domingo, 23 de fevereiro de 2014

Por que a Globo é contra o governo venezuelano - por Paulo Nogueira (Diário do centro do Mundo)

     Noto, nas redes sociais, revolta contra a maneira como a Globo vem cobrindo a crise na Venezuela.

     A Globo ataca, ataca e ainda ataca o governo eleito.

     Não existe razão para surpresa. Inimaginável seria a Globo apoiar qualquer tipo de causa popular.

     O problema começou com Chávez.

     Chávez e Globo tinham um história de beligerância explícita. Ambos defendem interesses antagônicos.

     Se estivéssemos na França de 1789, a Globo defenderia a Bastilha e Chávez seria um jacobino. Em vez de recitar Bolívar, ele repetiria Rousseau.

     Chávez cometeu um crime mortal para a Globo: não renovou a concessão de uma emissora que tramara sua queda. Veja: um grupo empresarial usara algo que ganhara do Estado — a concessão para um canal de tevê — para tentar derrubar o presidente que o povo elegera. Chávez fez o que tinha que fazer. E o que ele fez é o maior pesadelo das Organizações Globo: a ruptura da concessão.

     Há uma cena clássica que registra a hostilidade entre Chávez e a Globo. Foi, felizmente, registrada pelas câmaras. É um documento histórico. Você pode vê-la no pé deste artigo.

     Chávez está dando uma coletiva, e um repórter ganha a palavra para uma pergunta. É um brasileiro, e trabalha na Globo. Fala num espanhol decente, e depois de se apresentar interroga Chávez sobre supostas agressões à liberdade de expressão.

     Toca, especificamente, numa multa aplicada a um jornalista pela justiça venezuelana.

     Chávez ouve pacientemente. No meio da longa questão, ele indaga se o jornalista já concluiu a pergunta. E depois diz: “Sei que você veio aqui com uma missão e, se não a cumprir, vai ser demitido. Não adianta eu sugerir a você que visite determinados lugares ou fale com certas pessoas, porque você vai ter que fazer o que esperam que você faça.”

     Quem conhece os bastidores do jornalismo sabe que quando um repórter da Globo vai para a Venezuela a pauta já está pronta. É só preencher os brancos. Não existe uma genuína investigação. A condenação da reportagem já está estabelecida antes que a pauta seja passada ao repórter.

     Lamento se isso desilude os ingênuos que acreditam em objetividade jornalística brasileira, mas a vida é o que é. Na BBC, o repórter poderia de fato narrar o que viu. Na Globo, vai confirmar o que o seu chefe lhe disse. É uma viagem, a rigor, inútil: serve apenas para chancelar, aspas, a paulada que será dada.

     “Como cidadão latino-americano, você é bem-vindo”, diz Chávez ao repórter da Globo. “Como representante da Globo, não.”

     Chávez lembrou coisas óbvias: o quanto a Globo esteve envolvida em coisas nocivas ao povo brasileiro, como a derrubada de João Goulart e a instalação de uma ditadura militar em 1964.

     Essa ditadura, patrocinada pela Globo, tornou o Brasil um dos campeões mundiais em iniquidade social. Conquistas trabalhistas foram pilhadas, como a estabilidade no emprego, e os trabalhadores ficaram impedidos de reagir porque foi proibida pelos ditadores sua única arma – a greve.

     Não vou falar na destruição do ensino público de qualidade pela ditadura, uma obra que ceifou uma das mais eficientes escadas de mobilidade social. Também não vou falar nas torturas e assassinatos dos que se insurgiram contra o golpe.

     Chávez, na coletiva, acusou a Globo de servir aos interesses americanos.

     Aí tenho para mim que ele errou parcialmente.

     A Globo, ao longo de sua história, colocou sempre à frente não os interesses americanos – mas os seus próprios, confundidos, na retórica, com o interesse público, aspas.

     Tem sido bem sucedida nisso.

     O Brasil tem milhões de favelados, milhões de pessoas atiradas na pobreza porque lhes foi negado ensino digno, milhões de crianças nascidas e crescidas sem coisas como água encanada.

     Mas a família Marinho, antes com Roberto Marinho e agora com seus três filhos, está no topo da lista de bilionários do Brasil.

     Roberto Marinho se dizia “condenado ao sucesso”. O que ele não disse é que para que isso ocorresse uma quantidade vergonhosa de brasileiros seria condenada à miséria.




Comentário
É uma grande pena que só um governante estrangeiro tenha colhões para dizer a globo o que ela realmente é. 

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