Marcelo Cipis / Editoria de Arte / Folhapress |
No Brasil, toda a reflexão e ação política parece
atualmente ter os olhos única e exclusivamente voltados para o ano de 2018.
Como se o país pudesse voltar a uma normalidade
mínima depois de ficar dois anos nas mãos de um ocupante do lugar de presidente
da República com perfil mais adaptado a trabalhar em filmes de aprendiz de
gângsteres e com aceitação popular zero, de um Congresso Nacional composto de
indiciados e oligarcas e de um Poder Judiciário exímio em operar com decisões
completamente contraditórias de acordo com os interesses imediatos do juiz que
julga.
No entanto há de se trabalhar com uma hipótese de
grande plausibilidade, a saber, a de que 2018 não existirá.
A cada dia que passa fica claro que o Brasil está
atualmente submetido a uma espécie de guerra civil capitaneada por aqueles que
tomaram de assalto o Estado brasileiro contra os setores mais desfavorecidos da
população. Sim, uma guerra civil silenciosa, mas tão brutal quanto as guerras
abertas. Pois esta é uma guerra de acumulação e espoliação, de vida e de morte.
De um lado, um sistema financeiro com lucros
inacreditáveis para um país que se diz em crise, sistema este com amplo
controle das políticas do Estado. Junto a ele, a elite rentista do país com
seus ganhos intocados, sua capacidade de proteger seus rendimentos de qualquer
forma de tributação.
Na linha de frente, representando seus interesses,
uma casta de políticos degradados que criam leis e usam deliberadamente o
dinheiro público para se blindar, que mudam regras eleitorais para continuarem
onde estão e defenderem os verdadeiros donos do poder.
Do outro, temos a massa da população empobrecida e
agora submetida a um sistema de trabalho que retira o mínimo de garantias de
segurança construídas nesse país, que faz aposentadoria se transformar em uma
relíquia a nunca mais ser vista. Uma massa que sentirá rapidamente que ela tem
apenas duas escolhas: ou a morte econômica ou a submissão ao patronato.
Junto a elas, a população que se vê humilhada da
forma mais brutal por prefeitos que marcam crianças na escola para que elas não
comam duas refeições, que violentam moradores de rua com jatos de água nos dias
frios para que eles sumam, governadores que destroem a céu aberto universidades
que não podem mais começar seu ano letivo por falta de verbas.
Toda essa população submetida a uma força policial
que atira em manifestantes, invade reuniões públicas sem que nenhuma punição
ocorra.
Seria suprema ingenuidade acreditar que esses que
agora nos governam, esses senhores de uma guerra civil não declarada, esses
mesmos que têm consciência absoluta de que nunca ganhariam uma eleição
majoritária no Brasil para impor suas políticas aceitem ir embora de bom grado em
2018.
Quem deu um golpe parlamentar tão tosco e primário
quanto o brasileiro (lembra-se das “pedaladas fiscais”? Quem mais foi punido
neste país? Só o antigo governo federal dela se serviu?) não conta em sair do
poder em 2018.
Só que há várias formas de 2018 não existir. A
primeira delas é assistirmos uma eleição “bielorrussa”. Trata-se de uma eleição
na qual você impede de concorrer todos aqueles que têm chance de ganhar, mas
que não fazem imediatamente parte do núcleo hegemônico do poder atual. Caso essa
saída não dê certo, teremos uma mudança mais radical da estrutura do poder, ou
seja, uma eliminação da eleição presidencial como espaço possível de mudança.
Então aparecerá a velha carta do parlamentarismo: o
sonho de consumo das oligarquias locais que veriam enfim seu acesso direto ao
poder central. Pois não confundam o parlamento brasileiro com o sueco. Entre
nós, o Congresso sempre foi a caixa de ressonância de interesses oligárquicos
com seus casuísmos eleitorais.
Por fim, se nenhuma das duas opções vingar, não há
de se descartar uma guinada mais explicitamente autoritária. Não, esta hipótese
não pode ser descartada por nenhum analista minimamente honesto da realidade
nacional.
Neste sentido, pautar todo debate político atual a
partir do que fazer em 2018 é simplesmente uma armadilha para nos prender em
uma batalha que não ocorrerá, para nos obrigar a naturalizar mais uma vez uma
forma de fazer política, com seus “banhos de Realpolitik”, razão mesma do
fracasso da Nova República e dos consórcios de poder que a geriram.
Melhor seria se estivéssemos envolvidos em uma luta
clara pela recusa dos modelos de “governabilidade” que nos destruíram.
Nenhum comentário:
Postar um comentário