sexta-feira, 5 de julho de 2013

A discussão sobre a capacidade do orçamento estatal - por Ari (Blog do Nassif)

     Na maioria dos meios de discussão que participo não vejo muita consciência como relação à capacidade orçamentária do estado.

     As pessoas têm tendências individualistas quando discutem estes temas. Eu ouço e leio tantas falsas verdades:

1) No geral, o cidadão acredita que o governo arrecada suficientemente para oferecer serviços públicos de qualidade.

     Não estou querendo aqui defender a idéia de que não dá para oferecer melhores serviços com o orçamento que existe. Meu questionamento é se, com os recursos atuais, seria possível oferecer serviços públicos com um mínimo de qualidade.

     Um indicador interessante que considero importante para desmistificar este tema é o da CTB (Carga Tributária) x PIB per capita (fonte http://portal2.tcu.gov.br/portal/page/portal/TCU/comunidades/contas/cont...

      Alguns números:

Noruega: 59% de $ 82.000 = $ 48.000 por habitante arrecadados pelo estado

Suíça: 34% de $ 60.000 = $ 20.400 por habitante

Alemanha: 44% de $ 41.000 = $ 16.400 por habitante

Nigéria: 11% de $ 1.100 = $ 121 por habitante

Chile: 21% de $ 10.000 = $ 2.100 por habitante

Brasil: 34% de $ 7.000 = $ 2.400 por habitante

     Seria possível para o estado brasileiro oferecer serviços públicos de qualidade se comparado, por exemplo, com o estado alemão?

     Um fato é que nossa arrecadação corresponde à vigésima parte da alemã. Um argumento para que sim, poderia oferecer serviços de qualidade como o alemão, é que os custos destes serviços seriam menores no Brasil do que na Alemanha. Será que este argumento é correto, principalmente em uma economia globalizada? Os custos em saúde seriam tão menores assim no Brasil se comparados com os custos na Alemanha?

     Seria possível para o estado brasileiro oferecer serviços públicos de qualidade se comparado, por exemplo, com o estado chileno?

     Neste caso, nossa arrecadação corresponde à chilena. Não sei como é a qualidade, por exemplo, dos serviços de saúde no Chile. Uma diferença que provavelmente exista é com relação às demandas por serviços públicos, se comparados Chile e Brasil, pois no Chile a distribuição de riquezas é um pouco melhor do que no Brasil.

2) A classe média (difícil definir quando a gente lê ou ouve este termo) acha que é ela que paga imposto.

     Eu sempre me deparo com gente nesta classe que defende uma reforma tributária achando que haverá diminuição em sua própria carga tributária. Na verdade, a carga tributária é maior quanto menor a renda familiar mensal (fonte http://www.cdes.gov.br/documento/2651756/indicadores-de-iniquidade-do-si...):

48% para rendas até 2 salários mínimos de renda familiar

38% de 2 a 3 salários

34% de 3 a 5 sálários

32% de 5 a 15 sálários

28% de 15 a 30 sálários

26% acima de 30 sálários

     Quando alguém defende uma reforma tributária, está imaginado uma reforma tributária justa, que irá diminuir a carga tributária daqueles que tem renda familiar menor? Você que defende uma reforma tributária justa, em que faixa salarial se enquadra na lista acima?

     No caso de uma reforma tributária justa e, assumindo que o estado, para cumprir com as demandas pelos serviços públicos, teria que manter sua arrecadação, como seria compensação das reduções na CTB para pessoas de menor renda? Um argumento de que não haveria necessidade de sobrecarregar a classe média é de cobrança de mais impostos dos mais ricos. Será que este argumento é correto? Qual seria a faixa de renda familiar para definir "mais ricos" que garanta uma compensação no orçamento pela redução da CTB para famílias de menor renda?

     Uma compensação na arrecadação poderia vir através da inclusão dos ganhos do sistema financeiro nos indicadores do PIB e de renda. Acredito que tem muita gente ganhando no sistema financeiro que não estão incluídos nas estatísticas e que também não contribuem com impostos. Não tenho a menor idéia do quanto representaria estes setores para a arrecadação do estado.

3) A classe média acha que não utiliza os serviços públicos.

     Outro mantra repetido pelo cidadão de classe média. Mas quando uma família faz sua declaração de renda, ela deduz valores pagos para escola particular e convênios médicos. Portanto, o estado brasileiro está renunciando a uma arrecadação, pois considera que o cidadão mesmo não utilizando a escola pública e o SUS, tem este direito e deve exercê-lo. Um argumento é que esta dedução é ridícula, se comparada com os gastos totais com escola particular, por exemplo. Mas não seria o desconto exercido o custo anual que o estado tem com um aluno na escola pública?

     Uma conta interessante que aquele que tem filho em escola particular poderiam fazer para desmistificar algumas idéias com relação ao orçamento do estado:

a) Você acha que a escola particular que seu filho estuda é de boa qualidade. Se a resposta for sim, siga adiante.

b) Pegue o valor da mensalidade escolar que você paga e desconte o que acha que é lucro do dono da escola. Fica ao seu critério, estabelecer se o dono da escola é um empresário safado ou não.

c) Multiplique o valor obtido em b) por 12 meses. Este é o custo anual de seu filho em uma escola de qualidade.

d) Multiplique o valor obtido em c) por 45.000.000, que é número de alunos matriculados no ensino básico em escolas públicas. O valor obtido é o quanto o estado precisaria gastar por ano para manter uma escola com a qualidade da escola do seu filho.

e) Compare o valor com a arrecadação total no Brasil (todas as esferas, federal, estadual e municipal). Em 2012, foi em torno de 1,6 trilhões.

f) Ficou surpreso com o custo? Multiplique o valor obtido em c) por 17.000.000, que é o número de alunos matriculados no ensino básico em escolas particulares. Este valor deveria ser adicionado ao valor obtido em d) Por quê ? Se o estado oferecer uma educação básica de qualidade, a maioria irá matricular seus filhos em escolas públicas.

Um comentário:

Sugestão de Livros disse...

Muito legal o texto, faz a gente pensar bastante.