa também fazer a reforma da Constituição para a reforma agrária autêntica e verdadeira.
A reforma agrária não é capricho de um governo ou programa de um partido. É produto da inadiável necessidade de todos os povos do mundo. Aqui, no Brasil, constitui a legenda mais viva da esperança do nosso povo, sobretudo daqueles que labutam no campo. A reforma agrária é também uma imposição progressista do mercado interno, que necessita aumentar a sua produção para sobreviver.

Os tecidos e os sapatos sobram nas prateleiras das lojas e as nossas fábricas estão produzindo muito abaixo de sua capacidade. Ao mesmo tempo em que isso acontece, as nossas populações mais pobres vestem farrapos e andam descalças, porque não têm dinheiro para comprar.
Assim, a reforma agrária é indispensável, não só para aumentar o nível de vida do homem do campo, mas, também, para dar mais trabalho às indústrias e melhor remuneração ao trabalhador urbano.

Interessa, por isso, também a todos os industriais e aos comerciantes. A reforma agrária é necessária, enfim, à nossa vida social e econômica, para que o país possa progredir, em sua indústria, e no bem-estar do seu povo.
Como garantir o direito de propriedade autêntica quando, dos quinze milhões de brasileiros que trabalham a terra, no Brasil, apenas dois milhões e meio são proprietários?

O que estamos pretendendo fazer no Brasil, pelo caminho da reforma agrária, não é diferente, pois, do que se fez em todos os países desenvolvidos do mundo. É uma etapa de progresso que precisamos conquistar e haveremos de conquistar.

Esta manifestação deslumbrante que presenciamos é um testemunho vivo de que a reforma agrária será conquistada para o povo brasileiro. O próprio custo da produção, trabalhadores, o próprio custo dos gêneros alimentícios está diretamente subordinado às relações entre o homem e a terra. Num país em que se paga aluguéis da terra que sobem a mais de 50% da produção obtida daquela terra, não pode haver gêneros baratos, não pode haver tranqüilidade social. No meu Estado, por exemplo, o Estado do Dep. Leonel Brizola, 65% da produção de arroz é obtida em terras alugadas e o arrendamento ascende a mais de 55% do valor da produção. O que ocorre no Rio Grande é que um arrendatário de terras para o plantio de arroz paga, em cada ano, o valor total da terra que ele trabalhou para o proprietário. Esse inquilino rural desumano e medieval é o grande responsável pela produção insuficiente e cara que torna insuportável o custo de vida para as classes populares em nosso país.

A reforma agrária só prejudica uma minoria de insensíveis, que deseja manter o povo escravo e a Nação submetida a um miserável padrão de vida.

E é claro, trabalhadores, que só se pode iniciar uma reforma agrária em terras economicamente aproveitáveis. É claro que não poderíamos começar a reforma agrária, para atender os anseios do povo, nos Estados do Amazonas ou do Pará. A reforma agrária deve ser iniciada nas terras mais valorizadas e ao lado dos grandes centros de consumo, com transporte fácil para o seu escoamento.

Governo nenhum, trabalhadores, povo nenhum, por maior que seja o seu esforço, e até mesmo o seu sacrifício, poderá enfrentar o monstro inflacionário que devora os salários, que inquieta o povo assalariado, se não forem efetuadas as reformas de estrutura e de base exigidas pelo povo e reclamada pela Nação.

Tenho autoridade para lutar pela reforma da atual Constituição, porque esta reforma é indispensável e porque o seu objetivo único e exclusivo é abrir o caminho para a solução harmônica dos problemas que afligem o nosso povo. Não me animam, trabalhadores - e é bom que a Nação me ouça –, quaisquer propósitos de ordem pessoal. Os grandes beneficiários das reformas serão, acima de todos, o povo brasileiro e os governos que me sucederão. A eles, trabalhadores, desejo entregar uma Nação engrandecida, emancipada e cada vez mais orgulhosa de si mesma, por ter resolvido mais uma vez, e pacificamente, os graves problemas que a História nos legou.
Dentro de 48 horas vou entregar à consideração do Congresso Nacional à mensagem presidencial deste ano. Nela, estão claramente expressas as intenções e os objetivos deste governo. Espero que os senhores congressistas, em seu patriotismo, compreendam o sentido social da ação governamental, que tem por finalidade acelerar o progresso deste país e assegurar aos brasileiros melhores condições de vida e trabalho, pelo caminho da paz e do entendimento, isto é, pelo caminho reformista, pacífico e democrático.

