Abrigados sob uma premissa absolutamente despropositada, os ministros do Supremo Tribunal Federal foram enredados por indícios. Ora, indícios, como se sabe, são prenhes de significados, os quais, muitas vezes, dizem mais dos intérpretes do que de si mesmos
É supérfluo o debate sobre a influência das ruas na opinião dos juízes do Supremo Tribunal Federal, em nova etapa da Ação Penal 470. Não é matéria de livre arbítrio. Os juízes são tão influenciáveis quanto qualquer um de nós. Outra coisa é o caráter que revelam (e o real livre arbítrio de que dispõem) ao resistir submeter suas decisões à inescapável pressão da opinião pública e da publicada.
É supérfluo o debate sobre a influência das ruas na opinião dos juízes do Supremo Tribunal Federal, em nova etapa da Ação Penal 470. Não é matéria de livre arbítrio. Os juízes são tão influenciáveis quanto qualquer um de nós. Outra coisa é o caráter que revelam (e o real livre arbítrio de que dispõem) ao resistir submeter suas decisões à inescapável pressão da opinião pública e da publicada.
Acresce um complicador: os votos que deram anteriormente, aspecto ausente das aflições jurídicas de Luiz Roberto Barroso e Teoris Zavaski. A veemência que acompanhou todas, sem exceção, todas as manifestações dos meritíssimos durante o julgamento original estará presente entre as variáveis que deverão ponderar, agora, na etapa dos embargos. Com que argumentos os ministros Joaquim Barbosa, Luiz Fux, Gilmar Mendes, Celso de Mello e Marco Aurélio convencerão a si próprios que os votos que proferiram – e em especial as justificativas que os acompanharam, posteriormente apagadas do Acórdão – estavam equivocados, quer na tipificação, quer na dosimetria?
Esses mesmos ministros, além do aposentado Ayres de Brito, promoveram o primeiro desfile de discursos de ódio na política brasileira, superando de longe as diatribes contra Getúlio Vargas na década de 1950. E as ministras Carmen Lúcia e Rosa Weber que, aparentemente, só na metade do caminho se deram conta da enorme ficção de que estavam sendo involuntariamente co-autoras, irão reler os volumes do processo instruído e mal comunicado pelo relator Joaquim Barbosa?
Nada de novo aconteceu do final do julgamento até agora. A demonstração de que os fundos supostamente utilizados para a compra de parlamentares não eram públicos e que, ademais, foram pagos a empresas de publicidade em troca de serviços efetivamente prestados, todas as comprovações desses momentos decisivos para a montagem do fabuloso projeto de perpetuação no poder atribuído ao Partido dos Trabalhadores já estavam disponíveis nos volumes originais do processo. Assim como está no processo a evidência da falsidade da informação prestada pelo relator Joaquim Barbosa ao ministro Marco Aurélio sobre a data da morte de personagem político, tão relevante no enredo fabricado pelo procurador Roberto Gurgel.
Pelo outro lado, continuam inexistindo as provas de que havia de fato um projeto partidário de perpetuação no poder, comandado por José Dirceu, e de que seriam cúmplices banqueiros nacionais e estrangeiros, publicitários, funcionários públicos, empresários e políticos em cargos de elevada responsabilidade e visibilidade. Só um articulador incompetente imaginaria que um golpe político com tantos cúmplices em grande parte desconhecidos entre si poderia obter sucesso. E sem deixar rastros. Pois essa é a situação atual, já pré-figurada no processo original: não há evidência que garanta a existência de tal projeto. Mais do que isso, nas alegações de diversos acusados são inúmeras as demonstrações de que um projeto de tal natureza não poderia existir, mostrando-se incompatível com o comportamento geral da maioria dos acusados. Ou seja, comprovou-se o oposto da ficção do procurador: não existia e nem era possível a existência de um projeto dessa magnitude.
Em lugar de provas, indícios. Indícios transformados em evidências pela ginástica mental do Procurador e o Relator, graças à mirabolante premissa de um plano de apropriação indébita do poder, premissa engolida por todos os ministros. Isto aceito, bastava ao então presidente do STF, Ayres Brito, remeter o valor dos indícios ao “conjunto da obra” para que se transformassem em formidáveis petardos de acusação. A rigor, desde que aceitaram a fantasia de um projeto de perpetuação no poder, os ministros estavam logicamente obrigados a aceitarem todos os argumentos do Procurados e do Relator, eis que eram derivados desse mesmo projeto. Daí que, hoje, parece-me que os únicos votos coerentes foram os daqueles ministros que acolheram, sem exceção, as tipificações e veredictos enunciados pela dupla Procurador-Relator.
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