Há dois projetos de Brasil em disputa, diz Samuel Pinheiro Guimarães |
1. Há uma luta ideológica, política e
econômica entre dois projetos para o Brasil, como Nação, como Sociedade, como
Estado.
2. Estes dois projetos decorrem de visões
distintas da sociedade brasileira, de suas características, de seu potencial,
de seu lugar no mundo.
3. O primeiro projeto para o
Brasil encontra-se articulado, e em acelerada execução, no programa
econômico e político de Michel Temer e Henrique Meirelles, o qual decorre de
uma visão do Brasil que pode ser assim resumida:
· o principal desafio da economia e da
sociedade brasileira seria a inflação;
· a economia brasileira não poderia
crescer a taxas superiores a 3 % ao ano, sob risco de gerar inflação, a qual
poderia se tornar incontrolável ;
· a principal causa da inflação seria o
desequilíbrio fiscal, o desequilíbrio entre receitas e despesas do Estado;
· somente a iniciativa privada,
brasileira, mas em especial a estrangeira, seria capaz de enfrentar e resolver
todos os desafios da economia, e como consequência, da sociedade e do sistema
político brasileiro;
· o Estado constituiria o maior obstáculo
ao funcionamento de uma economia capitalista eficiente;
· a intervenção do Estado como empresário
e regulamentador da atividade econômica afastaria e inibiria os investidores
privados nacionais e estrangeiros;
· a redução da dimensão e da competência
do Estado, assim como de sua capacidade de intervir na economia como
regulamentador e empresário, seriam objetivos indispensáveis para liberar
as energias e a vontade de investir da iniciativa privada;
· o capital estrangeiro deveria ser o
motor do desenvolvimento da economia capitalista no Brasil;
· os custos do trabalho (salários,
direitos etc.) seriam muito elevados no Brasil;
· os impostos no Brasil, que constituem
em seu conjunto a chamada carga tributária, seriam elevados e complexos;
· o Brasil, pelas suas características e
recursos, deveria ser um país produtor/exportador de matérias primas agrícolas
e minerais e importador de produtos industrializados;
· a atividade industrial no Brasil
deveria estar limitada ao processamento de matérias primas e à produção de bens
industriais de tecnologia simples;
· a economia brasileira seria “fechada”,
o que prejudicaria a inserção do Brasil na economia internacional globalizada;
· o Brasil, devido a sua história, a seus
valores e a seus interesses econômicos, deveria ter como aliados naturais, na
política e na economia mundial, os Estados Unidos e os países europeus — o
chamado Ocidente;
· os países latino americanos, africanos
e asiáticos não teriam maior contribuição a dar ao Brasil;
· a política exterior brasileira deveria
ser discreta, aceitar nossa pequena importância e Poder, e se ater a sua
região, em aliança (informal) com os objetivos dos Estados Unidos.
* * *
4. Esta visão do
Brasil, que é compartilhada, com entusiasmo, pelo chamado “mercado” — na
realidade, constituído por uma ínfima minoria de proprietários e executivos de
grandes empresas, basicamente multinacionais, e de megabancos e de acadêmicos
de escola neoliberal — tem amplo apoio dos proprietários da grande mídia
ortodoxa, que procuram apresentar esta visão como a única correta e as
políticas dela decorrentes como a única solução para o Brasil evitar a
catástrofe final.
5. Seria possível
afirmar que o “Mercado” é integrado pelos 71 mil brasileiros que declararam à
Receita Federal terem rendimentos superiores a 160 salários mínimos, cerca de
160 mil reais por mês, e que são os indivíduos que determinam de fato os
movimentos das Bolsas, as grandes operações com divisas e as decisões de
realizar ou não investimentos especulativos ou produtivos.
6. A síntese das
politicas adotadas pelos formuladores e executores deste projeto para o Brasil,
que é impulsionado por Michel Temer e Henrique Meirelles, é a seguinte:
(a) congelamento dos
gastos e investimentos públicos, em nível constitucional, durante vinte anos;
(b) nenhum controle
sobre as despesas do Estado com os juros da dívida pública que correspondem a
um valor entre 40 e 50% do orçamento federal;
(c)
desregulamentação, privatização e desnacionalização dos sistemas públicos:
·
de
educação;
·
de
saúde ;
·
de
previdência e assistência social.
