A campanha midiática pela alta dos juros nas semanas que antecederam a reunião do Copom, do dia 17, foi tão intensa e manipuladora que acabou prejudicando quem pretendia beneficiar.
Vivendo a ressaca agora, o mesmo jornalismo informa discretamente, longe das manchetes arrebatadoras de dias atrás, que apenas um dos muitos iludidos pelo seu jogral, uma financeira conceituada no mercado, embolsou um prejuízo de quase R$ 100 milhões no carnaval do tomate rentista. Um exemplo, entre muitos.
A instituição fixou posições especulativas com base na aposta de que o BC elevaria em 0,5% a Selic, num primeiro estirão de três, até completar 1,5% de alta este ano.
Justiça seja feita, trabalhou-se operosamente para que isso ocorresse.
Diariamente, não raro mais que uma vez ao dia, vendeu-se ‘informação segura’ de que essa seria a dosagem do BC para a taxa básica de juro em 2013.
A ‘formação das expectativas’ tão caras ao cálculo financeiro – e de fato importantes num capitalismo em que as finanças precificam o futuro no presente, condicionando todo o cálculo econômico-- foi modelada ao bel prazer de um jornalismo que divulga interesses como se fosse verdade.
Ao mesmo tempo em que cobra do ‘Banco Central independente’ que ‘ancore as expectativas’ para evitar estouros da manada, esse jornalismo age como carrasco da autonomia que idolatra.
O tomate foi só o porta-estandarte desse jogo ecoado pela menos transparente de todas as esferas da mídia, que, diga-se, não prima por essa qualidade.
O prejuízo colhido por rentistas iludidos com o próprio eco estampado nas manchetes evidencia a precariedade da arena na qual são decididas variáveis de incidência importante no futuro do país.
Uma narrativa ardilosa e comprometida distorce as expectativas e pode, de fato, desencadear uma dinâmica agressiva de preços que transforma profecia em verdade.
É capaz de embalsamar um país num formol de juros e recessão.
A suprema irracionalidade martelada diariamente pauta a agenda do próprio governo, ao mesmo temo em que veta o debate e interdita as soluções dos desafios reais do país.
No episódio recente da Selic de nada adiantou figuras insuspeitas , como a do ex-ministro Delfim Netto, escancarar o jogo pesado em curso.
”Nos últimos 14 anos a taxa média de inflação anual foi de 6,36%. O fato curioso é que uma inflação tão alta durante tanto tempo foi bem suportada pelo setor financeiro enquanto a taxa de juro real era de 7% ou 8%. Agora, com a taxa de juro real de 2%, ela parece insuportável”, disse o ex-ministro em artigo na revista Carta Capital, uma semana antes da reunião do Copom.
Outros lembraram que em 14 anos de regime de meta de inflação o sacrossanto centro da meta só foi cravado em três oportunidades: 2000, 2006 e 2007.
Não tanto pelos efeitos terapêuticos do juro alto.
Induziu-a, de fato, a valorização cambial que promoveu a deletéria invasão de importações baratas –a um custo elevado em termos de desindustrialização.
Ao ceder ao jogral rentista, decepcionando-o na talagada, o Copom do último dia 17 gerou, paradoxalmente, um efeito bumerangue na contabilidade do dinheiro a juro.
No dia seguinte à elevação da Selic em 0,25% as apostas no mercado futuro de juros recuaram.
Quem havia dormido num colchão inflado em uma alta de 0,5% colheu os frutos do próprio veneno.
Morder a própria língua faz parte do jogo especulativo. Punido com prejuízo em espécie.
O incompreensível é que o backing-vocal e alguns dos principais veículos-solistas desse enredo periódico de alarmismo e manipulação persistam com a reputação intocada.
Ancorados em uma capacidade de difusão monolítica, que faz gato e sapato da teoria das expectativas, bem como de governantes e autoridades desprovidos de meios equivalentes, repousam incólumes.
Afinando o tom para o próximo assalto.
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