sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Como o NY Times vê o Brasil - por Luiz Carlos Azenha

Deu na capa do New York Times, nesta quinta-feira, dia 31, assinada por Alexei Barrionuevo (a tradução, como sempre, é meia boca):
ECONOMIA FORTE EMPURRA BRASIL PARA O PALCO MUNDIAL


Fortaleza, Brasil - Desesperada para escapar de sua existência da-mão-para-a-boca em uma das regiões mais pobres do Brasil, Maria Benedita Sousa usou um pequeno empréstimo cinco anos atrás para comprar duas máquinas de costura e começar seu próprio negócio fazendo roupas íntimas femininas.
Hoje Ms. Sousa, mãe de três filhos que começou a trabalhar numa fábrica de jeans, emprega 25 pessoas numa modesta fábrica de dois cômodos que produz 55 mil pares de calcinhas de algodão por mês. Ela comprou e reformou uma casa para sua família e está pensando em comprar um segundo automóvel. A filha dela, que estuda para ser farmacêutica, poderá ser a primeira da família a terminar a faculdade.
"Você não pode imaginar a felicidade que sinto", Ms. Sousa, 43 anos de idade, disse do chão da fábrica batizada com o nome de um filho. "Vim do campo para a cidade. Batalhei, batalhei e hoje meus filhos estão estudando, com uma na faculdade e os outros dois na escola. É um presente de Deus".
Hoje o país dela está se levantando da mesma forma. O Brasil, a maior economia da América do Sul, está finalmente pronto para realizar seu muito antecipado potencial como um jogador global, dizem economistas, no momento em que o país vive sua maior expansão econômica em três décadas.
Esse crescimento é sentido em quase todas as partes da economia, criando uma nova classe de super ricos ao mesmo tempo em que pessoas como a Ms. Sousa ascendem a uma classe média que se expande.
Isso também deu ao Brasil mais auto-confiança, por exemplo, para barganhar com os Estados Unidos e a Europa em negociações globais de comércio. Depois de sete anos, essas negociações fracassaram esta semana depois de demandas da China e da Índia por proteção a seus agricultores, um claro sinal do crescente poder destas economias emergentes.
Apesar do temor de investidores sobre a tendência esquerdista do presidente Luiz Inácio Lula da Silva quando foi eleito para liderar o Brasil em 2002, ele demonstrou cuidado quando se trata da economia, evitando impulsos populistas de líderes da Venezuela e Bolívia.
Em vez disso, impulsionou o crescimento da economia do Brasil através de uma combinação de respeito pelos mercados financeiros e programas sociais que estão tirando milhões da pobreza, diz David Fleischer, um analista político e professor emérito da Universidade de Brasília. Ms. Sousa é uma beneficiária.
Famoso por sua distribuição de renda desigual, o Brasil reduziu sua diferença de renda 6% desde 2001, mais do que qualquer outro país da América do Sul, disse Francisco Ferreira, um economista do Banco Mundial.
Enquanto os 10% mais ricos viram sua renda subir 7% entre 2001 e 2006, os 10% mais pobres dispararam com 58%, de acordo com Marcelo Côrtes Neri, o diretor do Centro para Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas, no Rio de Janeiro.
Mas o Brasil também gasta mais que seus vizinhos em programas sociais e no conjunto o gasto público continua a ser quatro vezes maior que o do México em porcentagem do Produto Interno Bruto, afirmou Ferreira.
O momentum da expansão econômica do Brasil deve durar. Enquanto os Estados Unidos e partes da Europa enfrentam recessão e as consequências de uma crise no setor imobiliário, a economia do Brasil mostra poucas vulnerabilidades de outros poderes emergentes.
A economia diversificou sua base industrial, tem grande potencial de expandir o boom do setor agrícola em terras virgens e tem um tremendo pool de recursos naturais. Novas descobertas vão colocar o Brasil no escalão das potências do petróleo na próxima década.
Ainda assim, embora a exportação de commodities como petróleo e bens agrícolas sejam responsáveis por muito do crescimento recente, o Brasil depende cada vez menos dela, dizem economistas, por ter a vantagem de um grande mercado interno - 185 milhões de pessoas - que está enriquecendo graças ao sucesso de gente como Ms. Sousa.
De fato, com uma moeda forte e a inflação sob controle, os brasileiros estão numa gastança que se tornou o motor primário para a economia, que cresceu 5.4% no ano passado.
Eles estão comprando tanto bens brasileiros quanto importados. Muitos negócios relaxaram o crédito para permitir aos brasileiros comprar geladeiras, automóveis e até cirurgia plástica em anos, em vez de meses, apesar de juros que estão entre os mais altos do mundo. Em junho o país atingiu 100 milhões de cartões de crédito, um aumento de 17% em relação ao ano anterior.
Nas Casas Bahia, uma rede de venda de móveis com preços modestos, o número de consumidores comprando à prestação triplicou para 29,3 milhões de 2002 a 2007, disse Sônia Mitaini, uma porta-voz da empresa.
Outros sinais de riqueza são abundantes. Em Macaé, uma cidade do petróleo perto do Rio de Janeiro, empreiteiros estão correndo para terminar shopping centers e condomínios de luxo para atender à demanda de firmas de exploração de petróleo. Num porto em Angra dos Reis, uma cidade conhecida por suas ilhas espetaculares, 25 mil trabalhadores encontraram serviço construindo plataformas de petróleo.