(d) desregulamentação
total do mercado de trabalho:
·
prevalência
do negociado sobre o legislado;
·
terceirização
em todos os setores de atividade das empresas;
·
trabalho
temporário;
·
fim
do imposto sindical;
·
fragilização
dos sindicatos;
·
revisão
da fórmula de atualização do salário mínimo;
·
enfraquecimento
da Justiça do Trabalho e sua eventual desaparição.
(e) abertura total de
todos os setores da economia para facilitar a aquisição de empresas brasileiras
e a realização de investimentos pelas megaempresas de capital estrangeiro;
(f) desregulamentação
de todos os setores da economia e redução da fiscalização do Estado sobre as
atividades das empresas;
(g) privatização
(desnacionalização) de todas as empresas do Estado, em especial da:
·
Petrobras
·
Eletrobras
·
BNDES
·
Caixa
Econômica
·
Banco
do Brasil
·
Casa
da Moeda
·
Eletronuclear
(h) entrega, em
condições excepcionais, a megaempresas multinacionais petrolíferas das enormes
reservas do pré-sal.
* * *
7. Essas políticas
reduziriam ao mínimo as dimensões e a competência do Estado como investidor;
como promotor do desenvolvimento; como regulador e fiscalizador da atividade
econômica.
8. Essas políticas,
de uma forma ou de outra, implementam o que os Estados Unidos e as potências
capitalistas e industriais ocidentais vêm demandando do Brasil há varias
décadas. De certa forma, estão todas previstas no Consenso de Washington,
documento redigido por representantes do FMI, do Banco Mundial, do Departamento
do Tesouro americano e acadêmicos, em 1989.
9. Essas políticas
vêm sendo executadas por um governo com escassíssima popularidade e
elevadíssima rejeição, com o auxílio de um Congresso que se caracteriza por ter
grande número de seus membros comprometidos por denúncias de corrupção e por
ter uma larga maioria de representantes de setores empresariais, eleitos por
contribuições financeiras de grandes empresas. A legislação, caracterizada por
ser um retrocesso histórico, é aprovada de forma apressada e com pequeno debate
público, apesar de sua enorme importância.
10. A determinação em
fazer aprovar essas políticas pelo Congresso e a necessidade de rejeitar as
denúncias de corrupção apresentadas pela Procuradoria Geral da República
fizeram com que o governo de Michel Temer “adquirisse” os votos das bancadas de
parlamentares que representam os interesses mais conservadores, tais como a
bancada da bala, as bancadas religiosas, a bancada ruralista etc.
11. Os compromissos
do governo com essas bancadas conservadoras levaram à adoção de leis, decretos
e medidas administrativas que representam grave retrocesso nas áreas de
direitos humanos tanto políticos, como econômicos e sociais, que se encontram
protegidos pela Constituição em seus artigos 5º e 6º e por tratados
internacionais subscritos pelo Brasil.
12. Paralelamente,
verifica-se uma politização do Poder Judiciário, da Polícia, do Ministério
Público e do Tribunal de Contas da União, que se comprova pelo seu afã
persecutório contra o PT, contra seu líder o Presidente Lula e contra os
direitos dos trabalhadores, e por sua leniência e “ignorância” em relação a
delitos cometidos por partidos e políticos conservadores.
13. Essa politização
do Judiciário em todos os seus níveis, desde as Varas de Primeira Instância ao
Supremo Tribunal Federal (STF), dos procuradores individuais até a Procuradoria
Geral da República (PGR) e da Polícia Federal leva a práticas e decisões que
agridem os princípios fundamentais do Direito e violam os direitos dos
cidadãos:
· a tortura física ou psicológica (longas
prisões, sem culpa formada) para extrair confissões e delações;
· a desmoralização pública de acusados
pela Polícia (condução coercitiva, uso de algemas, ostentação de força);
· a intimidação, através da imposição de
penas absurdas, àqueles que são acusados por delatores;
· o vazamento seletivo de trechos de
delações;
· a “convicção de culpa” dos juízes como
único fundamento para condenar acusados;
· a não observância do princípio de
presunção de inocência do início das investigações até o trâmite da sentença
final em julgado;
· a transferência para o acusado do ônus
da prova;
· não obediência ao principio de não
retroatividade da Lei;
· a aplicação incorreta da teoria do
“domínio do fato”;
· a criação de tribunais e juízes de
exceção;
· a violação da privacidade da família
dos acusados;
· a extensão da pena, na prática, à
família do acusado;
· a excitação da opinião pública contra
indivíduos denunciados.
