quinta-feira, 10 de novembro de 2016

O ano que parece não acabar (Um roteiro para Hillary)

     De fato, parece que o ano de 2016 não acabará nunca.
     A discrição, a educação, a fineza, são características básicas de uma pessoa que ocupa cargo diplomático de qualquer país. José Serra, este que como ministro das relações exteriores parece ter especial apreço pela Suíça (Odebrecht manda lembranças), perpetrador de peripécias múltiplas, em sua rematada imbecilidade conseguiu a proeza de dizer qual deveria ser o candidato que os norte-americanos deveriam eleger.
     As pérolas que Serra soltou são impressionantes: “não acho que vai acontecer (a eleição do Trump)… Não pode acontecer”. Mas isto foi pouco perto de “É preciso ser muito masoquista para ficar imaginando que o Trump vá ganhar”. Em outro momento, classificou sua possível eleição como um “pesadelo”. 
     Esta não é uma opinião irresponsável dita num bar, mas devido ao posto que inexplicavelmente ocupa, representa a opinião do país. Para quem é o chefe do Itamaraty, fina flor do funcionalismo público brasileiro, local onde habitualmente se encontram pessoas do mais alto profissionalismo e distinção, atacar candidato que disputa eleições majoritárias de outro país (e logo qual), é um absurdo, é de uma imbecilidade, de uma ignorância tão extravagantes que só mesmo um completo sem noção como José Serra poderia cometer. Defender a eleição da Hillary já seria inconveniente – mas atacar Trump é, de fato, inconcebível para quem ocupa tal cargo de tal envergadura.
Sem medo do ridículo
      Como se não bastasse se imiscuir nas eleições de outra nação, Serra ainda apoiou a candidata que veio a ser derrotada.
     Mas um dos momentos mais patéticos e inimagináveis do ministro foi o transcrito ao lado pela BBC Brasil. 
     Justamente ele, José Serra, que é membro de um partido que foi derrotado nas últimas eleições presidenciais dizer algo assim é, de fato, não ter medo do ridículo.
     De maneira estapafúrdia e inacreditável, o partido da candidata que venceu as eleições no Brasil, hoje, pasmem, é oposição. Quem perdeu, é governo. Não precisa explicar, eu só queria entender, era um bordão de um humorista brasileiro em anos idos.
     Não bastassem todos os outros argumentos, com apenas esse, provar-se-ia que houve – mais – um golpe no Brasil.

     Na verdade, ao invés de proferir estas tolices, José Serra poderia aproveitar o momento e dizer algumas palavras à candidata que ele apoiou (!), deveria dizer à Hilary (que, no fim das contas, teve mais votos que Trump) como perder uma eleição e ainda assim ganhar um governo. 
     Aqui nós podemos ajudá-lo a sistematizar um pequeno roteiro de quais seriam os conselhos a serem dados por este grande ministro à candidata derrotada nas eleições presidenciais americanas. Nele, Serra poderia descrever o que fizeram os partidos de direita – capitaneados pelo PSDB e seus reboques (DEM, PPS, etc.) – no Brasil para inverter o resultado das eleições:

