Em 1907, alguns magnatas britânicos decidiram construir os três maiores navios do mundo. Um deles foi o Titanic. Era então o mais moderno, seguro e luxuoso transatlântico do mundo. Cinco anos depois, em 9 de abril de 1912, o Titanic zarpou para sua viagem inaugural. Durou só cinco dias: o navio colidiu com um iceberg, naufragou e mais da metade dos seus 3.000 passageiros morreram.
A história está repleta de exemplos que lembram a saga do Titanic: algo esplêndido e tido como imbatível, mas que acaba derrotado por motivo aparentemente banal.
Coisa semelhante ocorre, hoje, na política brasileira. A iminente candidatura do governador de São Paulo, José Serra (PSDB), à presidência da República, era tida até poucos meses atrás como fortíssima. Ele é apresentado pela oposição de direita e por parte da mídia burguesa como administrador competente, sério, ilustrado, bom de voto... e os números das pesquisas davam alguma sustentação para este discurso.
Davam. Agora o quadro começa a mudar. Há uma pesquisa recente do Vox Populi que pode indicar o oposto: a erosão da vantagem do tucano paulista. Até agora, só foram divulgados os dados parciais do Rio de Janeiro e de Pernambuco. No Rio, Serra (27%) está empatado com a candidata do PT, Dilma Rousseff (26%). Em Pernambuco, ele tem 23%, contra os 45% de Dilma. Segundo o jornal O Globo da quarta-feira (27), o presidente do DEM, Rodrigo Maia, passou recibo: ao ser informado sobre estes números, teria dito: “Isso é um pesadelo. Deus me livre”.
Dizem que nossos sonhos e pesadelos estão sempre relacionados a algo que nos aconteceu recentemente. Se for isso mesmo, o pesadelo que atormenta a oposição tem motivo. É só listar os últimos acontecimentos da cena política brasileira. Não há quase nenhuma notícia ruim para o governo: Lula continua muito popular, a economia vai bem, os empregos aumentaram, o salário mínimo aumentou, os programas sociais foram consolidados, nossa imagem no exterior é muito positiva e até mesmo a polêmica sobre o Plano Nacional de Direitos Humanos serviu para mostrar que dentro do governo há muita gente disposta a comprar esta briga com a direita raivosa...
Enquanto isso, sobram constrangimentos para a oposição. Entre eles o mensalão do DEM no Distrito Federal, a entrevista do senador tucano Sérgio Guerra (PE) pregando o fim do PAC, a iminente derrota da ala serrista do PMDB na disputa interna para decidir pelo apoio a Dilma; a desistência de Aécio Neves da disputa presidencial, que saiu da briga querendo distância de Serra. E, por fim, as chuvas em São Paulo, que causaram grandes problemas e provocaram, até agora, 65 mortes no estado.
Entre estes episódios, as enchentes paulistas têm potencial para causar grandes estragos para a candidatura Serra. A forma tímida, praticamente omissa, com a qual ele e seu pupilo, o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (DEM), lidam com o problema das enchentes revelou a inaptidão com que o tucanato paulista conduz uma administração tacanha, despreparada para lidar com situações de crise e insensível aos problemas que atingem os mais pobres.
As tormentas paulistas nos remetem mais uma vez ao exemplo do Titanic que desapareceu nas profundezas do Atlântico Norte. A pesquisa Vox Populi ainda não foi divulgada na íntegra. Quando isso acontecer, poderá dar uma dimensão mais precisa sobre os reais estragos que ela causou no casco da candidatura tucana.
Seja como for, muita água ainda rolar por baixo da disputa eleitoral até outubro. Portanto, é cedo para cantar a vitória ou a derrota de quem quer que seja. Mas com os dados disponíveis já é possível dizer que há uma grande pedra no caminho de Serra, um "iceberg" que poderá levar a candidatura da direita ao naufrágio. Um afundamento que deve muito à própria soberba, arrogância e desprezo do tucanato pelos dramas reais da parcela mais pobre da população.
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