* * *
14.
O governo Temer, com o auxílio, “remunerado”, de sua maioria no Congresso, e de
integrantes do Poder Judiciário, desde a primeira instância até o Supremo
Tribunal Federal, vem procurando tornar permanentes as políticas econômicas que
implementa através de reformas que consolidem, no sistema político/judiciário,
o poder das classes hegemônicas tradicionais, tais como:
· a adoção do parlamentarismo (semi-presidencialismo
etc.);
·
o
financiamento privado, em especial empresarial, de campanhas;
·
o voto
distrital, em suas diversas formas;
·
a adoção do
voto voluntário;
·
a redução do
tempo de campanha política;
·
o fim da
reeleição.
15. A atitude, leniente e conivente, do
governo Temer diante das violações de direitos humanos no campo e nas cidades
contra os indivíduos mais pobres e vulneráveis, o silêncio diante das
manifestações de racismo e das ações violentas de grupos de direita, em público
e na Internet, leva a uma divisão ainda mais profunda da sociedade, com o
aguçamento dos preconceitos raciais, de gênero, de orientação sexual, e ao
antagonismo em relação à política e às instituições, criando uma situação
propícia ao desenvolvimento de movimentos fascistas e conducente a regimes
autoritários e à ditadura.
*
* *
16. O segundo projeto para o Brasil parte da
seguinte visão da realidade:
· a primeira e principal característica do Brasil é
seu extraordinário potencial que é definido por ter o Brasil o quinto mais
extenso território do mundo e, portanto, ampla gama de recursos minerais; por
ter a quinta maior população do mundo, 207 milhões de habitantes e, portanto,
amplo mercado interno potencial; e por ter um dos maiores parques industriais
do mundo;
·
a segunda
característica do Brasil é o subdesenvolvimento de sua força de trabalho, de
seu capital e de seus recursos naturais;
·
a terceira
característica do Brasil são as extraordinárias disparidades de riqueza; de
renda; regionais; de gênero; de origem étnica; culturais; e políticas;
·
a quarta
característica é a sua extrema vulnerabilidade externa, de natureza econômica,
tecnológica, ideológica, militar e política;
·
a quinta
característica é a fragilidade do Estado.
17. Para enfrentar os múltiplos desafios
que aquelas cinco características colocam é necessária uma estratégia de
desenvolvimento que conjugue a ação da iniciativa privada nacional, do capital
estrangeiro e do Estado.
18. Os investidores privados e as
empresas tendem a se concentrar, por definição, nas atividades em que há maior
perspectiva de lucro, menor risco e menor concorrência interna e externa e,
portanto, não são capazes, sozinhos, de enfrentar com êxito os desafios que as
características da sociedade brasileira colocam.
19. Os investimentos de longo prazo, em
especial em infraestrutura e de menor rendimento são inibidos, pois o Estado,
que tem competência constitucional por sua prestação, não tem capacidade para
realizá-los, delegando-os à iniciativa privada que só os assume quando consegue
obter, em contrato, condições excepcionais de remuneração, enquanto que as empresas
muitas vezes descumprem, mais tarde, os compromissos que tinham assumidos.
20. Para tais investimentos não há
financiamento suficiente do sistema bancário privado, a juros e prazos
adequados, o que cria uma dependência do BNDES, da CEF e do Banco do Brasil e a
necessidade de sua existência.
21. O Estado, sozinho, igualmente não é
capaz de enfrentar de forma eficiente esses desafios e tem de se fortalecer
financeira e tecnicamente para enfrentar a parte que lhe cabe desses desafios.
