quarta-feira, 26 de março de 2008

A ocupação do Iraque, cinco anos depois - por Guilherme Scalzilli

Há um equívoco de origem nas discussões sobre se os EUA estão vencendo a “guerra contra o Iraque”: nunca houve guerra, mas ocupação. E essa constatação é mais conseqüente do que pode parecer à primeira vista. Guerras e ocupações têm objetivos e métodos diferentes. As primeiras terminam, por exemplo, e são fundamentalmente empreitadas militares, planejadas para atingirem essa finalidade o mais rapidamente possível. Domínio territorial, quando visado em si, faz sentido apenas se longevo, e possui aspectos econômicos indissociáveis da força armada.

Mas o completo usufruto das potencialidades econômicas, estratégicas e até simbólicas da ocupação não depende apenas da deposição do governo local e da presença de tropas. Um país em ruínas, com população hostil e mão-de-obra extenuada proporciona mais prejuízos que dividendos. A missão formalmente civilizadora dos EUA é incompatível com o expressivo número de baixas dos invasores, o genocídio dos civis iraquianos e o predomínio do terror, da tortura e da clandestinidade.

Acontece que manter um longo estado de beligerância no Iraque também é lucrativo para os grandes conglomerados que assumiram o poder com George W. Bush. A espantosa cifra de três trilhões de dólares (gasto estimado da invasão até agora) dá uma boa medida do tipo de riqueza envolvida. Trata-se de dinheiro público (ou quase) passando às mãos de companhias privadas, em pleno florescimento da maior crise financeira das últimas décadas. Mesmo exagerando a quantia gasta para cobrir indenizações, percebe-se que essa fortuna quase não se abala. Simplificando, para visualizar remotamente a cifra, imaginemos duas mil empresas recebendo um bilhão de dólares cada, em cinco anos.

Eis o aspecto tenebroso da conquista estadunidense: ela não transcorre segundo expectativas claramente definidas. Quanto mais se aproxima de uma vitória estritamente militar (inevitável a longo prazo), mais consolida a derrota do projeto inicial, que vislumbrava um protetorado submisso e estável. E o abandono dos objetivos originais, além de garantir satisfação financeira aos asseclas de Bush, ajuda a criar novos critérios de sucesso para divulgação à opinião pública.

Em resumo, basta imergir a ocupação desastrada no imaginário guerreiro para se inventar um triunfo militar. Em breve os EUA poderão abandonar um Iraque arruinado, sem perspectivas, entregue à miséria e ao desespero, e esse gesto parecerá vitorioso apenas pelo alívio que proporcionará.

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