quarta-feira, 22 de maio de 2013

A falta de ética do editorial do Estadão - por Jorge Furtado (Blog do Nassif)

"Quando vocês não acreditarem em mais ninguém, no Lula, no Haddad, na Dilma, em ninguém, nem no Paulo Maluf... ainda assim, pelo amor de Deus, não desistam da política", afirmou o ex-presidente à plateia presente no Centro Cultural São Paulo, na capital paulista. "O político ideal que vocês desejam, aquele cara sabido, aquele cara probo, irretocável do ponto de vista do comportamento ético e moral, aquele político que a imprensa vende que existe, mas que não existe, quem sabe esteja dentro de vocês".
Luis Inácio (Lula) da Silva, São Paulo, 13 de maio de 2013.

http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,nao-existe-politico-irretocavel-diz-lula,1031462,0.htm

Editorial do jornal O Estado de São Paulo, 18 de maio de 2013.

No lançamento de um livro hagiográfico dos 10 anos de governo petista, Lula garantiu que não existe político "irretocável do ponto de vista do comportamento moral e ético". "Não existe", reiterou. Vale como confissão. Lula está errado. O que ele afirma serve mesmo é para comprovar os seus próprios defeitos.

*

Meu comentário:

Lula está certo, a fala é muito boa, um convite a valorização da política, uma sábia convocação cívica, que inclui uma autocrítica realista e bem-humorada e um alerta contra os falsos moralistas, os mesmos que apoiaram ditaduras e acobertaram ou se omitiram sobre os conhecidos malfeitos de seus amigos e sócios no poder.

(Alguém aí já esqueceu de Demóstenes Torres, o despachante de bicheiro que a imprensa vendia como um dos mosqueteiros da ética no Congresso? E o grampo sem áudio usado para demitir Lacerda e salvar a turma do Dantas, já encontraram a fita? E a ficha da Dilma, cadê? E a faxineira que roubou a foto do dinheiro dos aloprados, por onde anda?)

A falta de ética e a precariedade dos argumentos do editorialista do Estadão é tamanha que esmiuçá-la inteiramente demanda tempo e disposição que não tenho. A falta de ética do Estadão, que torce a ótima frase de Lula e a transforma num clichê mastigável aos leitores do jornal, é o padrão da antiga imprensa brasileira desde que a elite que representa foi apartada do poder em Brasília, em 2002.

A partir da falcatrua inicial que justifica manchetes, o editorialista  -  e é compreensível que o autor prefira manter-se anônimo – enfileira as palavras de ordem do partido da imprensa (aquele quase sempre a serviço da direita rentista, o pessoal que gosta, por que vive, de juros) e termina seu arrazoado com o que imaginou ser uma grande sacada:

"Essa obsessão no ataque à imprensa (...) só não explica como, tendo a conspirar contra si todo o aparato de comunicação do País, o lulopetismo logrou vencer três eleições presidenciais consecutivas."

O que o texto do Estadão tenta dizer é que se fosse verdade que Lula e o PT tem mesmo “a conspirar contra si todo o aparato de comunicação do País” (coisa que só ele, o próprio editorialista, afirma), seria impossível que tivessem vencido “três eleições presidenciais consecutivas”.

A barbeiragem do raciocínio (obsessões pessoais ou partidárias só explicariam resultados eleitorais a quem acredita que o eleitor é idiota e a democracia, portanto, inviável) explicita a visão generosa que o editorialista tem de si mesmo e a crença no grande poder dos seus patrões, mas a dúvida latente é esclarecida pelo próprio texto, pela outra boa fala de Lula (que o editorialista imagina contestar simplesmente ao classificar de “pérola” e “antológica”) :

Lula: "Acho que determinados setores da comunicação estão exilados dentro do Brasil. Eles não estão compreendendo o que está acontecendo".

A frase não tem nada de pérola ou antológica, é uma constatação pura e simples do óbvio, o editorialista apenas vestiu o capuz .

O PT “logrou vencer três eleições presidenciais consecutivas”  e, tudo indica, deverá vencer a quarta, entre outros motivos (distribuição de renda, empregos,  inclusão social, etc.) simplesmente porque a eleição, base da democracia, é uma escolha e a oposição não tem nenhuma proposta para apresentar ao país, e por isso não o fez, nestes 10 anos em que esteve (pela primeira vez) afastada do poder central.

Sabendo de tudo isso – da falta de ética que distorce declarações, dos interesses escusos e da absoluta falta de ideias da oposição para o futuro do país – a imensa maioria da população brasileira, coberta de razão, não dá a mínima importância ao que pensam ou escrevem os editorialistas anônimos.


Comentário
A fala do presidente Lula "Acho que determinados setores da comunicação estão exilados dentro do Brasil. Eles não estão compreendendo o que está acontecendoé exímia, irretocável.
Outro ponto, a fala do Estadão: "Essa obsessão no ataque à imprensa (...) só não explica como, tendo a conspirar contra si todo o aparato de comunicação do País, o lulopetismo logrou vencer três eleições presidenciais consecutivas", é uma frase terrível, de fazer corar qualquer pessoa que tenha o mínimo de apreço pela democracia. 
Quer dizer então que, de acordo com o jornal, caso os veículos jornalísticos tivessem o interesse de eleger alguém, seria este um fato consumado? Não deveria ser o povo, os eleitores a decidirem os destinos da nação via voto - e não os donos dos veículos de comunicação? É isso que o jornal pensa, que se eles quiserem, eles elegem quem bem entenderem?
É um absurdo, uma frase dessas só não tem uma repercussão extremamente negativa porque os outros (poucos e enormes) veículos de comunicação estão todos do mesmo lado (direito), com os mesmos interesses escusos, com as mesmas mesquinharias e canalhices, além do fato de serem todos eles antidemocráticos, só tolerando a democracia quando nesta o povo logra votar em quem os interessa. 
Tivessem o mínimo de base social para tanto, já teriam dado um golpe, é inegável. Como os militares estão quietos, passaram a apelar para o Ministério Público e para o judiciário.

Diz-se que normalmente se avalia o mundo a partir de si mesmo. É fato inegável no que tange ao Estadão e a outros veículos da imprensa marrom brasileira: anti-democráticos, golpistas e corruptos, acusam continuamente os outros de possuírem os defeitos que neles já deixaram de ser uma característica: passou a ser o seu próprio âmago. 

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