22. O capital estrangeiro, também
sozinho, não seria capaz de enfrentar esses desafios, múltiplos, complexos e
inter-relacionados, até por não ter uma visão global e nacional do Brasil e nem
competência legal para tal tarefa.
* * *
23. A segunda característica do Brasil é o
subdesenvolvimento, que pode ser definido como a utilização,
com menor eficiência e plenitude, de seus fatores de produção, isto é, de sua
força de trabalho, de seu capital e de seus recursos naturais.
24. A população brasileira é de 207
milhões de indivíduos e a população adulta corresponde ao número de eleitores,
que é de cerca de 140 milhões.
25. Os brasileiros adultos que
declararam rendimentos à Receita Federal em 2015 foram 27 milhões, que são
aqueles que percebiam rendimentos mensais superiores a 2.200 reais por mês ou
tinham algum imóvel.
26. Assim, cerca de 110 milhões de
brasileiros estariam fora do mercado devido a seu nível salarial mensal
insuficiente (inferior a 2.200 reais mensais) para adquirir muitos dos bens que
seriam produzidos pela iniciativa privada, tais como saúde (remédios,
cirurgias, internações, etc.) educação de qualidade adequada em todos os
níveis, transporte privado, moradia a preço de mercado, seguro de previdência
privada etc.
27. A organização e desenvolvimento da força de trabalho,
essencial para que a maioria dos brasileiros possam se tornar mais produtivos e
melhores cidadãos do ponto de vista cultural e político e, portanto, para
ampliar o mercado para a iniciativa privada, exigem políticas no campo da
educação, da saúde, da segurança pública, do saneamento, do transporte e
políticas públicas de salários, previdência pública e assistência. Essas
políticas são numerosas e complexas e serão mencionadas em princípio aquelas
que poderiam ser consideradas essenciais e prioritárias em cada área.
a. na Educação:
· ensino público, laico e gratuito para todos que
assim desejarem;
·
implantação de
horário integral em todas as escolas, do ensino fundamental e médio, públicas e
privadas;
·
a organização
da carreira de professor com salários dignos e atraentes.
b.
na Saúde:
· uma política de prioridade à saúde preventiva e não
à curativa;
·
a coleta
regular de lixo, o abastecimento de água tratada e a coleta de esgoto em todas
as comunidades;
·
o acesso
gratuito de toda a população à assistência médica.
c.
no Transporte:
· gratuidade do transporte público de massa.
d. na Moradia:
· crédito público acessível para a aquisição de casa
própria, digna e saudável.
e. a organização pelo poder público do
mercado de trabalho:
· a formalização da situação dos trabalhadores, com
fiscalização rigorosa da obrigação de carteira de trabalho;
· política de valorização do salário mínimo;
· aperfeiçoamento da Previdência Pública.
28. A organização e o desenvolvimento do capital em
suas três naturezas, financeira, física e empresarial, é indispensável para o
desenvolvimento e a geração de empregos capaz de absorver a força de trabalho
que chega todo ano ao mercado e os estoques de mão de obra subempregada e de
baixa capacitação.
29.
Quanto ao capital financeiro:
· manutenção de baixas taxas de juros e redução do
spread bancário;
·
desprivatização
do Banco Central;
·
desprivatização
das agências reguladoras;
·
controle
rigoroso de evasão de impostos;
·
controle da
evasão de divisas para o exterior;
·
fortalecimento
das instituições financeiras públicas.
30. Quanto ao capital em sua natureza
física:
· estimular a indústria de bens de capital instalada
no país;
·
organizar
programas de compras governamentais da produção brasileira;
·
estimular a
nacionalização da indústria instalada no Brasil por políticas de conteúdo
nacional, conjugadas a compras governamentais.
31. Quanto ao capital em sua natureza
empresarial:
· financiamento preferencial às empresas de capital
nacional;
·
participação
dos empresários produtivos, industriais, agrícolas e de serviços, nos conselhos
de administração das instituições financeiras públicas.
