quinta-feira, 1 de outubro de 2009

O caso Opportunity e a Folha - por Luis Nassif

O caso Opportunity e a Folha
Da Folha
Telecom Italia espionou várias teles no país
Em depoimentos à Justiça italiana, ex-executivos da TI revelam que Vivo, Telefônica e Telmex também foram investigadas
Entre as diversas atividades clandestinas estavam a invasão de computadores de empresas concorrentes e o furto de documentos

LEONARDO SOUZA
VALDO CRUZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Em depoimentos à Justiça italiana obtidos pela Folha, ex-executivos da Telecom Italia (TI) revelam, em detalhes, que a operação de espionagem montada pela companhia no Brasil era muito mais abrangente do que se imaginava.
Sabia-se desde 2004 da guerra de contrainteligência entre a TI e o Opportunity, do banqueiro Daniel Dantas, pelo controle da Brasil Telecom, que contratara a agência de investigação Kroll para bisbilhotar os italianos, atingindo também integrantes do alto escalão do governo Lula. Pela primeira vez, contudo, vêm a público no Brasil relatos da atividade clandestina contra outras companhias: Vivo, Telefônica e Telmex (Claro e Embratel).

LEONARDO SOUZAVALDO CRUZDA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Em depoimentos à Justiça italiana obtidos pela Folha, ex-executivos da Telecom Italia (TI) revelam, em detalhes, que a operação de espionagem montada pela companhia no Brasil era muito mais abrangente do que se imaginava.
Sabia-se desde 2004 da guerra de contrainteligência entre a TI e o Opportunity, do banqueiro Daniel Dantas, pelo controle da Brasil Telecom, que contratara a agência de investigação Kroll para bisbilhotar os italianos, atingindo também integrantes do alto escalão do governo Lula. Pela primeira vez, contudo, vêm a público no Brasil relatos da atividade clandestina contra outras companhias: Vivo, Telefônica e Telmex (Claro e Embratel).
Giuliano Tavaroli, Fabio Ghioni e Angelo Jannone, todos ex-dirigentes da TI, contam, nos testemunhos aos quais a Folha teve acesso, como invadiram as redes de computadores dos adversários, admitem furto de documentos e falam até como um deles foi usado como "isca" pela Polícia Federal para prender um agente da Kroll no Rio de Janeiro.
Os três foram denunciados pelo Ministério Público de Milão em julho do ano passado, com outros 31 envolvidos no caso, por violar sistemas de informática e fazer escutas ilegais contra pessoas na Itália e no exterior em defesa dos interesses da TI.
Eles foram afastados da empresa italiana, cuja direção atual costuma dizer que os episódios aconteceram em administrações anteriores.
No Brasil, a TI é dona da operadora de telefonia celular TIM. Foi por muitos anos também acionista da Brasil Telecom, numa sociedade conturbada marcada por brigas com Daniel Dantas e os fundos de pensão estatais (Previ, Petros e Funcef).
Além dos testemunhos, prestados em 2007, a polícia italiana também apreendeu com os investigados CDs e pen drives com os arquivos extraídos das companhias adversárias. Os documentos são listados no processo, que tramita no Tribunal Civil e Criminal de Milão. A reportagem teve acesso a mais de 700 mil páginas reunidas pela Justiça italiana.
Há e-mails, arquivos de texto, planilhas etc. No processo, os documentos são transcritos apenas de forma genérica.
"No que concerne ao material subtraído da sociedade Vivo e Telmex efetivamente lembro que [Giuliano] Tavaroli anunciou a exigência de adquirir informações sobre vários concorrentes no Brasil, [...] de recorrer a ataque preventivo contra concorrentes particularmente aguerridos [...]", contou Ghioni, ex-vice-diretor de Segurança da TI.
Ele se reportava diretamente a Tavaroli, então diretor mundial de segurança da companhia e apontado pelo Ministério Público de Milão como o cabeça do esquema de espionagem da TI.
Ghioni, por sua vez, era o principal integrante da "Tiger Team", grupo de hackers comandado por Tavaroli. "No que se refere à sociedade Vivo, poderia tratar-se de material subtraído no local, enquanto em relação à Telmex é possível que tenha sido interceptada a webmail", completou Ghioni.Na casa de Tavaroli foi encontrado um pen drive com vários documentos da Vivo, controlada pela espanhola Telefónica e pela Portugal Telecom.
Na casa de outro membro da "Tiger Team", Andrea Pompili, foi apreendido um CD com arquivos da Telefónica aparentemente confidenciais, segundo a Justiça italiana.
"No suporte estão de fato memorizados os resultados dos desvios [...] na Telefónica [...] contendo informações provavelmente reservadas e obtidas presumivelmente através de manipulação dos URL [endereços na internet]."