Mas estaria faltando ao meu dever se não transmitisse, também, em nome do povo brasileiro, em nome destas cento e cinqüenta ou duzentas mil pessoas que aqui estão, caloroso apelo ao Congresso Nacional para que venha ao encontro das reivindicações populares, para que, em seu patriotismo, sinta os anseios da Nação, que quer abrir caminho, pacífica e democraticamente, para melhores dias. Mas também, trabalhadores, quero referir-me a um outro ato que acabo de assinar, interpretando os sentimentos nacionalistas deste país. Acabei de assinar, antes de dirigir-me para esta grande festa cívica, o decreto de encampação de todas as refinarias particulares.

A partir de hoje, trabalhadores brasileiros, a partir deste instante, as refinarias de Capuava, Ipiranga, Manguinhos, Amazonas e Destilaria Rio-Grandense passam a pertencer ao povo, passam a pertencer ao patrimônio nacional.

Procurei, trabalhadores, depois de estudos cuidadosos elaborados por órgãos técnicos, depois de estudos profundos, procurei ser fiel ao espírito da lei que foi inspirada nos ideais patrióticos e imortais de um brasileiro que também continua imortal em nossa alma e nosso espírito.

Ao anunciar, à frente do povo reunido em praça pública, o decreto de encampação de todas as refinarias de petróleo particulares, desejo prestar homenagem de respeito àquele que sempre esteve presente nos sentimentos do nosso povo, o grande e imortal Presidente Getúlio Vargas.
O imortal e grande patriota tombou, mas o povo continua a caminhada, guiado pelos seus ideais. E eu, particularmente, vivo hoje momento de profunda emoção ao poder dizer que, com este ato, soube interpretar o sentimento do povo brasileiro.

Alegra-me ver, também, o povo reunido para prestigiar medidas como esta, da maior significação para o desenvolvimento do país e que habilita o Brasil a aproveitar melhor as suas riquezas minerais, especialmente as riquezas criadas pelo monopólio do petróleo. O povo estará sempre presente nas ruas e nas praças públicas, para prestigiar um governo que pratica atos como estes, e também para mostrar às forças reacionárias que há de continuar a sua caminhada, no rumo da emancipação nacional.

Na mensagem que enviei à consideração do Congresso Nacional estão igualmente consignadas duas outras reformas que o povo brasileiro reclama, porque é exigência do nosso desenvolvimento e da nossa democracia. Refiro-me à reforma eleitoral, à reforma ampla que permita a todos os brasileiros maiores de 18 anos ajudar a decidir dos seus destinos, que permita a todos os brasileiros que lutam pelo engrandecimento do país a influir nos destinos gloriosos do Brasil. Nesta reforma, pugnamos pelo
princípio democrático, princípio democrático fundamental, de que todo alistável deve ser também elegível.

Também está consignada na mensagem ao Congresso a reforma universitária, reclamada pelos estudantes brasileiros, pelos universitários de classe que sempre tem estado corajosamente na vanguarda de todos os movimentos populares e nacionalistas.

Ao lado dessas medidas e desses decretos, o governo continua examinando outras providências de fundamental importância para a defesa do povo, especialmente das classes populares.

Dentro de poucas horas, outro decreto será dado ao conhecimento da Nação. É o que vai regulamentar o preço extorsivo dos apartamentos e residências desocupados, preços que chegam a afrontar o povo e o Brasil, oferecidos até mediante o pagamento em dólares. Apartamento, no Brasil, só pode e só deve ser alugado em cruzeiros, que é dinheiro do povo e a moeda deste país. Estejam tranqüilos que dentro em breve esse decreto será uma realidade.

E realidade há de ser também a rigorosa e implacável fiscalização para que seja cumprido. O governo, apesar dos ataques que tem sofrido, apesar dos insultos, não recuará um centímetro sequer na fiscalização que vem exercendo contra a exploração do povo. E faço um apelo ao povo para que ajude o governo na fiscalização dos exploradores do povo, que são também exploradores do Brasil. Aqueles que desrespeitam a lei, explorando o povo – não interessa o tamanho de sua fortuna, nem de seu poder, esteja ele em Olaria ou na rua do Acre – hão de responder perante a lei pelo seu crime.

Aos servidores públicos da Nação, aos médicos, aos engenheiros do serviço público, que também não me têm faltado com seu apoio e o calor de sua solidariedade, posso afirmar que suas reivindicações justas estão sendo objeto de estudo final e que em breve serão atendidas. Atendidas porque o governo deseja cumprir o seu dever com aqueles que permanentemente cumprem o seu para com o país.

Ao encerrar, trabalhadores, quero dizer que me sinto reconfortado e retemperado para enfrentar a luta que tanto maior será contra nós quanto mais perto estivermos do cumprimento do nosso dever. À medida que esta luta apertar, sei que o povo também apertará sua vontade contra aqueles que não reconhecem os direitos populares, contra aqueles que exploram o povo e a Nação.