32. A organização e o desenvolvimento da exploração dos recursos naturais do
território brasileiro é o terceiro desafio do subdesenvolvimento. As medidas
prioritárias seriam:
a. no caso do solo:
· a reforma agrária, com desapropriações com base no
valor do imposto territorial declarado pelos proprietários;
·
o controle
severo do desmatamento, pela tributação;
·
o zoneamento
econômico do uso do solo;
·
o controle do
uso da água.
b. no caso do subsolo:
· o estimulo à formação de geólogos;
·
o mapeamento
geológico de todo o território;
·
a limitação da
propriedade do solo por empresas e por indivíduos estrangeiros;
·
controle da
exploração do subsolo.
* * *
33. A terceira característica da sociedade e
da economia brasileiras são as disparidades de toda ordem
que entravam o desenvolvimento econômico, político e social brasileiro. As
principais medidas em cada setor seriam as seguintes:
a. disparidades de riqueza e de renda:
· implantação de um sistema tributário progressivo
com o fim das isenções de que gozam os indivíduos mais ricos e as grandes
empresas;
·
o combate
rigoroso à evasão de impostos.
b. disparidades regionais e
intra-urbanas:
· tratamento diferencial tributário para
investimentos em munícipios e distritos urbanos de baixa renda.
c. disparidades de gênero:
· controle e punição severa da violência contra as
mulheres;
·
salário igual
para funções iguais.
d. disparidades de origem étnica:
· controle e punição severa das manifestações
racistas e das agressões de natureza étnica, inclusive na Internet;
· libertação dos indivíduos que se encontram presos
sem terem sido condenados.
e. disparidades culturais:
· ingresso gratuito para os trabalhadores
sindicalizados em espetáculos culturais de excelência (concertos, exposições,
etc.);
·
desconto de
50% na aquisição de livros por trabalhadores sindicalizados.
f. disparidades de poder político:
· fortalecimento das conferências nacionais;
·
aumento do
tempo de campanha política;
·
adoção do
sistema de revogação de mandato eletivo;
·
combate às
manifestações de intolerância política e religiosa na Internet.
* * *
33. A quarta característica da sociedade brasileira é a
vulnerabilidade a pressões, ameaças e agressões externas,
nos campos econômico, tecnológico, ideológico, político e militar.
34. A redução das vulnerabilidades
depende do aumento da presença nacional nos diversos setores da sociedade em
que se verifica a influência externa e na maior capacidade da sociedade de
influir sobre esses setores no sentido de induzi-los a agir de acordo com os
interesses gerais e não apenas em favor de seus interesses individuais, ou de
interesses estrangeiros.
35. No campo econômico, as principais
medidas e políticas que reduziriam a vulnerabilidade seriam as seguintes:
· controle do endividamento das empresas privadas no
exterior;
·
a
diversificação das exportações, em especial de manufaturas;
·
a exigência às
empresas estrangeiras de exportar para promover a modernização do parque
industrial brasileiro;
·
não
participação em acordos internacionais econômicos que reduzam a capacidade de
realizar políticas de desenvolvimento.
36. No campo tecnológico, as principais
medidas que reduziriam a vulnerabilidade seriam as seguintes:
· organizar e reforçar centros de formação cientifica
e tecnológica de excelência;
·
conceder
bolsas de estudos vinculadas a resultados nas áreas de ciências exatas e
aplicadas desde o ensino médio ao universitário, para estimular vocações
cientificas;
·
conceder
prêmios de excelência e de realizações nas áreas de ciências exatas e
aplicadas.
37. No campo ideológico, as medidas e
políticas que reduziriam a vulnerabilidade seriam:
· impedir a formação de oligopólios de comunicação e
a propriedade cruzada dos meios;
·
a
democratização e desconcentração da alocação das verbas oficiais de propaganda;
·
o
fortalecimento da mídia comunitária de rádio e televisão;
·
financiamento
especial a rádios, televisões e editoras de acordo com sua programação de
produtos culturais brasileiros;
·
financiamento
de produção, da distribuição e da exibição da produção audiovisual brasileira.
38. No campo militar, as medidas e
políticas que reduzem a vulnerabilidade externa seriam:
· financiamento especial a empresas de defesa de
capital nacional;
·
fortalecimento
e diversificação das instituições de formação de oficiais superiores;
·
não adesão a
tratados desiguais na área militar;
·
fortalecimento
da capacidade dissuasória do país.
