domingo, 4 de março de 2012

Tombini postula taxa neutra de juros mais alta que a atual - por Carlos Lopes (Hora do Povo)

O depoimento do presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado (CAE), na terça-feira (28), foi notável pela quase total irrelevância das perguntas e comentários dos senadores. Nenhum parecia preocupado com o que importa: o crescimento do país. Assim, Tombini, depois de sua exposição, passou a agradecer aos elogios encomiásticos do senador Lindbergh, do senador Simon, do senador sei-lá-das-quantas, e mais uma plêiade.


No entanto, considerando o fracasso de 2011, Tombini projetou um quadro próximo do tétrico para 2012, sempre dizendo que tudo ia bem e ia ficar melhor ainda. Ou será que projetar apenas 3% de crescimento do PIB para 2012, depois do crescimento pífio de 2011, não é, sobretudo para um país do tamanho do Brasil, um quadro perto do tétrico? Certamente, com sua longa exposição sobre a crise dos países centrais, quis passar que o Brasil não tem condições de crescer enquanto esses países estiverem em crise. Mas ele mesmo se desmentiu, ao falar da China – permanece o fato de que esta não é uma crise mundial, mas uma crise dos países imperialistas.

No Senado, Tombini nem mesmo teve que explicar por que a sua projeção de crescimento é tão menor que a do ministro Mantega - que no momento ainda propala uma previsão de 4,5% -, nem a razão por que, segundo disse, a China vai crescer 8,5%, mas o Brasil não pode ir além de medíocres 3%.

Ninguém se interessou pelo assunto, apesar dessa previsão estar em tamanho garrafal no slide 37 da apresentação de Tombini, e dele mesmo ter dito: “nos últimos três trimestres, o Brasil tem crescido abaixo do potencial”. Ninguém perguntou, também, que “potencial” era esse, com exceção, muito tangencialmente, do senador Dornelles (PP/RJ) – mas esse aceitou que Tombini não respondesse, o que mostra que também não estava muito interessado.

Também ninguém perguntou porque Tombini apresentou uma previsão de US$ 65 bilhões para o déficit externo, quando o próprio BC publicou uma previsão de US$ 70 bilhões – é verdade que atribuindo-a ao “mercado”. Imaginemos que ninguém ali soubesse disso. Porém, US$ 65 bilhões já é motivo de alarme nacional. Entretanto, somente o senador Ricardo Ferraço (PMDB/ES) parecia alarmado com as contas externas.

Mas também ele deixou Tombini dizer impunemente que “sobre a deterioração das contas externas (…) em 2010 (…) a exportação cresceu 32% em valor e a importação cresceu um pouco mais, 42%; em 2011, a exportação cresce na faixa de 26,7% e a importação cresce 24%”, sem observar que isso se deu à custa de travar o crescimento do país, e que ele estava omitindo o papel das remessas de lucros no déficit – e, ainda mais, que mesmo com a economia travada, o déficit nas contas externas aumentou em 2011, assim como o próprio Tombini estava prevendo um aumento maior ainda – quase espetacular - em 2012.

Coisas absolutamente óbvias. Ou deveriam, para quem se propõe a ser membro da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado. Mas, qual o quê...

O pior foram os juros. O juro real básico está em 4,8% - uma enormidade em relação ao resto do mundo, pois o que importa, nas atuais circunstâncias, é o diferencial entre a taxa interna e as taxas externas. É esse diferencial que faz com que o país seja inundado por dólares, devido às superemissões monetárias dos EUA e demais países centrais, fazendo com que o câmbio seja deformado, tornando-se um subsídio às importações contra a produção interna.

Tombini, neoliberal que copiava no caderno tudo o que diziam na University of Illinois, onde obteve uma pós-graduação, sacou o estúpido conceito de “taxa de juros neutra”, aquela que não pode cair (também chamada “de equilíbrio”, talvez porque ela “equilibra” - isto é, enche - os cofres dos bancos sem, supostamente, fazer a população equilibrar alguns banqueiros e autoridades monetárias no poste).

Segundo ele, “o Banco Central procedeu a um exercício com o mercado financeiro. (…) a mediana da taxa de juros neutra caiu para 5,5%”. Tombini referia-se às taxas reais. A atual é 4,8% - ou seja, para atingir tal taxa “neutra”, a taxa básica de juros teria que subir, e não cair. Porém, 5,5% é a “mediana”, isto é, o número que fica no meio das previsões (não confundir com a média). Como “taxa neutra” ou “juro neutro” é um conceito muito científico, Tombini esclareceu que “tem gente que acha que a taxa é 3,49%. Há outros que acham que a taxa de juros neutra é 7%”.

Em suma, a “taxa de juros neutra” varia de acordo com a ganância do banqueiro.

Resta saber por que os senadores perdem seu tempo ouvindo esse tipo de coisa. Há tanta coisa melhor na vida para se fazer... Mas deve ser, precisamente, porque não estavam interessados no assunto, ou porque o ingresso era mais barato.

Muito perspicaz foi a resposta ao senador Dornelles sobre o chamado “PIB potencial”, acima do qual o Brasil não poderia crescer, definido pelo presidente Lula como “uma imbecilidade de certos economistas” - e pelo embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, Alto-Representante Geral do Mercosul, nos seguintes termos: “o conceito de produto potencial é uma farsa”.

Disse Tombini que no cálculo do “PIB potencial” “há variáveis não observáveis, que dependem de uma série de hipóteses. No nosso cálculo, temos várias metodologias...”. E não disse qual era o “PIB potencial” do BC. Também, com “variáveis não observáveis” pode-se calcular qualquer coisa. O único problema é que não terá relação com a realidade ou com a verdade.

O objetivo da lei, ao obrigar o presidente do BC a depor no Senado periodicamente, era fazê-lo prestar contas à sociedade – infelizmente, se depender de nossos atuais senadores, a audiência serve para a enrolação pública, ou nem para isso.

Nenhum comentário: