Eu gostaria de ter tempo, dinheiro e paciência para medir quantos centímetros e minutos foram gastos tratando da Venezuela na mídia brasileira nos últimos meses e comparar com os mesmos dados relativos à Colômbia. Você sabia que há 29 congressistas colombianos presos por causa do chamado escândalo da parapolítica?
Diz o jornal conservador colombiano El Tiempo, a respeito: O que se descobriu, depois das investigações da Justiça, nas quais se obtiveram confissões dos responsáveis, é que o fenômeno paramilitar permeou a classe dirigente da maioria dos partidos. E que muitos deles, uns mais que os outros, fizeram acordos com os criminosos e consentiram suas ações, em troca de votos para permanecer ativos na arena política.
Um leitor desavisado corre o risco de concluir, a partir da cobertura da mídia brasileira, que:
-- as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) surgiram incentivadas por Hugo Chávez. Não é verdade. Ele assumiu a presidência em 1998 e as FARC foram formadas em 1966, quando Chávez tinha 12 anos de idade.
-- as FARC têm o monopólio da violência na Colômbia. Não é verdade. Os grupos paramilitares, ligados a integrantes do exército e da polícia, se organizaram nos anos 80 e 90 para fazer a guerra suja contra o cartel de Medellin, dar apoio a narcotraficantes e proteger interesses políticos e econômicos de empresários e políticos.
-- os seqüestros são monopólio das FARC. Não é verdade. Eles foram praticados pela guerrilha, por paramilitares e por bandidos comuns.
-- os narcotraficantes fizeram acordos apenas com as FARC. Não é verdade. Eles também atuaram em parceria com grupos paramilitares, como as Autodefesas Unidas da Colômbia (AUC).
Em resumo, as raízes históricas da violência na Colômbia são complexas e não é possível uma saída militar para a guerra civil. Se fosse possível, já teria sido obtida pelo governo de Álvaro Uribe, que além da assessoria dos Estados Unidos e de bilhões de dólares de ajuda tem à sua disposição o equipamento militar mais moderno e tropas bem treinadas.
Uribe quer regionalizar a crise, flexibilizar as fronteiras e, ao mesmo tempo, faturar politicamente para prorrogar sua permanência no poder. A violência e o narcotráfico são problemas que a Colômbia exportou para os seus vizinhos - e não o inverso.
A pressão para que a Colômbia finalmente lidasse com os paramilitares partiu do Congresso dos Estados Unidos, sem o qual é impossível aprovar o Tratado de Livre Comércio entre os dois países.
O escândalo abalou especialmente a base de apoio do presidente Álvaro Uribe no Congresso. Um dos partidos, o Colômbia Democrática, teve três de seus senadores presos e o quarto, Mario Uribe, primo do presidente, renunciou e aguarda uma decisão da Procuradoria Geral. Ele recebeu ajuda dos paramilitares na campanha eleitoral de 2002. Ainda não se descobriu nada contra o Polo Democratico, principal partido de oposição, o que o fortalece para as eleições presidenciais de 2010.
Com o Congresso paralisado por prisões de senadores e deputados, a oposição fala em reforma política, mas os aliados de Uribe rejeitam a idéia.
YES, NÓS TEMOS BANANAS
Em outra frente da mesma crise, um grupo de 173 parentes de vítimas dos paramilitares move ação de indenização na Justiça dos Estados Unidos contra a Chiquita Brands International. A empresa, sucessora da famosa United Fruit, é acusada de ter usado os serviços dos paramilitares para se livrar de sindicalistas, militantes e trabalhadores na região de produção de banana da Colômbia.
Em 2007, a Chiquita fez um acordo com o Departamento de Justiça dos Estados Unidos pelo qual pagou 25 milhões de dólares em multa. A empresa admitiu ter feito pagamentos para as AUC no valor de cerca de U$ 1,7 milhão entre 1997 e 2004 em troca de proteção na área de colheita. A empresa também admitiu ter feito pagamentos às FARC e a outro grupo guerrilheiro, o Exército de Libertação Nacional (ELN).
Tecnicamente, a Chiquita violou a lei antiterrorista dos Estados Unidos, já que os três grupos estão na lista de Organizações Terroristas Estrangeiras do Departamento de Estado. Pelo acordo, a empresa ficou livre de identificar os seus executivos que aprovaram os pagamentos. Ou seja, quando um americano admite ter ajudado um grupo terrorista, conforme definido pelos próprios Estados Unidos, paga multa. Quando um estrangeiro é suspeito disso pode ser seqüestrado em seu país de origem, permanecer preso em Guantánamo sem acusação formal ou levar uma bomba na cabeça.
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