39. No campo político, a vulnerabilidade
externa se reduziria:
· por uma política de não intervenção e de respeito
absoluto ao direito de autodeterminação dos países vizinhos sul-americanos;
·
pela
cooperação econômica e financeira com esses vizinhos;
·
pelo
fortalecimento de um bloco sul-americano de nações;
·
pela
participação ativa no bloco dos BRICS;
·
pela campanha
política permanente para inclusão do Brasil no Conselho de Segurança.
* * *
40. A quinta característica brasileira é a fragilidade do Estado em
seus três Poderes.
41. As medidas prioritárias para
enfrentar as fragilidades do Poder Legislativo seriam:
· a adoção e fiscalização de sistemas efetivos de
inscrição partidária, de contribuição partidária obrigatória e de realização de
convenções periódicas para debate político e escolha das direções partidárias;
·
a proibição de
troca de partido pelos representantes eleitos;
·
a atualização
do número de representantes por Estado de acordo com sua população e extensão
territorial;
·
a adoção do
sistema de referendo revogatório para mandatos parlamentares;
·
financiamento
público de campanhas eleitorais e limitação de gastos por candidato.
42. As medidas necessárias para reduzir
as fragilidades do Poder Executivo seriam:
· revogar a Emenda Constitucional 95 que congela as
despesas primárias por 20 anos;
·
substituir o
tripé da política macroeconômica (câmbio flutuante, meta de inflação, meta de
superávit fiscal) por metas de desenvolvimento e de emprego;
·
utilizar o
orçamento como instrumento para combater a recessão econômica e estimular o
desenvolvimento;
·
estabelecer
uma política de juros que estimule o investimento privado;
·
combater a
sonegação e a evasão de impostos;
·
combater a
evasão de divisas para paraísos fiscais;
·
realizar a
auditoria da dívida pública;
·
combater o
super e o sub faturamento no comércio exterior.
43. No Poder Judiciário, as medidas
prioritárias seriam:
· despolitizar o Judiciário, com a nomeação para o
Supremo Tribunal Federal do mais antigo (no cargo) Ministro do Superior
Tribunal de Justiça e a nomeação para os tribunais estaduais do mais antigo (no
cargo) juiz de primeira instância;
·
garantir o
cumprimento pelos juízes de primeira instância e pelos membros do Ministério
Público dos direitos individuais, em especial: a presunção de inocência; o
sigilo das investigações; a garantia da integridade física dos investigados; a
não incitação da opinião pública contra investigados;
·
combater o
abuso de poder por autoridades judiciárias, policiais e do Ministério Público;
·
garantir o
julgamento dos processos nos Tribunais pela ordem cronológica de ingresso;
·
nomear para o
Conselho Nacional de Justiça apenas membros de fora do Poder Judiciário.
* * *
44. A luta entre esses dois projetos
para o Brasil é a luta entre:
· de um lado, o projeto de Temer e Meirelles que é o
projeto dos setores mais tradicionais das classes hegemônicas e mais vinculados
aos interesses das classes hegemônicas das Grandes Potências, em especial da
Potência Imperial, os Estados Unidos da América, com o objetivo de manter o
Brasil como um país médio, apequenado, produtor e exportador de produtos
primários, território de exploração desenfreada da mão-de-obra brasileira por
megaempresas multinacionais, de pequeno mercado interno e sem capacidade
política internacional e,
·
de outro lado,
o projeto dos setores mais avançados das classes tradicionais, em aliança com
as forças sindicais trabalhadoras, e setores modernos da classe média que
desejam construir no Brasil uma sociedade e um Estado que, com base no
desenvolvimento de seu enorme potencial humano e de recursos, sejam mais
desenvolvidos, mais prósperos, mais justos, mais democráticos, mais
includentes, mais tolerantes, mais soberanos, mais capazes de se defender a si
mesmos e de contribuir para a Paz mundial.
* * *
(*)
Samuel Pinheiro Guimarães é diplomata. Foi secretário-geral do Itamaraty
(2003-2009) e ministro de Assuntos Estratégicos durante o governo Lula
(2009-2010).
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