Em setembro de 1937, veio a público um documento que continha um plano de tomada do poder pelas forças comunistas no Brasil, pretensamente elaborado pela Internacional Comunista, o qual ficou conhecido como Plano Cohen.
O plano foi utilizado pela cúpula militar do Governo Vargas como a prova cabal de que o Brasil estava na iminência de uma insurreição comunista e serviu de estopim para que o Congresso decretasse o Estado de Guerra. No mês seguinte, usando dos poderes que esse instrumento lhe atribuía, Vargas afastou o seu maior opositor, o governador gaúcho Flores da Cunha e no dia 10 de novembro, implantou a ditadura do Estado Novo, prendendo mais de 10 mil opositores nas semanas seguintes.
Como se sabe, esse filme se repetiu em 1964 para o Golpe Civil-Militar e em 1968 para a implantação do AI 5 e a total supressão das liberdades no país.
No ano passado, em razão do aumento dos casos de vandalismo durante as manifestações de rua, diversos Deputados, Senadores, lideranças militares e veículos de comunicação, exigiriam (e quase conseguiram) a aprovação da Lei Antiterrorismo no Brasil.
Segundo alguns “especialistas”, o país se encontrava numa situação de grave risco e, tendo em vista a realização da Copa do Mundo, era preciso criar uma legislação de exceção, que possibilitasse meios de investigação mais fortes e céleres, além da detenção preventiva de suspeitos (vale a pena a leitura da matéria: Parlamentares querem lei antiterrorismo antes da Copa do Mundo).
Como se sabe, a Copa transcorreu com total sucesso, com muita alegria nas ruas e absolutamente nenhuma ameaça a Segurança Nacional. No entanto, até o momento não se sabe de nenhuma declaração dos defensores da Lei Antiterrorismo assumindo o equívoco de suas avaliações.
Pelo o que se viu até o momento, o episódio da prisão de duas dezenas de militantes políticos no Rio de Janeiro é mais um episódio da longa ficha corrida de práticas autoritárias do Estado Brasileiro.
O inquérito, a denúncia do Ministério Público e a decisão do Poder Judiciário, feitos em tempo recorde, construíram uma peça de ficção que em muito lembra o Plano Cohen. Não há elementos probatórios ou nexos que demonstrem vínculo entre as pessoas e os atos delituosos, chegando ao ridículo de utilizar a gíria “bombar”, absolutamente comum na linguagem dos jovens brasileiros, captada numa gravação, como a prova definitiva de que estava em curso a preparação de ataques a bomba.
Ao invés de identificar um autor de determinado ato de vandalismo e buscar sua responsabilização dentro de um devido processo legal, o que seria o esperado no Estado de Direito, o processo se preocupou em criar a figura da organização criminosa e realizar grandes operações espetaculosas para a prisão dos seus perigosos autores, tudo ao gosto da mídia.
Caso a legislação antiterrorismo tivesse sido aprovada ano passado, possivelmente centenas de militantes políticos já estariam presos em total isolamento e seriam designados em volumosos inquéritos como “perigosos terroristas”.
Mesmo depois de tantas décadas de ações autoritárias, ainda impressiona como “formadores de opinião”, veículos de comunicação e diversas lideranças políticas aplaudam mais uma demonstração de vandalismo do Poder Público contra os direitos e garantias fundamentais.
Aliás, pequenos Plano Cohen são prática cotidiana no Brasil, sempre prontos para justificar ações enérgicas de combate ao crime, que invariavelmente levam a morte ou a prisão de milhares de “perigosos traficantes”, todos com o perfil social e racial que se sabe.
Em tempo: oito anos depois, o General Goes Monteiro tornou pública a farsa do Relatório Cohen e assumiu que o documento havia sido forjado pelo chefe do serviço secreto da Ação Integralista Brasileira (AIB), organização nazista que a época possuía mais de um milhão de filiados no Brasil.
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