Sei das reações que nos esperam, mas estou tranqüilo, acima de tudo porque sei que o povo brasileiro já está amadurecido, já tem consciência da sua força e da sua unidade, e não faltará com seu apoio às medidas de sentido popular e nacionalista.

Quero agradecer, mais uma vez, esta extraordinária manifestação em que os nossos mais significativos líderes populares vieram dialogar com o povo brasileiro, especialmente com o bravo povo carioca, a respeito dos problemas que preocupam a Nação e afligem todos os nossos patrícios.

Nenhuma força será capaz de impedir que o governo continue a assegurar absoluta liberdade ao povo brasileiro. E, para isto, podemos declarar, com orgulho, que contamos com a compreensão e o patriotismo das bravas e gloriosas Forças Armadas da Nação.

Hoje, com o alto testemunho da Nação e com a solidariedade do povo, reunido na praça que só ao povo pertence, o governo, que é também o povo e que também só ao povo pertence, reafirma os seus propósitos inabaláveis de lutar com todas as suas forças pela reforma da sociedade brasileira. Não apenas pela reforma agrária, mas pela reforma tributária, pela reforma eleitoral ampla, e pelo voto do analfabeto, pela elegibilidade de todos os brasileiros, pela pureza da vida democrática, pela emancipação econômica, pela justiça social e pelo progresso do Brasil.

terça-feira, 20 de março de 2012

Era uma vez na floresta - por Andrei Pervukhin (Coolvibe)

Sobre a corrupção

Triste é constatar, nestas denúncias apresentadas pelo programa fantástico da rede globo sobre a corrupção em órgãos da saúde do Rio de Janeiro, quando as pessoas filmadas, falando sobre corrupção, afirmam que "Está é a ética do mercado", ou que "o normal é 10% (de propina)", elas diziam a verdade.
Lembra até a fala do Bruno Covas (deputado estadual de SP), dizendo que, ao se deparar com o esquema de vendas de emendas parlamentares - fato absolutamente comum na assembleia legislativa (tucana) paulista segundo sua fala - ele pediu então para que a "sua parte", sua cota da propina, fosse doada a uma instituição de caridade. Depois disse que não havia dito isso. Confrontado com a gravação da entrevista dada ao jornal, que comprovava que ele de fato havia dito o que o jornal publicou, ele disse que não disse que não tinha dito o que disse, mas que disse outra coisa diferente do que as pessoas pensam que ele disse. Confuso? A culpa não é minha, é da explicação (?).

Uma coisa a se destacar positivamente na reportagem foi o fato de, desta vez, o fantástico ter se preocupado com os corruptores. Normalmente, a culpa recai tão somente no corrupto - esquecendo-se que para que exista um corrupto, é necessário que haja um corruptor (este "esquecimento" decorre do fato dos corruptores serem muitas vezes, pessoas de alta influência e grande poder econômico - a operação Castelo de Areia que o diga).
É um caso a ser analisado com maior cuidado esta necessidade que há da existência da continuidade do crime para que este possa ser executado. Um ladrão só rouba algo, porque sabe que existe alguém para comprar este produto. Da mesma maneira que um traficante de entorpecentes só trafica porque há um usuário para o produto que ele ilegalmente vende. Claro que uma coisa não compensa a outra, o ladrão e o traficante são criminosos, da mesma maneira que o receptador de mercadorias roubadas, ou o usuário de drogas (ao menos penso que deveria ser) também são.
Para que o crime ocorra, alguém há de dar continuidade à aquilo que foi ilegalmente executado. Na minoria dos casos, o criminoso frui individualmente do delito que cometeu (um usuário de drogas, dificilmente planta sua maconha, a processa e consome seu cigarro).
Porém, para a justiça brasileira, mesmo nos casos mais improváveis, isto é possível. Um  caso recente envolvendo a empresa Kroll, que foi condenada por espionar ilegalmente diversas pessoas, é emblemático neste sentido. A empresa foi condenada, mas, obviamente, alguém mandou que ela espionasse - a empresa presta este tipo de serviço. Mas quem mandou? Daniel Dantas, é de conhecimento até do mundo mineral, como diria Mino Carta. Entretanto, para a justiça brasileira, não foi ninguém. A Kroll, uma empresa de espionagem, espionou. Mas ninguém contratou-a para que ela espionasse. Chega a ser cômico, de tão ridículo.

E aí fica a impressão de que a existência desta mistura ideal de combustível e comburente - corruptos e corruptores, da imprensa amiga com o moleque do Bruno Covas, da justiça brasileira tão cândida com o dono do país, o senhor Daniel Dantas, bem, fica a impressão de que tudo cá por estas plagas é uma lástima.

