domingo, 30 de março de 2008

O reacionarismo antidemocrático - por Luiz Felipe de Alencastro

Desde os anos 1970, quando se tornou o centro político do país nação (em 1965, a eleição direta de Negrão de Lima – juscelinista declarado – para o governo da Guanabara, abalou a ditadura e mostrou que o Rio ainda era a capital política nacional), São Paulo elege o que há de pior e de melhor no Brasil.

Jânio, Maluf, Enéas, Clodovil representam a primeira categoria. Ulysses, FHC, Suplicy, e Lula, cuja iniciação política deu-se em São Paulo, aparecem, conforme o gosto do freguês, como o que há de melhor.

Num artigo na Folha em 23/10/2005 procurei mostrar que este paradoxo constitui um dos componentes da "desordem paulista" que tumultua o quadro político nacional.

Dentre as coisas ruins da paulicéia, existe, ainda e sempre, um tipo de reacionarismo antidemocrático difícil de ser achado noutras partes do país.Assim, um artigo do deputado estadual paulista João Mellão Neto ("Os perigos da incomPeTência"), do DEM, publicado no Estadão em 3/08/2007, critica (com razão) a ausência de Lula junto às famílias das vítimas do Airbus em São Paulo, mas conclui com a seguinte reflexão:

"Nada contra o fato de o presidente se refugiar nos Estados nordestinos. Afinal, é neles que se encontra a grande maioria de seus eleitores, todos eles devidamente subornados pelo Bolsa-Família. Mas, a bem da Nação, a sua passagem deveria ser só de ida. Chegou a hora de dizer: Basta!"

Subornados?

BNH, correção monetária, juros altos para os bancos, juros negativos e perdão de dívidas para os usineiros, Proer, tudo que engordou a conta da classe média e de muita gente rica durante décadas desaparece diante do "suborno" do Bolsa-Família.

Ora, como escreveu outro dia Fernando Canzian no Folhaonline, "o difamado Bolsa Família é apenas uma fração dos juros pagos a quem tem dinheiro no banco, são 0,4% do PIB contra quase 7%".

Cabe lembrar que em 2006, Lula venceu na maioria dos Estados do Norte e do Nordeste, mas ganhou também em Brasília, Goiás, Espírito Santo, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Nestes 5 Estados ele obteve uma vantagem de 7.291.000 votos sobre Alckmin no segundo turno.

Ou seja, mesmo que todos os brasileiros do Norte e do Nordeste tivessem ficado em casa, ou pertencessem a um outro país, Lula ainda dava de lavada no candidato tucano no segundo turno.

Para ser coerente, o deputado do DEM deveria também incluir todos os brasilienses, goianos, capixabas, mineiros e cariocas no seu 'chega pra lá' excludente e preconceituoso.

De quebra, poderia agregar ainda, neste mesmo grupo de "subornados" cujo voto vale menos que o dele e de seus amigos, todos os eleitores da Baixada Santista e da Grande São Paulo, que também deram a maioria de seus votos a Lula.

Falta quanto tempo ainda para a direita brasileira aprender o caminho das pedras da prática democrática?

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