Dizia o velho Magalhães Pinto que a política é como as nuvens do céu. A cada olhada, ela se move.
Digo isso a respeito das análises do Carlos Augusto Montenegro sobre as eleições de 2010. Elas foram feitas em um almoço no iG, muito interessante, com avaliações do maior especialista em pesquisas sobre as eleições de hoje.
Mas daqui a 2010, mesmo para um especialista é quase impossível prever com exatidão o que irá ocorrer.
Ponto central é a questão do currículo, da competência administrativa. Ele parte do pressuposto que Serra tem e Dilma não tem. Serra fez seu nome em poucos anos como Ministro da Saúde. Antes, montou nome em cima de atuação eminentemente legislativa. Dilma está à frente do maior programa de obras das últimas décadas.
Há as seguintes incógnitas pelo caminho:
1. Dilma tem uma vitrine ampla para demonstrar o pique gerencial: o PAC e o ritmo que ajudou a dar ao governo Lula. Não é pouca coisa. Se o PAC for bem sucedido e a crise não pegar o Brasil tão intensamente, faz o nome.
2. Serra ainda não demonstrou, na prefeitura e no estado, o mesmo pique gerencial que na Saúde. Aí se entra em uma particularidade da sua formação: ele não acredita nos modernos modelos de gestão. Acha que, pelo fato de conseguir fazer, não necessita das ferramentas gerenciais. Esse estilo funciona em realidades mais simples, como o próprio Ministério da Saúde. Lá, as estruturas estavam ao alcance dos seus olhos. Bastava colocar uma pessoa de confiança em cada perna do Ministério e cobrar resultados.
Quando passou para realidades mais complexas (como a prefeitura de São Palulo e, mais ainda, com o governo do Estado) esse estilo revelou-se obviamente insuficiente. Serra colocou quadros melhores que Alckmin mas não conseguiu ainda dizer a que veio. Não conseguiu articular as forças de São Paulo em torno de um projeto de desenvolvimento, não conseguiu montar ações inter-setoriais.
Tem dois pilares – os Secretários da Fazenda e do Planejamento – que respondem pela coordenação entre as áreas, mas é muito pouco. Em termos gerenciais, é uma gestão mais competente que a de Alckmin, mas ainda à moda antiga.
3.Outras incógnitas residem no plano das grandes alianças. Ambos – Serra e Dilma – são considerados intransigentes na defesa de alguns princípios administrativos. Isso é virtude, mas também provoca resistências. Mas Dilma está comandando o processo de recuperação do investimento nacional, articulando atores que, até pouco tempo atrás, estavam em segundo plano – como a ABDIB, as grandes empresas industriais, os novos atores, como estaleiros e tudo o mais. Dependendo da crise, poderá abraçar a bandeira desenvolvimentista com uma folha de serviços maior que a de Serra – em parte devido à conjuntura mais favorável que herdou, em parte devido ao modelo de gerenciamento do PAC.
Há outra diferença importante entre ambos. Serra sempre foi o contraponto ao neoliberalismo exacerbado de FHC; mas nunca conseguiu impor suas idéias. Já Dilma é a pessoa que conseguiu livrar o governo Lula da inércia produzida pelo estilo Palocci.
4.No campo das alianças políticas, o caminho é para a centro-esquerda. Serra tardiamente esqueceu suas raízes e passou a cultivar um público classe média conservador. Seu aliado preferencial, hoje em dia, é Roberto Civita. Tenho a impressão de que, em algum momento do futuro, o discurso de Serra se tornará mais ambíguo. Hoje em dia se percebe nitidamente um político com o discurso manietado por essa ambiguidade.
5.Seja qual for o vitorioso, entra em um momento em que o ciclo de financeirização de esgota. A partir de agora, ambos terão que explicitar melhor seus projetos para o país, cercar-se de think tanks, recuperar a capacidade de pensar o futuro. De qualquer modo, entre os dois o país estará bem servido.
Comentário: discordo frontalmente do tópico 5. Ademais, para mim, Serra se destacou como ministro do planejamento assinando o Proer. E, sobre a capacidade gerencial, muito mais me parece uma jogada de marketing das aves de rapina. Como prefeito e governador é uma simples nulidade porque sempre o fora. Só que antes, havia uma pesada propaganda sobre ele. Ninguém se lembra, por exemplo, do período em que ele foi ministro do planejamento (incríveis 4 anos esquecidos). Também ninguém se lembra do malfadado pacote de medidas que ele apresentou como ministro da saúde, que, dentre outros, impedia as pessoas de consultar um especialista médico antes de se consultar com um clínico geral. Exemplo: estou com um problema de pele. Não posso ir ao dermatologista. Tenho que ir a um clínico geral antes. Mas por que? Porque o senhor Serra quer assim.
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