segunda-feira, 12 de julho de 2010

Por uma Agência Nacional de Inovação - por Glauco Arbix (O Estado de S.Paulo)

O Brasil hoje vive um momento especial. O País elevou seu patamar de crescimento, é fato. Mas as perspectivas de sua sustentação ainda seguem imersas em brumas. Não se trata de mais uma vez registrar o rol de conhecidos obstáculos à permanência do crescimento, mas de apontar e equacionar o desafio mais importante colocado para o País.

A economia brasileira precisa de um choque de inovação.

O necessário aumento do investimento, a melhoria da infraestrutura, a execução de uma boa gestão macroeconômica, capaz de manter domesticada a inflação, e o equacionamento no longo prazo da alta carga tributária e da dívida pública, por fundamentais que sejam, não podem turvar a visão de nossos governantes para a urgência de se promover um salto no padrão de qualidade da atividade econômica. Para isso, mais do que aumentar o investimento, é preciso melhorar o seu foco e sua qualidade, de modo a dinamizar e diversificar a economia e superar a crônica dependência brasileira do universo das commodities.

Esse é o maior desafio, que está longe de se limitar à esfera econômica. Desde o ciclo desenvolvimentista o Brasil procura repensar e modificar sua ossatura institucional, recriar sua arquitetura legal e repensar seus dispositivos políticos para se adaptar às transformações que sacudiram o mundo. O País deu passos enormes nessa direção. Mais importante ainda, caminhou rumo ao estabelecimento de um novo equilíbrio nas relações entre Estado e mercados, distante do velho desenvolvimentismo e da ortodoxia econômica que fez sucesso nos anos 90. Fato é que, sem a combinação de uma economia de mercado com um novo ativismo de Estado - sem estatismo -, dificilmente seria possível combater mazelas crônicas, como as desigualdades e a pobreza.

A sintonia entre esforço pelo crescimento e forte investimento social é a grande responsável pelo momento positivo que o País vive atualmente: ao acionar mecanismos sociais sutis, liberou energias por todos os poros da sociedade, com impacto no conjunto da economia.

Sabemos que as estratégias são mais cristalinas no papel, pois no mundo real são recheadas de ambiguidades e conflitos. Mesmo assim, é forçoso constatar que o País amadureceu e conseguiu diminuir a distância que o separa das nações mais avançadas, ainda que o caminho a percorrer seja longo.

O Brasil está hoje mais preparado para lidar com o novo lugar ocupado pelas atividades intensivas em conhecimento, que tornaram, mundialmente, os processos de reprodução da vida material, social e cultural mais complexos, dinâmicos e integrados. Essa constatação, porém, não nos leva a afirmar a inevitabilidade do sucesso. A economia está numa encruzilhada: ou as empresas evoluem, alteram seu metabolismo, dinamizam sua gestão, valorizam os recursos humanos como estratégia e buscam elevar seu padrão tecnológico e ligar-se às cadeias mundiais de alto valor agregado ou, mais uma vez, o fôlego será curto para manter o crescimento.

É essencial, por isso, que hábitos e costumes sejam alterados dentro das empresas. Mas o País só ganhará dinamismo com um esforço conjunto do setor público e do privado, capaz de envolver as universidades, o Legislativo, o Judiciário e demais instituições sociais.

A inovação no Brasil deve tornar-se regra, não exceção. Debates sobre a necessidade dessa evolução são cada vez mais frequentes e foram retomados com intensidade durante a 4.ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, realizada em Brasília em maio. Mais de 4 mil participantes mostraram que a reflexão sobre os rumos do País da parcela da elite brasileira mais diretamente envolvida com a produção de ciência e tecnologia atingiu um novo patamar.

Se conseguisse potencializar inquietações desse tipo, ainda que parcialmente, o debate eleitoral ajudaria a semear o futuro. Esperança vã?

Não custa convidar os candidatos a se pronunciarem sobre a proposta de criação de uma agência nacional de inovação, ligada diretamente à Presidência da República. Essa proposta constava do documento original preparatório à conferência e também fez parte das recomendações entregues pela Confederação Nacional da Indústria aos atuais candidatos presidenciais.

Uma agência nacional com peso, recursos e legitimidade para alavancar significativamente o investimento em inovação é essencial para diminuir a pulverização de recursos, a burocracia, a morosidade da máquina pública e manter o foco de suas atenções onde é preciso.

Uma agência desse porte, criada a partir da fusão de instituições como a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (Abdi), por exemplo, com orçamento renovado e representatividade institucional dada pela ligação estreita com os principais planos e metas da Presidência da República, pode ajudar o País a se conectar com o futuro.

Que as esperanças por um debate de qualidade sobre os alicerces de um novo Brasil não se frustrem mais uma vez.

COORDENADOR DO OBSERVATÓRIO DE INOVAÇÃO DO INSTITUTO DE ESTUDOS AVANÇADOS DA USP, É MEMBRO DO CONSELHO NACIONAL DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA

Nenhum comentário: