domingo, 27 de agosto de 2017

Pintura fluida - por Garth Williams (site homônimo)


Governo em que 94% dos brasileiros não confiam nem deveria existir - por Janio de Freitas (Folha)

O padrão moral do denunciado Michel Temer, comprovado publicamente no ardil noturno de Joesley Batista e no seu círculo "de confiança", mais do que autoriza, pede que se admita a priori a existência de negociatas embutidas no pacotaço de 57 vendas e concessões de bens públicos, comunicado pelo governo. Não é preciso discutir se privatizar-por-privatizar convém ou não aos habitantes e aos interesses do país. Ao lado da admissão, há outras razões contra a orgia de altos negócios pretendida pela atual Presidência da República.
Apenas umas 72 horas depois, ao aviso do pacotaço privatizante seguiu-se o conhecimento de que só 6% dos brasileiros ainda depositam alguma confiança no governo. Seis brasileiros em cada cem, constatação feita pela Fundação Getúlio Vargas. É humilhante, com sua correspondência a 94% da população, a falta de autoridade deste governo para fazer transações com bens da nação. Mesmo com os mais insignificantes, quanto mais com empresas e utilidades nacionais do porte essencial de uma Eletrobras –a maior empresa de geração de energia da América Latina. Governo em que 94 a cada 100 brasileiros não confiam nem deveria existir: é um dejeto institucional.
Além da autoridade, falta legitimidade ao governo para transformar-se em banqueta de comércio. A afinidade com a camelotagem que, em grande parte, explora o roubo de cargas, é bem perceptível. A legitimidade, no caso, só poderia vir da representatividade concedida. O denunciado Temer não a recebeu. Não chegou a vice-presidente por votação própria, mas a reboque. De uma candidata e dos votos dados a ela e ao programa escolhido pela maioria do eleitorado. Pacote de privatizações compunha o programa repelido com Aécio Neves, mesmo quando este era dado como bom moço. O salvo-conduto que a vice poderia dar, havendo posse como titular, não tem mais validade porque o denunciado Michel Temer adulterou-o. Como à própria Presidência da República, a votações do seu interesse pessoal na Câmara e à probidade exigida do cargo.
Não é supérflua a notícia sobre o primeiro interessado na compra da Eletrobras, tão logo foi divulgado o propósito de vendê-la. É José Abdalla, quarto maior acionista da empresa, maior acionista privado, cuja fortuna ganhou mais R$ 1 bilhão na Bolsa só com o anúncio da privatização, dono de múltiplos negócios –e integrante do círculo de amigos do denunciado Temer. Por aí se vê a dimensão da empresa e do negócio tratados pelo governo como coisa comum, sem estudos amplos e profundos de suas implicações.
O pacotaço tem também um aspecto político e eleitoral. Para o ministro Henrique Meirelles, privatizações no maior número e no menor tempo são um meio de fechar, ou diminuir muito, o rombo nas contas que sua política de arrocho, em vez de reduzir como prometido, aumenta. Com isso, ele daria à sua pretendida candidatura à Presidência o cacife de um alegado êxito sobre o rombo ameaçador.
BRASILEIRINHAS
– São muitos os embarcadouros na Amazônia. A Marinha não tem como fiscalizá-los todos. E o excesso absurdo de lotação dos barcos é a norma e a causa de muitos desastres fatais. Fiscalizar com maior presença e rigor a lotação dos barcos em saída e chegada, nos pontos mais movimentados, já atenuaria bastante os acidentes. Isso a Marinha sabe e pode fazer. E está há muito tempo para fazê-lo.
– Título na Folha (25.ago): "Recurso de Lula foi o que mais rápido chegou à 2ª instância". É uma informação que já contém a explicação, o histórico e o motivo do juiz Sergio Moro.

sexta-feira, 25 de agosto de 2017

Fotografia - por Gratisography

Não haverá 2018 - por Vladimir Safatle (Folha)

Marcelo Cipis / Editoria de Arte / Folhapress
No Brasil, toda a reflexão e ação política parece atualmente ter os olhos única e exclusivamente voltados para o ano de 2018.

Como se o país pudesse voltar a uma normalidade mínima depois de ficar dois anos nas mãos de um ocupante do lugar de presidente da República com perfil mais adaptado a trabalhar em filmes de aprendiz de gângsteres e com aceitação popular zero, de um Congresso Nacional composto de indiciados e oligarcas e de um Poder Judiciário exímio em operar com decisões completamente contraditórias de acordo com os interesses imediatos do juiz que julga.

No entanto há de se trabalhar com uma hipótese de grande plausibilidade, a saber, a de que 2018 não existirá.

A cada dia que passa fica claro que o Brasil está atualmente submetido a uma espécie de guerra civil capitaneada por aqueles que tomaram de assalto o Estado brasileiro contra os setores mais desfavorecidos da população. Sim, uma guerra civil silenciosa, mas tão brutal quanto as guerras abertas. Pois esta é uma guerra de acumulação e espoliação, de vida e de morte.

De um lado, um sistema financeiro com lucros inacreditáveis para um país que se diz em crise, sistema este com amplo controle das políticas do Estado. Junto a ele, a elite rentista do país com seus ganhos intocados, sua capacidade de proteger seus rendimentos de qualquer forma de tributação.

Na linha de frente, representando seus interesses, uma casta de políticos degradados que criam leis e usam deliberadamente o dinheiro público para se blindar, que mudam regras eleitorais para continuarem onde estão e defenderem os verdadeiros donos do poder.

Do outro, temos a massa da população empobrecida e agora submetida a um sistema de trabalho que retira o mínimo de garantias de segurança construídas nesse país, que faz aposentadoria se transformar em uma relíquia a nunca mais ser vista. Uma massa que sentirá rapidamente que ela tem apenas duas escolhas: ou a morte econômica ou a submissão ao patronato.

Junto a elas, a população que se vê humilhada da forma mais brutal por prefeitos que marcam crianças na escola para que elas não comam duas refeições, que violentam moradores de rua com jatos de água nos dias frios para que eles sumam, governadores que destroem a céu aberto universidades que não podem mais começar seu ano letivo por falta de verbas.

Toda essa população submetida a uma força policial que atira em manifestantes, invade reuniões públicas sem que nenhuma punição ocorra.

Seria suprema ingenuidade acreditar que esses que agora nos governam, esses senhores de uma guerra civil não declarada, esses mesmos que têm consciência absoluta de que nunca ganhariam uma eleição majoritária no Brasil para impor suas políticas aceitem ir embora de bom grado em 2018.

Quem deu um golpe parlamentar tão tosco e primário quanto o brasileiro (lembra-se das “pedaladas fiscais”? Quem mais foi punido neste país? Só o antigo governo federal dela se serviu?) não conta em sair do poder em 2018.

Só que há várias formas de 2018 não existir. A primeira delas é assistirmos uma eleição “bielorrussa”. Trata-se de uma eleição na qual você impede de concorrer todos aqueles que têm chance de ganhar, mas que não fazem imediatamente parte do núcleo hegemônico do poder atual. Caso essa saída não dê certo, teremos uma mudança mais radical da estrutura do poder, ou seja, uma eliminação da eleição presidencial como espaço possível de mudança.

Então aparecerá a velha carta do parlamentarismo: o sonho de consumo das oligarquias locais que veriam enfim seu acesso direto ao poder central. Pois não confundam o parlamento brasileiro com o sueco. Entre nós, o Congresso sempre foi a caixa de ressonância de interesses oligárquicos com seus casuísmos eleitorais.

Por fim, se nenhuma das duas opções vingar, não há de se descartar uma guinada mais explicitamente autoritária. Não, esta hipótese não pode ser descartada por nenhum analista minimamente honesto da realidade nacional.

Neste sentido, pautar todo debate político atual a partir do que fazer em 2018 é simplesmente uma armadilha para nos prender em uma batalha que não ocorrerá, para nos obrigar a naturalizar mais uma vez uma forma de fazer política, com seus “banhos de Realpolitik”, razão mesma do fracasso da Nova República e dos consórcios de poder que a geriram.

Melhor seria se estivéssemos envolvidos em uma luta clara pela recusa dos modelos de “governabilidade” que nos destruíram.

quarta-feira, 23 de agosto de 2017

Fotografia - por Nik MacMillan (Unplash)


A aberração da venda da Eletrobrás - por Luis Nassif (Jornal GGN)


O anúncio de venda da Eletrobrás para fazer caixa é uma das iniciativas mais aberrantes do governo Temer. A ideia da “democratização do capital” e a comparação com a Vale e a Embraer é esdrúxula. Ambas estão na economia competitiva enquanto a Eletrobrás é uma concessionária de serviços públicos, estratégica para o país.
A avaliação de R$ 20 bilhões equivale a menos da metade de uma usina como Belo Monte. A Eletrobrás tem 47 usinas hidroelétricas, 114 térmicas e 69 eólicas, com capacidade de 47.000 MW, o que a faz provavelmente a maior geradora de energia elétrica do planeta. É uma empresa tão estratégica quanto a Petrobras.
A Eletrobrás está sendo construída desde 1953 e exigiu investimentos calculados em R$ 400 bilhões do povo brasileiro. Além da capacidade geradora, que equivale a meia Itaipu, a Eletrobrás controla linhas de transmissão, seis distribuidoras e a Eletronuclear, empresa estratégica que detém as únicas usinas nucleares brasileiras.
         O modelo elétrico brasileiro é uma obra de engenharia fantástica, resultado do pensamento estratégico de especialistas como Octávio Marcondes Ferraz, Mário Thibau, Mário Bhering, um conjunto de técnicos da Cemig – que também corre risco idêntico.
No governo Fernando Henrique Cardoso, o desmonte irresponsável desse modelo promoveu um encarecimento brutal das tarifas, que acabou tirando a competitividade brasileira em vários setores eletro intensivos. Lá, como ágora, moviam-se exclusivamente por visão ideológica, sem um pingo de preocupação com a lógica de um sistema integrado.
O comprador com toda probabilidade será um grupo chinês que por 20 bilhões de reais assumirá o provavelmente maior parque de geração hidroelétrica do planeta. É realmente inacreditável o nível de improvisação, cegueira estratégica, leviandade suspeita atrás desse tipo de decisão de quebra-galho financeiro.
Nos EUA, o parque hidroelétrico, que corresponde a 15% da matriz energética, é estatal federal, porque lá se acredita que energia elétrica, que envolve recursos hídricos são de interesse nacional e não podem ser privados. Lá há muito cuidado com água, rios e represas e nunca se pensou em privatizar.
A ideia de privatizar estava óbvia quando a rainha das privatizações da Era FHC, Elena Landau foi colocada como presidente do Conselho da empresa. Há um mês pediu demissão para não ficar evidente demais sua presença com o anúncio da privatização, ligando a lembranças de sua atuação no governo tucano.

     Para completar o pesadelo, o Ministro de Minas e Energia é um rapaz de 33 anos, formado em administração de empresas pela FAAP, sem qualquer especialização na área e representando o histórico PARTIDO SOCIALISTA BRASILEIRO, de ilustres nomes como João Mangabeira, que deve estar se revirando na tumba com tal iniciativa por um "socialista" pernambucano.

Comentário
Só um governo neoliberal seria capaz de propor a venda por 20 bilhões de uma empresa que ano passado faturou 61 bilhões de reais.
O escárnio é inacreditável.
Uma lástima.