Para sintetizar a força da criminalidade dos potentes, a saudosa escritora italiana Camilla Cederna repetia o teor de uma frase mandada grafar pela Máfia siciliana nos muros de Palermo: Chi ha soldi e amicizia va in culo alla Giustizia.
Os poderosos, ainda que usem de métodos mafiosos, têm pouco a temer. A propósito, o presidente Lula afirmara em entrevista, logo depois da reação negativa dos cidadãos em face do afastamento do delegado Paulo Lacerda do comando da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), que ele voltaria ao cargo quando quisesse.
Uma sindicância do Gabinete de Segurança Institucional, comandado pelo general Jorge Armando Felix, concluiu não ter tido Lacerda nenhuma responsabilidade pelos fatos noticiados pela revista Veja, ou seja, um “grampo” de conversa telefônica entre o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, e o senador Demóstenes Torres (DEM-GO).
Mais ainda: o inquérito policial aberto sobre os fatos ainda carece da prova da materialidade delitiva, isto é, da existência do crime. Isto porque a gravação da conversa mencionada pela revista não foi encontrada: existe apenas a transcrição da interlocução, que pode ser resultado de montagem.
Nesse episódio do “grampo sem áudio”, coube ao ministro da Defesa, Nelson Jobim, representar o papel do guardião da moralidade. Bem ele que, em livro laudatório, confessou ter fraudado a Constituição ao inserir artigos não apresentados e aprovados aos seus pares deputados.
A fim de pressionar Lula para afastar Lacerda, Jobim fez, durante reunião ministerial, afirmação falsa. Ele sustentou possuir a Abin, da mesma maneira que o Exército, equipamentos sofisticados para promoção de escutas telefônicas.
O pacato general Felix ameaçou resistir, mas preferiu, como se fora um disciplinado cabo-da-guarda, aceitar, embora a contragosto, o afastamento temporário de Lacerda. No início do governo Lula, já tinha sido passado para trás. Apesar de chefe, não pôde escolher o diretor da Abin e aceitou a indicação do delegado de polícia estadual Mauro Marcelo.
Com efeito. Àquela altura do episódio noticiado por Veja, o ministro Gilmar Mendes já havia, pelos jornais, ameaçado “chamar às falas” o presidente da República. Posteriormente, em entrevistas, Mendes deixou claro que jamais aceitaria a volta de Lacerda. Felix capitulou de novo.
Para fechar 2008, um acordo tirou Lacerda da Abin. O ministro Jobim foi mantido, apesar da mentira. Quanto a Felix, este não teve a dignidade de apanhar o boné.
O ministro da Justiça continua também. E a ele coube a missão de promover um atentado contra a inteligência do comum do povo. Lacerda virou adido policial, cargo importante, segundo explicou Genro. Teria ficado melhor, menos escancarado, reverter a sua aposentadoria, para legitimá-lo na função de adido: adido aposentado, só em república bananeira.
Na prática, a saída apresentada pelo ministro da Justiça não atendeu ao interesse público. Mais uma vez, Daniel Dantas saiu vitorioso.
Entre beijar a lona e aceitar a toalha jogada, Lacerda optou, com a consciência em paz pelo dever cumprido, por um exílio em Portugal. Talvez, para se fingir de morto.
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O escritor Amóz Oz, professor de literatura na Universidade Ben-Gurion, concluiu que os conflitos entre israelenses e palestinos não podem ser vistos como uma guerra de religião ou um choque de culturas, como sustentam muitos. Para Oz, trata-se de um conflito pela posse de terras, a ser resolvido por entendimentos e não pela via militar.
Levou tempo para a questão da posse da terra ser percebida pelo ex-premier Ariel Sharon. Ao notá-la, Sharon propôs ao Parlamento e retirou, em 25 de outubro de 2004, mais de 8 mil israelenses assentados em Gaza.
Outro dado que impressionou o até então beligerante Sharon foi a questão demográfica, nesta semana retomada pelo historiador Benny Morris, a mostrar que a entrega de territórios aos árabes e as costuras políticas voltadas a um acordo de paz são fundamentais para Israel.
Morris destacou que 92% da população de Israel se concentra nos centros urbanos. Os hebreus representam 80% dessa população e os restantes 20% são de árabes nascidos em Israel. Segundo Morris, os árabes de Israel têm de quatro a cinco filhos por família, ao passo que os hebreus possuem de dois a três. Nesse ritmo, entre 2040 e 2050, eles serão maioria dentro do território de Israel.
Em 2005, semelhante raciocínio fora desenvolvido por Ariel Sharon, influenciado pelos dados demográficos apresentados pelo professor Sergio Della Pergola, catedrático na Universidade de Jerusalém.
O premier israelense, Ehud Olmert, por duas vezes optou pela militarização. Em Gaza, promoveu, em nome do Estado, crimes contra a humanidade.
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