A Petrobras, a companhia nacional de petróleo, chocou o mundo em novembro quando anunciou que o poço de águas profundas Tupi, na costa do Rio de Janeiro, teria reservas de 5 a 8 bilhões de barris. Analistas acreditam que pode haver outros bilhões em áreas próximas.
Enquanto o petróleo será difícil e caro de extrair, a Petrobras disse que espera produzir 100 mil barris por dia em Tupi até 2010, e espera um milhão por dia dentro de uma década.
As novas jogadas do petróleo estão causando um boom de investimento no Rio de Janeiro, com U$ 67,7 bilhões de investimento esperados no estado até 2010, de acordo com a Federação das Indústrias do Rio de Janeiro. Só a Petrobras espera investir U$ 40,5 bilhões até 2012.
Alguns economistas dizem que a redução do crescimento no resto do mundo, especialmente na Ásia, que engole boa parte das exportações brasileiras de soja e minério de ferro, poderia afetar o Brasil. "Mas essa probabilidade é pequena", disse Alfredo Coutino, economista chefe da Moody's Economy.com para a América Latina.
De fato, a economia do Brasil se tornou tão diversificada em anos recentes que o país se tornou menos suscetível a ressacas causadas por problemas nos Estados Unidos.
As exportações do Brasil para os Estados Unidos representam 2,5% do PIB, comparadas com 25% das exportações do México, de acordo com a Moody's.
"O que faz do Brasil mais resistente é que o resto do mundo tem menor importância para o país", diz Don Hanna, chefe de economia para países emergentes do Citibank.
O resto do mundo certamente ajudou. Preços crescentes para os minerais e outras commodities criaram uma nova classe de super-ricos. O número de brasileiros com fortunas de mais de U$ 1 milhão cresceu 19% no ano passado, o terceiro lugar depois da China e da Índia, de acordo com uma pesquisa da Merrill Lynch e Capgemini.
Ao mesmo tempo, o presidente Da Silva aprofundou muitos dos programas sociais iniciados dez anos atrás sob Fernando Henrique Cardoso, que como presidente promoveu muitas das reformas estruturais que serviram de base para o crescimento do Brasil hoje.
No caso de Ms. Sousa, por exemplo, ela deve muito do sucesso do negócio aos empréstimos do Banco do Nordeste, um banco financiado pelo governo que deu microcrédito a 330 mil pessoas para desenvolver negócios nessa região.
Outros programas, como o Bolsa Família, dão pequenos subsídios para que os pobres brasileiros comprem comida e outros artigos essenciais. O Bolsa Família, que beneficia 45 milhões de pessoas nacionalmente e tem um orçamento anual de U$ 5,6 bilhões, tem sido mais eficaz em aumentar a renda per capita do que aumentos no salário mínimo, que cresceu 36% desde 2003.
A natureza destes programas sociais expandiu o emprego informal e formal, assim como a classe média brasileira. O número de pessoas sob a linha de pobreza - definidos como aqueles que ganham menos de 80 dólares por mês - caiu 32% de 2004 para 2006, disse o Mr. Neri.
Os programas foram particularmente eficazes no Nordeste, historicamente uma das regiões mais pobres do Brasil. Os residentes receberam mais da metade dos U$ 15,6 bilhões dos programas sociais dados entre 2003 e 2006, de acordo com a Empresa de Pesquisa Energética, um braço do Ministério da Energia.
As pessoas estão usando essa nova riqueza para comprar bens como aparelhos de tevê e geladeiras num ritmo maior do que o resto do país. O Nordeste, de fato, passou o Sul em uso de energia pela primeira vez este ano, de acordo com a empresa.
Muitas famílias passaram à classe média usando o Bolsa Família para cobrir gastos básicos e em seguida obtendo pequenos empréstimos para começar novos negócios e assim escapando da economia informal. É o que Maria Auxiliadora Sampaio e o marido dela fizeram em Fortaleza, uma cidade costeira de 2,4 milhões de habitantes. Eles recebiam pagamentos do Bolsa Família de cerca de 30 dólares mensais, que usaram para cuidar dos três filhos. Então, dois anos atrás, Ms. Sampaio usou um empréstimo de cerca de 190 dólares para comprar esmalte e dar início a um salão de manicure em casa.
Hoje ela fatura cerca de 70 dólares por dia - cerca de quatro salários mínimos por mês, ela diz. Com o próximo empréstimo ela pretende investir 140 dólares num esterilizador para fazer o serviço que ela hoje faz com água fervida.
Com os frutos de seu novo negócio o casal reformou a casa, comprou um aparelho de tv e um telefone celular. Este mês o marido, que trabalha numa fábrica de Cachaça, realizou um sonho: comprou uma bateria.
Ele planeja usá-la em uma banda de forró, música tradicional do Nordeste. "Nós comíamos e pagávamos as contas e ele esperava, esperava, esperava" e finalmente comprou a bateria por U$ 780, ela disse.
"Sinto que somos parte de um grupo de gente que está subindo no mundo", disse Ms. Sampaio, de 28 anos de idade. "Quando você não tem nada, quando não tem uma profissão, não tem meio de vida, você não é nada, é uma mosca. Eu não era ninguém. Hoje, estou no paraíso".

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