1) Insuflam um clima de ódio durante anos no país, desde o início do governo Lula – fato que se agrava no governo Dilma. 
2) Ao serem derrotados pela quarta vez seguida, primeiramente dizem que houve fraude nas eleições (mas, pasmem, não nas eleições paulistas).
3) Contratam uma “auditoria independente” para verificar se o resultado foi legal. A auditoria conclui o oposto que o PSDB afirmara, diz que o resultado apontado pelo TSE foi o correto. 
     Ainda assim, não se deve descansar ante o ridículo, interessa jogar um mar de sombras sobre o resultado e manter a “fervura”.
4) Os derrotados pedem então a cassação da chapa vencedora.
5) Não bastasse a política neoliberal de Levy/Barbosa/Tombini, a seca que se arrasta por anos, a crise econômica internacional e a consequente queda no preço dos produtos primários que o Brasil exporta, a crise política ainda contribui para piorar quadro econômico brasileiro. O resumo da estratégia da direita brasileira, adotada diuturnamente foi o “quanto pior, melhor”.
6) Grandes democratas que são, os fascistas brasileiros (vulgo coxinhas) já defendiam o impeachment desde o próprio dia da derrota. Porém, passam a fazê-lo de maneira mais descarada e formal, vitaminando-se com o vasto apoio da mídia conservadora.
     Vê-se pela primeira vez na história desde a 
--> marcha com Deus, pela família e liberdade, protestos que não são criminalizados pela mídia tupiniquim, ao contrário, são insuflados. Como se lutava por privilégios para uma elite e não direito para trabalhadores e estudantes, chegou-se ao cúmulo de parar eventos esportivos para ampliar artificialmente a cobertura das manifestações e vitaminar seu tamanho. Hoje, passado o momento, voltou-se a criminalizar todo protesto orgânico – os estudantes que heroicamente ocupam escolas e universidades, por exemplo, são tratados como marginais.
7) Os golpistas são os maiores cabos eleitorais para a eleição do chefe de quadrilha Eduardo Cunha (¡quanta responsabilidade!) no terceiro posto da sucessão presidencial – na expectativa que ele deflagrasse o impeachment (como de fato veio a fazer).
     Meses depois, Cunha vem a ser acusado de quebra de decoro e, três horas depois de a bancada do PT decidir votar pela admissibilidade do processo de cassação dele na CCJ, ele retalia abrindo o processo de impeachment. 
     Assim é que devem ser feitas as coisas, sem preocupações maiores de disfarçar que um impeachment se inicia por uma vendeta pessoal, capitaneado por um chefe de quadrilha apoiado pelos golpistas.
8) A direita financia grupos “apartidários” de caráter despudoradamente nazifascista e antinacional como MBL, Revoltados On-line e que tais.
9) A direita insufla uma crise política de gravíssimas proporções. Por conta da crise política que eles mesmos geraram, defendem que Dilma renuncie (?).
10) Com algum fôlego conseguido pelo governo (não tenho capacidade de me esquecer da estultice e inabilidade política inacreditáveis de Dilma dizendo que 
--> a reforma da previdência preocupava mais o governo do que o impeachment), os partidecos de direita voltam a atacar pela cassação da chapa. Para tanto utilizam-se do representante-mor do fascismo nos tribunais brasileiros, indivíduo abjeto que ocupa cargo no TSE e no STF – é desnecessário nominá-lo, todos sabem a quem me refiro.
11) Como o impeachment dá uma resfriada no final do ano, a direita volta a defender que Dilma renuncie.
12) Na volta do congresso, decidem reativar o impeachment. Tucanos e afins barganham com Eduardo Cunha sua cabeça pela da Dilma.
13) As bestas-feras da direita, muito preocupadas com os destinos do país, anunciam que não votarão mais nada antes de aprovarem o impeachment. Tendo maioria no congresso, fazem com que o legislativo pare e agravam a crise política.
14) Às exceções a esta paralisação são as “pautas bombas”, aprovadas pelo congresso com o voto decisivo dos conservadores, piorando a crise econômica – que, por si, contribuirá para a queda da Dilma (nunca se esquecendo que ela fez sua parte para agravá-la, nomeando a trupe neoliberal para o BC e a fazenda).
15) Mesmo com a derrota no plebiscito de 1993 (¿quem se importa com resultado de eleições?), os fascistas tupiniquins passam a defender a deposição de Dilma com a subsequente adoção do sistema parlamentarista no país (?). Como tem maioria no congresso, conseguiriam o comando do governo.
     Esta foi só uma das múltiplas hipóteses golpistas aventadas e malogradas – mas uma teria que dar certo.
16) O discurso de ódio prossegue ininterruptamente durante todo o tempo, insuflando a classe média mal-informada (e por conseguinte deformada) e vitaminando seus protestos de brancos.
     Como não poderia deixar de ser, a Rede Globo, histórica defensora da democracia no Brasil (¡rá!), é a maior apoiadora dos protestos. 
     ¿Quem pode se esquecer dos patéticos panelaços contra a corrupção (que, ironicamente, nunca se deram contra o próprio Serra e sua continha na Suíça, FHC ou Eduardo Cunha)?
¿Qual é pior?
     Diga-se de passagem, da mesma maneira que cá, um agressivo e hipócrita discurso contra a corrupção, daqueles que faz a baba escorrer pelo queixo, foi feito contra Hillary (apelidada reiteradamente nesses ataques de Killary).
17) Por fim, a soma de todos estes fatores: um governo fraco, uma governante politicamente inepta e despreparada para posto de tal envergadura, a imprensa marrom uníssona em seu discurso bandido, uma oposição fascista e suicida, um povo mal informado, o partido do governo envolvido em sequenciais e verazes denúncias de corrupção, uma megaoperação da PF com nítidos contornos partidários e abundantes vazamentos (ilegais, sempre é bom lembrar) para esta mesma mídia corrompida, uma crise econômica de graves proporções (com responsabilidades internas e externas), enfim, com todos estes elementos somados, consegue-se derrubar uma pessoa eleita.
     Aliás, consegue-se até, pasmem, em nome do combate a corrupção, substituir uma pessoa honesta por um bando de corruptos.
18) Para a votação da cassação da chapa no TSE, de repente, como que num passe de mágica, aproveitando-se do fascista lá instalado, chapa não é mais chapa. Chapa agora passa a ser uma pessoa só (?). Se houve O exército de um homem só de Moacyr Scliar (posteriormente título de bela música dos Engenheiros do Hawaii), ¿por que não poderia haver a chapa de uma pessoa só?

     Este é um pequeno roteiro para o grande patriota José Serra ensinar a Hillary como perder uma eleição e ainda assim ganhar o governo. 
     Ele ainda poderia finalizar seus conselhos para Hillary da mesma maneira que alguns recadinhos são dados nas redes sociais: #ficaadica.


P.S.: Dilma deveria ter cumprido sua palavra e adotado uma política econômica de esquerda consoante ao que prometera na campanha – e não praticado um dos maiores embustes eleitorais da história, nomeando um neoliberal e legando um desastre econômico ao país. Dilma poderia até ter caído adotando uma política econômica de esquerda, mas teria caído em pé e seria julgada benevolamente pela história da mesma maneira que João Goulart. 
     Outrossim, de maneira similar, já que era para o partido democrata cair, teria sido muito melhor cair em pé com Bernie Sanders.
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