No dia do protesto em que Vieira foi preso, prevaleceu a imagem da festa na Candelária |
Os protestos tinham se multiplicado pelo país na semana da prisão de Vieira. Depois de uma noite de dura repressão em São Paulo, na quinta-feira anterior, as manifestações se massificaram e ganharam o apoio até da grande imprensa, que antes pedia "ação contundente" contra quem "atrapalhava o trânsito" nas cidades. Era uma “grande festa” pelo país, onde, na percepção da imprensa, a polícia não cometia mais abusos e mais de um milhão de pessoas foram às ruas em todo o país. No Rio, quatro foram presos naquela noite por furto qualificado e soltos posteriormente. Negro, morador de rua e catador de latinhas, Vieira não teve a mesma sorte. Com 26 anos de idade, ele já havia sido preso duas vezes por roubo, em 2006 e 2008, e cumpriu as penas completas.
Vieira disse, em seu depoimento, que vivia há um mês na loja abandonada em frente à Delegacia da Criança e Adolescente Vítima (DCAV). Ele argumenta que retirou os dois frascos pois eles estavam no espaço onde dormia. O laudo do esquadrão antibomba da Polícia Civil atestou que Vieira carregava produtos de limpeza. “[As substâncias têm] ínfima possibilidade de funcionar como coquetel molotov,” dizia o laudo feito pouco mais de um mês após a detenção. Mesmo assim, o Ministério Público seguiu entendimento de que se tratava de “material incendiário” e o enquadrou no inciso III do artigo 16 do estatuto do desarmamento, que proíbe carregar ou usar “artefato explosivo ou incendiário, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar.”
A culpa dele surge “de maneira cristalina” segundo o Ministério Público. “Não haveria motivo para o denunciado retirar do interior da loja abandonada duas garrafas intactas de material incendiário, levando-as para o meio da multidão que realizava protesto contra o governo. Conhecendo-se a violência que campeou nos recentes protestos realizados na cidade do Rio de Janeiro, é evidente que o réu pretendia fazer uso nocivo dos frascos incendiários.”
Segundo a defesa, não havia panos na boca das garrafas (como de costume nas bombas incendiárias), ao contrário do escrito no laudo, e os recipientes de plástico jamais serviriam como molotov, já que não se estilhaçam ao quebrar no chão (argumento que também consta no laudo). O juiz Guilherme Schilling Pollo Duarte acatou a sugestão do Ministério Público, no dia 28 de setembro, e manteve a prisão cautelar. Com a sua liberdade cerceada, Vieira segue sem previsão de julgamento.
Na defesa de Rafael, a Defensoria Pública do Rio de Janeiro resumia a situação: “andar com produtos de limpeza nunca foi e nunca será crime, sob pena de inviabilizar a vida moderna. Se esta linha prosperar, podemos dizer que portar canetas é crime de perigo, pois uma pode levar a morte se inserida em determinada parte do corpo humano. Impossível.”
Comentário
Onde estará o famoso STF, aquele em que os juízes se “indignam” quando um magnata é preso algemado?
Este juiz, é bom repetir o nome dele, Guilherme Schilling Pollo Duarte, é um resumo do judiciário brasileiro: conservador, deplorável, temeroso de tudo o que cheira a povo e a Brasil. Finge proteger o país - e é exatamente o contrário -, é uma das principais causas de ainda estarmos em estado tão deplorável.
Uma lástima.
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