quarta-feira, 11 de abril de 2012
Honrar o país - por Vladimir Safatle (Folha de São Paulo)
Quando a ditadura extorquiu uma anistia
votada
Depois desse engodo, os torturadores
acreditaram poder dormir em paz, sem o risco de acordar com os gritos
indignados da execração pública e da vergonha. Eles criaram um “vocabulário da
desmobilização”, que sempre era pronunciado quando exigências de justiça
voltavam a se fazer ouvir.
“Revanchismo”, “luta contra a ameaça
comunista”, “guerra contra terroristas” foram palavras repetidas por 30 anos na
esperança de que a geração pós-ditadura matasse mais uma vez aqueles que morreram
lutando contra o totalitarismo. Matasse com as mãos pesadas do esquecimento.
Mas eis que estes que nasceram depois do fim
da ditadura agora vão às ruas para nomear os que tentaram esconder seus crimes
na sombra tranquila do anonimato.
Ao recusar o pacto de silêncio e dizer onde
moram e trabalham os antigos agentes da ditadura, eles deixam um recado claro.
Trata-se de dizer que tais indivíduos podem até escapar do Poder Judiciário, o
que não é muito difícil em um país que mostrou, na semana passada, como até
quem abusa sexualmente de crianças de 12 anos não é punido. No entanto eles não
escaparão do desprezo público.
Esses jovens que apontam o dedo para os
agentes da ditadura, dizendo seus nomes nas ruas, honram o país por mostrar de
onde vem a verdadeira justiça. Ela não vem de um Executivo tíbio, de um
Judiciário cínico e de um Legislativo com cheiro de mercado persa. Ela vem dos
que dizem que nada nos fará perdoar aqueles que nem sequer tiveram a dignidade
de pedir perdão.
Se o futuro que nos vendem é este em que
torturadores andam tranquilamente nas ruas e generais cospem impunemente na
história ao chamar seus crimes de “revolução”, então tenhamos a coragem de
dizer que esse futuro não é para nós.
Este país não é o nosso país, mas apenas uma
monstruosidade que logo receberá o desprezo do resto do mundo. Neste momento,
quem honra o verdadeiro Brasil é essa minoria que diz não ao esquecimento. Essa
minoria numérica é nossa maioria moral.
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