A revista Economist, usando a tradicional ironia britânica, brincou um dia desses que se os democratas perderem a eleição presidencial de 2008 nos Estados Unidos devem "mudar de ramo". Sim, a conjuntura era francamente favorável a Barack Obama: país em guerra, governo impopular e crise econômica. Hoje podemos dizer que Obama está empatado com o republicano John McCain nas pesquisas.
Qual é, caro leitor, a conjunção que pode provocar a vitória de McCain contra todas as previsões em contrário?
Vamos dividir em três partes.
Em primeiro lugar estão as ações do próprio presidente Bush, com repercussões na campanha eleitoral. Bush passou os últimos dois anos, desde que os democratas reassumiram o controle do Congresso, caminhando para o centro. Fez, na economia, tudo o que um democrata teria feito para salvar Wall Street: a maior intervenção estatal na economia desde a Depressão de 1929. No Iraque, adotou a proposta de Barack Obama: retirada parcial das tropas, um calendário vago prevendo a saída da maior parte dos soldados, a transferência de reforços para o Afeganistão e ações militares preventivas no Paquistão para enfrentar o talibã. Ou seja, na prática Bush esvaziou a plataforma de Obama.
Em segundo lugar estão as ações de John McCain. Ele tomou a iniciativa de partir para o ataque com uma campanha que usou contra Obama o que o democrata tem de melhor: a retórica e o apelo ao idealismo. Colou no adversário o rótulo de "celebridade". Em seguida, McCain partiu para se definir como agente da mudança - outro ponto forte de Obama. Quando os democratas articularam um discurso tentando colar McCain a Bush, em sua convenção, os republicanos lançaram Sarah Palin como candidata a vice - o que reforçou a imagem de McCain como "agente da mudança".
Em terceiro lugar estão as ações do próprio Barack Obama. Depois de vencer as primárias ele começou a dar passos ao centro com o objetivo de se tornar confiável para o grupo que controlava historicamente o Partido Democrata, ligado ao casal Clinton. Com isso perdeu o entusiasmo da ala mais à esquerda do Partido Democrata, especialmente quando votou a favor de dar imunidade às companhias telefônicas que ajudaram o governo Bush a monitorar, sem autorização da Justiça, os telefones de cidadãos estadunidenses. Esse "realismo" político, que alguns preferem chamar de oportunismo, solapou a própria idéia de que Obama era um político diferente dos outros, combustível do movimento de "mudança" que o levou à vitória. Além disso, a guinada de Obama em direção ao centro fez com que ele assumisse posições muito próximas das de McCain.
Os dois candidatos são favoráveis à entrada da Geórgia e da Ucrânia na OTAN; os dois candidatos são favoráveis às posições de Israel no Oriente Médio; os dois candidatos apóiam a exploração de petróleo na costa dos Estados Unidos; os dois candidatos prometem enfrentar o aquecimento global. Qual é a diferença marcante entre os dois? McCain fala em manter os cortes de impostos do governo Bush. Obama diz que manterá os cortes de impostos até certa faixa de renda. McCain indicou uma vice que é contra o aborto, mas ele tem uma posição mais flexível. Obama também "flexibilizou" sua posição sobre o aborto e o porte de armas.
Assim sendo, é apenas natural que os eleitores analisem os currículos dos dois candidatos em busca de diferenças. Obama é um senador em primeiro mandato, que nunca desempenhou qualquer papel no Executivo e que fez a campanha em torno de sua biografia. Tem como vice um senador veterano, Joe Biden, sem experiência administrativa, que é a imagem escarrada de Washington.
John McCain é um senador veterano com fama de independência que foi herói de guerra no Vietnã e tem como vice uma governadora jovem de um estado distante de Washington que, assim como o colega de chapa, tomou decisões que não são necessariamente populares mas indicam que tem personalidade: teve um filho com síndrome de down quando poderia ter recorrido à saída mais fácil, o aborto.
Os republicanos roubaram a plataforma de Barack Obama e podem se eleger como candidatos da oposição.
PS: Os Clinton não perdem nada se McCain se eleger. Se isso acontecer, Hillary Clinton assume imediatamente o comando da oposição, de olho em 2012. Assim é a política.
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