Diversos meios

Ghioni explicou como se davam as invasões, podendo ser adotados diferentes meios, dependendo das circunstâncias. Um dos mais empregados ocorria da seguinte forma: eles criavam um e-mail fictício igual ao de uma pessoa conhecida do alvo desejado. Era então enviada uma mensagem contendo um programa espião chamado "animaletto.txt".
Como o remetente parecia confiável, o destinatário abria o e-mail, dando-se então a instalação do "spyware", que passava a remeter para o hacker os arquivos contidos no computador atacado.
Para dificultar a origem da pirataria telemática, caso fosse descoberta, Ghioni usava servidores (computadores que proveem dados e serviços a redes como a internet) localizados nos Estados Unidos, Coreia, Malásia e Tailândia.
Em 2005, os fundos de pensão, em acordo com o Citibank, conseguiram destituir o Opportunity da administração da Brasil Telecom. Foi então selecionada a consultoria Angra Partners para gerir a BrT.
Os integrantes da "Tiger Team" também invadiram os computadores da Angra Partners em 2005, segundo admitiu Ghioni em seu depoimento à Justiça italiana.
Em 2004, a PF iniciou a Operação Chacal, que investigou suposta atividade ilegal da Kroll no Brasil, a mando de Daniel Dantas. Paralelamente ao trabalho da PF, os italianos promoveram uma série de ações contra os agentes da Kroll. Numa delas, em um hotel no Rio, invadiram o computador de um deles e roubaram vários arquivos, que depois foram selecionados e gravados em um CD entregue à PF.
Em outra passagem, Angelo Jannone, ex-chefe da Segurança da TI para América Latina, ajudou os policiais brasileiros a prender um colaborador da agência americana de investigação. "Eu tive de servir de isca para a Polícia Federal", contou Jannone à Justiça italiana.

Comentário

Alguns comentários:
1. A notícia é velha. É o tal relatório italiano que a Veja vivia alardeando. Está disponível há mais de ano nos sites da Justiça italiana. Já mereceu ampla reportagem da Carta Capital. A única informação relevante é tentar levantar qual a motivação da Folha para ressuscitar notícia velha, correndo um claro risco de imagem.
2. Conforme a discussão que houve aqui na época, a intenção dos advogados do Opportunity sempre foi a de misturar os dois inquéritos – a Operação Anaconda da Polícia Federal (que apura grampos de Dantas) e o dos italianos – por uma razão simples. O inquérito italiano se baseou em interceptações ilegais de telefones e emails pela Telecom Italia. O brasileiro só em cima de interceptações autorizadas pelo juiz. Misturando os dois inquéritos, haveria uma “contaminação” do inquérito brasileiro. O que daria margem a anos de discussão.
3. Na minha série sobre a Veja, no capítulo “O lobista de Dantas”, expliquei essa manobra jurídica. Quando explodiu a Satiagraha e a defesa de Dantas entrou em pânico, Mainardi acelerou passo para conseguir a incorporação do inquérito italiano no brasileiro. Afirmou em sua coluna ter levado pessoalmente o material ao juiz que cuida do caso. Logo em seguida, o “macaco em loja de louças” Nélio Machado – advogado do Opportunity – escancarou a defesa, ao admitir a tese da “contaminação. Sua manifestação provocou uma resposta da procuradora paulista Anamara Osório Silva que cuida do caso, que soltou uma nota sustentando que não haveria essa incorporação e que a tese da contaminação não se sustentava. Então que fique claro que a tese da defesa de Dantas, para melar o inquérito, é sustentar que a Anaconda contou com ajuda dos arapongas da Telecom Italia.
5. Certamente os advogados do Opportunity farão muito bom uso desses parágrafos especialmente selecionados:
(…) Em 2004, a PF iniciou a Operação Chacal, que investigou suposta atividade ilegal da Kroll no Brasil, a mando de Daniel Dantas. Paralelamente ao trabalho da PF, os italianos promoveram uma série de ações contra os agentes da Kroll. Numa delas, em um hotel no Rio, invadiram o computador de um deles e roubaram vários arquivos, que depois foram selecionados e gravados em um CD entregue à PF.
(…) Em outra passagem, Angelo Jannone, ex-chefe da Segurança da TI para América Latina, ajudou os policiais brasileiros a prender um colaborador da agência americana de investigação. “Eu tive de servir de isca para a Polícia Federal”, contou Jannone à Justiça italiana.
É nítida a intenção da matéria em definir a relação entre a Operação Chacal e os arapongas italianos. Supor que dois jornalistas sem familiaridade maior com o tema leram 700 mil páginas e selecionaram jornalisticamente apenas trechos que interessavam diretamente à defesa de Dantas, é acreditar demais nos métodos de leitura dinâmica.
Como são jornalistas sérios, a matéria traz pelo menos uma informação relevante: o tema Opportunity passa diretamente pela Direção de Redação do jornal.

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