Jamie da floresta - por Christina Hess (Coolvibe)

TV Cultura: nova privataria em curso - por Joaquim Ernesto Palhares (Carta Maior)

A ninguém mais é dado o direito de supor que o colapso da ordem neoliberal conduzirá, mecanicamente, à redenção da esfera pública na vida da sociedade. O que se verifica em muitos países, sobretudo na Europa, é que o pior pode acontecer. A imensa reconstrução a ser enfrentada ainda espera por seus protagonistas históricos. Em muitos casos, sequer existe o que recuperar. A crise realçou carências antigas; respostas nunca antes contempladas de fato, aguardam uma equação inovadora.

Esse é o caso, por exemplo da democratização da mídia. Em São Paulo, nesse momento, o esfarelamento da TV Cultura, uma emissora pública que nunca assumiu integralmente a sua vocação, é uma referência dos desafios a superar.

A exceção de um pequeno hiato nos anos 80, quando, inclusive, alcançou índices de audiência de até 14 pontos, a televisão pública paulista teve seus objetivos desvirtuados pela asfixia, ora financeira, ora política. Ou, como acontece agora, espremidos pelo duplo torniquete de constrangimentos institucionais e econômicos.

Dela pode-se dizer que até hoje não superou uma crise de identidade que conduz a permanente oscilação entre ser um canal estatal, um veículo público ou um arremedo amesquinhado de emissora comercial.

A longa agonia da TV Cultura de São Paulo está longe de ser um problema apenas financeiro, como se alardeia, e menos ainda de natureza técnica. Nichos de qualidade indiscutível comprovaram a capacidade dos profissionais que ali passaram de gerar uma programação diferenciada, irretocável competência. Suas raízes são políticas, agravadas pelo peso de uma agenda histórica que hoje definha. Aqueles que decretaram a irrelevância da esfera pública na construção da sociedade brasileira e de seu desenvolvimento não poderiam jamais ter um projeto coerente de emissora de televisão, voltada para os interesses gerais da cidadania.

Esse é o cerne da montanha-russa vivida pela TV pública paulista nas últimas décadas. Ele explica por que, no Estado mais rico da federação, uma emissora criada há 45 anos, ainda não sabe a que veio; não tem laços orgânicos com a cidadania; não dispõe de estrutura estável de financiamento e, sobretudo, continua a mercê do arbítrio de governantes de plantão que nomeiam e cortam cabeças ao sabor de suas conveniências fiscais e, pior que isso, eleitorais.

A crise da TV Cultura, é forçoso repetir, alinha-se a um processo corrosivo que, por quase três décadas, hostilizou, desdenhou, induziu ao sucateamento e estigmatizou aos olhos da opinião pública tudo o que não fosse mercado; tudo o que não fosse interesse privado, que não refletisse uma eficiência medida em cifras e valores negociados em bolsa, foi desqualificado e loteado.

Nesse funeral da coisa pública, seria um milagre se a emissora de TV do Estado que se notabilizou como a trincheira ideológica desse credo, tivesse outro destino que não o recorrente arrastar de demissões, o liquidacionismo de acervos, programações e talentos. Tudo a desembocar num eterno e desairoso recomeço rumo a lugar nenhum.

A essa montanha desordenada de impulsos irrefletidos agrega-se agora um novo golpe: o loteamento da grade de programação pública aos veículos de mídia privada, alinhados à doutrina e aos interesses dos ocupantes do Palácio dos Bandeirantes.

Reconheça-se a pertinência de um espaço ecumênico de debate jornalístico numa televisão pública, como contraponto à insuficiência - para dizer o mínimo - do noticioso oferecido pela maioria das emissoras comerciais.

Não é disso, porém, que se trata. Quando se concede, unilateralmente, a uma corporação midiática, caso da Folha de São Paulo, 30 minutos semanais, em horário nobre, o que se sugere é uma apropriação do sinal público pela endogamia de interesses que não são os da sociedade.

A construção de uma verdadeira emissora pública de televisão em São Paulo - e no Brasil - não é um capricho ideológico, mas uma necessidade da democracia brasileira. Trata-se de um serviço que a lógica privada do lucro não se dispõe, nem tem condições de atender.

Não é fazendo da TV Cultura um anexo do 'jornalismo amigo' produzido na Barão de Limeira que esse objetivo será alcançado.

O desmonte da TV Cultura tem que ser interrompido. Mais que isso, hoje ele tem condições de ser contrastado. O colapso da hegemonia neoliberal reforçou o discernimento da sociedade para a urgente necessidade de se construir exatamente o inverso do que se arquiteta sob as asas da Fundação Padre Anchieta. Ou seja, substituir a dominância dos interesses privados pela regulação democrática das demandas e aspirações da sociedade.

Em São Paulo, o primeiro passo nessa direção tem que ser dado agora. É preciso impedir que uma privatização anômala do sinal público seja consumada na TV Cultura.